Oxigenoterapia Daiane Scortegagna Maria Buratto Souto 3 3 Este capítulo apresenta um conhecimento que envolve um saber científico no cotidiano de cuidado com crianças que necessitam de suplementação de oxigênio. Acredita-se que esse saber instrumentaliza os profissionais de saúde, reduzindo o risco de iatrogenias, pois a administração de medicamentos como o oxigênio exige cuidados minuciosos, visto o papel que exerce sobre a vida. INTRODUÇÃO O sistema respiratório representa a principal interface entre e meio ambiente e o corpo humano e é representado por uma série de tubos acoplados a uma espécie de fole elástico, o território alveolar. Essa interface é extremamente grande, com área aproximada de 70 a 100 m2, e, ao mesmo tempo, por ser extremamente fina, é representada por uma barreira cuja espessura média não ultrapassa 1μm. O trato respiratório compreende desde o nariz até os alvéolos pulmonares e visa fundamentalmente a garantir a realização das trocas gasosas em condições adequadas, face à inalação constante de impurezas e de microrganismos presentes no meio ambiente (West, 2002). No entanto, não se pode esquecer das diferenças anatômicas do pulmão pediátrico e do pulmão adulto. Como afirma Naspitz, [...] o pulmão do recém-nascido não é a miniatura do pulmão de um adulto. Durante o crescimento e até atingir o estágio adulto, o diâmetro traqueal triplica, as dimensões alveolares aumentam cerca de quatro vezes e o número de alvéolos aumenta cerca de dez vezes, enquanto a massa corpórea aumenta vinte vezes (Naspitz, 2003, p. 149). 30 Souto, Lima, Breigeiron e cols. Em decorrência do processo de alveolização no período da infância, novos septos secundários continuam a aparecer no interior dos sáculos e crescem para o interior dos espaços aéreos. Como conseqüência disso, o número de alvéolos aumenta rapidamente de 20 milhões a 200 milhões até o terceiro ano de vida. Após os oito anos de vida, poucos alvéolos se desenvolvem; a partir desse momento, o crescimento ocorre por aumento das dimensões alveolares. O número de alvéolos nos pulmões de um indivíduo adulto varia de 200 a 600 milhões. Conforme Naspitz, [...] enquanto ocorre a multiplicação dos alvéolos, novos vasos sangüíneos aparecem juntamente com os ácinos, e a razão entre o número de alvéolos e o número de capilares arteriais permanece relativamente constante durante a infância. A ramificação arterial continua até os 18 meses de idade, sendo que um número maior de capilares arteriais continua aparecer até oito anos de idade. Com o decorrer da idade, há um aumento proporcionalmente maior de artérias em relação aos alvéolos (Naspitz, 2003, p.149). Mesmo existindo significativas diferenças anatômicas, as funções do sistema respiratório permanecem as mesmas, independentemente da idade. As principais funções do sistema respiratório são a obtenção de oxigênio do ambiente externo e o seu suprimento às células e a remoção do dióxido de carbono (produzido pelo metabolismo celular) do corpo (Levitzky, 2004). Quando sadio, o funcionamento do sistema respiratório e circulatório determina condições favoráveis de vida. Conhecer o mecanismo sadio de ambos os sistemas facilita o entendimento das manobras de reanimação, pois é por meio das vias aéreas (oxigenação e ventilação) e da circulação (perfusão) que se sustentam as primeiras abordagens em ressuscitação de crianças. Prevenir o colapso respiratório e circulatório constitui a melhor atitude da equipe de saúde pediátrica. As crianças, na maioria das vezes, mostram sinais de piora por meio do sistema respiratório. Os profissionais de enfermagem treinados e capacitados possuem um potencial inestimável de contribuição no sentido de prevenir a parada cardiorrespiratória. A avaliação freqüente da eficácia da ventilação e da oxigenação, a identificação das alterações e a intervenção precoce podem determinar o prognóstico de uma criança em situação de risco. Intervenções simples podem tornar efetivas a oxigenação e a ventilação de uma criança doente em situação de hospitalização. Mudanças na Reanimação cardiorrespiratória pediátrica 31 freqüência respiratória (FR) e na responsividade, fraca resposta aos estímulos, não