Artigo_Emprego Sustentavel_SORRI-BRASIL_01

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EMPREGO SUSTENTÁVEL: UM PROJETO DE CONVERGÊNCIA SOCIAL1
Resumo
O desafio que a humanidade tem de enfrentar diante da pobreza e degradação ambiental que impedem
que um grande número de pessoas tenha acesso aos recursos básicos de sobrevivência, dado que têm
poucas chances de ingressar e permanecer no mercado de trabalho exige uma mudança radical na
forma como o mundo empresarial compreende a diversidade humana. A partir de conceitos como
desenvolvimento sustentável, responsabilidade social e qualidade de vida, os autores propõem o
conceito de emprego sustentável. Este conceito relaciona-se aos princípios do desenvolvimento
holístico das pessoas e das comunidades moradoras do entorno da empresa, utilizando o tripé da
sustentabilidade, pressupondo o desenvolvimento holístico da pessoa e do seu entorno. Este
desenvolvimento deve alcançar o grau ótimo de empregabilidade do sujeito, na dimensão profissional e
a sua realização e satisfação na dimensão pessoal. Isto se constitui em um desafio para o nosso tempo,
implicando em geração de renda suficiente para uma vida digna, sem comprometer a geração de
empregos para os demais trabalhadores no momento atual e para as gerações futuras. Quando se fala
de emprego sustentável é necessário ultrapassar a ideia de trabalho meramente decente, adotando
uma administração holística que assume responsabilidades de promoção da pessoa e desenvolve
políticas inclusivas de gestão. A adoção dessas políticas pressupõe transformações importantes desde os
princípios de recrutamento e seleção até a concepção e o desenvolvimento de carreira. Pressupõe
também a promoção de geração de renda e a adoção de práticas trabalhistas que vão além do mero
respeito à lei. O reconhecimento e o respeito às diferentes necessidades e talentos dos colaboradores
leva a organização empresarial holística a adotar sistemas de suporte, ou seja, medidas, mecanismos e
equipamentos para que o colaborador tenha viabilizado e facilitado seu trabalho por meio de apoios
para a sua realização profissional. Este modelo de gestão também se compromete com o
desenvolvimento da comunidade do entorno e o envolvimento, com poder de decisão, por parte de
todos os membros do grupo social é o segredo para sua promoção e emancipação. Discutindo a
importância do trabalho para a promoção e desenvolvimento da pessoa e das comunidades, diante de
sua face de alienação e seu potencial de emancipação humana, apresenta-se o modelo de gestão da
diversidade nas corporações, desenvolvido pela ONG SORRI-BRASIL, adotando-se como exemplo sua
aplicação no campo da atenção às pessoas com deficiência. Este modelo foi construído a partir de dois
princípios: a oferta de tratamento igualitário sob o ponto de vista dos direitos humanos e da justiça
social e a busca pela individualização do tratamento a cada pessoa, atendendo a sua singularidade. Este
Programa está fundamentado em três linhas de ação: promover a igualdade de oportunidades com
igualdade de condições; promover e valorizar a diversidade reconhecendo e respeitando as diferenças e
aprender com as diferenças e crescer em função delas. Por meio deste artigo os autores esperam estar
abrindo possibilidades de reflexão e construção gradativa e participativa do conceito de emprego
sustentável, contribuindo para a transformação da realidade de gestão de pessoas no Brasil.
Abstract
The challenge that humanity has to deal with in facing poverty and environmental, that prevent a large
number of people having access to basic resources for survival, because they have few chances to enter
and remain in the labor market, requires a radical change in how the business world understands human
diversity. From concepts such as sustainable development, social responsibility and quality of life, the
authors propose the concept of sustainable employment. This concept relates to the principles of
holistic development of individuals and communities living around a company, using the triple bottom
line of sustainability ensuring the holistic development of the person and their surroundings. This
development should achieve the optimal degree of employability for the individual with both
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PAULA, A. R.; BUENO, C. L. R. - Emprego sustentável: um projeto de convergência social. São Paulo, SP, 1º de
julho de 2012.
