PSICOPATIA: OS CAMINHOS RECÔNDITOS DA PERVERSIDADE Fernanda Feuser de Freitas 1 Fabiana de Bittencourt Rangel 2 SUMÁRIO RESUMO: Muito se discute acerca da personalidade psicopática, como possíveis justificativas genéticas e sociais para seu surgimento, e a realidade quanto ao fato da inexistência de tratamento. Embora a sociedade tenha ciência da existência deste transtorno de personalidade, associa-o de forma errônea, ligando-o, geralmente, ao cometimento de ilícitos penais, como assassinatos brutais e em séries, com excesso do emprego de violência. Necessário se faz o esclarecimento quanto às diversas formas de condutas psicopáticas existentes, tornando claro à população de que nem sempre uma pessoa dotada de personalidade psicopática, tornar-se-á um assassino. Este pleno conhecimento da realidade envolto da psicopatia traz, de certa forma, maiores chances de defesa ante esses seres tão perversos. PALAVRAS-CHAVE: Psicopatia. Psicopata. Violência. Conduta anti-social. Imputabilidade penal. Introdução O presente artigo traz, como proposta, a explanação acerca da psicopatia e seus efeitos, no intuito de compreender as razões pelas quais os sujeitos acometidos dessa patologia transgridem toda e qualquer norma social, dotados de perversidade, violência e indiferença para com as outras pessoas. Os estudos envolvendo psicopatas são de suma importância, tanto para o Direito, como para a sociedade, pois, através desses é possível estabelecer a relação da patologia com as taxas de incidência e reincidência criminal, analisar a eficácia das penas aplicadas a esses indivíduos, auxiliar na busca de um possível tratamento ou, também, de novos modelos de reabilitação direcionada, no sistema penitenciário. 1 Acadêmica do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, endereço eletrônico [email protected], telefone 47-99815286. 2 Professora do Curso de Direito do Campus Sede da Universidade do Vale do Itajaí, Psicóloga, Mestre em Administração, Docente da Disciplina de Psicologia, endereço eletrônico [email protected], telefone 47-99670727. A relação do Direito Penal com a Psiquiatria e a Psicologia é essencial, e vem sendo firmada e destacada, ao longo dos anos, ainda nas primeiras versões do Código Penal. A Medicina contribuiu estabelecendo as condições nas quais um sujeito pode ser responsabilizado e imputado pelos seus atos, definindo os diversos estados mentais já constatados e os transtornos de personalidades existentes. Por tal motivo, o presente estudo foi construído, não só com base nas disposições legais e suas fundamentações, mas também na psicopatologia forense. A metodologia utilizada neste artigo foi a pesquisa bibliográfica, que consiste: A pesquisa bibliográfica, ou de fontes secundárias, abrange toda a bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas, boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses, material cartográfico etc., até meios de comunicação oral: rádio, gravações em fita magnética e áudio visuais: filmes e televisão. Sua finalidade é colocar o pesquisador em contato direto com tudo o que foi escrito, dito ou filmado sobre determinado assunto [...]. 3 A psicopatia é também denominada, hodiernamente, como transtorno de personalidade anti-social, sociopatia, transtorno de caráter, transtorno sociopático e transtorno dissocial 4 , porém, no presente trabalho, adotaremos apenas as terminologias: psicopatia e transtorno de personalidade anti-social. A ideia da abordagem central desse tema surgiu na observância do desconhecimento, por parte dos acadêmicos do curso de Direito, no que se refere ao transtorno de personalidade anti-social. Em decorrência da falta desse cabedal científico, indiscutivelmente necessário à prática jurídica, uma vez que o tema em questão faz parte do exercício diário do operador do Direito, objetivamos trazer à luz um estudo contextualizado sobre a psicopatia. Com a detecção da falta de conhecimento do tema por parte dos acadêmicos, presume-se também a necessidade de levar à sociedade dados básicos que os permitam identificar as características, as causas e demais 3 LAKATOS, Eva Maria; MARCONI, Mariana A. Fundamentos de metodologia científica. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 166. 4 FIORELLI, José Osmir; MANGINI, Rosana Cathya Ragazzoni. Psicologia jurídica. São Paulo: Atlas, 2009. p. 105. 2 aspectos que envolvem a psicopatia, possibilitando, desta forma, chance a defesa. Fiorelli e Mangini contribuem: [...] da mesma forma que acontece com as doenças em geral, é útil o conhecimento de sinais (ou seja, manifestações visíveis) porque estes sugerem linhas de ação para aqueles que os observam. 5 Por fim, far-se-á uma explanação acerca dos tratamentos já identificados e testados em psicopatas, as dificuldades enfrentadas e o benefício das intervenções sociais, como também a forma de imputabilidade aplicada aos indivíduos portadores do transtorno de personalidade anti-social. 