Unidade de cuidados pós anestésicos - Tempo de definir novos conceitos? 18 Neusa Lages, Cristiana Fonseca, Fernando Abelha Serviço de Anestesiologia, Hospital S. João, EPE Resumo As Unidades de Cuidados Pós Anestésicas foram criadas inicialmente para permitir detectar e tratar precocemente as possíveis complicações relacionadas com o acto anestésico ou cirúrgico. A visão estática e tradicional das Unidades de Cuidados Pós Anestésicos criadas com o objectivo único de tratar complicações anestésicas ou cirúrgicas foi ultrapassada surgindo a necessidade de encarar estas unidades como elos de ligação dinâmicos entre a cirurgia e a alta hospitalar, e sendo assim, é tempo de definir novos conceitos. Várias perguntas são equacionadas no sentido de uniformizar e melhorar a qualidade dos cuidados pós anestésicos nomeadamente: - Que espaço físico? - Nº de camas e ratio em enfermagem? - Presença física de anestesiologista? - Tipo de doentes a admitir? - Tempo de permanência? - Tipo de monitorização? - Qualidade de cuidados anestésicos sala operatória/ UCPA ? - Critérios de alta? Palavras Chave: Unidade de cuidados pós anestésica, Critérios de Admissão e Alta, Dor pós operatória, Nauseas e Vómitos Pós Operatórios. Abstract Postanesthesia Care Units were initially developed to allow early detection and treatment of potential complications related to either anaesthesia or surgical procedures.This traditional and rather static role of Postanesthesia Care Units has been changing gradually over time, so that these Units are nowadays seen as an interface between the surgical time and the hospital discharge, which makes this time the perfect one for a reappraisal. In this paper, several questions that can help standardizing and improving quality of care in these Units have been raised, such as: - Which physical space? - Number of beds and nursery ratio ? - Is there a need for the presence of an anaesthesiologist? - Do all patients submitted to anaesthesia or surgery need to be admitted into a Postanesthesia Care Unit? - What should be the minimal inpatient stay? - Quality of PACU care ? - Criteria for discharge ? Keywords: Postanesthesia Care Unit; Admission and Discharge Criteria; Postoperative pain; Post operative nausea and vomiting. CORRESPONDÊNCIA: Neusa Lages Serviço de Anestesiologia do H.S. João, EPE, Porto [email protected] Revista SPA ‘ vol. 15 ‘ nº 4 ‘ Outubro 2006 Introdução Tradicionalmente o recobro de um doente era designado como o período que se iniciava no fim de uma cirurgia até à recuperação do estado fisiológico pré-operatório do doente1. No sentido de detectar precocemente incidentes que pudessem estar relacionados com o acto anestésico ou cirúrgico, o anestesiologista “saiu” do bloco operatório (BO) e passou a acompanhar o doente no pós-operatório, surgindo as unidades de cuidados pós anestésicos (UCPA). Assim, os doentes são transferidos do BO para um espaço onde estão disponíveis meios técnicos necessários para providenciar uma monitorização standard, uma correcta analgesia, um controlo das náuseas e vómitos (NVPO) e uma vigilância de complicações pós-operatórias. Podem ser equacionadas perguntas relativamente à organização, à monitorização e às possíveis intervenções efectuadas nas UCPA e ao papel dinâmico que o anestesiologista poderá assumir: É n e c e s s á r i a a p re s e n ç a f í s i c a d o anestesiologista nas UCPA? A necessidade de um controlo apertado da dor, das NVPO e das complicações inerentes ao acto operatório justificam a presença física de um anestesiologista na UCPA. Além disso, o anestesiologista constitui uma mais valia pela capacidade de gestão de vagas e altas e de identificação e manuseamento de complicações. O grupo de trabalho destas unidades é constituído por uma equipa de enfermagem (com um ratio de 1 enfermeiro para cada 3 