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professional and personal fulfillment and satisfaction. It is a challenge for our time to generate sufficient
income for a dignified life, without compromising the jobs of other workers at present and for future
generations. When we speak of sustainable employment it is necessary to overcome the idea of merely
decent work, adopting a holistic management that assumes responsibility for promoting inclusive
policies and develops people management. The adoption of these policies requires major changes from
the early recruitment and selection to the design and development of careers. It also requires the
promotion of income generation and adoption of labor practices that go beyond mere compliance with
the law. Recognition and respect for the different needs and talents of employees leads the organization
to adopt holistic business support systems, i.e., measures, mechanisms and equipment for the employee
and has facilitated their work through support for professional achievement. This management model is
also committed to the development of the surrounding community and involvement, decision-making,
by all members of the social group. It is the secret to their advancement and empowerment. The
importance of working for the promotion and development of individuals and communities that face
either alienation or potential for human emancipation cannot be overstated. We present a model of
diversity management in corporations developed by the NGO SORRI-BRASIL that applies its knowledge
in the field of persons with disabilities. This model was constructed based on two principles: the
provision of equal treatment from the point of view of human rights and social justice and the quest for
individualized treatment for each person, given their uniqueness. This program is based on three lines of
action: promoting equal opportunities with equal conditions, promoting and valuing diversity by
recognizing and respecting differences, and learning from the differences and growing with them.
Through this article the authors expect to be opening up possibilities for reflection and gradually
building the concept of participatory and sustainable employment, contributing to the changing reality
of people management in Brazil.
Palavras-chave: Sustentabilidade, Administração holística, Pessoas com deficiência, Trabalho e
Emprego.
Algumas considerações preliminares
A concepção de sustentabilidade nasce com a preocupação pelo fato do modelo de
desenvolvimento econômico adotado pelo mundo, particularmente, pelo mundo capitalista,
estar pautado na ilusão do capital material ser inesgotável.
Podemos compreender sustentabilidade como toda ação que se desenvolve no presente com a
preocupação de sua possibilidade de continuidade futura. Assim, o desenvolvimento
sustentável implica em um novo modelo de planejamento e gestão no qual o conceito de
crescimento econômico leva à justiça e oportunidade a todos.
A sustentabilidade é um processo que deve abranger todas as facetas da vida humana,
requerendo uma mudança profunda nas formas de gerir os recursos e, também, uma nova
ética mundial (BOFF apud CHACON, 1999). Este novo agir levará à consciência da necessidade
de cooperação mútua, da promoção de uma nova ordem social, da melhoria da qualidade de
vida no planeta, por meio de uma melhor distribuição dos recursos existentes e minorando,
gradativa e sistematicamente, a concentração e má distribuição dos mesmos.
As ideias de responsabilidade social e dos novos modelos de gestão empresarial foram atraídas
para um conjunto de conceitos relacionados à sustentabilidade econômica, social e da
humanidade no planeta.
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Para a WWF-Brasil “É cada vez mais importante que as empresas tenham consciência de que
são parte integrante do mundo e não consumidoras do mundo. O reconhecimento de que os
recursos naturais são finitos e de que nós dependemos destes para a sobrevivência humana,
para a conservação da diversidade biológica e para o próprio crescimento econômico é
fundamental para o desenvolvimento sustentável, o qual sugere a utilização dos recursos
naturais com qualidade e não em quantidade”. (WWF-Brasil, 2011).
Rapidamente se percebeu que esta preocupação não deveria limitar-se aos recursos físicos,
mas também estar voltada à qualidade de vida dos trabalhadores e das comunidades em torno
dos empreendimentos econômicos.
As práticas de sustentabilidade empresarial possuem implicações várias: econômicas, na
medida em que estão relacionadas à geração e melhor distribuição de renda, ambientais, não
só porque se preocupam com a preservação dos recursos naturais, mas também porque devem
estar voltadas à implantação e manutenção de um clima organizacional saudável, harmonioso e
seguro, além de garantir condições de acessibilidade em todos os seus aspectos. Outro fator
relacionado a uma gestão sustentável de negócios é a criação de condições favoráveis ao
desenvolvimento de comunidades pró-ativas.