reação à dor e hipotonia são sinais de que algo sério está por acontecer e exigem uma avaliação. Ao constatar um ou mais desses sinais, deve-se imediatamente comunicá-los ao enfermeiro ou ao médico, bem como realizar o registro dessas observações. Os registros asseguram a visibilidade e legalizam as ações de cuidado, constituindo prova documental e auxiliando na continuidade dos cuidados. Além disso, os registros conferem credibilidade aos serviços e às instituições de saúde. Manter a calma, utilizar o conhecimento, estabelecer a comunicação entre a equipe de enfermagem e a equipe médica, agir rápida e precisamente e manter-se presente e atento durante a situação de risco possibilitam bons resultados no cotidiano de cuidado da criança hospitalizada. Os familiares não podem ser esquecidos no momento de piora de seu filho, e sim incluídos no plano de cuidados. Eles devem receber informações sobre o que está acontecendo, para que possam participar desse processo de conviver com a situação crítica da doença e contribuir nas decisões para as quais forem socilitados. Ao avaliar uma criança, é importante observar: a) permeabilidade das vias aéreas superiores; b) qualidade do padrão respiratório; c) incursões adequadas e movimentos simétricos de inspiração e expiração; d) qualidade da resposta aos estímulos; e) ausculta de sons pulmonares em ambos os hemitórax; f) esforço para respirar, retrações supraclavicular, intercostal e subcostal; g) perfusão sangüínea periférica; cor, aquecimento e tempo de enchimento capilar; h) controle de saturação de oxigênio por oximetria de pulso. As crianças que apresentam insuficiência respiratória exigem vigilância dos profissionais de saúde, avaliações sucessivas e registros do acompanhamento. As crianças com comprometimento em sua ventilação e em sua oxigenação podem apresentar agitação, alterações no nível de consciência, aumento da FR, retrações supra clavicular, intercostal e subcostal de grau leve a grave, agitação da cabeça de um lado para outro, cianose, retardo no enchimento capilar, queda ou elevação da temperatura 32 Souto, Lima, Breigeiron e cols. axilar e saturação de oxigênio menor que 90%, entre outros sinais (Hazinski, 2003). A escolha do método para a oferta de oxigênio suplementar é uma determinação médica, pois deve ser feita considerando o quadro clínico e a doença base da criança. A monitoração dos sinais de melhora definem o sucesso da determinação terapêutica. A monitoração da oxigenoterapia é realizada por oxímetro de pulso, um equipamento não-invasivo que possibilita a medição contínua da saturação de oxigênio no sangue arterial, porém não garante que a ventilação esteja adequada. A oximetria de pulso não é confiável nas seguintes situações: a) vasoconstrição; b) intoxicação por monóxido de carbono; c) anemia profunda, hemoglobina = <5g/dL; d) hipotermia < 30oC ou 86°F (Hazinski, 2003). Possíveis iatrogenias podem ser evitadas quando o sistema de administração de oxigênio é instalado, monitorado e revisado por profissionais treinados. MEDIDAS DA OXIGENAÇÃO A oxigenação arterial pode ser expressa tanto pela pressão arterial parcial de oxigênio (PaO2), como pela saturação arterial da hemoglobina (SaO2). A PaO2 é a medida da pressão parcial do oxigênio dissolvido no plasma do sangue arterial e pode ser medida em mmHg, sendo também o mais importante determinante da saturação de hemoglobina. Valores normais encontram-se acima de 80 mmHg (Postiaux, 2004). A saturação de oxigênio é medida pela quantidade deste gás ligado à hemoglobina e é expressa como valor percentual, sendo que sua faixa normal situa-se entre 90 e 96%. Quando não há oxigênio suficiente nas células, acontece a hipoxia; quando a concentração sérica de oxigênio é inadequada, ocorre a hipoxemia. A Figura 3.1 mostra o equipamento usado para monitorar a saturação de oxigênio periférico. CIANOSE Entende-se por cianose a coloração azulada observada na pele e/ou mucosa do paciente que está provavelmente apresentando alguma altera- Reanimação cardiorrespiratória pediátrica 33 FIGURA 3.1 Oxímetro de pulso. ção respiratória e/ou circulatória. Seu aparecimento deve-se a dois fatores: queda na