unidades) supervisionados por um anestesiologista. Todos os pós-operatórios devem ser admitidos, obrigatoriamente, nas UCPA? A utilização intra-operatória de anestésicos de curta duração de acção, a possibilidade de uma monitorização mais precisa do estado de consciência e função neuromuscular, através da utilização do BIS (Bispectral índex) e do neuroestimulador, permitem ao anestesiologista uma administração mais precisa dos fármacos e portanto, um recobro mais rápido. Por outro lado, a utilização de técnicas locoregionais, permite um melhor controlo da dor pós-operatória. Assim, face a estes factos que condicionam um recobro mais rápido do doente e, baseado nos conhecimentos da anestesia para cirurgia do ambulatório, surge um novo conceito de recobro, caracterizado pela não passagem de todos os doentes (“fast-tracking”) pelas UCPA2. Fast-tracking consiste na passagem dos doentes directamente do BO para a Sala de Operados (fase II do recobro) ou enfermaria (fase III do recobro). O sucesso deste novo paradigma depende da modificação da técnica anestésica, com recurso a fármacos de curta duração de acção que induzam uma emergência anestésica mais rápida e, da prevenção de complicações pós-operatórias comuns, tais como a dor e NVPO, através de uma terapêutica multimodal 3 . 19 Quais os critérios da não passagem dos doentes (“fast-traking”) pelas UCPA? Devem ser aplicados a todos os doentes? Podemos dizer que os índices que determinam os requisitos para a não passagem do doente pela primeira fase do recobro, utilizam os mesmos critérios de alta das UCPA. Estes critérios, fundamentados na tabela original de Aldrete, avaliam a recuperação pósanestésica face ao estado de consciência e sinais vitais. A escala modificada de Aldrete é utilizada para a alta do doente nas UCPA, mas não está concebida para avaliar a capacidade do doente para ultrapassar a fase inicial do recobro. Assim, os critérios desenvolvidos por White acrescentam à escala modificada de Aldrete a dor e as NVPO, permitindo, de uma forma objectiva, determinar quais os doentes que reúnem os critérios de não passagem pelas UCPA4. Enquanto que a alta precoce, a eficácia peri-operatória e os custos parecem sustentar este conceito, é também necessário saber se a não passagem do doente pela UCPA é seguro, se apresenta benefícios para o doente e se é aplicável às diferentes instituições hospitalares. Song et al são os primeiros a olhar para este problema de uma forma objectiva, através de um estudo prospectivo randomizado, onde problemas como os custos e as complicações pós-operatórias são analisados5. Admitem a hipótese que a não passagem dos doentes pelas UCPA implica uma alta mais precoce Revista SPA ‘ vol. 15 ‘ nº 4 ‘ Outubro 2006 20 e uma redução dos custos, através da diminuição do trabalho de enfermagem5. Neste estudo, duzentos e sete doentes, com idades compreendidas entre os 1865 anos, ASA 1 e 2, submetidos a procedimentos cirúrgicos minor (artroscopia, histeroscopia e laparoscopia diagnóstica) sob técnica anestésica standard, são randomizados em 2 grupos: o grupo cujo recobro é feito na UCPA e o grupo de não passagem pela UCPA. A não passagem pela primeira fase do recobro era determinada pelos critérios de alta de White. Estes critérios acrescentam à escala modificada de Aldrete, o controlo da dor e das NVPO, mas não incluem as complicações pós-cirúrgicas2,4,5. No grupo de não passagem pela UCPA verificou-se uma alta mais precoce (em 17 minutos) sem evidência de mais complicações pós-operatórias, como a dor e as NVPO, mas não houve redução estatisticamente significativa do trabalho de enfermagem e consequentemente dos custos. A aplicabilidade dos critérios de não passagem pela UCPA depende da cirurgia e da patologia associada do doente, pelo que, doentes ASA ≥ 3, doentes obesos, e procedimentos cirúrgicos major, são