Ainda para WWF-Brasil “nos últimos anos, práticas de responsabilidade social corporativa
tornaram-se parte da estratégia de um número crescente de empresas, cientes da necessária
relação entre retorno econômico, ações sociais e conservação da natureza e, portanto, do claro
vínculo que une a própria prosperidade com o estado da saúde ambiental e o bem-estar coletivo
da sociedade”. (WWF-Brasil).
Um desses novos modelos de gestão empresarial que é coerente com este núcleo conceitual é
o da administração holística.
Podemos dizer, em síntese, que a administração holística parte da consciência de que o ser
humano não pode ser “coisificado” sob pena de comprometer sobremaneira sua qualidade de
vida e, consequentemente, toda ação que dele depende. Segundo Antonio Raimundo dos
Santos e colaboradores “A cultura organizacional holística inicia-se por um novo modelo de
administração, que começa pelo resgate da autoestima, tratando o funcionário como parceiro
nas decisões, utilizando seu talento pessoal para ajudar no desenvolvimento organizacional,
saindo da ideia dogmática para o pragmatismo, para que a visão do todo-parte-todo comece a
acontecer.” (SANTOS e col. In SERPRO).
Algumas das práticas preconizadas pela cultura holística nas corporações baseiam-se na
integração dos objetivos organizacionais com os objetivos individuais de autorrealização
pessoal e profissional.
Como decorrência natural destas concepções, faz-se necessário e oportuno o desenvolvimento
do conceito de emprego sustentável.
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O conceito de emprego sustentável
O conceito de emprego sustentável, que se propõe neste artigo, relaciona-se diretamente aos
princípios do desenvolvimento holístico das pessoas e das comunidades moradoras do entorno
da empresa, utilizando o tripé da sustentabilidade (Triple Bottom Line).
Para que a adoção de uma administração holística e do próprio conceito de emprego
sustentável seja aplicável em na realidade brasileira em processo de crescimento e
desenvolvimento social e econômico, é necessária uma transformação cultural e
comportamental radical, que altere, inclusive, a própria noção de trabalho, desarticulando as
representações sociais tradicionais, tanto dos trabalhadores quanto dos empresários.
A emancipação social dos indivíduos e grupos é determinante para o desenvolvimento
sustentável. Chacon, ao enfatizar a importância da participação efetiva de todos os atores
sociais no processo de desenvolvimento sustentável, afirma que a pobreza está na base da
apatia social e conformismo e este “leva à degradação não só do ser humano, mas de todo o
meio em que ele se insere. Essa parcela marginalizada e improdutiva da população acaba por
depredar e exaurir os recursos que são de todos e os custos gerados por essas ações são pagos
pela sociedade produtiva e pelas gerações futuras”. (CHACON, 1999). Disto se depreende que
sustentabilidade relaciona-se com qualidade de vida e esta por sua vez também se trata de um
fenômeno multidimensional.
A concepção de deficiência adotada atualmente e assumida oficialmente pelo governo
brasileiro rompe com a ideia desta ser um fenômeno ligado à área de saúde, exclusivamente
centrada no indivíduo. Adotando uma compreensão multidimensional está vinculada à relação
homem/meio. As limitações dentro deste referencial surgem das possibilidades e barreiras do
meio. Trata-se, portanto, de um conceito apoiado em um modelo social.
No início do surgimento dos movimentos reivindicatórios das pessoas com deficiência, dado
que estes foram engendrados por líderes do sexo masculino, de classe média, com formação
universitária, com grande influência do ideário americano, os valores que se encontravam em
suas bases eram os ligados à autonomia e independência individual. De acordo com a ideia do
self made man – o homem que se faz por si mesmo – base filosófica do liberalismo, os
princípios de luta preconizavam que as pessoas com deficiência eram capazes, por si só, de se
desenvolver social, cultural e economicamente, tratando-se de uma questão de esforço,
capacidade pessoal e força de vontade.
A extrema valorização da independência estava no fundamento da crítica à dependência do
homem, desconsiderando que esta é uma característica inerente ao ser humano. O homem
vivencia pelo menos em dois momentos de sua vida uma situação de maior dependência: na
infância e ao longo do processo de envelhecimento. Na verdade, toda pessoa experimenta
situações de dependência. A sociedade, entretanto, não vê esta condição como um processo
natural, atribuindo valores negativos que desqualificam o indivíduo dependente.