saturação de oxigênio e quantidade de hemoglobina reduzida no sangue capilar periférico. Tipos de Cianose A cianose é dividida, fisiologicamente, em duas categorias: cianose periférica e cianose central. Cianose Periférica Na cianose periférica, a tensão de oxigênio no sangue arterial está normal, mas a lentificação do fluxo capilar sangüíneo leva a uma maior extração de oxigênio pelos tecidos. Causam cianose periférica a exposição ao ar frio, a queda do débito cardíaco, a redistribuição do fluxo sangüíneo (síndrome do choque) e a estase venosa (Aires, 2000). Por exemplo, pode-se observar cianose periférica nas mãos, nos pés e na região peribucal (Murahovschi, 1993). Cianose Central Na cianose central, a queda na saturação de oxigênio é secundária à diminuição de tensão de oxigênio no sangue arterial. A cianose central, ocorre quando há diminuição de oxigênio no ar inspirado, hipoventilação alveolar (comprometimento dos centros respiratórios), alteração da difusão de O2, shunt sangüíneo venoarterial (a cianose ocorrerá se o shunt for maior que 30% do débito; esses shunts podem ocorrer em nível cardíaco ou pulmonar) e alterações da hemoglobina (metemoglobina) (Aires, 2000). Um exemplo de cianose central é a cianose generalizada, que envolve tronco, membros, língua e mucosa bucal (Murahovschi, 1993). 34 Souto, Lima, Breigeiron e cols. MÉTODOS DE ADMINISTRAÇÃO DE OXIGÊNIO O oxigênio está disponível na natureza em uma concentração de 21%. Quando há necessidade de se ofertar uma concentração superior a 21%, o oxigênio é oferecido como medicamento. O oxigênio possui as seguintes características: é um gás inodoro, incolor, inflamável e impermeável à água e ou à secreção (Carvalho, 2001). Os métodos de administração de oxigênio estão em constante aperfeiçoamento. Neste capítulo, não são esgotados os métodos existentes de administração de oxigênio em pediatria. É necessário lembrar que o método deve ser adequado à situação e à tolerância da criança. Para crianças com a percepção sensorial preservada, recomendam-se métodos que previnam a agitação e possibilitem a comunicação, a alimentação e a recreação no leito ou fora dele (Hazinski, 2003). Os dispositivos de oferta de oxigênio são classificados de acordo com seu modelo. Existem três modelos básicos: sistema de fluxo baixo, sistema com reservatório e sistema de fluxo alto (Scanlan; Wilkins; Stoller, 2000). Cada um desses modelos compartilha características, capacidades e limitações comuns (Scanlan; Wilkins; Stoller, 2000). A seguir é feita uma breve descrição de cada modelo e, posteriormente, são abordadas, com mais detalhes, as formas mais utilizadas na oferta de oxigênio em pediatria. Sistema de Fluxo Baixo O sistema de fluxo baixo fornece oxigênio suplementar às vias aéreas diretamente com fluxo de 8 L/min ou menos. O oxigênio fornecido por um dispositivo de fluxo baixo é sempre diluído com ar, resultando em uma FiO2 baixa e variável (Scanlan; Wilkins; Stoller, 2000). Sistema com reservatório O sistema de reservatório é um mecanismo de coleta e armazenamento de oxigênio entre as inspirações do paciente. O paciente utiliza esse suprimento de reserva sempre que seu fluxo inspiratório for superior ao fluxo de oxigênio que entra no dispositivo. Uma vez que isso reduz a diluição aérea, os dispositivos com reservatórios geralmente fornecem uma FiO2 mais elevada do que os sistemas de fluxo baixo (Scanlan; Wilkins; Stoller, 2000). Sistema de Fluxo Alto Os sistemas de fluxo alto fornecem concentrações de oxigênio em fluxos iguais ou superiores ao fluxo inspiratório máximo do paciente. Isso Reanimação cardiorrespiratória pediátrica 35 ocorre devido a um sistema de arrastamento de ar ou de mistura. Enquanto o fluxo liberado for superior ao fluxo do paciente, ambos os sistemas podem assegurar uma FiO2 fixa. A seguir, são descritos os diferentes métodos de administração de oxigênio, bem como suas concentrações aproximadas, vantagens e desvantagens. Cateter intranasal Este método de fluxo baixo é pouco utilizado e desaconselhado em pediatria, pois não acrescenta vantagens e pode causar hemorragias por trauma a adenóides aumentadas, produzir distensão gástrica e complicações