excluídos destes estudos2,5. Os autores concluem que a diminuição dos custos através da não passagem pelas UCPA depende não só do trabalho de enfermagem, mas também da organização e estruturação do BO, da UCPA, nomeadamente do número de doentes que por ela passam por dia, pelo que mais estudos têm que ser implementados5. Existe um tempo mínimo de permanência na UCPA? Não está estabelecido que um tempo de internamento mínimo melhore o grau de satisfação ou a segurança dos doentes. Segundo a Sociedade Americana de Anestesiologia, os doentes devem permanecer na UCPA até que os riscos de depressão do sistema nervoso central ou cardiovascular sejam ultrapassados6. O fluxo aumentado de doentes críticos face à resposta das UCI, uma equipe de enfermagem tecnicamente bem preparada, um anestesiologista 24 horas por dia, a presença de equipamento para monitorização e ventilação invasiva, fazem das UCPA lugares atractivos para doentes críticos, pós-operatórios ou não 7 . Contudo, as UCPA não estão estruturadas nem convenientemente equipadas para servirem como UCI7. Monitorização – monitorizar por critérios? A Sociedade Americana de Anestesiologia definiu em 2002 algumas recomendações para o manuseio dos doentes no período pós-operatório8. A rotina deverá incluir a monitorização das funções respiratória, cardiovascular, neuromuscular, neurológica, dor e NVPO. Da monitorização da função respiratória deverá fazer parte a determinação periódica da patência da via aérea, a frequência respiratória e a saturação de oxigénio. A monitorização da função cardiovascular deverá ser avaliada através da medição da pressão arterial e frequência cardíaca e só em doentes seleccionados o electrocardiograma deverá ser rotina. A função neuromuscular é facilmente depreendida pelo exame físico, pelo que apenas nos doentes com antecedentes de alterações neuromusculares se deverá utilizar como rotina o neuroestimulador. A função neurológica, as escalas de dor, e a presença de náuseas e vómitos, deverão ser avaliadas frequentemente de forma a poderem ser detectadas e tratadas precocemente possíveis complicações. O estado de hidratação, a temperatura, o débito urinário, a capacidade de micção e a avaliação do estado dos drenos/hemorragia deverá ficar reservado para doentes cujos antecedentes patológicos ou tipo de cirurgia efectuada o recomendar. Tratamento da dor pós-operatória- Qual o papel das UCPA? É necessário estabelecer critérios de admissão para as UCPA? Um dos problemas que surge é a utilização das UCPA como unidade de cuidados intensivos (UCI). Revista SPA ‘ vol. 15 ‘ nº 4 ‘ Outubro 2006 O tratamento da dor pós-operatória é um desafio e deve ser considerado pedra angular no pósoperatório. Se ineficaz, a curto prazo, origina alterações fisiopatológicas importantes nos diversos sistemas orgânicos, prolonga o tempo de recobro, origina menor participação do doente na reabilitação, menor satisfação e altas hospitalares mais tardias; a longo prazo, pode diminuir a qualidade de vida do doente, agravar a disfunção cognitiva pós-operatória e originar a evolução para a dor crónica9. Apesar dos grandes avanços na compreensão da fisiopatologia da dor e do desenvolvimento de novas técnicas analgésicas, muitos doentes continuam a experimentar dor no pós-operatório. As primeiras recomendações oficiais para o tratamento da dor pós-operatória surgiram em 1988 na Austrália, posteriormente em 1990 no Reino Unido e em 1992 na América. Em conjunto recomendam a criação de instituições multidisciplinares, Acute Pain Service (APS), orientadas por um anestesiologista. Estas, são constituídas por equipas responsáveis pela avaliação regular e respectivo tratamento da dor pós-operatória, em repouso e em movimento, 24 horas por dia9,10. As últimas recomendações preconizam que os anestesiologistas, integrados nos serviços de dor