CEFAC MOTRICIDADE ORAL FONOAUDIOLOGIA E ORTODONTIA

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CEFAC
CENTRO DE ESPECIALIZAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA CLÍNICA
MOTRICIDADE ORAL
FONOAUDIOLOGIA E ORTODONTIA
UMA VISÃO INTERATIVA EM PACIENTE CLASSE II
Monografia de conclusão do
curso de especialização em
Motricidade Oral
Orientadora: Mirian Goldenberg
MILLA FERREIRA COURI
RIO DE JANEIRO
2000
1
Resumo
Este
estudo
teórico
tem
como
objetivo
unir
o
trabalho
da
Fonoaudiologia com a Ortodontia no atendimento do paciente classificado
por Angle como classe II.
Um dos aspectos relevantes deste estudo é observar como se realizam
as funções do sistema estomatognático neste paciente e, por quê ocorrem
algumas inadequações.
Avalia-se as diferenças do classe II divisão 1 para o divisão 2, no que se
refere às posturas de lábios e língua, qualidade respiratória, mastigação,
deglutição, e quais as conseqüências dos maus hábitos neste indivíduo.
Analisa-se ainda, como as características pessoais podem mascarar ou
acentuar um possível problema.
De forma geral, as funções estão mais afetadas no classe II divisão 1 do
que no divisão 2; e alguns casos dependem da correção ortodôntica, para
que se realize a terapia fonoaudiológica. Verifica-se assim, que o classe II é
um paciente mais adaptado do que atípico.
Esta pesquisa pode contribuir para os profissionais que se interessam
em proporcionar aos seus clientes a correção dentária associada ao
equilíbrio funcional. O trabalho da Fonoaudiologia com a Ortodontia,
melhora não só a qualidade de atendimento ao paciente, como também trás
benefícios para os ortodontistas envolvidos, pois torna mais claro para estes
profissionais saber o momento de indicar a terapia miofuncional, quem deve
ser encaminhado e quais resultados pode-se esperar desta reeducação.
2
Abstract
This theoric study has the aim to connect the
Speech Therapy`s work to Orthodontia in the
attendance of the patient classified by Angle as
class II.
One of the relevants aspects of this study is to abserve how do the functions
of the stomatognatic system occur in this patient and, why there are some
inadequacies.
The differences from class II division 1 to the division 2 are examined
considering the positions of the lips and tongue, respiratory quality, mastication,
deglutition and the consequences of bad habits in this individual. It is still analyzed
how the personal characteristics can occult or accentuate a possible problem.
In general, the functions are more affected in class II division 1 then in the
division 2; and some cases depend on the orthodontic correction to the Speech
Therapy`s realization. It is possible to realize that the class II patient is more
adapted than atypical.
This research can contribute to the professionals that are interested in
proportionate their clients the orthodontic correction connected to the functional
equilibrium. The Speech Therapy`s work with Orthodontia improves not just the
attendance`s quality, but it brings benefits to the orthodontists involved, `cause it
helps these professionals to know the exact moment to indicate the myofunctional
therapy, who should be managed to it and what results can be expected from this
reeducation on.
3
Sumário
1. INTRODUÇÃO
1
2. DISCUSSÃO TEÓRICA
2.1 – Classificação da maloclusão
4
2.2 – Etiologia da maloclusão
13
2.3 – O paciente classe II
32
2.4 – Fonoaudiologia e Ortodontia
56
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
65
4. GLOSSÁRIO
70
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
80
4
Introdução
A Fonoaudiologia e a Ortodontia são ciências distintas que, nos últimos
anos, parecem estar dividindo conceitos, conhecimentos e pacientes.
Muitos livros de Ortodontia contêm capítulos sobre princípios de terapia
fonoaudiológicas, mesmo que não conceituem assim. Há mais de trinta anos,
encontrávamos profissionais e técnicos usando as famosas listas de exercícios
que, hoje, sem valor, foram substituídas por um encaminhamento ao
fonoaudiólogo para uma reeducação mais individualizada.
O ortodontista pode oferecer ao fonoaudiólogo dados importantes para sua
terapia e o fonoaudiólogo trabalhará para a aquisição de funções mais harmônicas
neste paciente, a fim de que o tratamento ortodôntico se estabilize.
A união das duas profissões me faz pensar em conceitos como forma e
função. A forma não existe sem a função e nenhuma função está presente, se não
há um tecido para interagir. A forma é estática, é como o objeto se apresenta: sua
ocupação, tamanho, volume, espessura – algo inerte. Dinâmica, ativa, repleta de
movimento – assim é a função. Pode ser rápida, lenta, fraca ou forte, mas nunca
parada. Ela se relaciona sempre com uma ação.
Procurar qual é a mais importante ou qual sofre maior influência da outra (a
forma da função ou a função da forma), é utopia, como também querer entendêlas separadamente. Quero pensar nas duas juntas (forma e função),
e
acrescentar mais duas palavras - Fonoaudiologia e Ortodontia. Pode-se agora
começar a entender que muitas características estão contidas em um mesmo caso
5
e não pode ser analisado só por um especialista, já que os efeitos do problema
atingem áreas de vários profissionais.
Conseguindo unir conhecimentos dentro de uma equipe multidisciplinar,
pode-se oferecer não só um diagnóstico mais completo, mas também um
prognóstico mais real, tentando considerar os limites de cada paciente e, assim,
diminuir o número de insucessos e recidivas.
Fiquei muito estimulada em pesquisar o paciente Classe II, quando observei
que cerca de 70% dos pacientes das clínicas de Ortodontia apresentam esta
classificação; talvez porque os fatores que levam a esta característica sejam mais
freqüentes do que os que causariam a Classe III, por exemplo.
A escolha determinada sobre um tipo de paciente pode sugerir que estou
tornando este estudo restrito, observando somente o paciente chamado de Classe
II por Angle. Quando fecho a classificação neste paciente e coloco o foco em suas
características, meu ideal é vê-lo por todos os lados, como se
olhasse uma
pirâmide de cristal. Ela é somente um objeto, mas, dependendo do lado que é
observada, pode-se achar várias formas, várias luzes, um número enorme de
possibilidades.
Assim é o paciente Classe II, um leque aberto para todas as direções. Ele
sofre a influência de diversos fatores que poderão determinar características
diferentes de acordo com a individualidade de cada caso no que se refere à idade,
tipo facial, padrões de crescimento, hábitos e outros itens vistos ao longo dos
capítulos.
6
Este estudo faz uma revisão bibliográfica e tem como ponto de partida a
explicação do que é a Classe II, noções de oclusão e maloclusão, a etiologia das
maloclusões e como funciona o sistema estomatognático neste paciente.
O capítulo sobre etiologia foi o mais pesquisado, talvez por pensar que seria
necessário achar a causa dos problemas. Mas será que descobrir a causa é o mais
importante? Sistematizar cada caso com determinada etiologia não seria algo fácil
demais para um sistema tão complexo?
Durante este trabalho procuro utilizar recursos do diagnóstico ortodôntico,
para ajudar na compreensão das características do paciente do ponto de vista
fonoaudiológico e gostaria de deixar para o ortodontista dados desta visão
fonoaudiológica que possam auxiliar no seu trabalho, e este estar cada vez mais
próximo do tão almejado equilíbrio – palavra que envolve tantos tecidos, funções,
formas e se aproxima do que é chamado de normal.
7
Classificação da maloclusão
“Sabe-se que entre todas as deformidades
humanas, as de maior freqüência são as
dentofaciais“.
Strang
Antes de descrever a classificação da maloclusão como é conhecida
atualmente, faço um breve histórico da Ortodontia e das idéias de se classificar a
maloclusão.
Hipócrates foi um dos primeiros a comentar sobre a deformidade
craniofacial: “Entre as pessoas com cabeça alongada, algumas apresentam
pescoço grosso, órgãos e ossos fortes. Outras possuem a abóboda palatina bem
arqueada, e seus dentes são dispostos irregularmente, apinhando-se uns com os
outros; estas são incomodadas por dores de cabeça e otorréia” (Moyers, 1988,
p.2).
Adamandios, escrevendo no séc. V d.c., relacionava características faciais
e personalidade, ao relatar que pessoas cujos lábios estão forçados para fora,
devido ao deslocamento dos caninos, são de mau caráter, gritões, desaforados e
difamadores.
A
preocupação com a oclusão é bastante antiga; toscos aparelhos,
aparentemente construídos para regularizar os dentes, foram encontrados como
artefatos arqueológicos em túmulos do Egito Antigo, da Grécia e dos Maias, no
8
México. É provável que a Ortodontia (como conhecemos hoje) tenha tido sua
origem na França, no séc. XVIII, quando Pierre Fauchard descreveu um aparelho
ortodôntico facilmente reconhecido como tal por qualquer dentista moderno
(Moyers, 1988 ).
A maioria dos norte-americanos afirma que a Ortodontia iniciou na virada do
século, quando
Edward H. Angle publicou “Um sistema de aparelhos para
corrigir irregularidades nos dentes” e fundou uma escola para treinamento de
dentistas como especialistas em Ortodontia. Angle foi um intelectual e um gênio
da mecânica que dominou o cenário ortodôntico no Novo Mundo, mais que
qualquer outra pessoa na Europa.
Os europeus estudaram mais a importância do esqueleto craniofacial nas
anomalias dentofaciais e na oclusão. Talvez esta seja a razão pela qual, nos
E.U.A., a especialidade seja denominada Ortodontia (do grego: “orthos”, que
significa reto, e “odontos”, que significa dente), enquanto na Europa se usam
termos como Ortopedia dentofacial.
A preocupação em sistematizar as anomalias dentárias sempre esteve
presente entre os anatomistas (Lino, 1994). Parece que a primeira classificação
proposta deve-se a Mekel (1722), publicada em seu livro “Manual de Anatomia
Patológica”. De Mekel a Angle (1899) identifica-se um período da Ortodontia em
que muitas proposições de classificação das anomalias dentárias e das
desarmonias dos arcos foram feitas.
Entre os vários métodos de classificação das maloclusões existentes,
apenas dois persistem e são de amplo uso atualmente. Um deles é o sistema de
9
Angle, que se conserva intacto; o outro, o sistema de Simon, que é usado na sua
totalidade por poucos clínicos (Moyers, 1988).
O trabalho de Angle (1855 - 1930) inspirou tanto ardorosos seguidores
como implacáveis antagonistas, porém seu intenso esforço resultou num grande
número de informações que antes não eram conhecidas. Seu nome figura até hoje
em um jornal e em uma organização ligada à Odontologia, mas, provavelmente,
ele é mencionado com maior freqüência quando se fala do Sistema de Angle de
classificação da maloclusão (Hanson e Barret, 1995).
Angle não teve o benefício da pesquisa moderna e muitas de suas idéias
estavam incorretas, mas sua classificação de maloclusão é ainda mais usada hoje
do que em 1907, ano de sua apresentação. Ele considerava a posição do primeiro
molar permanente como alicerce sobre o qual se construiria a “chave de oclusão”,
sendo esta uma classificação horizontal estática (Bianchini, 1998).
Há críticas em relação à classificação de Angle, especialmente porque um
dos principais fundamentos da mesma baseia-se no fato hipotético da posição fixa
do primeiro molar permanente (Lino, 1994).
A ênfase no relacionamento dos primeiros molares permanentes levou os
clínicos a ignorar o esqueleto facial e pensar somente em termos de posição
dentária. A disfunção muscular e os problemas de crescimento ósseo muitas
vezes eram passados despercebidos (Moyers, 1988; Hanson e Barret, 1995).
Outro aspecto criticado é que esta classificação examina apenas a direção
ântero-posterior, como que “esquecendo” os desvios verticais e transversais.
Desta forma, deixa de dar atenção às anomalias de mordida aberta, mordida
cruzada, sobremordida e estreitamento das arcadas ( Petrelli, 1994).
10
Cabe também interrogar que a classificação de Angle só é observada com
relações oclusais estáticas em relação cêntrica, (Mohl e Davidson, 1989) e que
muitas vezes os desvios dentários não são acompanhados pelas bases, o que
parece não ter sido levado em consideração (Lino, 1994).
Tem-se consciência de que alguns conceitos de Angle foram elaborados
apenas como recurso didático e não ferem a sua genialidade. Apesar de algumas
outras colocações que possam ser feitas, a classificação de Angle resiste sem
deixar de ser científica, além de simples, metódica e de fácil compreensão. É
universalmente conhecida como um ótimo denominador de comunicação entre os
especialistas da arte e ciência de Angle (Lino, 1994). Um grande mérito, para
quem é considerado o “Pai da Ortodontia”, que sua classificação seja adotada até
os nossos dias.
A introdução do sistema de Angle foi o passo mais importante para
converter os conceitos clínicos desorganizados na disciplinada ciência da
Ortodontia. Isto pode ser verdade, mas sabe-se que nenhum outro aspecto da
Ortodontia é menos compreendido e mais mal empregado (Moyers, 1988).
O sistema de classificação é um agrupamento de casos clínicos de
características similares, que facilitam seu manejo. Pode-se ordenar ou dispor em
classes as anomalias semelhantes segundo o tipo, forma do desvio, grau e
natureza comparadas à normalidade (Petrelli, 1994).
Certos sinais e sintomas tendem a se agrupar em maloclusões típicas,
produzindo síndromes ou classes, cuja identificação e classificação são úteis para
fins de comparação e para facilitar a referência e comunicação pessoal. A
classificação não é um sistema de diagnóstico, um método para determinar o
11
prognóstico ou uma forma de definir o tratamento. Não deseja-se rotular o
paciente; deve-se estudar a maloclusão, entendê-la por modelos e cefalometria e,
então, se possível, classificá-la.