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É importante diferenciar-se de uma concepção de emancipação e autonomia individualista e
calcada na autossuficiência pessoal. O conceito de emancipação, contrariamente ao de
independência, aponta outro caminho para a realização humana: a construção de uma
sociedade solidária, onde a interdependência humana é espontânea e natural.
A emancipação acontece no cotidiano quando as pessoas, no interior das coletividades,
conquistam e distribuem poder, assumindo a história individual e grupal.
A partir da visão dialética, a participação no mundo do trabalho no regime capitalista,
simultaneamente em que possibilita a emancipação, também desumaniza, aliena e submete o
homem ao capital, afastando-o de sua vocação emancipatória.
Assim, qualquer pessoa e, particularmente os excluídos precisam participar do mundo do
trabalho para romperem o ciclo de discriminação e segregação. Os processos de marginalização
social têm sua base na exclusão do mundo do trabalho. Ainda que alienante, participar desse
mundo é a garantia de estar na História e construir uma nova sociedade por dentro desta.
Outro conceito atual, também com caráter multidimensional e intimamente ligado às ideias de
emancipação é o de qualidade de vida.
Para Schalock e Verdugo (2007) “qualidade de vida é um estado desejado de bem estar pessoal
que é multidimensional, tem propriedades éticas, universais e émicas ligadas à cultura com
componentes objetivos e subjetivos, sendo influenciada por fatores pessoais e ambientais”.
Ao referir-se à qualidade de vida, considera-se o imenso desafio que a humanidade tem que
enfrentar diante do estado atual do mundo onde a pobreza e a degradação ambiental
impedem que significativo número de pessoas tenha acesso aos recursos básicos de
sobrevivência, diante do agravamento do fosso que separa as populações dos países ricos da
dos países pobres e do fracasso das políticas econômicas em reverter este quadro.
Grupos populacionais marginalizados, como as minorias sociais são aqueles que mais sofrem
com as desigualdades mundiais. Pessoas com deficiência, mulheres, negros, homossexuais são
indivíduos que, em geral e tradicionalmente, estão alijados dos bens e recursos sociais,
fundamentalmente por terem chances diminutas de ingressar e, principalmente, permanecer
no mercado de trabalho.
As possibilidades de transformação dessa realidade dos grupos minoritários estão vinculadas à
mudança radical de como o mundo empresarial compreende a diversidade humana.
É necessário que a diversidade seja reconhecida como um valor, no qual estão implicadas e
articuladas às ideias da igualdade na diferença, da diferença na igualdade e a distinção e o
processo social de transformação da diferença em desigualdade.
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Para o respeito à igualdade na diferença é fundamental valorizar a humanidade que provém de
todo e qualquer indivíduo, base da ideia de direitos humanos. Para a consideração da diferença
na igualdade devem ser reconhecidas e respeitadas as peculiaridades das pessoas em termos
étnicos, religiosos, culturais e sociais, físicos e sensoriais, de gênero, entre outros, na medida
em que impliquem em adaptações para que sua participação social seja efetivada. Esta ideia
está na base do surgimento do conceito de diversidade. Já a diferença socialmente
transformada em desigualdade exige o resgate dos direitos humanos e a valorização da
diferença como formas de desconstrução desta violação dos direitos humanos. Esta é a base
que fundamenta a prática da diversidade como valor.
Dois princípios devem ser aqui ressaltados: a oferta de tratamento igualitário sob o ponto de
vista dos direitos humanos e da justiça social e a busca pela individualização do tratamento a
cada pessoa, atendendo a sua singularidade. Para tanto, a justiça social aplicada a estes grupos
minoritários passa pela criação e operacionalização da equidade através de ações afirmativas.
O conceito que ora propomos apóia-se no tripé da sustentabilidade (Triple Bottom Line) na
medida em que tem implicações e repercussões nas dimensões da pessoa, da empresa e do
território, ou seja, nas áreas onde este tripé se expressa: a dimensão social através da pessoa, a
dimensão econômica, por meio da empresa e o ambiente representado pelo território, ou
comunidade do entorno da empresa.