esofágicas se colocado erroneamente no esôfago (AHA,1998) (Fig. 3.2). Para instalar o cateter, é necessário medir a distância entre a base do nariz e o lóbulo da orelha. O resultado dessa medida é o máximo que se deve introduzir no nariz, para evitar complicações. Pólipos de desvios de septos podem bloquear a inserção. Com cateter intranasal, pode-se ofertar oxigênio em um fluxo com uma variação de FiO2 de 22 a 45% (Scanlan; Wilkins; Stoller, 2000). a) Vantagens: boa estabilidade; descartável e barato. b) Desvantagens: é difícil de inserir; pode provocar reflexo de vômito, deglutição de ar e aspiração; necessita ser trocado com freqüência; obstrui facilmente. FIGURA 3.2 Cateter intranasal. 36 Souto, Lima, Breigeiron e cols. Cateter nasal tipo óculos Atualmente, existem no mercado vários desenhos de cateter tipo óculos, com qualidade e custo variáveis. Com esse método, o oxigênio é administrado com fluxo baixo de 0,5 a 6 litros e pode atingir concentrações de até 50% (Fig. 3.3). Esse é um método de administração de oxigênio bem tolerado em lactentes e crianças maiores. a) Vantagens: é confortável; facilita a comunicação, a alimentação, o brincar e a visualização do rosto da criança sem afetar o fluxo; é barato e de fácil utilização. b) Desvantagens: fluxos superiores a 3 litros podem ressecar e traumatizar a mucosa nasal; em situação de obstrução nasal, torna-se sem efeito; em vigência de respiração bucal, a fração de oxigênio inspirado diminui. FIGURA 3.3 Cateter nasal tipo óculos. Campânula ou oxitenda Campânulas e oxitendas são equipamentos de plástico ou acrílico transparentes que possibilitam oferta de oxigênio em várias concentrações. Reanimação cardiorrespiratória pediátrica 37 Seu uso vem sendo substituído por métodos mais modernos. A campânula utilizada em recém-nascidos é arredondada, permitindo posicioná-los de forma que sua via aérea superior inale o oxigênio na concentração programada. Para a oferta de 100% em uma campânula, são necessários 8 litros de oxigênio puro. Para concentrações menores, a oferta de oxigênio é associada ao ar comprimido. Para crianças maiores, é utilizada a oxitenda de 15 ou de 30 litros. Para a oferta de oxigênio a 100%, é oferecido o gás puro, sendo que, na redução das concentrações, associa-se o ar comprimido, utilizando-se a seguinte fórmula: FiO2 = litros OO22× ×100 100++nno ode delitros litrosde dearar××0,21 21 nnoolitros o o nn total de litros litros Por exemplo, para oferecer uma FiO2 de 40% em uma oxitenda com capacidade de 15 litros para 100%, necessita-se de um fluxo de 11 litros de ar e fluxo de 4 litros de oxigênio. O somatório da mistura oxigênio e ar comprimido deve ser igual à capacidade da oxitenda. Esse método requer oxímetro específico para medir a concentração de oxigênio em campânula e monitorar adequadamente a oferta na concentração desejada. FIGURA 3.4 Campânula para ofertar oxigênio. 38 Souto, Lima, Breigeiron e cols. Máscaras Existem quatro tipos de máscaras para ofertar oxigênio: dois tipos sem reservatório e dois tipos com reservatório. Máscaras sem reservatório Máscara simples A máscara simples é projetada para cobrir a boca e o nariz do paciente, coletando e armazenando oxigênio entre as inspirações. O paciente expira diretamente através dos orifícios laterais da máscara. A variação do fluxo de entrada de uma máscara simples é de 5 a 12 L/min. A máscara simples fornece uma FiO2 variável de acordo com o fluxo (Scanlan; Wilkins; Stoller, 2000). a) Vantagens: pode ser usada em adultos e crianças; pode ser colocada com facilidade; possui baixo custo. b) Desvantagens: é desconfortável; deve ser removida para a alimentação. Máscara de Venturi Por meio desse método é possível oferecer concentrações de oxigênio de baixo e de alto fluxo, pois essas máscaras são precisas, seguras e facilmente controláveis, permitindo obter concentrações de oxigênio entre 25 e 60%, ajustadas pela mudança do dispositivo denominado Venturi. Esse método permite a inalação de ar ambiente misturado ao oxigênio fornecido. Uma máscara simples é adaptada a uma conexão tipo traquéia, conectada ao Venturi, a qual dispõe de uma abertura variável, determinando o fluxo e