Atualmente os clínicos usam o sistema de Angle de maneira um pouco
diferente do originalmente apresentado, pois a base da classificação sofreu uma
mudança de relação molar para relação esquelética. Se o objetivo for descrever
as más posições dentárias individuais ou em grupos de dentes, usa-se a
classificação de Lischer (Moyers, 1988).
Sistema de Angle de classificação das maloclusões :
Classe I: estão incluídas nesta categoria as maloclusões onde existe uma
relação
ântero-posterior
normal
entre
maxila
e
mandíbula.
A
cúspide
mesiovestibular do primeiro molar superior oclui no sulco vestibular do primeiro
molar inferior. As bases ósseas estão correspondentes e nenhuma delas (maxila
ou mandíbula) está em posição mais anterior ou posterior em relação ao crânio
(Moyers, 1988; Petrelli,1994).
A maloclusão ocorre nos segmentos anteriores, um ou vários dentes podem
ser desviados do seu curso normal. Lischer (1912) denominou esta categoria de
neutroclusão (Hanson e Barret, 1995).
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Classe II: constituída pelas maloclusões nas quais se observa uma relação
distal da mandíbula com a maxila (também conhecida como distoclusão). O sulco
mesiovestibular do primeiro molar inferior oclui posteriormente à cúspide
mesiovestibular do primeiro molar superior (Moyers, 1988; Petrelli, 1994);
produzindo desarmonia muito marcante na região incisiva e nas linhas faciais
(Mohl e Davidson, 1989).
Divisão 1 : distoclusão na qual os incisivos superiores estão tipicamente em
labioversão exagerada.
Divisão 2 : distoclusão em que os incisivos centrais superiores estão quase
em sua posição normal ântero-posteriormente ou apresentam uma leve
linguoversão, enquanto os incisivos laterais superiores
apresentam uma
inclinação labial ou mesial (Moyers, 1988). Em alguns casos, podemos encontrar
tanto os incisivos centrais e laterais superiores inclinados para palatino como os
caninos superiores em posição vestibular (Petrelli, 1994).
Subdivisão: quando a distoclusão ocorre apenas de um lado do arco
dentário, a unilateralidade é expressa como uma subdivisão de sua divisão.
Classe III : nesta categoria englobam-se as anomalias que apresentam uma
posição anterior da mandíbula em relação à maxila. O sulco mesiovestibular do
primeiro molar permanente inferior oclui anteriormente à cúspide mesiovestibular
do primeiro molar permanente superior (Petrelli, 1994). É conhecida também como
mesioclusão (Hanson e Barret, 1995).
13
Classificação de Lischer:
Na classificação de Lischer, faz-se a adição do sufixo “versão” à palavra
indicadora da direção para a qual o dente se desvia da posição normal (Moyers,
1988; Hanson e Barret, 1995; Petrelli, 1994).
a) Mesioversão: mesial à posição normal.
b) Distoversão: distal à posição normal.
c) Linguoversão: lingual à posição normal.
d) Lábio ou vestibuloversão: em direção ao lábio ou à bochecha.
e) Infraversão: aquém da linha de oclusão.
f) Supraversão: além da linha de oclusão, isto é, abaixo da maxila e acima
da mandíbula.
g) Axiversão: inclinação axial incorreta.
h) Giroversão: rotada sobre seu longo eixo.
i) Transversão: alterada da ordem do arco, transposição.
Quando a maloclusão compromete somente os arcos dentários são
denominadas dentárias e quando comprometem as suas bases ósseas são
denominadas esqueléticas ou dentoesqueléticas, visto que, ao comprometer a
base óssea, esta leva consigo o posicionamento inadequado dos dentes (Cabrera,
1997).
A análise cefalométrica
proporciona o melhor
meio para se estudar
as variações do esqueleto craniofacial e verificar se o problema é ósseo ou
dentário. A displasia óssea ou desarmonia esquelética, infelizmente, não é um
componente raro nas maloclusões. O adjetivo esquelético é usado para uma
grande porcentagem de casos de classe II e indica um comprometimento ósseo
14
significativo. A maioria da classe III é de origem esquelética e mesmo as
anomalias localizadas, tais como a sobremordida ou mordida cruzada, podem ter
uma base esquelética (Moyers, 1988).
A maloclusão dentária envolve principalmente os dentes e suas estruturas
de suporte. A maior parte dos pacientes apresenta este tipo de maloclusão e tem
bom prognóstico. Pode-se encontrar nesta categoria características como: má
posição dentária, alteração no número, forma ou tamanho dos dentes.
As maloclusões neuromusculares ou funcionais são os problemas de
função da musculatura dentofacial e podem estar associados às manifestações
dentárias ou esqueléticas. Qualquer alteração persistente na sincronia normal dos
movimentos mandibulares ou das contrações musculares pode resultar no
crescimento anormal dos ossos da face ou em posição anormal dos dentes.
Relaciona-se com os resultados dos maus hábitos, principalmente hábitos de
sucção, que podem provocar o estreitamento do arco dentário superior e retração
da mandíbula.
Raramente encontra-se uma maloclusão que seja apenas um problema
dentário, muscular ou ósseo; tão íntimas são as interações de crescimento que
uma alteração em um tecido afeta facilmente o outro. Embora os três tecidos
(osso, músculo e dente) estejam quase sempre envolvidos em todas as
deformidades dentofaciais, um é dominante (Moyers, 1988).
Ao fechar a classificação das maloclusões acho que será interessante citar
um conceito muito repetido entre os ortondontista: “a maloclusão não tratada,
poderá encontrar a qualquer momento, o equilíbrio dinâmico; pois representa a
15
melhor tentativa da natureza em manter o equilíbrio entre os elementos do sistema
estomatognático” (Hanson e Barret, 1995, p.187).
Etiologia da maloclusão
“Feliz é aquele capaz de aprender
a
causa das coisas”.
Virgílio, Geórgicas
Etiologia é a análise e a investigação das causas de um fenômeno. É a parte
da medicina que trata da origem das doenças. Etiologia da maloclusão é o estudo
das causas das anomalias da oclusão dentária (Schwartz, 1994).
Pouco se sabe sobre todas as causas determinantes de deformidades
dentofaciais; a dúvida aparece porque o estudo da etiologia é feito sob o ponto de
vista da classificação clínica final, do que se vê no paciente. Moyers (1988)
considera esta uma abordagem difícil, quando observa que muitas maloclusões,
que parecem similares e são classificados de modo semelhantes, não têm o
mesmo padrão etiológico. O autor sugere que seria correto estudar a etiologia a
partir de causa original, porém
o conhecimento nesta área é insuficiente. A
discussão sobre a etiologia continua centralizada no tecido afetado.
16
A idéia de discutir a etiologia em termos de local de tecido envolvido foi
elaborada por Dockrell (1952) e adotada por outros ortodontistas. A equação
ortodôntica de Dockrell é uma breve expressão do desenvolvimento de todas as
deformidades dentofaciais. Uma determinada causa original atua por um tempo
sobre o local, produzindo resultados (reação causa – efeito).
AS CAUSAS atuam em PERÍODOS sobre OS TECIDOS produzindoRESULTADOS
A longo dos anos, os autores foram acrescentando vários itens à equação
de Dockell, que era muito simplificada. Os ortodontistas observaram que seguir
esta equação seria como dizer que uma mordida aberta, por exemplo, se origina
sempre da sucção do polegar. Moyers (1988), verificando que não podia isolar e
identificar todas as causas originais, decidiu estudá-las em grupo e considerou que
os grupos se sobrepunham e podiam formar um grande número de variáveis para
um mesmo resultado.
A ampliação da equação do Dockell teve a seguinte forma:
AS CAUSAS atuam em PERÍODOS sobre OS TECIDOS produzindo RESULTADOS
(predisponentes,
(pré-
(primariamente,
(podem ser os
excitantes)
ou
secundariamente)
seguintes, ou
pós-natal)
uma combinação
dos mesmos)
1- hereditariedade
2- causas de
desenvolvimento
de origem
desconhecida
3- traumatismos
4- agentes físicos
5- hábitos
6- enfermidades
7- má-nutrição
1-contínuo ou
intermitente
2-atuação em
diferentes
faixas etárias
1-ossos e
cartilagem
2- dentes
3- sistema
neuromuscular
4- tecidos moles
além dos músculos
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1- disfunção
2- maloclusão
3- displasia
óssea
Cada região atingida neste processo possui um tecido diferente. Ossos,
dentes e músculos crescem de maneira e em velocidade diferentes; assim ocorrem
respostas ao meio de formas variadas. A diferença na resposta tecidual, durante a
fase de desenvolvimento, é fator determinante no resultado final.
Problemas clínicos semelhantes derivam de fatores etiológicos distintos. A
maloclusão, em contraste com a doença, pode ocorrer por combinação das
menores variações do normal. A soma de variações suaves produz maloclusão
(Moyers, 1988).
Didaticamente, Lino (1994) dividiu os fatores etiológicos em fatores
hereditários, fatores pré-natais e fatores pós-natais. De acordo com esta divisão,
vamos observar as colocações de alguns autores:
Fatores hereditários:
A hereditariedade é o fenômeno biológico pelo qual os descendentes
recebem dos ascendentes os caracteres normais ou patológicos (Schwartz, 1994).
Mesmo que a natureza (sempre programada para acertar), busque o equilíbrio, as
combinações genéticas podem levar a desvios (Lino, 1994).
Na discrepância ósseo-dentária podemos ter volumes dentários grandes
para base óssea pequena, determinando falta de espaço para o alinhamento dos
dentes; ou, ao contrário, podem resultar em diastemas (espaços entre os dentes)
generalizados.
A desarmonia das bases apicais (maxila-mandíbula) é uma característica
bastante comum e pode também ser observada como padrão de grupos étnicos.
O papel da hereditariedade no crescimento craniofacial e na etiologia das
maloclusões tem sido bastante estudado e, na realidade, ainda pouco se sabe
18
(Moyers, 1988).
Apesar deste conhecimento quantitativo ser escasso, todos
concordam que a herança genética tem função principal na etiologia das anomalias
dentofaciais.
Fatores pré-natais:
São as causas maternas e embrionárias, que, de modo geral, estão muito
vinculadas entre si (Lino, 1994). A deficiência ou excessos na alimentação da
gestante podem implicar na formação do feto. Algumas doenças como a rubéola e
sífilis também causam transtornos na formação.
Traumas e quedas da mãe são mais significantes nas primeiras semanas,
quando o sistema de proteção ainda é insuficiente.
Um exemplo de transtorno de má-formação que atinge diretamente a face é
o lábio leporino – fenda palatina, uma anomalia congênita de origem desconhecida
(Schwartz, 1994).
Fatores pós-natais:
Neste item, encontra-se um grande número de agentes que levam à
maloclusão. Chamam-se fatores intrínsecos aqueles que são parte ou estão
diretamente ligados aos arcos dentários e fatores extrínsecos aos que não são
diretamente ligados aos arcos dentários; de uma forma geral,
hábitos bucais.
19
constituem os
Tem-se inicialmente conceitos relativos aos fatores intrínsecos. Como estes
são fatores com localização determinada (dentes), não há muita discordância entre
os autores sobre seus efeitos na oclusão (Lino, 1994; Moyers, 1988; Graber, 1974;
Petrelli, 1994).
Para os fatores extrínsecos a discussão é mais ampla. Observa-se neles
maior importância para este estudo, já que têm influência direta sobre os tecidos
moles e funções estomatognáticas.
Fatores intrínsecos:
a) Cáries extensas: ocorrendo na dentição decídua, poderão comprometer
a
dentição permanente, levando a inclinações incorretas dos dentes por falta de
espaço. Esta é a maior causa isolada de maloclusão.
b) Hipoplasias: falha na formação do esmalte. Ocorre perda de substância com
diminuição do espaço proximal e funcional.
c) Perdas precoces.
d) Restaurações insatisfatórias: modificam os contatos oclusais.
e) Retenção prolongada: quando o dente decíduo permanece por muito tempo,
pode causar impactação do permanente.
f) Impactação: dentes permanentes que não irrompem.
g) Oligodontias: não-formação dos dentes.
h) Poliodontias: maior número de dentes que o normal.
i) Anomalias na forma dentária: devido a traumas ou enfermidades.
j) Anomalias de tamanho: dentes grandes ou pequenos, mas mantendo a forma
característica.
20
k) Arrizogênese: quando não forma a raiz do dente, podendo levar à perda
precoce.
l) Freio labial anormal: provocando diastemas.
m) Erupção tardia ou precoce: a não-erupção próxima de dentes homólogos pode
determinar desvio no estabelecimento dos contatos proximais.
As enfermidades sistêmicas têm maior efeito na qualidade do que na
quantidade do crescimento facial. A maloclusão pode resultar secundariamente de
algumas neuropatias e distúrbios neuromusculares ou ser seqüela do tratamento
de certas patologias.
Os distúrbios endócrinos pós-natais podem retardar ou acelerar a direção de
crescimento facial, mas não a distorcem. As alterações gengivais e periodontais
produzem um efeito direto sobre os dentes, causando perda de dentes , tumores e
dependendo de sua localização, também produzem maloclusão. Em relação à
qualidade dos tecidos, a má-nutrição influencia na velocidade de calcificação dos
dentes e não afeta muito no seu tamanho .
Fatores extrínsecos:
Os hábitos são padrões de contração muscular aprendidos, de natureza
complexa. Alguns deles são estímulos ao crescimento normal dos maxilares
(Moyers, 1988). Os chamados hábitos deletérios são considerados fatores
etiológicos das maloclusões de caráter muscular, esquelética ou dentária (Soares e
Totti, 1996).
É importante entender que, em qualquer hábito, existe a função neurológica.
Os hábitos funcionais como andar, falar ou sucção nutritiva são descargas reflexas.
