ENSINAR MATEMÁTICA AS CRIANÇAS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL: UM DESAFIO QUE NOS REMETE DA TEORIA A PRÁTICA Maria Joselma do Nascimento Franco¹; UFPE Silvânia Maria Marinete dos Santos²; UFPE ¹ Universidade Federal de Pernambuco – Centro Acadêmico do Agreste ² Universidade Federal de Pernambuco – Centro Acadêmico do Agreste Resumo: O presente estudo se propõe a investigar o papel do professor em relação ao ensino da matemática, com crianças entre cinco e seis anos de idade, bem como sua concepção metodológica utilizada. Tem por objetivo Identificar o nível de interesse das crianças pelas aulas de matemática em uma escola urbana do município de Caruaru. Toma como abordagem metodológica a pesquisa qualitativa, com foco no estudo de caso do tipo etnográfico. O levantamento de dados em campo é realizado em uma escola pública de ensino fundamental, em Caruaru-PE. Sua conclusão aponta que embora as professoras tenham formação no nível superior, ainda há um distanciamento entre as referências estudadas na formação, que fundamentam o ensino e a aprendizagem da matemática e as práticas desenvolvidas, evidenciando a necessidade de outro formato de formação continuada na área, o acompanhamento pedagógico sistemático e um material didático que ajude na construção dos conceitos necessários as crianças nessa faixa etária. Palavras- chave: ensino-aprendizagem, matemática, educação-infantil Objetivos: Investigar o papel do professor em relação ao ensino da matemática, com crianças entre cinco e seis anos, bem como sua concepção metodológica. Identificar o nível de interesse das crianças pelas aulas de matemática em uma escola urbana do município de Caruaru. Introdução: Provocadora de tensões, medos e até repulsa por parte de alguns estudantes, o ensino e a aprendizagem da Matemática, ao longo da educação básica, nos desafia. O presente estudo se justifica pela necessidade que temos de compreender como no início da escolarização, os professores vêem desenvolvendo o conceito de número. Segundo KAMII (2006:15), “a criança progride na construção do conhecimento lógico matemático pela coordenação das relações simples que ela anteriormente criou entre os objetos”. Sendo assim, a necessidade de aproximar o cotidiano das relações do ensino e aprendizagem da Matemática nos parece obvia. Para a criança desenvolver o conceito de número é necessário que ela tenha oportunidades de quantificar objetos (Ex.: A criança não sabe contar dinheiro, mas através do ato de comprar algo ela, raciocina, faz relações e aprende). É partir de atividades como esta que ela vai desenvolvendo a inteligência. Como cita KAMII (2006: 37) “A inteligência desenvolve-se pelo uso”. O sistema numérico decimal é apresentado pelo professor por partes inicialmente de 1 a 10 sem que sejam apresentados outros números. Segundo SPNILLO, MAGINA apud PAVANELO (2004: 14) “números de um só dígito são mais fáceis de serem compreendidos pelas crianças do que números grandes, de dois ou mais dígitos, e que os alunos podem contar usando os dedos.” Para SPNILLO, MAGINA apud PAVANELO (2004: 13) “A noção de contagem é mais um comportamento imitativo ou lúdico do que uma atividade consciente com um propósito determinado.” Caracterizando-se inicialmente apenas como um comportamento imitativo do mundo adulto que pouco a pouco vai associando-se aos objetos que guiam para a 1 necessidade de quantificar. Mas é através da contagem que a criança faz a passagem dos objetos físicos para os objetos matemáticos, isto é, dos manipulativos para os números. Segundo KAMII; DEVRIES apud KAMII (1980: 76), “(...) jogos em grupo proporcionam um contexto excelente para o pensamento em geral e para comparação de quantidades”. Nessa direção, tomamos como referência à situação crítica do ensino e da aprendizagem matemática no processo escolar, e levantamos a seguinte questão/problema: Como se dá o processo de inserção das crianças, com idade entre cinco e seis anos, no universo dos números? Quais os procedimentos metodológicos adotados pelo/a professor/a como mediador/a para ensinar o conceito de número? Nossos propósitos são: Investigar o papel do professor em relação ao ensino da matemática, com crianças entre cinco e seis anos, bem como sua concepção metodológica. Identificar o nível de interesse das crianças pelas aulas de matemática em uma escola urbana do município de Caruaru. Metodologia: Tendo em vista que, buscamos como contexto para o presente estudo na área urbana, uma escola pública municipal de “referência” para a rede pública da cidade de Caruaru – PE. Elegemos uma turma de 1º ano do ensino fundamental como campo para o levantamento de dados. Optamos metodologicamente pela abordagem qualitativa, porque ela constitui o caminho metodológico mais adequado para a realização da atividade em foco, tendo em vista que, LUDKE & ANDRÉ (1986), a concebem “como aquela que envolve a obtenção de dados descritivos, por meio do contato do pesquisador com a situação estudada”. Com foco no estudo de caso do tipo etnográfico, por se tratar da busca por um conhecimento singular, em um determinado grupo social. Kenny e Grotelueschen (1980, apud ANDRÉ) ao tratarem da pertinência do estudo de caso do tipo etnográfico