1. Psicopatas: uma breve análise A busca por definições e justificativas para a existência e o comportamento de psicopatas ocorre desde o início da história da psiquiatria, em que, frequentemente, especialistas deparavam-se com indivíduos que, mesmo apresentando comportamento de insanidade mental, não evidenciavam sintomas delirantes, alucinatórios ou deficiências mentais. A ideia inicial era de que o comportamento violento e imotivado, apresentado por determinadas pessoas, estava ligado a algum tipo de doença mental ainda não explorada, correlacionando-a com problemas de cunho moral 6 . A psicopatia abrangida anteriormente como doença mental passou a ser classificada como um transtorno de personalidade 7 , ou personalidade doente, sendo também considerada como um fenômeno psicopatológico, pois nela não estão presentes sintomas como alucinações, delírios ou grave déficit intelectual. Hodiernamente, utiliza-se termos como transtorno de personalidade anti-social, psicopatia, sociopatia, transtorno de caráter, transtorno sociopático 5 FIORELLI, José Osmir; MANGINI, Rosana Cathya Ragazzoni. Psicologia jurídica. p. 113. 6 Para Freud, a moral tem a função de regular os relacionamentos entre os homens a fim de possibilitar o convívio em comunidade e o desenvolvimento da civilização. (ALTHUSSER, L. Freud e Lacan, Marx e Freud. Rio de Janeiro: Graal, 2000) 7 Transtornos de personalidade são “padrões de comportamento profundamente arraigados e permanentes, manifestando-se como respostas inflexiveis a uma ampla série de situaçoes pessoais e sociais.” (FIORELLI, José Osmir; MANGINI, Rosana Cathya Ragazzoni. Psicologia jurídica. p. 104). 3 e transtorno dissocial. A variação terminológica reflete a aridez do tema e o fato de a ciência não ter chegado a conclusões definitivas a respeito de suas origens, desenvolvimento e tratamento. 8 O conceito de Psicopatia para Pacheco (2011): Segundo os manuais internacionais de classificação e diagnóstico psiquiátrico DSM-IV (1995) e CID 10 (1993), o sujeito com o diagnóstico de T.A.S.P. é conhecido popularmente como psicopata ou sociopata e apresenta desprezo pelas obrigações sociais, falta de empatia para com os outros, baixa tolerância à frustração, tendência a culpar os outros ou a fornecer racionalizações duvidosas para explicar um comportamento de conflito com a sociedade, além de um padrão de desrespeito e violação dos direitos alheios, utilizando-se do engodo, da manipulação maquiavélica, da agressão a pessoas e animais e da violência para violar normas ou regras sociais importantes. 9 Dentre as diversas causas apontadas para o surgimento deste transtorno, estão elencadas a presença de transtorno de conduta 10 na infância, fatores genéticos, ambientais, e possível deficiência na formação do superego. Trindade preleciona algumas das causas citadas: Transtorno de Personalidade Anti-Social é fruto de uma combinação de fatores genéticos com fatores ambientais. Família e contexto social podem levar a déficits no controle do impulso individual. Isso, em combinação com a predisposição genética para a impulsividade, que pode ser causada pela disfunção da região frontal e límbica do cérebro, é capaz de conduzir a dificuldade de aprendizagem, assim como problemas de controle do impulso, resultando no distúrbio de conduta na infância e, posteriormente, Transtorno de Personalidade Anti-social. [...] Alem da predisposição genética, tem-se apontadas como causa patologias da região frontal e límbica do cérebro. Alguns estudos sugerem que os indivíduos com TPA apresentam uma redução na área cinzenta do 8 FIORELLI, José Osmir; MANGINI, Rosana Cathya Ragazzoni. Psicologia jurídica. p. 105. 9 PACHECO. Pesquisas do cérebro e psicopatias: a potencialidade do criminoso justificada por saberes científicos. Tese (Doutorado em Psicologia) Faculdade de Psicologia, Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2011.p.131. 10 Os transtornos de conduta são caracterizados por padrões persistentes de conduta dissocial, agressiva ou desafiante. Tal comportamento deve comportar grandes violações das expectativas sociais próprias à idade da criança; deve haver mais do que as travessuras infantis ou a rebeldia do adolescente e se trata de um padrão duradouro de comportamento. (CID-10 F91 Distúrbios de conduta) 4 cérebro, denominada córtex, mais precisamente no lobo frontal, 11 quando comparados com sujeitos sem o transtorno. O autor supracitado destaca, ainda, o fato de que, filhos biológicos de pais com Transtorno de Conduta, também apresentam o transtorno, ainda que sejam adotados e criados por pais que não possuam essa patologia. Fiorelli e Mangini destacam como causas identificadas: Observam-se falhas na formação do superego (valores morais, éticos e sociais) e ausência de sentimentos de culpa, de remorso e de empatia, entre outros. Estatísticas apontam para influências biológicas, ambientais e familiares, surgindo, portanto, uma conjugação de fatores. 