O roer unha ou respiração bucal, quando automatizados são também
21
essencialmente reflexos. Esta consideração é válida para indivíduos com padrão
neurológico normal (Lino, 1994).
Hábitos funcionais podem se transformar em deletérios; para Silva Filho,
Okada e Santos (1986), os desequilíbrios musculares decorrentes destes hábitos
são capazes de alterar o desenvolvimento da oclusão , principalmente no período
de crescimento. Garliner (1966) completa, justificando que ocorrem estas
alterações dentárias porque os dentes sofrem influência dos tecidos moles; assim,
transtornos miofuncionais ocasionam desvios dentários. A maloclusão, então, é
conseqüência de uma alteração miofuncional gerada por maus hábitos (Petrelli,
1988).
Os hábitos deletérios, segundo Rossi (1986), que mais influenciam na
oclusão são: sucção digital, uso prolongado de chupeta, interposição de objetos
entre os dentes e a onicofagia (roer unha). Soares e Totti (1996) acrescentam a
sucção do lábio inferior e a postura incorreta ao dormir . Tabith (1988) acredita que
a deglutição atípica tem sido o hábito mais relacionado a alterações oclusais.
Lewis (1925), citado por Galvão (1986), já destacava o uso da mamadeira
como fator etiológico da maloclusão. Garliner, em 1971, fez a mesma relação,
assim como vários outros que vieram mais tarde, como Canongia (1990) e Felício
(1994).
Em 1998, Marchesan concluiu que “o uso da mamadeira não parece
interferir com a oclusão” (p.167), criando controvérsia em relação as afirmativas
dos autores anteriores. Humphreys e Leigerton (1950), citados por Abreu (1997),
também não encontraram nenhuma diferença significativa na freqüência de uso de
mamadeira em crianças com maloclusão.
22
A respiração bucal é bastante relacionada à oclusão, principalmente pela
posição em que os lábios se encontram (Sisakun e Bishop, 1989, citados por Tomé
e Marchiori, 1998). Segundo Proffit (1978), a postura de lábios abertos
desempenha um importante papel na posição final dos dentes.
Após citar os hábitos mais freqüentemente ligados à maloclusão, acho que
será melhor revê-los separadamente e, assim, compreender a justificativa de cada
autor para esta associação .
Hábitos de sucção:
O hábito de sucção de polegar ou de outros dedos, chupeta e mamadeira,
mais encontrados em crianças, causa grandes alterações no equilíbrio do aparelho
estomatognático (Moresca e Feres, 1994). Se a criança consegue se livrar de um
hábito de sucção digital até os três ou quatro anos de idade, não terá maiores
conseqüências para a arcada dentária; porém, a partir desta idade pode provocar
maloclusões graves (Moyers, 1988).
Lino (1994) acredita que os hábitos de sucção vêm da insatisfação do bebê
com a sucção da mamadeira. Quando é oferecida a mamadeira à criança, ao invés
do peito, o bico não tem a perfuração calibrada e irá deixar passar um fluxo de leite
bem superior àquele obtido no peito. Assim, a criança raramente atinge a sensação
de satisfação psico-emocional devido ao pouco tempo de mamada, em média cinco
minutos contra trinta minutos no peito. A criança resolve este déficit fazendo a
sucção do dedo ou da chupeta.
O uso da mamadeira encontra controvérsias entre os autores. Hellman
(1914), citado por Abreu (1997), sugere que há uma relação direta no uso da
mamadeira e ocorrência da maloclusão. Humphreys e Leighton (1950) não relatam
23
nenhuma diferença significante na freqüência do uso da mamadeira e ocorrência
de maloclusão. Abreu (1997) e Straub (1960-61-62) acham que o fator de risco
está no tipo de bico usado na mamadeira. Se for usado o bico ortodôntico, que se
assemelha ao bico do peito, evitará a maloclusão. A posição deste bico na
cavidade bucal também influencia no desenvolvimento das arcadas (Subtelny,
1965).
A instalação de hábitos viciosos de sucção não fisiológica está intimamente
ligada a uma amamentação inadequada nos primeiros meses de vida (Abreu,
1997). Felício (1994) e Edger (1985) relatam que qualquer objeto colocado na
cavidade oral e sugado pelo bebê, que não seja o seio materno, agirá como um
dispositivo ortodôntico e não só alterará a correta postura de repouso da língua
como também criará diferentes possibilidades de maloclusão.
Nota-se, desta forma, que o uso de chucas ou mamadeiras
levam à
deglutição atípica, que pode provocar deformação da arcada dentária (Barbosa e
Schnonberger, 1996), principalmente pela forma grosseira do bico, que altera o
comportamento postural da língua
e pelas funções compensatórias durante a
amamentação (Graber e Neumann, 1987).
Em um ponto todos concordam: a sucção digital ou chupeta, por uso
prolongado, interferem diretamente na oclusão (Marchesan, 1998; Urias, 1994;
Segovia, 1992), considerando que o tipo facial do indivíduo também pode ser fator
contribuinte. A ação da sucção do polegar
em indivíduo com tendência ao
desenvolvimento de um prognatismo mandibular não é a mesma, quando existe
tendência para distoclusão basal (Elgoyhen, 1994).
24
A sucção do lábio pode aparecer só ou com a sucção do polegar. Em quase
todos os casos, o lábio inferior está envolvido na sucção (Moyers, 1988). O lábio
inferior é constantemente mantido por baixo dos dentes superiores anteriores,
provocando uma maloclusão onde os incisivos superiores ficam em labioversão e,
se o caso se agrava, produz uma linguoversão dos dentes inferiores (Soares e
Totti, 1996).
A maloclusão provocada por hábito de sucção digital depende de variáveis
como: posição do dedo, contrações musculares buco-faciais associadas, posições
da mandíbula durante a sucção, padrão do esqueleto facial, número de dedos
sugados, freqüência, duração e intensidade.
Onicofagia:
O ato de roer unhas inicia-se por volta dos quatro ou cinco anos de idade.
Coincide com a fase que a criança está vivendo, saindo de um mundo de proteção
e segurança, para um mundo de exigências. Moresca e Feres (1994) aceitam que
o roer unhas é um mecanismo liberador de tensões.
A maloclusão associada a este hábito é mais localizada do que aquelas
encontradas com outros hábitos de pressão já citados. Aparece em crianças
tensas, não é raro apresentarem desajustes sociais e psicológicos e a onicofagia
não é nada mais que um sintoma do seu problema básico (Moyers, 1988). A
característica principal da maloclusão será baixo desgaste na zona pressionada,
desviando um ou mais dentes (Soares e Totti, 1996).
Lino (1994) tenta descartar a possibilidade de associação da onicofagia com
fatores emocionais, justificando este hábito pela necessidade da criança ao morder
25
quando surgem os primeiros dentes. A criança poderá morder vários objetos, mas
o mais comum é roer unhas.
Do ponto de vista ortodôntico, deve-se agrupar neste item também o hábito
de morder lápis ou palitos, pois causam as mesmas anomalias dentárias que a
onicofagia (Soares e Totti, 1996).
Postura:
Inclui-se neste item todos os hábitos de postura corporal ou facial; já que
ambos, unidos ou separados, afetam a oclusão normal.
A manutenção da posição supino (barriga para cima) de um bebê em
superfície dura e plana pode causar achatamento do osso occipital ou produzir uma
assimetria facial (Moyers, 1988). Após três ou quatro anos de idade, se a criança
tem o hábito de colocar a mão ou o braço sob o rosto para dormir poderá provocar
uma compressão uni ou bilateral na face que, neste período de crescimento,
produziria a maloclusão com mordida cruzada (Soares e Totti, 1996). Moyers
acrescenta que a postura corporal defeituosa, de modo geral, em idade de
crescimento, quase sempre demonstra uma posição mandibular indesejável.
Proffit (1978) e Shelhart (1996) relatam que as pressões exercidas durante o
repouso pelos lábios, língua e bochechas desempenham um importante papel na
posição final dos dentes. Proffit (1978), Hanson e Barret (1995) referem-se à
postura de lábios como o elemento mais importante na determinação de posições
estáveis para a dentição.
Hanson e Barret (1995) justificam esta importância, esclarecendo que a
posição de boca aberta neutraliza totalmente a influência da faixa de músculos
26
periorais, permitindo que todos os dentes anteriores se desenvolvam em
labioversão. Marchesan (1998) afirma ter observado associação entre a
maloclusão e o selamento labial, porém acha difícil concluir qual é causa e qual é
efeito.
Não encontramos autores que acreditassem que a postura corporal ou facial
incorretas não acarretariam transtornos na face em conjunto com a maloclusão.
Respiração bucal:
Muitas vezes a respiração bucal não é somente
paciente pode apresentar
também obstrução
um mau hábito, o
das vias aéreas superiores ou
processos alérgicos. Neste estudo busca-se analisar a influência da respiração
bucal sobre as arcadas dentárias; por isso, não há referências sobre a origem
deste problema.
Brenchley (1991) cita a respiração bucal como o mau hábito mais freqüente
e que maiores danos causam à oclusão. Sisakun e Bishop (1989), citados por
Tomé e Marchiori (1998), completam que a postura de boca aberta associada à
respiração bucal em idade
de crescimento e desenvolvimento irão influenciar
negativamente as características dento-faciais.
Em 1960, Linder - Aronson e Backstron não encontraram relação direta
entre respiração bucal e maloclusão. Os resultados por eles obtidos não
demonstraram diferenças significantes na sobresaliências, sobremordida, largura
da arcada e distribuição das maloclusões. Estes autores não encontraram muitos
adeptos às suas teorias, principalmente depois que Ricketts (1968) descreveu a
síndrome da obstrução respiratória e todos os seus efeitos posturais e dentofaciais.
27
O padrão respiratório alterado se reflete em alterações neuro musculares,
funcionais, na formação dos maxilares e posição dos dentes (Jorge, 1997). As
principais características na oclusão deste indivíduo são: cruzamentos e/ou
abertura de mordida e protrusão dos dentes anteriores (Saffer, 1989).
Na literatura mais recente todos confirmam a influência da respiração bucal
sobre a deformação dos tecidos (Posen, 1972; Cervera, 1996; Paul e Nanda, 1973;
Proffit, 1978; Canongia, 1990).
Deglutição atípica:
A
deglutição incorreta já foi um pouco descrita no item de hábitos de
sucção, como sendo fator intermediário entre o hábito de sugar e a maloclusão. A
criança que usa mamadeira ou chupeta poderá desenvolver a deglutição atípica e
esta deglutição alterada provoca a maloclusão. Garliner (1971), citado por Segovia
(1992), coloca a maloclusão e a deglutição atípica como problemas relacionados à
falta de amamentação natural. A posição inadequada da língua durante o repouso
e a deglutição seriam capazes de alterar o posicionamento dos dentes (Black,
1980). O autor afirma que a força exercida pela língua é de tal relevância , assim
como o número de deglutições diárias, que podem não só intervir, causando sérias
anomalias em dentes já existentes (decíduos), como também agir diretamente no
crescimento da futura dentição (permanente).
Alguns não acreditam na deglutição
atípica como grande vilã da
maloclusão. Moyers (1988) relata que a deglutição com projeção anterior pode ser
adaptativa à mordida aberta já existente. Neste caso, as contrações musculares
28
anormais, durante a sucção e deglutição, estabilizam a deformação, não a
provocam.
As deglutições com interposição de língua, que podem ser etiológicas de
maloclusão, são de dois tipos:
1) Deglutição com interposição lingual simples, com dentes em oclusão associada a hábitos de sucção.
2) Deglutição com interposição lingual complexa, com dentes separados relacionada a problemas naso-respiratórios crônicos.
Braga e Machado (1994) descrevem a deglutição atípica como uma
deglutição infantil ou visceral capaz de agravar casos de mordida aberta anterior
como também provocar a mordida aberta anterior
ou lateral, dependendo do
impulso feito pela língua sobre as arcadas (Segovia, 1992).
Fala:
O trabalho de Subtelny e Cols (1964) tenta achar a relação entre oclusão e a
fala. Seus resultados mostram que a maloclusão coexiste nos dois grupos,
articuladores normais e portadores de defeitos articulatórios. Assim, a fala não
pode ser fator determinante para a etiologia e nem pode ser considerada uma
característica de associação à maloclusão.
Marchesan (1998) encontrou dados sugestivos de que o ceceio anterior
poderá estar relacionado à maloclusão, porém como adaptação à forma da arcada
e não como fator causador.
29
Hábitos - considerações:
É importante destacar que os efeitos dos hábitos deletérios se fazem sentir
mais naqueles indivíduos cujo padrão esquelético facial predispõe a desvios mais
drásticos (Lino, 1994).
Os padrões faciais bons, definidos por forças inerentes do crescimento bem
equilibrado, muitas vezes não são atingidos e, quando acontecem desvios, a
simples remoção dos hábitos é o suficiente para a normalização.
Há tipos faciais mais propensos a sofrerem deformações induzidas por máfunções (dolicofaciais) e outros mais resistentes (braquifaciais). Os dolicofaciais
apresentam esta predisposição por sua musculatura ser mais débil e estirada,
devido ao padrão de crescimento mais vertical (Bianchini, 1998).
Segundo Barroso (1998), os hábitos nocivos não devem ser removidos de
repente , mas através da colaboração e compreensão da criança, sob o risco de
desenvolverem-se hábitos de compensação. Pierce (1990), concluiu que forças
pequenas, mas contínuas, têm um maior impacto na oclusão do que forças
grandes, mas intermitentes.
Alimentação:
Vamos abrir um parêntese neste capítulo, para discutir a influência da
alimentação civilizada nas arcadas dentárias.