a concentração de oxigênio desejados. Tanto o fluxo quanto a concentração são indicados no próprio Venturi, os quais são diferenciados por cores. O sistema é adaptado a um extensor de látex ou plástico conectado ao umidificador (Fig. 3.5). a) Vantagem: permite a regulagem das concentrações de oxigênio desejadas, sem manuseio excessivo do paciente; b) Desvantagem: não pode de ser indicada para uso domiciliar devido ao alto fluxo de ar que é utilizado. Reanimação cardiorrespiratória pediátrica 39 FIGURA 3.5 Máscara de Venturi e assessórios. Máscaras com reservatório Máscara de reinalação parcial Por esse método, considerado de baixo e de alto fluxo, o oxigênio é oferecido através de uma máscara facial plástica simples e transparente acoplada a uma bolsa reservatório. Durante a exalação, uma parte do ar entra na bolsa e se combina com o oxigênio fresco. Essa máscara promove de forma confiável a oferta de oxigênio inspirado em uma concentração de 35 a 60%. Nesse método é requerido um fluxo de oxigênio de 6 a 10 L/min, o que impede o colapso da bolsa na inspiração, ofertando uma FiO2 de moderada a elevada. a) Vantagens: acontece a troca rica em oxigênio, pois, durante a inspiração, o paciente extrai predominantemente o oxigênio fresco da bolsa reservatório; a bolsa reservatório se mantém cheia de oxigênio; a reinalação de CO2 é evitada na medida em que é garantido o fluxo de oxigênio. b) Desvantagem: é desconfortável; deve ser removida para a alimentação; impede a perda de calor rapidamente; bloqueia o vômito no paciente inconsciente; apresenta risco potencial de sufocação. 40 Souto, Lima, Breigeiron e cols. Máscara de não-reinalação A máscara de não-reinalação impede a reinalação por meio de uma válvula unidirecional. Uma válvula inspiratória encontra-se localizada no topo da bolsa, enquanto a(s) válvula(s) expiratória(s) cobre(m) as portas de expiração sobre o corpo de máscara. Durante a inspiração do paciente, uma pressão negativa discreta na máscara fecha a válvula expiratória. Ao mesmo tempo, a válvula inspiratória se abre, fornecendo oxigênio ao paciente (Scanlan; Wilkins; Stoller, 2000). Na expiração, a ação da válvula reverte a direção do fluxo. Essa máscara promove de forma confiável a oferta de uma concentração de oxigênio inspirado em 55 a 70%. Esse método requer um fluxo de oxigênio de 6 a 10 L/min, o que impede o colapso da bolsa na inspiração (Scanlan; Wilkins; Stoller, 2000). Com a máscara bem vedada à face, oferta-se uma FiO2 de até 95% com fluxo de 10 a 15 L/min. a) Vantagens: é rápida e fácil de ser colocada; oferece uma troca rica em oxigênio, pois, durante a inspiração, o paciente extrai predominantemente o oxigênio fresco da bolsa reservatório que se mantém cheia de oxigênio; a reinalação de CO2 é evitada na medida em que é garantido o fluxo de oxigênio. b) Desvantagem: é desconfortável; deve ser removida para a alimentação; FIGURA 3.6 Máscara de não-reinalação. Reanimação cardiorrespiratória pediátrica 41 impede a perda de calor rapidamente; bloqueia o vômito no paciente inconsciente; apresenta risco de sufocação. MÉTODOS DE ADMINISTRAÇÃO DE OXIGÊNIO POR VENTILAÇÃO MECÂNICA NÃO-INVASIVA O tratamento da insuficiência respiratória passou por mudanças importantes nestes últimos 20 anos, principalmente em relação a técnicas de suportes ventilatórios. Surgiram respiradores com maiores recursos, mais sensíveis e integrados, permitindo, assim, maior segurança e eficiência terapêutica (Carvalho, 2001). Definição A ventilação não-invasiva é definida como uma técnica de ventilação mecânica em que não é empregada qualquer prótese traqueal (tubo orotraqueal, nasotraqueal ou cânula de traqueostomia); a conexão entre o ventilador e o paciente é uma máscara. Os benefícios da ventilação nãoinvasiva, segundo Beidack e Savi (2006), resumem-se em: a) alívio dos sintomas; b) melhora da troca gasosa; c) redução do risco de entubação; d)redução do tempo de hospitalização; e) redução da mortalidade; f) redução dos custos. As contra-indicações para o uso de ventilação mecânica não-invasiva são as seguintes: a) diminuição de consciência, sonolência, agitação, confusão ou recusa do paciente; b) instabilidade hemodinâmica com necessidade de utilização de vasopressores, choque e arritmias complexas; c) obstrução das vias aéreas superiores ou trauma de face; d)distenção abdominal e/ou vômito; e) sangramento digestivo alto; f) infarto agudo do miocárdio; g) pós-operatório recente de cirurgias de face, vias aéreas superiores e esôfago. 