explicitam: (...) é a singularidade da situação: a unidade vai ser escolhida porque representa por si só, um caso digno de ser estudado, seja por que é representativo de muitos outros casos seja porque é completamente distinto de outros casos (2005: 29. grifo nosso). Nossa intenção no caso em estudo, é que este seja distinto de outros, já que estamos numa escola de “referência” para a rede municipal de educação de Caruaru. Como procedimentos metodológicos, utilizamos: a observação nas aulas de Matemática, as conversas informais, o diário de campo e as fotografias. O campo empírico é o 1º ano do ensino fundamental de uma escola de ensino fundamental. Trabalhamos com 16 sujeitos com idade entre 5 e 6 anos, 1 professora e 1 auxiliar pedagógica, totalizando 18 sujeitos. O levantamento de dados foi realizado nos meses de março, abril e maio/2009 em uma escola localizada na periferia do município. Resultados e discussão dos dados: Considerando que o estudo foi desenvolvido, e marca uma aproximação entre o campo de formação do/a pedagogo/a (professor/a) e sua atuação profissional na escola, na sala de aula. Apresentamos os dados levantados para o presente estudo, na busca de compreender como se dá a inserção das crianças no universo dos números no 1º ano do ensino fundamental. Procuramos assim, identificar os procedimentos adotados pela professora para que as crianças construíssem o conceito de número; a concepção metodológica utilizada e o interesse das crianças nas aulas de matemática. Baseadas na literatura, bem como na compreensão de que os profissionais detêm formação no nível superior, tomamos como hipótese inicial, que: na busca pela superação do quadro de dificuldades, os/as professores/as utilizariam procedimentos metodológicos diversos, bem como material concreto no cotidiano da sala de aula para mediar esta construção. 2 Nas observações desenvolvidas na sala de aula, identificamos que a escola não oferece materiais concretos, tais como: blocos-lógicos, dominó, ábaco e material dourado. Segundo SPNILLO, MAGINA apud PAVANELO (2004: 7), “o material concreto é um recurso amplamente adotado no ensino da matemática nas séries iniciais”. A professora afirma que a falta de recursos faz com que as aulas sejam pouco proveitosas, usando a música para “treinar” a sequência numérica e técnicas tradicionais como: fazer as crianças copiarem repetidas vezes um número para memorizá-lo; fazer a leitura inúmeras vezes dos números (Diário de campo, abril, 2009), o que não ajuda a construir o conceito. A literatura subsidiária do presente estudo aponta caminhos muito diferentes dos que encontramos na escola, SMOLE, DINIZ, e CÂNDIDO (2000), ao estudarem as questões didáticas da área nessa faixa etária, afirmam: (...) temos optado por elaborar um conjunto de ações didáticas que não apenas levem os alunos da educação infantil a desenvolver noções e conceitos matemáticos, mas que também privilegiam a percepção do aluno por inteiro, nessa perspectiva, a criança deve ser vista como alguém que tem idéias próprias, sentimentos, vontades e que está inserida em uma cultura, que pode aprender matemática e que precisa ter possibilidades de desenvolver suas diferentes competências cognitivas (p.10). Poucas são as atividades lúdicas desenvolvidas com as crianças nas aulas de matemática. Ao observarmos o nível de envolvimento delas numa atividade que envolvia brincadeiras e jogos, como foi o uso do bingo, destacamos esta aula como a mais participativa durante o período em que levantamos os dados em campo. Diante do exposto, concordamos com SMOLE, DINIZ, e CÂNDIDO (2000: 14), ao afirmar que: (...) brincar é mais que uma atividade lúdica, é um modo para obter informações, respostas e contribuir para que a criança adquira uma certa flexibilidade, vontade de experimentar, buscar novos caminhos, conviver com o diferente, ter confiança, raciocinar, descobrir, persistir, preservar; aprender a perder percebendo que haverá novas oportunidades para ganhar . E o desafio do/a professor/a é identificar se nas brincadeiras, as crianças estão desenvolvendo estas habilidades. O que exige do/a professor/a o desenvolvimento da capacidade de análise do processo de aprendizagem das crianças. A partir das dificuldades evidenciadas, com base nos dados levantados, criar condições de problematizá-los e buscar alternativas de intervenção que superem as condições dificultosas à luz da concepção de ensino e aprendizagem trabalhada. Percebemos que embora seja comum nas escolas públicas a disponibilidade de material concreto para trabalhar a matemática, havendo dificuldades do ponto de vista humano, nesta escola, a precariedade atinge tanto os recursos materiais, quanto humanos. Esse quadro aponta para a necessidade de equipar as escolas rumo a estas necessidades. O material concreto utilizado de maneira apropriada pode ajudar as crianças a compreender a formalização matemática. Nessa direção, comungamos com SPINELO; MAGINA apud PAVANELO (2004: 12), ao afirmar que: É importante criar situações que levem as crianças a desenvolver ações físicas e mentais, e que promovam a reflexão sobre essas ações, descobrindo as propriedades lógicas subjacentes à situação. A mera presença de objetos e sua manipulação são