Gomes (1997) com enfoque antropológico e bio-social,
defende a
descaracterização do sistema estomatognático face à influência da dieta
constituída de alimentos moles, principalmente usados após a revolução industrial.
O autor considera que quase todos os problemas do nosso aparelho
30
estomatognático são originários da atrofia funcional mastigatória e embasa suas
afirmativas na teoria da Matriz Funcional de Melvin
Moss, nas Leis de
desenvolvimento de Pedro Planas e nas mais recentes pesquisas de Petrovic e Mc
Namara.
Em seus estudos, cita autores como Begg (1954), Barret (1973) e Proffit
(1991), que analisaram a estrutura mastigatória dos aborígines australianos.
Naquelas civilizações primitivas, a excelente performance funcional dos maxilares e
dentes era fator de sobrevivência e reprodução. Gomes (1997) recomenda que,
nas terapias atuais, devemos nos aproximar ao máximo das bases naturais do
homem, e considera que a alimentação atual desvia o sistema estomatognático de
sua função natural e contribui para a incidência das maloclusões.
Simões (1985) e Van der Laan (1995), observando os índios Ianomâmis e
comparando-os a povos primitivos, concluíram que o grande biprognatismo maxilar
se dava por uso contínuo de uma alimentação dura e seca. Estudando o
crescimento facial em ratos, Watt e Willians (1951), verificaram que os ratos que
usaram alimentos duros apresentaram maior espessura e densidade nas áreas de
inserção dos músculos mandibulares, quando comparados a outro grupo que
utilizou o mesmo alimento, porém previamente amolecido.
Planas (1988) concorda com os anteriores na relação que a função
determina a forma e associa a maloclusão à alimentação civilizada, quando
determina a “atrofia mastigatória” como um dos grandes problemas de todos os
tempos. Enlow (1979) não vai tão longe e associa a dieta mole, refinada a somente
certos tipos de maloclusões, relacionadas mais ao desenvolvimento dos arcos
dentários.
31
O maior problema destas teorias é que não existem provas suficientes para
demonstrar como o estímulo da atividade mastigatória possa ser traduzido em
aumento dos arcos dentários (Proffit, 1995). Mudanças no hábito alimentar
ocorreram ao mesmo tempo que um grande aumento do número das maloclusões,
porém a relação direta não está bem definida e, mesmo que esta correlação fosse
demonstrada, isso não provoca causa e efeito.
O grupo analisado por Marchesan (1998) dá mostras da existência de
padrões alimentares que podem estar exigindo pouco esforço na mastigação, o
que provavelmente pode se relacionar com as maloclusões vistas hoje. Porém, as
maloclusões já existiam há muitos anos, mesmo com uma alimentação
considerada mais adequada. Torna-se evidente que os padrões alimentares, assim
como as características oclusais, sofrem uma modificação evolutiva ao longo dos
anos.
Conclusão:
Poucas maloclusões têm uma única causa específica; não há vírus que
desencadeie a Classe II, ou um microorganismo responsável pela mordida
cruzada. Por isso, não existe uma enfermidade ortodôntica (Moyers, 1988; Cervera,
1996). Tem-se que admitir que um mesmo tipo de maloclusão pode ter diversas /
diferentes causas ou fatores combinados. É um desvio de origem heterogênea e
multifatorial.
A maloclusão é o resultado da interação de vários fatores que agem sobre
um sistema em desenvolvimento, o qual possui o seu próprio padrão de
crescimento. Porém, existe uma tendência fisiológica para que algumas
32
maloclusões
apareçam
dentro
de
um
único
sistema
tissular
e
afetem
secundariamente outros tecidos, à medida que estes vão se adaptando às
modificações.
Os tipos mais graves são de origem óssea, no qual são sobrepostos os
aspectos dentário e muscular. Muito mais que uma etiopatogenia patológica, o que
existe nas maloclusões é uma desarmonia orgânica. Esta desarmonia cria a
disfunção e a disfunção modela e forma a maloclusão e a displasia óssea (Cervera,
1996).
Silva Filho (1986) ressalta que para a estabilização da maloclusão, alguns
fatores devem ser considerados, tais como: a Tríade de Graber (intensidade,
freqüência e duração), a competência muscular, a resistência alveolar e o padrão
facial do paciente.
Moyers (1988) acrescenta o fator tempo que, no desenvolvimento da
maloclusão, tem dois componentes: o período durante o qual atua a causa e a
idade em que é vista.
A presença de condições favoráveis nem sempre significa a garantia de que
surgirá uma maloclusão. É preciso lembrar que existem mecanismos individuais de
ajuste no desenvolvimento e modificação do crescimento , que podem, até certo
ponto, compensar tais situações, permitindo uma evolução normal da oclusão
(Lino, 1994).
O crescimento neural, linfóide, ósseo e dentário tem, cada um, seu próprio
curso, ritmo e velocidade. Estas variáveis, quando associadas, por exemplo, ao
mesmo tempo ao crescimento esqueletal da face e às funções respiratórias,
parecem complicar o estudo e o entendimento da região craniofacial em sua
33
integridade (Köhler, 1998). Este realmente é um assunto complexo, pois o indivíduo
tem características próprias e reações diferenciadas.
Considerando os relatos anteriores, acredito que Moyers foi brilhante ao
concluir que: “As maloclusões se originam devido aos desequilíbrios entre os
sistemas em desenvolvimento, que formam o complexo crânio-facial, desequilíbrios
com os quais a face em crescimento não pode lutar” (p. 236).
34
O paciente classe II
“Equilíbrio é sinônimo
de atividade”.
Jean Piaget
A classe II é uma maloclusão grave comum. O termo classe II é usado
somente em sentido geral, pois a única coisa que as inúmeras variedades de
classe II possuem em comum é a relação molar (Moyers, 1988). Os dentes
inferiores encontram-se posterior à sua relação normal com os dentes superiores.
A má relação pode ser devida a uma displasia óssea básica, ou ao deslocamento
anterior do arco dentário maxilar e dos processos alveolares, ou a uma
combinação dos fatores dentário e esquelético.
A cefalometria fornece dados esqueletais do classe II. Assim, podemos
observar um perfil tipicamente retrognático ou convexo, devido ao retrognatismo
mandibular, à protrusão da parte média da face ou a ambos. O arco mandibular é
curto em relação ao arco maxilar e o ângulo ramo-corpo (goníoco) é fechado
(Enlow, 1993). A fossa craniana média tem um alinhamento inclinado para frente e
para baixo, o que posiciona o complexo nasomaxilar mais protrusivamente.
35
A altura anterior da face superior geralmente é maior que o normal e, assim,
o plano oclusal pode estar muito inclinado, devido à displasia esquelética vertical
(Moyers, 1988). O tipo de forma da cabeça é freqüentemente dolicocéfalo, assim o
palato e a maxila são correspondentes longos e estreitos na divisão 1 (Enlow,
1993; Bianchini, 1998; Petrelli, 1994) e freqüentemente mais amplo que o normal
na região intercaninos para a divisão 2 (Petrelli, 1994).
Cada característica acima ocorre em cerca de 70% dos casos; isto quer dizer que
os outros 30% sofrem ações compensatórias. Em todos os indivíduos, a somatória
dos valores dimensionais de todos os fatores que levam à de protrusão
mandibular se contrabalança à soma dos valores de todos os fatores de retrusão
mandibular. Ou elas chegam a um predomínio efetivo ou uma predomina sobre a
outra. Todos nós temos uma face e um crânio que representam uma mistura
complexa de desequilíbrios regionais contrabalançados (Enlow, 1993).
As padrão dentário do classe II é, na maioria, um reflexo de adaptação do
padrão esquelético e muscular e pode ser estudado no cefalograma , nos modelos
dentários ou no próprio paciente.
Os incisivos podem estar em labioversão (na divisão 1) ou mais
verticalizados em sobremordida profunda (na divisão 2). O deslocamento mesial
dos molares superiores é uma comprovação da classe II. A angulação dos caninos
é um fator importante para a comprovação do diagnóstico, pois deve-se
correlacionar as chaves de molar e canino para definir a oclusão.
O plano oclusal, posteriormente, é um reflexo das características
esqueléticas da classe II, enquanto que, anteriormente, está associado às funções
de lábio e língua em relação ao agravamento das determinantes incisais da
36
maloclusão. Em praticamente todos os casos, a forma do arco superior é
desarmônico com a forma do arco inferior (Moyers, 1988).
Posen (1972) observou 135 pacientes com idades entre 8 a 18 anos e
verificou que, aos que apresentaram classe II divisão 2 , ele poderia atribuir a
inclinação dos incisivos centrais e a posição labial dos incisivos laterais à força
excessiva exercida por uma musculatura perioral fortalecida. E, nos casos de
protrusão bimaxilar, onde os lábios estão afastados, isto permitiria a migração dos
dentes para frente devido à ausência de pressão constante dos lábios sobre os
dentes.
As neuromusculatura muitas vezes parece ter ampla adaptação ao
esqueleto e às posições dentárias típicas da maloclusão classe II. As posições
labiais impostas pelo esqueleto facial causam o aumento da labioversão dos
incisivos superiores e, freqüentemente, inclinação para a lingual dos incisivos
inferiores. Em outros casos, os incisivos superiores e inferiores estão em
labioversão; uma vez que os lábios e a língua devem efetuar um selamento
anterior durante a deglutição e na produção de certos sons da fala, seus esforços
para fazê-lo em presença de uma displasia esquelética quase sempre resultam
em algum agravamento das relações incisais (Moyers, 1988).
Warren (1958) observou 100 crianças com idade de 11 anos e constatou
que 674 dos pacientes com maloclusão demonstraram acentuada atividade do
músculo mentalis. Alguns tipos de maloclusões produzem alterações significativas
no complexo craniofacial e, se o caso for mais grave, podem manifestar-se em
diversos níveis como na articulação temporo-mandibular, ouvido, faringe,
37
ou
alterações de postura (cabeça à frente, elevada e queda de ombros), (Bianchini,
1998).
Praticamente, todos os indivíduos com alterações oclusais mostram um
padrão disfuncional em alguns ou em todos os músculos do sistema
estomatognático, o que pode induzir a padrões adaptativos de mastigação e
deglutição ( Rodrigues; Barretin; Jorge; Genaro, 1998).
Fatores comuns e freqüentemente encontrados na classe II são a
respiração bucal e a interposição de língua (Moyers, 1988). Os indivíduos com
padrão facial braquifacial ou face larga, com forte musculatura facial, plano
mandibular baixo e sobremordida profunda são menos afetados em relação ao
fator neuromuscular do que aqueles com padrão dolicofacial ou face longa,
estreita e com musculatura hipotônica (Jorge, 1997).
Na classe II divisão 1, o perfil retrognato e a excessiva sobressaliência
exigem que os músculos faciais e a língua se adaptem
mediante padrões
anormais de contração que, na divisão 2, ocorre de forma mais suave, pois esta
não apresenta um retrognatismo tão acentuado.
Irei, à partir daqui, descrever separadamente os efeitos da classe II sobre
os lábios, língua, mastigação, deglutição e sua relação com a respiração e hábitos
inadequados.
Lábios :
Em grande maioria, as relações morfológicas dos lábios são determinadas
pelo perfil esquelético. Em repouso, os lábios normalmente se tocam de leve,
efetuando um selamento bucal quando a mandíbula está em sua posição postural
(Moyers, 1988).
38
A
relação lábios-dentes é considerada normal quando o lábio superior
cobre 2/3 da coroa do incisivo superior, enquanto o lábio inferior cobre o terço
inferior do incisivo superior (Bianchini, 1998).
Para observar se os lábios superiores e inferiores estão anatomicamente curtos,
eles são medidos separadamente em posição relaxada. A medida normal do lábio
superior é de 19 a 22mm. Esta medida é mais longa no sexo masculino do que no
feminino. Se o lábio superior é anatomicamente curto (18mm ou menos), observase um espaço interlabial aumentado e uma exposição do incisivo associado a um
aumento da altura facial inferior. As medidas de lábio inferior ficam entre 38 a
44mm. Na adolescência, os meninos constantemente mostram um lábio inferior
mais longo do que as meninas (Suguino, 1996).
Somente em raras ocasiões, o lábio superior apresenta-se curto. Em geral,
há uma adaptação da posição normal do lábio devido às posições dentárias. Há
casos, também, em que lábios muito competentes se adaptam à maloclusão;
assim, embora haja um selamento, este não será um selamento lábio-lábio, mas
uma disposição lábio-dente-lábio.
As relações morfológicas dos lábios estão condicionadas por um perfil
esquelético; portanto, um fator etiopatogênico labial é dependente da relação de
classe óssea esquelética em primeiro lugar. Nos casos normais, quando um over
jet ósseo de classe II é leve, os lábios mantêm uma posição normal (Cervera,
1996).
A medida que se vai produzindo uma classe II óssea, o lábio superior vai se
protruindo e o inferior retrai, os dentes seguem as bases ósseas e os lábios têm
sua posição e função alteradas:
39
- Lábios em classe II, divisão 1: há uma hiperatividade do músculo
mentoniano, que se contrai fortemente para elevar o orbicular dos lábios e efetuar
o selamento
dos lábios. Em posição de repouso, o lábio superior mostra-se
muitas vezes incompetente, devido à inclinação vestibular dos incisivos superiores
e o lábio inferior evertido, encaixado na sobressaliência (Moyers, 1988; Bianchini,
1998; Vellini, 1996).
Numa anomalia de classe II divisão 1, com discrepância de meia coroa de
pré-molar, o lábio inferior proporciona suporte vertical significante
para os
incisivos superiores. Se o caso for mais sério, a pressão dirigida lingualmente
pelo lábio inferior sobre os incisivos superiores é pequena ou insignificante.