42 Souto, Lima, Breigeiron e cols. A utilização de ventilação mecânica com Continuous Positive Aireway Pressure (CPAP) e Bilevel Positive Pressure Airway (BIPAP) contribuem com recursos terapêuticos eficientes e podem evitar que muitos pacientes venham a ser ventilados invasivamente. A ventilação não-invasiva requer monitoração clínica e laboratorial e pessoas bem treinadas e cientes da gravidade dos casos e das limitações do tratamento. Ela nunca deve ser utilizada fora de uma unidade especializada (Carvalho, 2001). Tipos Na ventilação não-invasiva, há dois tipos de ventilação, um com níveis fixos de pressões para a inspiração e a expiração (CPAP) e outro com pressões diferentes e ajustáveis para a inspiração e a expiração (BIPAP). Essas pressões são chamadas de IPAP (inspiratory positive airway pressure) e EPAP (expiratory positive airway pressure). CPAP (Continuous positive airway pressure) O sistema de CPAP consiste no fornecimento fixo de determinadas pressões tanto na inspiração quanto na expiração em pacientes que têm ventilação espontânea (Azevedo, 2000). Essas pressões são mantidas entre 5 a 20 cmH2O. O sistema pode ser utilizado em bebês, prematuros ou não, em crianças e em adultos. Fatores benéficos dessa terapia: 1) o recrutamento de alvéolos colapsados por meio de um aumento da CRF (capacidade residual funcional); 2) a diminuição do trabalho respiratório em razão do aumento da complacência ou da abolição da auto-PEEP; 3) uma melhor distribuição da ventilação por intermédio dos canais colaterais (p. ex., Poros de Kohn); 4) um aumento da eficácia de remoção de secreção (Scanlan; Wilkins; Stoller, 2000). Contra-indicações: Traumatismos faciais, pneumotórax não-drenado, náuseas e hipertensão intracraniana. a) Vantagens: não invasibilidade; diminição do desconforto; redução do índice de entubação; preservação da fala/da comunicação; preservação da tosse; manutenção da dieta. Reanimação cardiorrespiratória pediátrica 43 b) Desvantagens: somente para pacientes selecionados distensão gástrica; hipoxemia transitória; problemas na interface; trauma facial quando não estão disponíveis os curativos hicolóides para proteger a pele. FIGURA 3.7 CPAP nasal. BIPAP (Bilevel Positive Pressure Airway) O sistema BIPAP oferece dois níveis de ventilação, um fluxo de inspiração e um fluxo de expiração, e é indicado para pacientes gravemente hipoxêmicos (PaO2 < 60 mmHg). São equipamentos que possuem válvula exalatória e promovem repouso da musculatura respiratória, sobreposição da pressão expiratória intrínseca e redução da sobrecarga do miocárdio (Beidack; Savi, 2006). O uso desse método exige a não-interrupção da oferta de oxigênio, exceto em caso de expectoração e de vômitos. Os pacientes que utilizam esse método de pressão positiva intermitente devem ter PaCO2 e pH monitorados e mantidos entre 30 a 50 mmHg e 7,30 e 7,50, respectivamente. As complicações também devem ser monitoradas, pois nem todas as crianças o toleram bem. Sinais de distensão abdominal e piora da disfunção respiratória devem ser comunicados ao médico. O BIPAP exige ajustes de acordo com a situação e a evolução de cada paciente. a) Vantagens: equipamentos leves e portáteis; máscaras confortáveis; preservação da fala, da comunicação; 44 Souto, Lima, Breigeiron e cols. preservação da tosse; manutenção da dieta; redução do risco de entubação e de infecção; melhora da hipercapnia; possibilidade de aspiração de secreção. b) Desvantagens: distensão gástrica por aerofagia; problemas de interface; dificuldade de ajustes da máscara em pacientes muito emagrecidos; trauma facial quando não estão disponíveis os curativos hidrocolóides para proteger a pele. FIGURA 3.8 Máscara de BIPAP/CPAP. ADMINISTRAÇÃO DE OXIGÊNIO POR USO DE VENTILADORES MECÂNICOS INVASIVOS Os aparelhos de ventilação mecânica invasiva podem ser classificados de