insuficientes para garantir a compreensão matemáticas. A compreensão acima exposta pelos autores é de fundamental importância para os/as professores/as que trabalham com as crianças nessa faixa etária. O avanço das crianças na 3 área da matemática, passa necessariamente pelo domínio do repertório de conhecimento matemático do professor, é a partir do domínio do conhecimento na área, que conseguirão planejar suas atividades, de forma a promover desafios para as crianças, instigando-as na busca da construção do conhecimento matemático. Como sabemos, esta perspectiva será possível a partir da mudança da concepção de ensino da matemática no início da escolaridade. A partir das amostras obtidas em campo, podemos reconhecer situações que de alguma forma direciona o nosso olhar para responder a questão/problema, explicitada no início desse trabalho. As ações conservadoras se mantêm no ensino da matemática, o uso da cópia e repetição são procedimentos preponderantes, tornando a aprendizagem superficial. Diante dos dados tratados até o presente, destacamos que a concepção que o/a professor/a tem em relação ao ensino e a aprendizagem da matemática é elemento central nesse processo. Ter material concreto para trabalhar matemática nas séries iniciais, é necessário, mas não é suficiente. A formação continuada do professor nessa área, promotora da mudança de concepção, paralelo ao acompanhamento de sua prática pedagógica, é uma ação necessária para materializar os avanços. Nessa direção, concebemos que apenas formação continuada não evidencia alterações nas práticas pedagógicas, principalmente no formato de “professores multiplicadores” que continua se desenvolvendo. O cotidiano mostra que em relação ao ensino e a aprendizagem da matemática, se faz necessário encontrar outras metodologias de formação, que estabeleça relação entre a formação continuada e as repercussões dessa formação no cotidiano da sala de aula do professor/a. Na conclusão do estudo, destacamos o indicativo comprovado pelos próprios dados: as repercussões do tipo de formação continuada que temos desenvolvido com os professores/as da educação básica na área, ainda não respondem as demandas de aprendizagem da população escolar. A vantagem que estudos como este traz, é o que corresponde à correção da “rota de formação”. A formação numa perspectiva construtiva vem se desenvolvendo na região a mais de 20 anos. É preciso perguntar se a formação vem propiciando mudança de concepção e melhoria da aprendizagem das crianças. As limitações se colocam na condição de que este é um estudo de caso. Embora estejamos estudando aqui, uma escola de “referência” para a rede pública municipal, hipoteticamente, com mais condições de provocar alterações nas práticas curriculares, estas nos parece ainda não estar presentes. O que pode indicar que este possa ser um caso representativo de muitos outros. Considerações Finais: Diante dos dados trabalhados, identificamos que a professora, um dos sujeitos desse estudo, ainda não se convenceu de seu papel mediador na construção do conhecimento matemático. Logo, sua concepção metodológica ainda está preponderantemente concentrada na memorização, na repetição e no máximo na técnica. Não há ainda, mudança da concepção metodológica. Os registros apresentados no diário de campo identificam até o momento, crianças que não têm interesse na matemática. Exceto, quando eventualmente a professora trabalha com atividades lúdicas. Sendo assim, o processo de inserção das crianças, no universo dos números, no início da escolarização, continua sendo insuficiente para se construir uma relação favorecedora da aprendizagem das crianças na área da matemática. Os procedimentos metodológicos adotados não primam por uma perspectiva mediadora, que propicie significado e envolvimento da criança com a matemática, dificultando assim, a construção do conceito de número. Nossa expectativa vai numa direção propositiva, de que sejam reavaliados os programas de formação continuada na área, objetivando a materialização de práticas que se 4 configurem na direção do aprender matemática de maneira menos dolorosa, mais desafiadora, envolvente e superadora dos danos que o ensino da matemática tem provocado nos diferentes sujeitos educativos. O que indica para a necessidade de um acompanhamento pedagógico sistemático, outro formato de formação continuada, além de material didático que ajude as crianças a construírem os conceitos necessários nessa faixa etária. Até o momento, á assim que pensamos. Referências ANDRÉ, M. E. D. A. Etnografia da prática escolar. 2ª ed. São Paulo: Papirus, 1995. _______. Estudo de caso em pesquisa educacional. Brasília: Liber, 2005 ARROYO, Miguel; CALDART, Roseli; MOLINA, Mônica. (Org). Por uma Educação do Campo. Petrópolis:Vozes, 2004 KAMII, Constance. A criança e o número: implicações educacionais da teoria de Piaget para a atuação com escolares de 4 a 6 anos. Trad. Regina A. de Assis. 11ª ed. São Paulo: Papirus, 1990. LÜDKE, M; ANDRÉ, M.E.D.A. Pesquisa em educação: Abordagens qualitativas. São Paulo: Editora Pedagógica e Universitária, 1986. MARANHÃO, Maria Cristina S. A.; SENTELHAS, Maria Silvia B.; MESQUITA, Monica Maria B. 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