Figura 1: Triple Bottom Line / Fonte: Dreosvg, 2009
O conceito Triple Bottom Line/Tríplice Resultado é utilizado para definir todo um conjunto de
valores, objetivos e processos que uma companhia deveria focar com a finalidade de criar valor
econômico, social e ambiental.
A concepção de pessoa que apóia toda a discussão deste artigo é a de sujeito histórico. Adotase a ideia de que o sujeito humano se engendra no interior das contingências sócio-históricas e
bioculturais, além de ser constituído por uma dimensão consciente e outra da qual ele não
possui consciência e controle.
Já a concepção de empresa que aqui se adota leva em consideração que como uma organização
produzida pelos sujeitos que a constituem tem um caráter social, além do econômico, como tal
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precisa assumir sua parcela de responsabilidade no desenvolvimento da pessoa e do território
adstrito.
Utiliza-se a definição fenomenológica de território, na qual o território é um conjunto de
espaços e de itinerários, marcados pela percepção e ação humana, constituídos por
características culturais e, principalmente, pelas interações sociais, distanciando-se da visão
simplista do território como determinado somente por razões econômicas, por limites espaciais
e poderes políticos.
O conceito de emprego sustentável proposto tem como base a ideia de qualidade de vida e do
papel do trabalho e emprego como fator determinante desta qualidade. É necessário
ultrapassar a ideia de trabalho meramente decente quando falamos de emprego sustentável. A
concepção de emprego sustentável pressupõe que este deve contribuir para o
desenvolvimento holístico da pessoa e do seu entorno. Este desenvolvimento deve alcançar o
grau ótimo de empregabilidade do sujeito, na dimensão profissional e a sua realização e
satisfação na dimensão pessoal. Isto se constitui em um desafio para o nosso tempo,
implicando em geração de renda suficiente para uma vida digna, sem comprometer a geração
de empregos para os demais trabalhadores no momento atual e para as gerações futuras.
A criação de possibilidades de emprego e renda para gerações futuras, por sua vez, depende de
uma mudança significativa no estilo de vida de cada um, na medida em que os hábitos têm que
garantir a sustentabilidade do trabalho, da sociedade, do planeta e da vida.
O esquema abaixo ilustra as interrelações entre as dimensões econômicas, ambientais e sociais
e os entes “empresa”, “pessoa” e “território”.
A empresa
O conceito de convergência social, ou seja, a aliança entre a iniciativa privada, as organizações
não governamentais e o governo com vistas à promoção de qualidade de vida para a
população, demonstra a mudança dos tempos nos quais a competitividade agressiva deve
ceder lugar à cooperação e ao trabalho conjunto em prol da pessoa.
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De acordo com Ferreira et al apud Lages, Lages, e Braga (2009),
“A organização deve ser capaz de produzir produtos e serviços
continuamente, manter níveis de dívidas gerenciáveis, evitar desequilíbrios
setoriais que possam prejudicar o segmento; (ii) a dimensão Ambiental
procura reduzir as agressões ao meio ambiente, promover a melhoria das
condições ambientais e evitar o desperdício de seus insumos – diretos ou
indiretos. A organização deve manter uma base estável de recursos não
renováveis somente na extensão em que investimentos forem feitos em
substitutos adequados, inclui-se a manutenção da biodiversidade,
estabilidade da atmosfera e outras funções ecossistêmicas não comumente
classificadas como recursos econômicos, e (iii) a dimensão Social que busca
avaliar o impacto do negócio da organização no sistema social onde ela
atua e a sua performance por meio da análise do impacto da organização
sobre seus stakeholders, identificando a análise por cada uma das partes
interessadas. A organização deve obter justiça na distribuição de renda e
oportunidades, provisão adequada de serviços sociais, incluindo saúde e
educação, tratamento igualitários dos gêneros e participação e assunção
de responsabilidades.”
Dentre os modelos de administração empresarial, a administração holística é a que mais se
aproxima da visão integrada proposta pelo tripé da sustentabilidade. As dimensões da
administração holística expressam as mesmas áreas do Triple Bottom Line no campo da
sustentabilidade e envolvem as dimensões física, mental, espiritual e cósmica no campo da
pessoa humana.