aguda, em colaboração com profissionais de outras especialidades, sejam responsáveis pela educação e treino de pessoal de saúde capacitado para a avaliação da dor pós-operatória e do seu tratamento, integrando o manuseamento de técnicas analgésicas específicas, tais como PCA (patient control analgesia), analgesia epidural, PCEA (patient control epidural analgesia) e bloqueios periféricos11-14. Até à década de 80 o tratamento da dor pósoperatória era simplista e dividido em dois grandes grupos (dor ligeira/moderada ou moderada/severa) sendo o seu tratamento efectuado com paracetamol, anti-inflamatórios não esteroides (AINE) e opioides administrados por via intramuscular de forma intermitente10. É sabido que o recurso aos opioides como método analgésico único e a necessidade de doses elevadas para o controlo eficaz da dor, provocam efeitos colaterais nas diversas funções orgânicas (gastrointestinal, respiratória, neurológica) e que, a dor pós operatória tem caracter multifactorial, pelo que só a intervenção nos vários níveis de processamento do fenómeno álgico poderá ser eficaz no tratamento e controlo da dor, devendo a visão simplista e baseada num só fármaco ser ultrapassada10,15. Actualmente a analgesia pós-operatória deverá obedecer, segundo o estado da arte, ao conceito de analgesia balanceada ou multimodal7. Este conceito baseia-se na utilização de diferentes classes de fármacos ou métodos analgésicos com actuação distinta ao longo da via nociceptiva, apresentando efeitos sinérgicos, permitindo uma maior eficácia analgésica com redução dos efeitos colaterais associados a doses elevadas dos fármacos. A terapêutica da dor pós operatória deverá integrar a utilização de técnicas locais e locoregionais, como por exemplo a analgesia epidural, o bloqueio de nervos periféricos, a infiltração intracavitária, intrarticular ou da ferida cirúrgica com anestésicos locais, em associação com analgésicos não opioides (AINE e paracetamol). A utilização dos opioides endovenosos deverá ficar reservada aos doentes em que as técnicas locoregionais estejam contra-indicadas, podendo ser administrados num regime controlado pelo doente, através de uma PCA. 21 Estão as UCPA preparadas para a execução de técnicas loco-regionais? A escolha adequada dos anestésicos e da técnica anestésica no intra-operatório pode aumentar e perpetuar a eficácia da analgesia pós-operatória, contudo, a presença física de um anestesiologista 24h/dia, de uma equipa de enfermagem preparada e direccionada para problemas pós-operatórios e técnicas analgésicas, a presença de equipamento de suporte à realização dessas mesmas técnicas, fazem das UCPA locais apetecíveis para a realização de técnicas analgésicas loco-regionais. Estas podem ser realizadas sempre que a estratégia definida pré-operatoriamente não se adequou ao doente, quer pela extensão cirúrgica não esperada, quer pelas necessidades individualizadas dos próprios doentes que, embora submetidos ao mesmo estimulo cirúrgico não apresentam níveis de dor semelhantes. Uma vez que a UCPA é o local primário de permanência do doente após o procedimento anestésico e cirurgico, esta unidade está orientada para que a estratégia definida no intra-operatório seja reavaliada e continuada e, em caso de ineficácia, propostos novos métodos analgésicos e de administração de fármacos com diferentes vias de actuação. Fundamentados nestes argumentos, as UCPA podem ser consideradas locais de sede dos APS, Revista SPA ‘ vol. 15 ‘ nº 4 ‘ Outubro 2006 22 surgindo o conceito dos APS baseados nas UCPA16. O plano analgésico de cada doente, decidido pelo anestesiologista no intra-operatório, deverá seguir protocolos analgésicos recomendados para cada intervenção e as orientações para as enfermarias deverão ser claras e padronizadas, com protocolos de analgesia de resgate e planos de actuação