Na classe II divisão 1, com sobressaliência pronunciada, o lábio inferior não
contata contra as bordas incisais dos incisivos superiores, proporcionando
dificilmente suporte vertical para eles. Como o lábio inferior fica por trás dos
incisivos superiores, os incisivos inferiores sofrem pressão adicional para a lingual,
o que pode levá-los a uma inclinação para a lingual associada à extrusão. A
situação poderá piorar, se o paciente apresentar algum hábito de sucção (Van der
Linden, 1990).
No caso de uma classe II divisão 1, se o lábio inferior estiver localizado alto
em relação ao processo alveolar dos incisivos superiores, isso pode levar à
situação de classe II divisão 2 pela força pequena, porém contínua deste lábio,
inclinando os incisivos superiores para a lingual (Bianchini, 1998). Fig. 8.
- Lábios em classe II divisão 2: encontramos, nesta categoria, uma função
labial mais próxima do normal (Moyers, 1988), ocorrendo mais facilmente o
vedamento labial (Bianchini, 1998; Vellini, 1996). Somente em alguns casos, nota40
se a hipertonicidade do lábio inferior (Petrelli, 1994). Se ocorrer uma linguoversão
dos incisivos centrais superiores e labioversão pronunciada dos incisivos laterais,
a linha do lábio segue uma forma de curva, elevada medialmente e baixa nas
comissuras labiais.
Quando os quatro incisivos superiores estão inclinados para palatino, o
lábio inferior exerce grande força sobre os incisivos superiores e é responsável
pela severa retroinclinação dos incisivos superiores e inferiores (Van der Linden,
1990).
Cervera (1996), observando os lábios, conclui que, dentro da análise de
fatores etiopatogênicos, eles são apenas um fator a mais de um tipo
constitucional, uma característica. Diante de uma maloclusão, o lábio só é mais
um componente que a provocou.
Existem três tipos de lábios, que correspondem a funções labiais diferentes.
Lábios médios apresentam função normal, lábios hiperativos são hipertônicos no
cerramento e nas funções de deglutição, fonação e articulação e; lábios
hipotônicos são os que se apresentam incompetentes no vedamento e nas
funções.
Lábios hiperativos fazem grande força na face lingual dos dentes e isto faz
com que os incisivos não protruam. Assim, a classe II divisão 2 está sempre
relacionada com este tipo de lábios. A
posição labial hiperativa
também se
produz pela diminuição da dimensão vertical do terço inferior da face, nos
pacientes que têm uma ação muscular potente ou conhecidos como braquifaciais
(Bianchini, 1998). Os lábios hiperativos são geralmente finos, têm uma textura
mais firme e têm menos parte rosada exposta (Cervera, 1996).
41
Lábios hipoativos se apresentam em classe II divisão 1. Neste tipo de
maloclusão, a dimensão vertical está aumentada, o que coincide com o tipo facial
chamado de hiperdivergente ou dolicofacial. O face longa possui altura facial
inferior aumentada, podendo apresentar hipotonia de lábio inferior , hipofunção de
lábio superior e compensações feitas pela hipertonia do músculo mentoniano. Os
lábios hipoativos têm textura suave, são grossos, com parte rosada muito exposta
e são pouco expressivos e funcionais.
A maioria das funções anormais dos lábios durante a fala dos pacientes
com maloclusão é uma adaptação ou acomodação à posição dos dentes.
O lábio superior em casos extremos de classe II divisão 1 funciona
parcialmente, pois o selamento bucal é feito pelo lábio inferior com os dentes
superiores (Cervera, 1996). Depois da retração dos incisivos, geralmente a função
normal do lábio ocorre espontaneamente. Assim, muitos casos de lábios com
funções inadequadas podem ser confundidos com lábios funcionalmente
anormais, porque, no classe II, a acomodação da função à forma é fator
predominante, quando se observam os lábios (Moyers, 1988).
A correção de alguns hábitos de postura de lábios, em casos de classe II,
não é possível sem se corrigir a maloclusão, é uma batalha perdida, uma
impossibilidade física (Thuer e Ingerbrall, 1996). Na muitos casos, a reeducação
da função muscular dos lábios deve ser feita, quando necessária, após a correção
dentária (Cervera, 1996).
42
Língua :
Observa-se o repouso da língua quando a mandíbula está em posição
postural; desta forma, o dorso da língua toca o palato de leve, enquanto a ponta
normalmente está em repouso na fossa lingual ou no sulco dos incisivos inferiores.
As posições anormais são:
1- a ponta sobre os incisivos inferiores, produzindo uma mordida aberta;
2- uma língua retraída ou levantada, que não causa maloclusão.
Moyers (1988), afirma que a língua deve ser avaliada nos procedimentos de
deglutição (inconsciente, saliva e água), mastigação e fala. Fig. 9.
O contato da parte anterior da língua depende da altura facial anterior, da
inclinação do plano palatino e do plano mandibular, da largura dos arcos dentários
e da convexidade da face. A postura de repouso da língua adapta-se à parte
esquelética (Bianchini, 1998). Observa-se uma posição mais elevada do dorso da
língua na classe II divisão 1 esquelética, em função da retrusão e inclinação
mandibular; assim, o ápice da língua está rebaixado devido à dimensão ânteroposterior diminuída. A postura protruída
ou interdental está relacionada às
mordidas abertas esqueléticas, como adaptação à altura inferior da face
aumentada (Bianchini, 1998; Moyers, 1988; Vellini, 1996).
Somente a postura protruída da língua tem um significado clínico; já que
afeta os dentes. Esta postura ainda se subdivide em:
- Endógena: é a persistência do padrão postural infantil, provocando
mordida aberta, na maioria das vezes, de forma leve.
- Adquirida: geralmente, é um problema mais simples, pois é o resultado
transitório de uma faringite ou amigdalite (Moyers, 1988).
43
A postura anormal de língua relaciona-se à sua própria tensão e morfologia,
podendo também estar associada a problemas respiratórios e tonsilas palatinas
aumentadas (Bianchini, 1998).
Não é considerada anormal a posição de língua no arco mandibular e, nem
por isso, desenvolve-se a deglutição atípica (Hanson e Barret, 1995). Desde que
ocorra um vedamento satisfatório, a ponta da língua pode apoiar-se atrás dos
dentes incisivos superiores ou inferiores em situação de repouso e/ou deglutição
(Bianchini, 1998). As posturas de lábios e língua se relacionam à postura de
cabeça e pescoço; assim, Saboya (1985) defendeu a idéia de se fazer uma
avaliação de postura completa do paciente e, se necessário, encaminhar a outros
profissionais.
Em Ortodontia, pressões leves e contínuas são mais eficientes na
movimentação dentária do que a aplicação de forças de maior intensidade, mas
de curta duração. Desta forma, as pressões exercidas pela postura da língua em
repouso são mais significativas e atuantes no desenvolvimento das deformidades
oclusais do que aquelas exercidas durante a fala, deglutição e mastigação (Urias,
1994).
Van der Linden (1990) completa, relatando que a postura da língua não leva
só a alterações nos arcos dentários, mas influencia toda a morfologia facial. A
deglutição atípica é determinada pela posição da língua, pois é a partir daí que ela
se realiza. A deglutição atípica não sugere uma maloclusão; o fator efetivo é a
postura de repouso da língua, mas esta posição só pode ser corrigida,
normalizando-se a deglutição (Lino, 1994).
44
Os hábitos de interposição de língua são os mais discutidos e por isso
mesmo se questiona se a forma leva à função ou a função à forma. Proffit (1978)
acredita que a postura da língua protruída pode provocar uma mordida aberta,
inclusive esquelética, por ser uma força contínua.
Cervera (1996) crê em duas hipóteses: casos em que a força da língua
pode causar a maloclusão e casos em que a língua se adapta a uma falta de
contato dentário e, assim, não é considerada fator etiopatogênico ativo e, sim,
uma adaptação de toda a cadeia músculo-oro-facial.
Os casos de classe II com sobremordida profunda, não estão relacionados
com hábitos de língua. Somente podemos associar a hábitos de língua uma
pequena porcentagem de casos de classe II divisão 1, onde os incisivos inferiores
não estão muito extruídos, não há acentuada curva de Spee e não existe muito
contato nem com a face palatina dos incisivos superiores nem com a mucosa por
detrás.
Quase em todos os casos de classe II, a interposição de língua em repouso
e para a deglutição é devida à um over jet acentuado e lábios incompetentes e a
correção deste hábito depende da correção do over jet.
Em classe II, observa-se alterações de postura e função de língua, quando
o caso se associa à respiração bucal, ou a hábitos de sucção ou, ainda, quando o
paciente apresenta face longa com mordida aberta (Cervera, 1996).
45
Respiração :
O padrão correto de respiração é nasal e, quando por diferentes motivos tal
padrão é substituído por um padrão de suplência bucal ou misto, temos um
paciente chamado Respirador Bucal (Carvalho, 1996).
Pode-se diferenciar os respiradores bucais e nasais, examinando as
seguintes características:
- Respiradores nasais: os lábios se tocam ligeiramente ou ficam semiabertos, com a língua fazendo o vedamento bucal (Bianchini, 1998) e as narinas
se dilatam sob o comando da inspiração (Moyers, 1988).
- Respiradores bucais: os lábios permanecem separados em repouso. As
narinas mantém o tamanho ou se contraem sob o comando da inspiração com os
lábios mantidos em contato. Eles não têm bom controle reflexo dos músculos
alares, os quais controlam o tamanho e a forma das narinas externas. Além disso,
apresentam muitas características faciais determinantes da respiração bucal
(Moyers, 1988).
O tema respiração bucal em relação às maloclusões é um dos mais
polêmicos. Na opinião de Cervera (1996) , a respiração bucal se desenvolve num
tipo de paciente com uma constituição orgânica específica para isso, ou devido a
uma matriz orgânica ou ambas as coisas. A respiração bucal é conseqüência de
uma morfologia alterada e de condições constitucionais que nos fazem relacionar
o paciente com as características deste problema.
Pesquisando o efeito da respiração bucal sobre a oclusão, Paul e Nanda
(1973), concluíram que os indivíduos respiradores bucais apresentavam arcos
46
maxilares mais atrésicos transversalmente e aumentados no seu comprimento
ântero- posterior, aumento da sobressaliência e sobremordida.
Angle associou os casos de classe II divisão 1 à presença de respiração
bucal e não foi encontrado autor que discordasse dele (Petrelli, 1994; Bianchini,
1998; Hanson e Barret, 1995). Na classe II divisão 2, como o vedamento labial é
facilitado, não encontramos muitos respiradores bucais (Bianchini, 1998).
Outro fator importante, para determinar a respiração de um classe II , é o
tipo facial. As pessoas com face longa, terço inferior da face aumentado, a língua
no soalho da boca e com baixa tonicidade dos músculos elevadores da
mandíbula, são mais propensos a apresentarem também a respiração bucal
(Bianchini, 1998).
Mastigação :
A oclusão tem importância significativa para o desenvolvimento dos
movimentos mastigatórios. Em geral, os indivíduos com oclusão normal
apresentam movimentos mastigatórios regulares e coordenados (Anderson e
Matthews, 1982). Até mesmo nas maloclusões comuns, não encontra-se uma
função mastigatória muito prejudicada (Moyers, 1988). Os pacientes com
maloclusões dentárias mais graves, tendem a
ter
um padrão mastigatório
irregular, com freqüentes cruzamentos dos movimentos de abertura e fechamento.
Uma grande superposição vertical dos incisivos e cúspides (sobremordida),
reduz a deflexão lateral do fechamento e os movimentos apresentam uma direção
mais vertical, ou seja, movimentos de corte. Em contrapartida, se a sobremordida
é pequena e a guia lateral dos incisivos reduzida, os movimentos assumem uma
47
forma mais oval e alargada, com um componente lateral mais acentuado, isto é,
movimentos de trituração (Anderson e Matthews, 1982).
Bianchini (1998) também acredita que, na maloclusão, o padrão
mastigatório é adaptativo ao problema dentário, podendo até ocorrer um
crescimento assimétrico da mandíbula diante de uma mastigação unilateral viciosa
durante a fase de crescimento.
No paciente classe II esquelética, durante a mastigação, há uma tendência
à anteriorização da mandíbula com dificuldade de oclusão labial, impedindo o
correto desempenho dos músculos orbiculares e bucinadores (Vellini, 1996;
Bianchini, 1998). A modificação da mastigação se evidencia se o paciente for face
longa, onde a função mostra-se ineficiente, principalmente pelo baixo tônus dos
músculos elevadores da mandíbula.
Deglutição :
Segundo Bradley (1984), a deglutição consiste em uma seqüência reflexa
de contrações musculares que produzem o translado do alimento desde a
cavidade bucal até o estômago. A deglutição madura normal caracteriza-se por
elevação da mandíbula, havendo contração do músculo temporal. Os lábios se
tocam levemente e não há contrações faciais. O paciente é capaz de deglutir
saliva de lábios separados e a língua ocupa somente a cavidade bucal (Moyers,
1988).
Na Ortodontia, existe uma grande preocupação com a fase oral da
deglutição, pois acredita-se que há uma forte relação entre o posicionamento dos
dentes e o modo com que a língua se coloca em relação a eles. A definição atipia
48
surge para caracterizar a movimentação inadequada da língua durante a fase oral
(Marchesan, 1998).
Tanigute (1998) esclarece que a forma de engolir irá depender das
características faciais, do tipo de oclusão e mordida, da idade do indivíduo e da
natureza do alimento. Só depois de observar estes fatores, é que pode-se redefinir
as deglutições consideradas atípicas ou adaptadas (Marchesan, 1998).