O quadro abaixo ilustra essas relações:
A empresa ao adotar a administração holística assume responsabilidades de promoção da
pessoa e desenvolve políticas inclusivas de gestão. A adoção dessas políticas pressupõe
transformações importantes desde os princípios de recrutamento e seleção até a concepção e
o desenvolvimento de carreira. Pressupõe também a promoção de geração de renda e a
adoção de práticas trabalhistas que vão além do mero respeito à lei. O reconhecimento e o
respeito às diferentes necessidades e talentos dos colaboradores leva a organização
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empresarial holística a adotar sistemas de suporte, ou seja, medidas, mecanismos e
equipamentos para que o colaborador tenha viabilizado e facilitado seu trabalho por meio de
apoios para a sua realização profissional. Esses apoios podem ir desde pequenas adaptações
nas ferramentas de trabalho até a flexibilização da função em virtude de necessidades
específicas e legítimas.
A pessoa
O trabalho é uma via dupla para a emancipação da pessoa. O trabalho é caminho de
emancipação na medida em que possibilita renda e significa emancipação também porque
implica em realização pessoal e transformação da própria natureza humana e das situações e
contingências sociais e históricas.
O trabalho é meio de participação social para qualquer pessoa. O emprego permite seu
ingresso no mercado de consumo, condição que aliada à cidadania permite participação
político-social.
O emprego também possibilita a realização de sonhos por meio do planejamento do futuro
com vistas à melhoria da qualidade de vida. Para tanto é fundamental que o trabalho seja
vivenciado não como condição alienante, mas como forma de acesso e transformação social.
O território
O conceito de sustentabilidade nasce com o reconhecimento de que o planeta e o próprio
comportamento humano não se dão a partir de seus elementos considerados em separado.
Contrariamente ao que a ciência positivista pregava, a organização da vida resulta da
interatividade das partes, em oposição ao pressuposto da separatividade, da divisão em
variáveis excludentes.
As ciências humanas, por sua vez, durante muito tempo, adotaram esses mesmos pressupostos
positivistas influenciando a forma de compreensão das organizações humanas, inclusive do
funcionamento das empresas. Modelos materialistas de pensamento tem sido base de várias
teorias organizacionais resultando em gestões autoritárias e controlistas.
O mesmo desrespeito às limitações e diferenças humanas que gera administrações frias e
objetivantes, desconsidera as emoções, os processos criativos e a natureza humana
empobrecendo os resultados do trabalho.
Para Cibele Salviatto, essa forma de gestão tornou-se insustentável e, segundo a autora:
“é nesta realidade que surge a busca pela sustentabilidade
organizacional ou Responsabilidade Social Corporativa. Uma
tentativa de se remodelar a gestão de forma a tornar o ambiente
corporativo menos destrutivo ao meio ambiente e à sociedade.
Somos sim sistemas complexos cujo funcionamento se dá pela
interação entre as partes e não pela soma das mesmas. Nesta nova
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ótica, sustentabilidade relaciona-se com autoquestionamento,
autorresponsabilidade, entendimento e valorização da interconexão
entre as várias partes, e que se somos partes do todo, somos todos
responsáveis pelo todo. Num contexto no qual cada parte é
inseparável do todo, então a única solução sustentável é àquela que
contemple o benefício de todos e não apenas de uma maioria.”
É esse pensamento e comportamento comprometido com o todo que extrapola inclusive o
interior da organização que garante o terceiro elemento do Triple Bottom Line: o social,
representado pelo território.
É fundamental que a organização se comprometa com a comunidade onde está inserida ou
com a comunidade constituída pelos familiares de seus colaboradores. No primeiro caso a
gestão pró-ativa dos recursos dessa comunidade faz parte da responsabilidade social da
empresa. No segundo caso o fomento e apoio à rede de relações dos colaboradores também é
seu papel.
Em relação aos colaboradores com deficiência ou àqueles pertencentes a grupos minoritários, o
incentivo à criação, ampliação e participação dessas redes sociais de suporte é o fator que vai
garantir não só o aumento da probabilidade de permanência e progresso no emprego como o
desenvolvimento das famílias de seu entorno. Inclui-se também no papel de responsabilidade
social da empresa a promoção de sistemas de suporte a esses colaboradores por parte da
comunidade.