face a possíveis efeitos secundários. Só a utilização de protocolos baseados nas realidades dos serviços de anestesiologia em coordenação com os serviços cirúrgicos poderão constituir um método rigoroso e padronizado, permitindo atingir a eficácia máxima de cada esquema terapêutico proposto e assegurar condições de segurança para cada doente. Resumindo, a UCPA é um local, por excelência, adequado à optimização do plano analgésico definido no intraoperatório.A utilização de técnicas de analgesia loco-regional contínua, quer do neuroeixo, quer do bloqueio do plexo e nervos periféricos devem ser incentivadas, integradas num conceito de analgesia multimodal e obedecer a protocolos de actuação. A abordagem da dor deverá ser multidisciplinar englobando anestesiologistas, cirurgiões e enfermeiros para obter eficácia, vigilância e segurança máxima do doente. Náuseas e vómitos : tratamento na UCPA17? As náuseas e vómitos são as complicações mais frequentes no pós-operatório e, apesar dos avanços que se têm verificado nas técnicas anestésicas e cirúrgicas, surgem em cerca de 20 a 30 % dos doentes, atingindo em populações de risco 70%. Podem, em casos extremos, provocar situações mais graves como deiscência de suturas, aspiração de vómito, pneumonia de aspiração, desidratação, desequilíbrios hidroelectróliticos, rotura esofágica, aumento da pressão intra-craniana e pneumotorax bilateral. Representam causa frequente de insatisfação e, vários estudos realizados demonstraram que os doentes estariam, teoricamente, dispostos a dispender elevadas quantias de dinheiro para ter um pós-operatório sem náuseas ou vómitos, considerando mesmo que seria mais importante do que a ausência de dor pós-operatória18-20. Em 2003 uma reunião de consenso reuniu vários peritos nesta matéria no sentido de definir uma Revista SPA ‘ vol. 15 ‘ nº 4 ‘ Outubro 2006 estratégia de prevenção e tratamento de NVPO21. Baseado na identificação de factores de risco (características do doente, tipo de anestesia e cirurgia proposta), os doentes efectuam ou não profilaxia no BO. Quando na UCPA surgem NVPO deve ser considerada a existência ou não de profilaxia (terapêutica única ou múltipla), sendo que o tratamento depende da estratégia prévia utilizada no BO (Quadro 1). Assim, nos doentes em que não foi efectuada profilaxia ou apenas foi administrada dexametasona é recomendado administração de doses reduzidas de antagonistas dos receptores serotoninérgicos (um quarto da dose normalmente utilizada na profilaxia). Se a profilaxia inicial utilizada versou a associação de um antagonista dos receptores serotoninérgicos e um fármaco de uma classe diferente, então deverá ser efectuado o tratamento com um 3º fármaco de classe diferente dos anteriores. Finalmente se a estratégia inicial incluiu uma profilaxia tripla com antagonista dos receptores serotoninérgicos associado a um 2º e 3º fármacos, então a terapêutica deverá depender do número de horas após a cirurgia em que surgiram as náuseas ou vómitos: se menos de 6h, a terapêutica poderá ser efectuada com um outro fármaco de classe diferente dos anteriores ou com pequenas doses de propofol (20 mg), uma vez que o doente se encontra em ambiente de vigilância contínua; se as NVPO surgem para além das 6h do pósoperatório, poderá recorrer-se novamente aos fármacos utilizados na profilaxia, com excepção da dexametasona, que apresenta uma duração de acção superior a 6 horas21. Para além das medidas preventivas farmacológicas utilizadas no bloco operatório, a incidência de NVPO também poderá ser reduzida nas UCPA através da utilização de uma fluidoterapia correcta22 e de um tratamento da dor eficaz23. Da mesma forma que deve ser monitorizada a dor pós-operatória, baseada numa escala visual analógica, as NVPO deverão seguir o mesmo princípio. Recomenda-se a utilização e registo do