Deglutição atípica é aquela onde ocorre uma movimentação inadequada da
língua e/ou de outras estruturas que participam do ato de engolir, durante a fase
oral (sem que haja nenhuma deformação na cavidade oral). Na deglutição
adaptada, o movimento da língua é conseqüência de outro problema existente,
como, por exemplo, a maloclusão ou respiração bucal. Nesta última, a função
normal de engolir não se restabelece sem que faça uma correção da forma
(Marchesan, 1998).
Moyers (1988) ainda subdivide a deglutição com interposição de língua em:
-Interposição lingual simples: é caracterizada pela contração dos lábios,
músculo mentoniano e elevadores da mandíbula; portanto, os dentes estão em
oclusão, enquanto a língua se protrui (casos de mordida aberta). Os pacientes
com interposição simples geralmente são respiradores nasais com história de
sucção de dedos (a interposição da língua mantém a mordida aberta criada pela
sucção). A mordida aberta é bem circunscrita, isto é, tem começo e fim definidos.
-Interposição lingual complexa: é definida como uma deglutição de dentes
separados. Os pacientes demonstram contração dos lábios e músculo
mentoniano; nenhuma contração dos músculos elevadores da mandíbula e
interposição da língua entre os dentes. A mordida aberta, neste caso, é mais
49
difusa e difícil de definir e, às vezes, nem há uma mordida aberta; o que
observamos
nos
modelos
é
uma
oclusão
precária
e
instabilidade
de
intercuspidação. Provavelmente, são respiradores bucais, quase sempre com uma
história de doença naso-respiratória crônica ou alérgica.
- Deglutição infantil persistente: este comportamento é visto como a
persistência do reflexo de deglutição infantil. Felizmente, pouquíssimas pessoas
têm uma verdadeira deglutição infantil. Aqueles que a têm, mostram fortíssimas
contrações dos lábios e da musculatura facial; em geral, mais parece uma
“careta”. O prognóstico não é bom, por ser um reflexo tão primitivo.
A deglutição de sólidos exige maior estabilidade da língua e da mandíbula,
sendo esta importante para a ação dos músculos supra-hioídeos, ao contrário da
deglutição de líquidos, onde esta estabilização não é tão necessária e a contração
dos elevadores é mínima (Marchesan, 1998). Deve-se considerar também que a
contração dos músculos masseteres durante a deglutição depende da curva de
Spee, do espaço funcional livre, da altura facial inferior, da convexidade da face e
do que está sendo deglutido. Assim, não assegurar-se como uma regra geral que
a ausência de contração de masseteres na deglutição seja uma atipia (Bianchini,
1998).
A maior parte dos pacientes que apresentam deglutição atípica se
enquadram na classe II de Angle (Hanson e Barret, 1995). Alterações mais
freqüentes estão no classe II divisão 1; com sobressaliência pronunciada. Estes
comumente apresentam deglutição com interposição do lábio inferior atrás dos
incisivos superiores (na tentativa de selar anteriormente a boca), e atividade
intensa dos músculos mentoniano e bucinadores.
50
Pode haver simultaneamente deslize mandibular anterior durante a
deglutição para aumentar o espaço intra-oral. O arco superior apresenta-se com
grande atresia limitando a movimentação da língua para cima, havendo então
interposição lingual entre os arcos (Vellini, 1996; Bianchini, 1998; Hanson e Barret,
1995; Petrelli, 1994). Se for um caso de face longa, reforça ainda mais a
característica de interposição lingual e compensações feitas pelos músculos
periorais (Bianchini, 1998) .
A mordida aberta quando associada à classe II, demonstra características
funcionais iguais às associadas as outras classes. A interposição de língua entre
os dentes anteriores durante a deglutição foi considerada durante anos como fator
etiológico da mordida aberta (Urias, 1994). Hoje, a experiência clínica tem
mostrado que algumas mordidas abertas resultam de função anormal, mas é mais
vista como uma conseqüência de uma relação morfológica anormal e, portanto,um
fenômeno de adaptação (Moyers, 1988, Urias, 1994).
Fala :
A relação entre fala e maloclusão é freqüentemente exagerada, pois muitos
pacientes com maloclusões graves possuem uma fala inteligível. Geralmente, a
posição da língua ao falar é adaptativa à forma da oclusão; ou as duas, fala e
oclusão têm o mesmo fator etiológico, porém, uma não causa a outra (Moyers,
1988).
Distorções na fala são freqüentes, tanto nas desproporções verticais quanto
nas ântero-posteriores, pois os pontos de articulação dos sons estão modificados
pela alteração da forma (Bianchini, 1998).
51
Douglas (1988) é taxativo ao declarar que é óbvio que a maloclusão é uma
causa de alteração na fala. Assim,
80 % dos indivíduos com maloclusão
apresentam ceceio. O inverso, porém, não é verdadeiro; os dentes não são
deslocados em resposta às forças geradas na fonação. As forças mais
importantes na determinação da posição lábio-lingual dos incisivos são aquelas
desenvolvidas pela língua e pelos lábios em repouso (Van der Linden, 1990).
Nos indivíduos classe II esquelética, é comum observar distorções na fala.
Na presença de labioversão incisal grave, muitos pacientes consideram
anatomicamente impossível a oclusão dos lábios para a produção dos sons
bilabiais (/p/,/b/,/m/). Assim, eles falam estes sons com o contato do lábio inferior
no dente superior, levando a um reforço da hipofunção do lábio superior e sua
retração (Hanson e Barret, 1995; Vellini, 1996).
Segovia (1992), referindo-se à pronúncia alterada do /s/, afirma que uma
anomalia das arcadas dentárias ou um mau posicionamento dentário podem ser
muito importantes neste transtorno, mas são mais predisponentes do que
determinantes. Marchesan (1998) sugere que tanto a oclusão como a alimentação
ou os hábitos orais podem facilitar a ocorrência do ceceio anterior.
Muitos autores fazem relação direta do ceceio anterior ou lateral à presença
da classe II (Hanson e Barret, 1995; Vellini, 1996). É comum também o paciente
apresentar, além do escape de ar anterior, o deslize mandibular e projeção da
língua entre os arcos na emissão do /s/ e /z/ (Bianchini, 1998). Silva (1983) e
Moura (1994) fazem maior relação do ceceio anterior às mordidas abertas
anteriores.
52
A classe II esquelética se associa ao ceceio lateral, na maioria das vezes,
em pacientes com mordida aberta lateral ou sobremordida (face curta) (Vellini,
1996). O paciente face longa tem maior tendência a apresentar anteriozação da
língua para /t/, /d/, /n/ e /l/ (Bianchini, 1998).
Em alguns casos, a correção das arcadas consegue também corrigir o
problema de fala e, em outros casos, há necessidade de uma reeducação mais
dirigida (Hanson e Barret, 1995).
Hábitos:
Entre todos os hábitos deletérios, os de sucção são os que causam maiores
alterações às arcadas dentárias .
A sucção contínua pode estreitar o arco dentário superior . Esta contração do
arco maxilar dará origem a outro padrão de hábito neuromuscular complicado, a
retração mandibular. O estreitamento ou atresia do arco maxilar resulta em
interferência dentária e a mandíbula é desviada para trás, pelos músculos, para
uma posição de melhor função oclusal (distoclusão compulsiva).
O tamanho dos ossos e o posicionamento dos molares podem estar
próximos do normal e, ainda, eventualmente , haver uma relação molar de classe
II, pois os músculos da mandíbula a tracionaram para uma posição retraída . Com
o tempo, o distúrbio das forças que atuam sobre o sistema produz a síndrome
chamada classe II (Moyers, 1988).
Os hábitos de sucção são fatores importantes para a destruição do
equilíbrio muscular da área afetada (Moresca e Feres, 1994). Graber e Neumann
(1987) chamam a atenção para as seqüelas decorrentes da sucção prolongada,
53
citando a mordida aberta, atresia da maxila, mordida cruzada, hipotonia do lábio
superior e mentalis hipertônico.
O mau hábito tem importância etiopatogênica se permanecer presente após
a primeira infância. Se persistir após 30 meses, mas parar antes da erupção dos
incisivos permanentes, seus efeitos sobre a primeira dentição são corrigíveis e
não atingirá a dentição permanente. Para saber se o hábito é intenso ou suave,
precisamos observar as horas em que o paciente permanece com ele (só de dia,
dia e noite ou quando está distraído).
O mau hábito não modifica nem desenvolve um tipo facial, porém o
acentua. Se o paciente tem um tipo facial e oclusão normais, a presença de um
mau hábito é transitória e facilmente corrigida. A maloclusão, neste caso, é um
desvio transitório. Se o paciente já tem a maloclusão de origem congênita e
aparece algum mau hábito associado, então fica mais difícil superá-lo e isto não
levará à correção da maloclusão (Cervera, 1996).
Gingold (1978) também acredita que os maus hábitos levam à maloclusão e
associa o apinhamento anterior ao roer unhas, o overjet à deglutição atípica, a
inclinação lingual dos incisivos às posturas habituais de cabeça e pescoço. E
propõe a eliminação destes hábitos como medida preventiva à maloclusão .
Em relação à classe II, para a divisão 1, os maus hábitos podem provocar
protrusão incisiva superior, mordida aberta, over jet, arcada superior estreita,
mordida cruzada posterior unilateral (mais freqüente) ou bilateral; e retrusão dos
incisivos inferiores. O hábito mais desfavorável em uma anomalia classe II é a
sucção digital (Van der Linden, 1990; Cervera, 1996; Bianchini, 1998; Petrelli,
1994).
54
Para a classe II, divisão 2, ainda que os maus hábitos não provoquem este
desvio, os acentuam, como na retroinclinação inferior, retrusão dos incisivos ou
aumento da sobremordida com o hipercerramento labial; podendo ocorrer também
apertamento noturno como o bruxismo .
Cervera (1996) analisando o uso prolongado da chupeta e a sucção do
dedo em relação à mordida cruzada unilateral, conclui que o uso da chupeta é
mais prejudicial para o desenvolvimento da dimensão transversal do arco superior,
predispondo mais à mordida cruzada do que a sucção do dedo. Porém, o uso
prolongado da chupeta é um hábito que pode ser retirado mais facilmente e a
sucção do dedo persiste por muitos anos, sendo assim o efeito muito pior.
Existe uma forte relação de causa e efeito entre a atividade da língua e a
mordida aberta. A mordida aberta, cuja causa principal se deve ao hábito de
sucção de dedo ou chupeta, provoca uma alteração da função da língua e,
consequentemente, uma adaptação da postura da língua ao problema .
É fácil compreender que o padrão de crescimento facial desfavorável
associado à função anormal da língua aumentará e manterá a mordida aberta. Ao
contrário, quando essas influências estão associadas a um padrão de crescimento
favorável, os efeitos deletérios são raros (Sodré; Franco; Monteiro, 1998).
Cervera (1996) acredita que, muitas vezes, só conseguimos acabar com o
mau hábito se o paciente tiver bem clara a sua auto imagem, auto estima no
aspecto estético e da deformidade e capacidade de auto controle. Para isso
dependemos da maturidade do cliente.
55
Incidência :
Em geral, a maioria da população carece de uma dentição normal, com
maior ou menor grau; muitos de nós temos alguma classe de maloclusão (Enlow,
1993). Proffit (1995) observou, em sua pesquisa feita nos E.U.A na década de 60,
que as maloclusões e suas características apresentavam variações de acordo com
os grupos étnicos. Os problemas de classe II tiveram maior incidência em brancos
descendentes de regiões do norte europeu .
Não encontrei quem discordasse que a maloclusão de maior incidência é a
do tipo classe II de Angle, e os autores atribuem isto a variadas causas (Gomes,
1997; Nanda,1972; Van der Laan, 1995; Moyers, 1988).
Durante todo o período desta pesquisa, procurei observar se, realmente, a
prevalência da classe é uma realidade atual, e constatei, perguntando a vários
ortodontistas, que mais de 70% dos pacientes que buscam a correção dentária,
apresentam esta classificação.
Prognóstico :
Pode-se esperar um melhor prognóstico para indivíduos face média ou
curta. Os indivíduos face longa tendem a apresentar uma musculatura mais
estirada e mesmo depois da correção da forma, é difícil a estabilização do caso.
Há diferença de prognóstico também para uma classe II dentária ou esquelética,
sendo mais favorável para as dentárias já que apresentam harmonia das bases
ósseas.
As alterações de classe II estão muito associadas a hábitos inadequados e
à respiração bucal. O sucesso
do tratamento depende não só do correto
56
posicionamento dos dentes mas também da adequação das funções (Bianchini,
1998).
Fonoaudiologia e Ortodontia
“É principalmente na face que o
homem
expressa
sendo
o
mais
representar
seus
nobre
sua
sentimentos,
o
sorriso,
emoção
por
mais
positiva“.
Ivo Pitanguy
Na área da motricidade oral, que já é uma especialidade, é clara e
marcante a luta dos fonoaudiólogos,
que procuram desenvolver e mostrar a
importância da Fonoaudiologia para avaliar, diagnosticar, prevenir, orientar e tratar
as alterações do sistema estomatognático.
57
A Fonoaudiologia vem ganhando espaço nesses últimos anos, graças ao
empenho em pontuar seu valor, com um trabalho integrado, ético e com
cumplicidade, a fim de que o paciente seja o maior favorecido (Periotto e
Camargo, 1998). Os distúrbios miofuncionais são considerados como interferência
nas funções adequadamente exercidas pela face humana, ou seja, na sucção,
respiração, deglutição, mastigação, fonoarticulação e, consequentemente, em
toda a dinâmica neuromuscular (Barroso, 1998).