A chave para se alcançar essa interação com a comunidade do entorno é um planejamento e
uma atuação participativa. O envolvimento, com poder de decisão, de todos é o segredo para o
desenvolvimento das comunidades.
Prática de gestão da diversidade com recorte na pessoa com deficiência – tecnologia social
SORRI de gestão da diversidade
A SORRI-BRASIL, coordenação do Sistema SORRI, desenvolveu um modelo de gestão da
diversidade nas empresas, com ênfase na contratação e desenvolvimento profissional de
pessoas com deficiência, baseado nos conceitos e princípios acima descritos.
A valorização da diversidade, campo de trabalho da organização, constitui o alicerce de uma
sociedade inclusiva.
Esse modelo, ilustrado pelo quadro abaixo, reúne ações nos vários setores empresariais e com
todos os seus integrantes porque acredita que a gestão da diversidade pressupõe o
envolvimento de todos os níveis da corporação. Não se trata de um “problema do RH”, muito
menos deve ser visto com uma questão meramente financeira. É uma preocupação que
também deve atingir as esferas de decisão da empresa. Mais uma vez, o Tripé da
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Sustentabilidade, ou seja, o enfoque simultaneamente econômico, ambiental e social é o
cenário mais adequado para se pensar em gestão da diversidade.
Adoção de
ações afirmativas
Utilização de ONGs
fonte de recrutamento
Criação de comitês
de diversidade
Acessibilidade
segundo os princípios
do desenho universal
Indicadores de
qualidade & qualidade
de vida no trabalho
Desenvolvimento
de plano corporativo
de gestão
Desenvolvimento de
plano de comunicação
Interna e externa
Revisão dos critérios de
contratação da empresa
PRÁTICAS
DE GESTÃO
DA DIVERSIDADE:
ESTRATÉGIAS
Capacitação em serviço
de colaboradores com
deficiência
Capacitação de
profissionais de RH
Definição de
metas de
contratação
Capacitação
de gestores
O Programa de estratégias de gestão da diversidade, desenvolvido pela SORRI está
fundamentado em três linhas de ação: promover a igualdade de oportunidades com igualdade
de condições; promover e valorizar a diversidade reconhecendo e respeitando as diferenças e
aprender com as diferenças e crescer em função delas.
A primeira linha desenvolve-se a partir das seguintes ações: as operações de releitura dos
valores da empresa, revisão dos documentos de explicitação de sua política e
revisão/adequação do processo de recrutamento e seleção, em síntese:
• Revisão dos critérios de contratação da empresa transformando o modelo de contratação
pela deficiência para o modelo de contratação por competência, no qual as adaptações para
o posto de trabalho são elaboradas e implementadas após a contratação do colaborador
com deficiência.
• Adoção de ações afirmativas, incluindo a definição de objetivos e metas para o cumprimento
da legislação em vigor e para o desenvolvimento de políticas de equiparação e promoção
social.
• Utilização de ONGS como fontes de recrutamento e interlocução em relação à política de
gestão da diversidade.
Assim sendo, é fundamental que a alta direção da empresa se comprometa com o processo que
deve se iniciar com a firme decisão e envolvimento do corpo diretivo, não se transformando
apenas em ações pontuais do setor de Recursos Humanos. O êxito do processo implica no
envolvimento da alta direção da empresa, passando a integrar a política da empresa como um
todo.
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Para atingir o objetivo da segunda linha de ação, deve se buscar o equilíbrio das relações
pessoais, sensibilizando todo o corpo de dirigentes e colaboradores, preparando uma
ambientação adequada para todos e capacitando os profissionais de recursos humanos que
coordenam o processo de contratação de pessoas com deficiência na empresa.
A acessibilidade ambiental e dos postos de trabalho é um dos alvos preferenciais desta linha de
ação, visando ao ir e vir de todos que circulam pelos ambientes da empresa.
A promoção da acessibilidade deve estar em concordância com as Normas Brasileiras de
Acessibilidade – NBR 9050, publicada pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e
as Leis nº 10.048, de 2000 e nº 10.098, de 2000, regulamentada pelo Decreto nº 5.296, de
2004, em todos os aspectos das necessidades dos diversos tipos de deficiência.