12 Muitos especialistas como Freud, Penteado, Fiorelli, Trindade, Morana, Kaplan e Kernberg, apontam a má formação do superego como indicador da presença da personalidade psicopática, pois o papel do superego engloba, em sua função, a observação do ego e a parte moralizadora da personalidade. O ego consiste na superfície do id, é parte central da personalidade e mediador das nossas relações mundo interno-mundo externo, tem a função de estabelecer contato com a realidade, é a sede da inteligência, do pensamento, da atenção, da memória e do discernimento, cabendo-lhe a tarefa de examinar as demandas de prazer do id, assim como as condições oferecidas pelo mundo externo, além de atender as exigências do superego 13 ; o superego, por sua vez, é o observador do ego, tem uma função crítica e moralizadora, agindo de maneira mais ou menos racional, conforme o grau de maturidade que conseguimos atingir. A má 14 formação ou fragilidade do superego agrega uma desestruturação da personalidade, tendo em vista que este é responsável pela 11 TRINDADE, Jorge. Manual de psicologia jurídica para operadores do direito. 3 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009. p. 218. 12 FIORELLI, José Osmir; MANGINI, Rosana Cathya Ragazzoni. Psicologia jurídica p.107. 13 Freud acerca da definição do superego: “poderia dizer simplesmente que a instancia especial que estou começando a diferenciar no ego é a consciência. É mais prudente, contudo, manter a instancia como algo independente e supor que a consciência é uma de suas funções, e que a auto-observação, que é um preliminar essencial da atividade de julgar da consciência, é mais uma de tais funções. E desde que, reconhecendo que algo tem existência separada, lhe damos um nome que lhe seja seu, de ora em diante descreverei essa instancia existente no ego como superego.” (ALTHUSSER, L. Freud e Lacan, Marx e Freud. Rio de Janeiro: Graal, 2000. p. 45) 14 PEPE, Mafalda Janasievicz. Personalidade. In: COHEN, Claudio; SEGRE, Marco; FERRAZ, Flávio Carvalho (org). Saúde mental, crime e justiça. 2 ed. São Paulo: Editora da USP, 2006. p. 164. 5 internalizarão dos “bons atributos morais”; tal fato justifica, em parte, a total ausência de sentimento e remorso dos psicopatas. Acerca das funções do superego, elucida Kernberg: [...] manter uma honestidade social comum e experenciar um adequado sentimento de culpa e responsabilidade moral nas relações com as outras pessoas defendem a capacidade de manter funções básicas do superego. Pelo contrário uma desonestidade geral nas relações humanas e a falta de preocupação e responsabilidade em todas as trocas humanas indicam a ausência ou deterioração das funções do superego. Naturalmente, a severidade da patologia de superego está refletida no grau de comportamento anti-social presente. 15 Muito se discutiu, nos últimos dois séculos, acerca desse transtorno de personalidade, diversos estudos foram realizados, até que o termo psicopata e suas características fossem definidos. Um psicopata não tem a capacidade de sentir, amar, desfrutar dos mais nobres sentimentos já alcançados e vividos por um ser humano. São seres frios e individualistas, que vivem de forma única e exclusivamente racional, traçam ideais, desenvolvem suas preferências, e as executam, objetivando apenas o resultado final, sem se importarem de que maneira, ou através de que meio o resultado será atingido. Para um psicopata, os fins justificam os meios, mesmo que, para isso, findem vidas e afetem pessoas, deixando um rastro de destruição. Os indivíduos portadores da personalidade psicopática estão disseminados por toda parte, e, na maioria das vezes, convivem livremente com outras pessoas sem que sejam identificados, proporcionando-os um campo livre e farto para atuação de suas ardilosas vontades. Neste sentido, Kaplan aborda: [...] o transtorno de personalidade anti-social é caracterizado por atos anti-sociais e criminosos contínuos, mas não é sinonimo de criminalidade. Em vez disso, trata-se de uma incapacidade de conformar-se às normas sociais que envolvem muitos aspectos do desenvolvimento adolescente e adulto do paciente. 16 15 KERNBERG, O. F. Agressão nos transtornos de personalidade e nas perversões. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.p.234. 16 KAPLAN, H. I.; SADOCK, B. J.; GREEB. J. A. Compêndio de psiquiatria. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.p. 692. 