O autor conceitua a Ortodontia como uma especialidade da Odontologia
que compreende o diagnóstico, prevenção e tratamento das irregularidades
dentárias e faciais. Para Köhler (1998), a Ortodontia, não deve ser apenas um
campo das ciências da saúde, com conotações dogmáticas e estereotipadas;
mas, sim, ser aberta às nossas tendências e conhecimentos
-
e por
conseqüência - ser altamente dinâmica e evolutiva no transcorrer do tempo.
A
Ortodontia
e
a
Fonoaudiologia
no
Brasil
estão
caminhando
paralelamente, há pelo menos 30 anos, existindo momentos de maior ou menor
aproximação entre essas duas ciências (Marchesan e Mitri, s/d). Historicamente,
sabe-se que, em um primeiro momento, os problemas de motricidade oral foram
supervalorizados e, muitas vezes, vistos de forma fragmentada. Primeiramente,
nenhuma recidiva no posicionamento dentário era relacionada a alterações
funcionais; depois, todas as recidivas pareciam ocorrer por uma alteração de
função, e o fonoaudiólogo, neste período, foi muito requisitado para solucionar o
problema (Dragone; Coleta e Bianchini, 1998).
58
Hanson e Barret (1985) relatam que os ortodontistas faziam muitos
encaminhamentos para facilitar seu próprio trabalho e, principalmente, para evitar
a reincidência de problemas de oclusão após o tratamento ortodôntico.
Hoje, há uma reflexão maior sobre o que realmente é alteração de função e
o que pode ser uma adaptação frente ao tipo facial ou funcional de cada indivíduo.
Neste momento, tanto o fonoaudiólogo como o ortodontista têm a consciência de
que supervalorizar ou fragmentar dados pode trazer uma visão distorcida de casos
clínicos.
O sistema estomatognático é complexo e está interligado a muitas funções
orgânicas vitais. Muitos fatores concorrem para a estabilidade das estruturas
esqueléticas e dos padrões miofuncionais da face. Seu estudo abrange várias
áreas de conhecimento, o que significa que é necessária a opinião de vários
profissionais da saúde (Dragone; Coleta e Bianchini, 1998).
Quando os distúrbios miofuncionais já se instalaram e o paciente apresenta
alterações respiratórias e, possivelmente, deformidades morfológicas da face, é
urgente que o paciente seja encaminhado a um tratamento integral, feito por uma
equipe
profissional
otorrinolaringologista,
multidisciplinar,
fonoaudiólogo
e
composta,
pelo
menos,
ortodontista/ortopedista
por
dentofacial
(Barroso, 1998; Bianchini, 1998). O tratamento multidisciplinar não deve significar
vários tratamentos ao mesmo tempo, mas, sim, um tratamento único, realizado por
vários
profissionais,
a
fim
de
que
se
possa
superar
a
formação
compartimentalizada e se possa ver o ser humano em sua integridade (Felício,
1994).
59
Segovia (1992) ressalta a importância de uma análise anterior a qualquer
encaminhamento para estabelecer corretamente as reais necessidades de um
caso e, assim, tornar os encaminhamentos mais precisos, acertivos e eficientes
(Vellini, 1996). Merleau – Ponty (1975), faz uma analogia da visão de equipe sobre
um paciente, como uma casa : “A casa mesma não é a casa vista de nenhuma
parte, mas, sim, a casa vista desde todas as partes” (p. 88).
O fonoaudiólogo que possui condições de atuar sobre o sistema sensóriomotor oral se une ao ortodontista, com a finalidade de, juntos, obterem o equilíbrio
do sistema estomatognático (Felício, 1994). Tabith (1988) relata que as relações
entre a Fonoaudiologia e Ortodontia são fundamentais em dois aspectos básicos:
1- A correta articulação dos sons da fala solicita posicionamentos e movimentos
precisos dos articuladores, que só são viáveis na presença de uma adequada
estrutura morfológica orofacial. A intervenção odontológica, muitas vezes, é
essencial para a correção dos distúrbios articulatórios, em conjunto com o
tratamento fonoaudiológico .
2- Em contrapartida, uma inadequação miofuncional dos articuladores é decisiva
na determinação de alterações morfológicas orofaciais e requer uma
intervenção conjunta dos dois campos profissionais.
Uma conduta básica é que a avaliação funcional, prognóstico e tratamento
sejam resolvidos pelos dois profissionais. Nem sempre tem-se ortodontista e
fonoaudiólogo no mesmo local, mesmo assim , é necessário criar estratégias para
que se realize um diagnóstico em conjunto (Periotto e Camargo, 1998). Desta
forma, a terapia será mais adequada, já que as áreas integradas contribuirão com
suas experiências e conhecimentos tanto nas modificações estruturais como nas
60
funcionais (Marchesan e Mitri, s/d). Sabe-se que o sistema estomatognático é um
complexo de estruturas que exercem funções vitais para o organismo, tais como:
respiração, mastigação e deglutição. Tais estruturas são também utilizadas para
outras funções igualmente importantes, como a voz, a articulação das palavras e
como válvula auxiliar em esquemas de força (Dragone, Coleta e Bianchini, 1998).
As partes deste sistema não são especializadas em uma só função; assim,
alterações em quaisquer componentes do sistema estomatognático provocam
desequilíbrios que se manifestam na conformação e estrutura dos órgãos
interrelacionados. Adaptações funcionais são desencadeadas por este sistema e
organismo em geral, e, poderão ou não ser compensadas. A reação muito
dependerá da genética, das condições orgânicas momentâneas, das influências
do meio ambiente e dos hábitos de vida do indivíduo (Torres, 1973).
Jabur (1994) sugere que as avaliações devem ser realizadas no sentido de
tratar o problema de forma global, analisando todas as possibilidades, pois forma
e função estão intimamente ligadas. Köhler (1998), vai mais longe, e até idealiza
um profissional completo para uma terapêutica morfofuncional global da face. Este
profissional deveria ser no mínimo e ao mesmo tempo um otorrinolaringologista,
ortopedista funcional, ortodontista e mioterapeuta facial.
Como isto seria praticamente impossível; Marchesan e Mitri (s/d) sugerem
que a Fonoaudiologia precisa alguns dados da Ortodontia e vice-versa.
O que o ortodontista precisa saber sobre a Fonoaudiologia:
• Como as estruturas moles estão em termos de forma, mobilidade isolada
e tonicidade.
61
• Como essas estruturas atuam em conjunto nas funções de respiração,
mastigação e deglutição.
• O quanto a função está impedida de ocorrer de maneira correta por
causa da forma.
• O quanto o fonoaudiólogo pode controlar a nível de musculatura as
recidivas de mordidas abertas pós-tratamento.
• Até onde um escape lateral de fala pode ou não interferir na mordida
aberta lateral.
• O quanto o fonoaudiólogo pode interferir com uma terapia de respiração
nasal para maior estabilização do trabalho ortodôntico.
• O quanto os hábitos de sucção ou posturais podem estar intervindo no
trabalho da Ortodontia.
O que o fonoaudiólogo precisa saber sobre Ortodontia:
• Dados sobre crescimento e desenvolvimento craniofacial contidos na
análise cefalométrica.
• Se as alterações são esqueletais ou só deformidades dentárias devido a
hábitos viciosos.
• Se as bases ósseas estão harmônicas ou o paciente não tem condição
de estabilizar a parte funcional por falta de condições anatômicas.
• Se os dentes têm condição ou não de se acomodarem no arco para uma
melhor adequação da mastigação.
62
• Se uma mordida aberta é esqueletal ou apenas conseqüência de hábitos
viciosos.
• Se o palato é estreitado e pode sofrer uma expansão para uma melhora
do acoplamento lingual.
• Se o tratamento ortodôntico sendo precedente pode fornecer melhores
condições de trabalho à Fonoaudiologia.
A avaliação da postura do tecido mole e sua relação com a posição dos
incisivos deve ser sempre relevada em diagnóstico conjunto, já que extrações
dentárias podem trazer achatamento do perfil, assim
como a projeção dos
incisivos protrui o mesmo. Os parâmetros de normalidade deveriam ser revistos, já
que indivíduos diferentes, com faces distintas possuem características peculiares
que não deveriam ser confundidas com distúrbio ou atipia (Bianchini, 1998).
O profissional deve ser flexível o suficiente para encarar cada caso como
único. Deve evitar fazer padronização, pois a capacidade adaptativa de cada
indivíduo é muito variável. Para alguns, as alterações de oclusão, mesmo
pequenas, podem agir como fator desencadeante de uma alteração da função,
enquanto que, para outros, isto poderá não ocorrer (Vellini, 1996).
O sistema estomatognático possui grande plasticidade e capacidade de
desenvolver padrões adaptativos (Bianchini, 1998). Assim, ao avaliar a face - e
suas múltiplas funções - deve-se lembrar que ela é componente de um sistema
maior (Köhler, 1998). Qualquer terapêutica que visa corrigir os distúrbios
morfofuncionais desse aparelho orgânico, necessita ser conduzida segundo os
fundamentos anatomo-fisiológicos de todas as partes isoladas, mas que
funcionam coletivamente como uma unidade biológica (Vellini, 1996).
63
Para Bianchini (1998), as correções são interdependentes, porém cada
uma no seu momento, para assim contribuir com a reorganização do sistema
estomatognático (Torres, 1973). As arcadas devem ser observadas antes de se
propor um trabalho miofuncional: se há mordida cruzada, palato muito estreito;
qual a condição respiratória, presença de hábitos nocivos e a tipologia facial, uma
vez que esta última está diretamente relacionada ao padrão muscular do paciente
(Bianchini, 1998).
Às vezes, o tratamento fonoaudiológico pode ocorrer em concomitância
com o tratamento da maloclusão, mas, em alguns casos, os problemas oclusais
não favorecem a realização dos exercícios. Quando o ortodontista encaminha o
paciente ao fonoaudiólogo, deve dar condições para o trabalho deste especialista.
Estas condições seriam normalizações morfológicas básicas (Lino, 1994).
Encontra-se, às vezes, dificuldade em estabelecer um vedamento labial
satisfatório em função da posição inadequada dos dentes incisivos ou devido a
uma alteração esquelética, como altura facial inferior aumentada. Nestas
circunstâncias, o trabalho fonoaudiológico torna-se inviável sem a correção da
forma pelo ortodontista, pois as funções estomatognáticas encontram-se
adaptadas às estruturas de tecido duro.
Nos casos onde a inclinação dos dentes incisivos impede a posição ideal
dos lábios, é melhor que a correção ortodôntica se faça antes do trabalho
fonoaudiológico, porque, geralmente, após a correção dentária, os lábios retornam
à sua postura e função normais, sem necessidade de reeducação (Bianchini,
1998).
64
Ao final do tratamento ortodôntico, a grande preocupação de muitos
profissionais é a estabilização dos casos. Lino (1994) afirma com segurança que a
estabilidade dos bons resultados obtidos ortodonticamente depende muito da
normalização funcional .
Tabith (1988) considera
que o tratamento de padrões alterados de
atividade muscular é fundamental para a correção das maloclusões e manutenção
da oclusão normal obtida pelo tratamento ortodôntico. Bianchini (1998) e Vellini
(1996) salientam que, para a estabilidade postural tanto de língua quanto de
lábios, forma e função devem ser corrigidos.
Moyers e Carlson (1993), questionando sobre a modificação póstratamento, relatam que muitas maloclusões podem ter suas origens num
comportamento
neuromuscular
anormal,
e
muitas
maloclusões
tratadas
ortodonticamente não são estáveis porque a estabilidade oclusal, em última
análise, não pode ser mantida pelos músculos. Segundo Enlow (1993), o
problema clínico das recidivas é uma expressão do normal das mesmas funções
de remodelamento, como uma maneira biológica de restaurar
um estado
preexistente de equilíbrio morfológico complexo, que foi alterado por intervenção
clínica.
Os questionamentos, conceitos, e dúvidas são variados de autor para autor.
O que cabe a
cada
profissional é
buscar o outro e, assim, trocar e unir
conhecimentos. Como afirma Marchesan e Mitri (s/d), o tipo de conduta de um
profissional deve ser compreendido pelo outro para que o caso seja melhor
resolvido. Fala sobre um diálogo franco, sem pontos obscuros para o auxílio no
diagnóstico e prognóstico de cada caso.
65
Conclui-se que a funcionalidade individual e a intervenção conjunta são a
tônica deste trabalho, que tenta diminuir os insucessos (Marchesan e Mitri, s/d).
Atipias, adaptações e compensações devem ser compreendidas e analisadas num
raciocínio dinâmico e longitudinal, sempre calcados numa postura ética e de
humildade (Periotto e Camargo, 1998).
Para Segovia (1992), cada especialista deve conhecer as possibilidades e
limitações dos outros especialistas e trabalhar com espírito de equipe, baseado
nos quatro C : coerência – comunicação – compreensão – coordenação. A forma
de trabalho deve ser aberta e de estilo profissional. A interrelação entre os
profissionais deve ser clara, precisa e ampla, para evitar equívocos, erros ou
retrocessos. Trabalhar em equipe é enfrentar um problema comum a várias
especialidades, o qual é enfocado de diferentes ângulos e com uma só
perspectiva, para um único beneficiado: o paciente.
Considerações finais
“Os fatos são as peças que constituem a
Ciência, mas a Ciência não começa com
os
fatos.
Ela
começa
com
as
observações”.
J. Herrich
66
Este estudo teórico busca unir o trabalho fonoaudiológico ao tratamento
ortodôntico e mostrar as vantagens e desvantagens desta intervenção no paciente
classe II.
Sabendo-se que o classe II representa a grande parte dos clientes das
clínicas de Ortodontia, me propus a estudá-lo. Por fatores etiológicos, encontro
maior número de pessoas que se enquadram neste grupo, e não é por
apresentarem a mesma classificação que todos têm características semelhantes
nas funções do sistema estomatognático. Cada um sofre influência do tipo facial,
do tipo de classe II e dos estímulos externos; e ao mesmo tempo existe uma
predisposição pessoal em desenvolver ou não cada alteração.