No Paradigma da Inclusão a acessibilidade não pode se restringir apenas a alguns postos de
trabalho, muito menos, destinarem-se postos para pessoas com deficiências específicas.
A reserva apenas de postos plenamente acessíveis contraria o Decreto no.3.956, de 2002, que
dispõe sobre a não discriminação em razão da deficiência. A determinação do grau de
acessibilidade de todos os postos é o primeiro passo para a promoção do acesso, seguido da
provisão de equipamentos, instrumentos e acessórios – ajudas técnicas, para permitir e
favorecer a funcionalidade dos colaboradores.
As operações previstas para essa linha de atuação são:
• Acessibilidade segundo os princípios do desenho universal em todos os ambientes da
empresa, nos postos de trabalho ocupados por colaboradores com deficiência e no entorno
do edifício.
• Capacitação em serviço de colaboradores com deficiência, incluindo desde alfabetização de
jovens e adultos até aprimoramento em serviço.
• Capacitação de profissionais de RH, sensibilizando e informando sobre novos modelos de
gestão, em particular a administração holística e novos instrumentos de seleção e
desenvolvimento de pessoas.
A proposta da terceira linha de ação do Programa SORRI, é o desenvolvimento de competências
de gestão de grupos multiculturais, junto aos gestores de área. As operações relacionadas a
essa linha são:
• Capacitação de gestores no intuito de prepará-los para gerir os colaboradores com
deficiência promovendo equiparação de tratamento e de oportunidades.
• Indicadores de qualidade & qualidade de vida no trabalho visando à mensuração dos
resultados do plano corporativo, bem como avaliação do clima organizacional e sua
repercussão na vida das famílias dos colaboradores e da comunidade do entorno.
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• Criação de comitês de diversidade com o objetivo de garantir que os representantes dos
diferentes grupos de colaboradores acompanhem e sugiram medidas para o plano
corporativo de gestão da diversidade.
• Desenvolvimento de plano de comunicação interna e externa com objetivo de divulgar a
política empresarial para o público externo, para os stakeholders e para os colaboradores.
O intuito deste artigo é lançar bases para a discussão sobre o conceito de emprego sustentável.
Espera-se ter suscitado indagações e reflexões que compartilhadas no futuro, abram caminho
para a construção de um conceito sólido, que possa contribuir para a transformação da
realidade de gestão de pessoas no Brasil.
AUTORIA
Ana Rita de Paula, psicóloga, é consultora da SORRI-BRASIL há 15 anos, além de outras organizações não
governamentais e órgãos públicos municipais, estaduais e federais. Recebeu, entre outros, o Prêmio Direitos
Humanos da Universidade de São Paulo, em 2001 e o Prêmio Nacional de Direitos Humanos, outorgado pela
Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, em 2004. Mestre em Psicologia Social e
Doutora em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo (USP). Há 30 anos faz parte da liderança do
movimento pela defesa dos direitos das pessoas com deficiência. Coautora do livro “Sexualidade e Deficiência:
Rompendo o Silêncio” e autora do livro “Asilamento de pessoas com deficiência: a institucionalização da
incapacidade social”.
Carmen Leite Ribeiro Bueno, psicóloga, é Superintendente Geral da SORRI-BRASIL há 24 anos. Mestre em
Avaliação e Administração de Serviços em Reabilitação Profissional pela Southern Illinois University at Carbondale,
Illinois, nos Estados Unidos. Durante 10 anos foi professora da cadeira de Psicologia Organizacional e Recursos
Humanos da Fundação Educacional de Bauru/UNESP Campus Bauru. Há 35 anos participa do Sistema SORRI,
planejando, coordenando e executando projetos em parceria com empresas privadas, organizações não
governamentais e órgãos públicos municipais, estaduais e federais.
BIBLIOGRAFIA
CHACON, S. S. et. al. - O que é desenvolvimento sustentável? Definição da sustentabilidade
para comunidades rurais carentes através do planejamento participativo. Disponível em:
www.sep.org.br/artigo/vcongresso99.pdf. Acessado em: Março de 2011.
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