acordo com os mecanismos de ciclagem: pressão, tempo e/ou volume. Os aparelhos ciclados por pressão são os que fornecem ar para a inspiração a uma determinada pressão pré-selecionada. Após isso, interrompem a inspiração para permitirem uma expiração passiva. Os aparelhos ciclados por volume interrompem a inspiração depois de fornecerem volume pré-selecionado de ar, independentemente da pressão necessária para o fazer. Após isso, permitem expiração passiva. Reanimação cardiorrespiratória pediátrica 45 Os aparelhos ciclados por tempo são determinados para encerrarem a fase inspiratória, não contando o volume e a pressão atingida. Os métodos de suporte ventilatório mais praticados na rotina assistencial e, por isso, considerados convencionais, são os seguintes: – ventilação com pressão positiva intermitente, assistida e/ou controlada; – ciclada a volume ou pressão (IPPV); – ventilação com pressão controlada (PCV); – ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV); – ventilação com suporte pressórico (PSV); – pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP); – associações: SIMV + PSV, PSV + CPAP, SIMV + CPAP. Dentre as situações que demandam oferta de oxigênio por ventilação mecânica, podem ser citadas: a) PCR; b) hipoventilação e apnéia; c) insuficiências respiratória graves; d)cirurgias sob anestesia geral. MEDIDAS DE SEGURANÇA EM VIGÊNCIA DE USO DE OXIGÊNIO (CUIDADOS DE ENFERMAGEM) a) Revisar o sistema no mínimo a cada 6 horas, com ênfase para: umidificação (nível de água preconizado), fluxo conforme a prescrição médica, permeabilidade do sistema (presença de água no extensor, presença de dobras no extensor), conexão correta da válvula de oxigênio, existência de haste no interior do frasco umidificador, presença de escape do gás. b) Trocar a água do frasco umidificador uma vez a cada 7 dias para crianças em unidades de baixa complexidade e diariamente em unidades de alta complexidade. c) Evitar o uso de roupas sintéticas, álcool, vaselina e óleos na unidade do paciente. d) Manter o cilindro de oxigênio afastado a 1,5 m de fontes de calor e de aparelhos elétricos. e) Posicionar o cilindro de oxigênio de forma segura. f) Proibir o consumo de cigarros e assemelhados nas proximidades da unidade do paciente. 46 Souto, Lima, Breigeiron e cols. CONSIDERAÇÕES FINAIS Em pediatria, a insuficiência respiratória é um problema clínico grave. A equipe de saúde treinada pode identificar os sinais de alterações precocemente e comunicá-los ao enfermeiro ou ao médico para que estes atuem a fim de evitar complicações maiores. Uma avaliação criteriosa e minuciosa orienta para condutas corretas, determinando bons resultados. A administração de oxigênio é um tratamento de indicação médica que requer controle rigoroso e cuidados específicos no decorrer do uso. A umidificação constante, o controle do fluxo, a revisão do sistema e a monitoração dos sinais vitais do paciente, devem ser realizados de forma sistemática com o objetivo de prevenir iatrogenias. O enfermeiro, por intermédio da sistematização da assistência (SAE), realiza a atualização dos cuidados na prescrição de enfermagem por meio de exame físico diário. O aprimoramento contínuo da equipe de saúde, a uniformidade da linguagem e a atuação multidisciplinar repercutem na qualidade do atendimento e na credibilidade dos profissionais e dos serviços de saúde. A American Association for Respiratory Care (AARC) desenvolveu e publicou orientações práticas para a oxigenoterapia nas mais diversas situações com a finalidade de orientar os profissionais na provisão de uma terapia segura e eficaz ao paciente (Scanlan; Wilkins; Stoller, 2000). Por fim, é importante lembrar que a oxigenoterapia é individualizada e deve ser modificada de acordo com a necessidade de cada paciente. Além disso, tão importante quanto iniciar a terapia no momento certo e de forma adequada é interrompê-la assim que ela deixa de ser necessária. REFERÊNCIAS AIRES, V.L.T. Práticas pediátricas. Rio de Janeiro: Atheneu, 2000. AMERICAN COLLEGE OF SURGEONS. Suporte avançado de vida no Trauma para médicos: manual do curso para alunos. 7.ed. 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