A característica principal do classe II é a retrognatia mandibular, podendo
ter também desproporção do terço médio da face. De forma geral, ocorre muito
mais uma adaptação funcional aos problemas de oclusão do que atipias
propriamente ditas. Quando se observam lábios e língua, o classe II divisão 1
apresenta
alterações
predominantemente
dependentes
da
correção
da
maloclusão; e os de divisão 2 demonstram funções mais próximas da
normalidade.
A
respiração bucal pode ser fator etiológico de uma maloclusão,
principalmente, as oclusões que envolvem a atresia da maxila; porém, não pode
ser considerada conseqüência de uma alteração dentária. Este tipo de respiração
está
mais relacionado às características pessoais como a obstrução de vias
aéreas superiores, alergia ou mau hábito e se encontra presente mais
67
freqüentemente na classe II, divisão 1, do que na divisão 2, pelas condições
musculares desta categoria.
Pacientes com oclusão normal ou levemente alterada apresentam
movimentos mastigatórios regulares e coordenados; somente as maloclusões
graves demonstram um padrão mastigatório irregular.
Na classe II, divisão 1, a deglutição encontra-se geralmente adaptada à
forma dos dentes. O lábio inferior e outros músculos periorais atuam fortemente na
tentativa de fazer um vedamento oral anterior. Outras peculiaridades irão
depender do tipo facial, da idade do indivíduo, do tipo de alimento usado e da
qualidade dentária individual (mordida aberta, sobremordida profunda, entre
outros).
Muitos pacientes com graves maloclusões apresentam fala inteligível. O
som dos fonemas não se altera; o que ocorre é um contato articulatório fora dos
padrões esperados, sendo, neste caso, considerados muito mais adaptativos do
que atípicos.
Um dos grandes vilões da maloclusão continua sendo os hábitos de sucção
que, se não retirados a tempo, podem levar a alterações dentoesqueléticas. Nas
pessoas com face longa, eles trazem maiores problemas do que nas de face
curta, pelo tipo de contração da musculatura nestes indivíduos. Para eliminar
estes hábitos, precisa-se da vontade e maturidade do nosso paciente.
Todas as pessoas usam o sistema estomatognático de alguma forma,
podendo desenvolver funções normais, alteradas ou adaptadas. Para a
Fonoaudiologia, o paciente classe II é muito mais adaptado do que atípico, já que
a maloclusão que ele possue sugere posições e funções determinadas. Ao mesmo
68
tempo, é também “uma caixa de surpresas”, já que apresentam pontos individuais
que o faz não ser tratado somente como um “classe II”. A Fonoaudiologia está
crescendo, amadurecendo e chegando a conclusões como a de que usar métodos
de tratamento não é um bom caminho.
Quando escolhi o tema deste trabalho, meu principal objetivo não era só o
paciente classe II, ou qualquer outra “classe”, mas eu gostaria de unir a Ortodontia
à Fonoaudiologia, e somar a visão das duas áreas sobre um indivíduo. Diminuir a
distância destes longos corredores que separam nossos consultórios é algo
essencial neste momento.
Não olha-se só dentes, ou língua, ou lábios; não avalia-se só função ou só
estética. O homem é um corpo inteiro, único, que apresenta também reações,
adaptações e compensações próprias, o que me faz distanciar ainda mais da
idéia de padronização.
Reforço a necessidade desse indivíduo ser examinado por vários “olhos”,
vários especialistas. Não há como enxergar tudo e todos os caminhos de
reabilitação de um ser tão complexo com a visão de uma só área.
Com a avaliação multidisciplinar e a análise das características de cada
um, pode-se chegar a um diagnóstico/prognóstico mais seguros. Por isso a visão
de uma equipe é tão importante.
Este estudo objetiva alertar os ortodontistas sobre a importância da terapia
fonoaudiológica para o paciente classe II, I ou III. O que deve ser enfatizado é que
com o apóio da Fonoaudiologia, o plano de tratamento e as limitações de cada
caso podem ser rediscutidos; diminuindo o índice de recidivas e mantendo o
69
paciente mais apto possível para a realização das funções estomatognáticas com
eficiência.
Moyers lembrou, apropriadamente, que 5% das pessoas pensam, 15%
acreditam que pensam e outros 80% procuram regras para que não tenham que
pensar. Aqueles que se esforçam para encontrar a fórmula perfeita, que lhes
permitirá colocar cada caso em uma estante numerada, onde todos os casos serão
precisamente semelhantes e considerados do mesmo modo, infelizmente, estão
incluídos no grupo dos 80%.
É tempo de transformar os questionamentos, dúvidas e idéias em conceitos
mais sólidos e reais. É preciso desenvolver mais projetos e pesquisas, para
derrubar os mitos que envolvem a Fonoaudiologia. Espero que, daqui a alguns
anos, possa-se mudar a estatística dos 80% para os que pensam, analisam,
questionam e buscam a individualidade de seu paciente; e, tenho certeza de que a
união da Fonoaudiologia com a Ortodontia vai conseguir fazer deste ideal uma
realidade próxima.
70
Glossário
Braquifacial: biotipo de face em que, a altura facial anterior se encontra
reduzida. A musculatura em geral é forte, o arco dentário alargado, a face curta e
larga e apresenta maior tendência à mordida profunda (Cabrera,1997; Bianchini,
1998). Fig.16.
Cefalometria: é uma técnica de tomada radiográfica que tem o propósito
de fazer medidas da cabeça, com esta mantida numa posição fixa pelo
cefalômetro (Enlow, 1993).
71
A avaliação da radiografia lateral inclui basicamente a inclinação da base
do crânio, a relação da maxila e mandíbula entre si e com a base do craniana e a
posição e postura da dentição em relação às estruturas faciais (Bianchini, 1998).
Esta análise auxilia o clínico a visualizar três importantes aspectos na
morfologia craniofacial: 1- o que a face é agora (morfologia atual). 2- o que a face
foi ou será (crescimento que já houve ou crescimento esperado). 3- o que o
ortodontista deseja que a face venha a ser (morfologia corrigida ou idealizada).
(Moyers e Bookstein, 1988).
Existem vários tipos de análises cefalométricas, e cada uma leva o nome de
seu autor (Bianchini, 1998).
Curva de Spee: curva formada por uma linha que se inicia na borda
cortante dos incisivos inferiores e vai até à última cúspide distovestibular do último
dente molar inferior (Molina, 1989). Quanto maior a sobremordida, mais profunda
é a curva de Spee e, na mordida aberta, a curva é rasa. Este conceito é
importante, pois relaciona-se com a forma facial e anatomia da cavidade condilar
(Bianchini, 1998). Fig. 12.
Cúspides: são as pontas agudas ou elevações acentuadas de esmalte que
caracterizam alguns dentes, ou seja, o canino é um dente com uma cúspide, o
pré-molar tem duas e os molares em geral têm quatro (Hanson e Barret, 1995).
Fig.15.
72
Dolicofacial: biotipo de face em que a altura facial anterior se encontra
aumentada. A musculatura em geral é debil e estirada, a face tem aspecto
alongado, o arco dentário também é longo, estreito, e tem maior predisposição à
mordida aberta. Possui características diametralmente opostas ao braquifacial
(Cabrera, 1997; Bianchini, 1998). Fig. 16.
Espaço funcional livre: é o espaço que deve existir entre as arcadas,
quando a mandíbula estiver em repouso. A diferença entre a dimensão vertical de
oclusão e a dimensão vertical de repouso é indispensável sob o ponto de vista
fisiológico e mecânico (Molina, 1989; Bianchini, 1998).
Maloclusão: são chamadas maloclusões as situações em que os dentes
estão aglomerados
ou mal alinhados, de maneira
que não
podem
ser
higienizados corretamente (Barroso, 1998).
Não há como negar o fato de que a maloclusão, dentro do contexto geral
de patologia, deve ser encarada como um distúrbio de ordem morfofuncional,
em que podem estar envolvidos, além dos dentes, não só as estruturas ósseas de
suporte como também toda a neuromusculatura e o posicionamento da cabeça
sobre a coluna cervical (Köhler, 1998).
Mesiofacial: biotipo facial em que as dimensões horizontais e verticais são
correspondentes. Por esta característica a função muscular geralmente está
preservada. O arco dentário apresenta-se oval ou médio. O padrão mesiofacial
corresponde à face predominante na população e isto está longe de significar que
73
este padrão é normal, enquanto que os outros devem ser considerados desvio do
padrão normativo (Cabrera, 1997; Bianchini, 1998). Fig.16.
Mordida: característica básica de oclusão habitual do paciente; não
significa que não há dentes mal posicionados (Hanson e Barret, 1995).
Mordida aberta: ausência localizada de oclusão, enquanto os dentes
restantes estão em oclusão, isto é, quando há uma distância vertical entre as
superfícies incisais. Ocorre com maior freqüência na região anterior, mas também
pode aparecer na região posterior (Hanson e Barret, 1995; Moyers, 1988). Fig.10.
Mordida cruzada: se refere a um ou mais dentes mal posicionados facial,
lingual ou labialmente em relação aos seus correspondentes no arco oposto. É
uma variação transversal dos dentes e podemos denominá-la de mordida cruzada
lingual ou vestibular , de acordo com o desvio (Hanson e Barret, 1995;
Moyers,1988). Fig.11.
Oclusão: define-se oclusão como a ação de fechar ou o estado de estar
fechado. Em Odontologia, oclusão refere-se à relação dos dentes superiores e
inferiores quando em contato funcional durante a atividade mandibular (Okeson,
1992).
A oclusão é o direcionamento para a saúde e funcionamento do sistema
estomatognático e não para qualquer configuração oclusal específica. Este
conceito deveria incluir todos os relacionamentos funcionais, parafuncionais e
74
disfunção que possam existir entre os componentes do sistema mastigatório como
resultado de contatos entre os dentes antagônicos.
A normalidade e anormalidade da oclusão determina-se pela forma como
funciona e pela repercussão sobre os diferentes componentes do sistema
estomatognático e não pelo alinhamento dos dentes em cada arcada e sua
relação estática (Ramfjord e Ash, 1983).
Oclusão normal: é um conjunto estrutural constituído fundamentalmente
por dentes e ossos maxilares, caracterizado por relação normal dos planos
inclinados
oclusais
dos
dentes
que
se
encontram
individualmente
ou
coletivamente em harmonia com os ossos basais (Strang, 1958). Pode-se
encontrar oclusão normal e face harmoniosa independente do biotipo facial
(Cabrera, 1997).
A oclusão normal não é uma relação puramente dentária, ela pode ser
definida como um sistema morfofuncional constituído pelos órgãos dentários em
relação correta nos aspectos proximais e antagônicos, em harmonia arquitetônica
com os ossos basais da face e do crânio e em equilíbrio com os órgãos e tecidos
circundantes (Lino, 1994).
Dentro do conceito de oclusão normal, Moyers (1988) inclui o padrão de
movimento da mandíbula durante sua função. Hanson e Barret (1995) chegam a
concluir que a oclusão é uma função estritamente mandibular, já que o arco dental
superior é imóvel.
Spee (1890), citado por Molh e Davidson (1989) sugeriu que a oclusão
funciona como moinhos de esmerilhamento e que o movimento mandibular ocorre
75
em percursos circulares, como um pêndulo e se move ao redor de um eixo. A
mandíbula se movimenta em três dimensões, e sendo assim, não pode-se
considerar a oclusão pela relação estática dos dentes como são vistas em um
cefalograma ou nos modelos dentários (Moyers, 1988).
Lino (1994) aceita que a oclusão dentária normal é um caráter hereditário
dominante. Entretanto, são inúmeros os fatores que interferem como guias
orientadores para que a oclusão dentária se estabeleça corretamente, bem como
são inúmeros os fatores que atuam para que o processo não ocorra de forma
equilibrada durante toda a evolução até que se instale a dentição permanente.
Overjet: é uma dimensão ântero-posterior e constitui uma distância, no
plano horizontal, entre as superfícies linguais dos incisivos superiores e as
superfícies labiais dos incisivos inferiores (Hanson e Barret, 1995). Fig.13.
Protrusão: quando todo o segmento incisivo se encontra inclinado
labialmente. Se tanto os incisivos superiores quanto inferiores se protruem, o
termo apropriado é protrusão bimaxilar (Hanson e Barret, 1995).
Retrusão: termo usado para denominar a inclinação lingual de todo o
segmento incisivo (Hanson e Barret, 1995).
Sistema estomatognático: sistema composto pelos ossos maxilares e
mandíbula, dentes, articulação temporomandibular, vários músculos, entre eles, os
dos lábios, língua e bochechas, espaços orgânicos, nervos e vasos sangüíneos
76
que, controlados pelo sistema nervoso central, desempenham funções de
respiração, sucção, mordida, mastigação, deglutição e fala (Bianchini, 1998).
Este sistema mostra claramente a razão do trabalho conjunto da Ortodontia
e Fonoaudiologia, pois contêm estruturas bucais comuns divididas em dois
grupos, as estruturas ativas e passivas que, equilibradas e controladas pelo
sistema nervoso central, serão responsáveis pelo funcionamento harmônico da
face ( Tanigute, 1998).
Sobremordida: é uma dimensão vertical. Se o incisivo se coloca ponta a
ponta com seu antagonista, a sobremordida é zero. Se há um excessivo trespasse
vertical dos incisivos o termo usado é sobremordida profunda (Hanson e Barret,
1995). Fig.13.
Sulcos: são depressões compridas e estreitas no esmalte do dente que
podem se estender pela ponta cortante da superfície de oclusão até os lados dos
dentes (Hanson e Barret, 1995).
77
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