VAS de forma regular, antes e após o tratamento seguindo a classificação de severa (VAS> 7), moderada (VAS 3-7) e ligeira (VAS <3). Terapêutica inicial Tratamento Sem profilaxia ou tratamento com dexametasona Administrar doses reduzidas de antagonistas dos receptores de 5-HT3: ex.Ondasetron 1mg Terapêutica com anatagonistas dos receptores de 5-HT3 associada a outro fármaco: • doperidol - 0.625mg/ev • dexametasona - 2 a 4 mg/ev • prometazina - 12.5 mg/ev Administrar fármaco de classe diferente. Terapêutica tripla com anatagonistas dos receptores de 5-HT3 associada a dois fármacos: • doperidol - 0.625mg/ev • dexametasona - 2 a 4 mg/ev • prometazina - 12.5 mg/ev Se < 6 horas após cirurgia: • fármaco de classe diferente e/ou Propofol 20mg ( se cuidados de monitorização pósanestésicos) Se > 6 horas após cirurgia: • Repetir droperidol ou antagonistas dos receptores de 5-HT3 • Usar fármacos de classes diferentes NÃO REPETIR DEXAMETASONA 23 Quadro I Modificar critérios de alta da UCPA? Em 1970, com o propósito de tornar objectivo a alta do doente, Aldrete propôs um índice para monitorizar os doentes quanto à possibilidade destes atingirem valores compatíveis com a alta24. Baseavase em 5 variáveis: actividade (capacidade de mover 4, 2 ou nenhuma extremidade), respiração (capacidade de inspirar profundamente e tossir, dispneia ou respiração superficial e apneia), circulação (pressão arterial variável apenas em 20% relativamente aos valores pré anestésicos, variável entre os 30-50%, ou superior a 50% relativamente ao pré operatório), consciência (totalmente acordado, despertável à chamada ou sem resposta) e a cor (normal, pálido, mosqueado ou cianosado).A cada uma destas variáveis era atribuído um valor de 2, 1 ou 0 e a alta era atingida com o somatório ≥9. Estes critérios eram baseados apenas nos possíveis efeitos residuais da anestesia ou complicações cirúrgicas que se traduziam nas alterações do estado hemodinâmico. O aparecimento de novas técnicas analgésicas (anestesia loco-regional), de fármacos de eliminação rápida (sevoflurano e desflurano), com metabolização não dependente de órgãos (atracúrio, cisatracúrio), de novos dispositivos de ventilação (máscara laríngea), que obviam a necessidade de recorrer aos relaxantes neuromusculares, e de sistemas de monitorização neurológica e neuromuscular, surgiram de forma a que os critérios definidos por Aldrete sejam rapidamente atingidos, ainda mesmo no BO. Podemos depreender, das lições retiradas da anestesia em cirurgia do ambulatório, que existem parâmetros importantes e que devem ser tidos em consideração antes da alta do doente da UCPA e que não estão incluídos nos critérios de Aldrete, nomeadamente, náuseas e vómitos, controlo da dor e complicações cirúrgicas25. Os critérios de alta para cirurgia de ambulatório são fundamentados na escala de White, que acrescentam a dor e as NVPO à escala modificada de Aldrete4,25. Um dos problemas da escala de White é a não inclusão de complicações cirúrgicas nomeadamente hemorrágicas4,25. A escala Post Anesthetic Discharg Score System (PADSS) inclui estes critérios, contudo não menciona o estado de consciência ou função respiratória, parâmetros importantes na alta do doente 26. Nos critérios de alta não devem ser incluídos a capacidade de tolerar líquidos ou micção espontânea uma vez que estudos efectuados apontam para altas mais tardias sem benefício adicional quando estes requisitos são esperados6. Se nos critérios de alta de White ou PADSS, a inclusão da capacidade de mobilização dos membros na avaliação inicial da recuperação do bloqueio motor no pósoperatório de técnicas do neuroeixo, pode ter interesse pela possibilidade de detectar precocemente complicações, nomeadamente um hematoma epidural, cujo prognóstico depende do diagnóstico e tratamento em tempo útil, o mesmo não é válido quando se trata Revista SPA ‘ vol. 15 ‘ nº 4 ‘ Outubro 2006 24 de bloqueios periféricos.Vários autores defendem a prática de bloqueios periféricos em regime de ambulatório, pelas inúmeras vantagens que apresentam27-28, nomeadamente menor tempo de internamento. Nestas situações não é esperada a recuperação do bloqueio motor para a alta hospitalar, uma vez que a utilização de volumes elevados de anestésicos locais de longa duração de acção implica bloqueios motores mais prolongados29-30. Os doentes são no entanto aconselhados a proteger os membros (uso de suspensor dos membros superiores ou apoio externo de canadianas) e informados por escrito das possíveis implicações de um bloqueio motor residual e dos sinais de alarme que implicam a admissão hospitalar. Só aplicando estes princípios à prática diária das UCPA poderemos aproveitar as vantagens destas técnicas. O diagnóstico imediato de uma possível lesão neurológica secundária a um bloqueio periférico não é factor essencial para a sua resolução, uma vez que a maioria são auto-limitadas com resolução em dias ou meses, e o seu diagnóstico na UCPA aumenta consideravelmente o tempo de internamento. Consideramos assim que o parâmetro de mobilização dos membros deve ser apenas aplicado ao recobro dos bloqueios do neuroeixo. Assim propõe-se como critérios de alta da UCPA os referidos no quadro II,o doente tem alta da UCPA quando apresentar uma pontuação maior ou igual a doze, com um mínimo de um ponto para cada parâmetro. Critérios de alta Score Nível de consciência Acordado e orientado Despertável à estimulação mínima Resposta a estímulos dolorosos/sem resposta 2 1 0 Estabilidade hemodinâmica Diminuição da TA < 15% relativamente aos valores prévios Diminuição da TA 15% - 30% relativamente aos valores prévios Diminuição da TA > 30% relativamente aos valores prévios 2 1 0 Estabilidade respiratória Ventilação e tosse eficaz; Sat02>90% Presença de 1 ou + sinais de dificuldade respiratória; tosse eficaz; Sat >90% Sinais de dificuldade respiratória; tosse ineficaz; Sat 02<90% 2 1 0 Dor pós-operatória VAS<3 ou dor ligeira VAS 3-7 ou dor moderada VAS>7 ou dor severa 2 1 0 Náuseas e vómitos pós-operatória VAS<3 ou náuseas ligeiras sem vómitos activos VAS 3-7 ou náuseas e vómitos transitórios VAS>7 ou náuseas e vómitos persistentes 2 1 0 Actividade física (aplicável para pós-operatório de anestesia do neuroeixo) Reversão total do bloqueio motor Reversão parcial do bloqueio motor Sem reversão do bloqueio motor 2 1 0 Hemorragia cirúrgica Mínima: sem necessidade de mudança de penso cirúrgico Moderada: necessidade de mudança de penso cirúrgico 1 a 2 vezes Severa: mudança de penso cirúrgico 3 vezes Total máximo Quadro II - O doente tem alta da UCPA quando apresentar uma ponuação ≥ 12 com um mínimo de 1 por cada parâmetro. Revista SPA ‘ vol. 15 ‘ nº 4 ‘ Outubro 2006 2 1 0 14 Conclusão As UCPA vieram oferecer segurança aos doentes, economizar meios e permitir que os blocos operatórios funcionassem de modo mais eficiente. Novos desafios são colocados no sentido de melhorar a qualidade e satisfação dos doentes no pósoperatório, nomeadamente o controlo das NVPO e da dor pós-operatória. Baseados nas lições aprendidas da cirurgia de ambulatório devem ser criados critérios de admissão e alta destas unidades. O anestesiologista deve ser o elemento chave destas unidades pelos conhecimentos nas áreas médicocirúrgicas e pela capacidade de realizar técnicas específicas adequadas ao pós-operatório dos doentes. 25 Agradecimentos: Agradece-se à Dra. Fernanda Barros a revisão do artigo. Bibliografia 1. Marshall SI, Chung F. Discharge Criteria and Complications After Ambulatory Surgery. Anesth Analg 1999; 88:508-17. 2. Millar J, Fast-tracking in day surgery. Is your journey to the recovery room really necessary? 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