6 Os psicopatas não possuem a percepção de tempo, não planejam o futuro, vivem o presente, sempre no intuito de aliviar tensões e alcançar aspirações momentâneas, são imediatistas, além de possuírem a ciência das conseqüências de seus atos anti-sociais. Kenberng acrescenta: A ausência virtualmente total de capacidade para relações objetais não espoliativas e de qualquer dimensão moral no funcionamento de personalidade é o elemento-chave na distinção da personalidade anti-social. 17 Morana (2003), destaca algumas características dos diagnosticados com transtorno de personalidade anti-social: são os responsáveis pela maioria dos crimes violentos em todos os países; iniciam as carreiras criminais em idade precoce; cometem diversos tipos de crimes e com maior freqüência que os demais criminosos; são os que recebem o maior número de faltas disciplinares no sistema prisional; apresentam insuficiente resposta aos programas de reabilitação; apresentam os mais elevados índices de reincidência criminal. 18 Apesar de serem vastas as características identificadas em indivíduos com esse transtorno, o diagnóstico é algo extremamente complexo e difícil, um dos fatores que enfatizam essa dificuldade é a possibilidade de encontrar comportamentos anti-sociais em praticamente todos os transtornos de personalidade existentes. Um dos métodos utilizados para o diagnóstico de psicopatia é a psicanálise, porém, assim como os demais meios de detecção, este é vulnerável, pelo fato de basear-se nas informações obtidas do indivíduo. A maioria tenta manipular o psicanalista e não lhe fala a verdade, por não admitir que possua tal transtorno, e tão pouco desejar livrar-se de uma conduta considerada “brilhante” por eles. Neste sentido, Shine assevera que: 17 KERNBERG, O. F. Agressão nos transtornos de personalidade e nas perversões. p.81. 18 MORANA. Identificação do ponto de corte para escala PCL-R (Psychopathy Checklist Revised) em população forense brasileira: caracterização de dois subtipos da personalidade; transtorno global e parcial. Tese (Doutorado em Ciências) Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003. p. 05. 7 O método em psicanálise é o estudo de caso individual, enfocado em um quadro ou sintoma patológicos. A construção do entendimento do caso é feita a dois (analista e paciente) por meio da hermenêutica (análise e interpretação do discurso deste por aquele). De início temos uma dificuldade na aplicação do método em casos de psicopatia. Ora, o psicopata não se julga doente ou necessitado de ajuda. Normalmente, a intervenção profissional é solicitada por algum membro da família que sofre as conseqüências de seu ato. Ou também quando o psicanalista é chamado a intervir em instituições jurídicas: no tribunal na condição de perito. 19 Além da psicanálise, existe um instrumento chamado “PCL–R” de Psychopathy chek-list Revised, desenvolvido por Robert Hare, em 1991. O estudo faz uma revisão dos conceitos, inicialmente correlacionados ao Transtorno Específico de Personalidade e, posteriormente, ao Transtorno Antisocial da Personalidade, procurando estabelecer a diferença com o conceito de psicopatia. O PCL-R é o mecanismo de eleição para o estudo da psicopatia. Os países que o adotaram apresentaram índices significativos de redução da incidência criminal, motivo pelo qual é considerado hoje um dos principais instrumentos para o diagnóstico da psicopatia. 20 2. Sociedade x Psicopatas Um grande problema relacionado à psicopatia é a falta de conhecimento acerca do assunto pela grande massa da sociedade, esta, que é alvo diário da astúcia e da crueldade dos portadores da personalidade psicopática, e perece, na maioria das vezes, por essa falta de informação. Isso ocorre, pois, ao longo do tempo, o termo “psicopata” foi atrelado pela mídia a crimes brutais, como, por exemplo, os casos que envolvem serial killers, os temidos autores de assassinatos em série. Muitos entendem ser psicopata, apenas aqueles que cometem homicídios com requintes de crueldade, e nem sequer imaginam que, 19 SHINE, Sidney Kiyoshi. O psicopata e a moral. In: COHEN, Claudio; SEGRE, Marco; FERRAZ, Flávio Carvalho (org). Saúde mental, crime e justiça. 2 ed. São Paulo: Editora da USP, 2006. p. 84. 20 MORANA. Identificação do ponto de corte para escala PCL-R (Psychopathy Checklist Revised) em população forense brasileira: caracterização de dois subtipos da personalidade; transtorno global e parcial. p.02. 8 provavelmente, já estiveram, ou em dado momento da vida, estarão, frente a frente com um. A realidade da psicopatia muito se distancia da fantasiosa exclusividade de crimes bárbaros, apesar de existirem casos em que há a prática de ilícitos penais dotados de considerável e aterrorizante violência. A maioria dos psicopatas possui uma vida normal, convivendo em sociedade, sem agredir fisicamente, ou matar alguém. Esse tipo de psicopata é perigoso e deixa um rastro de destruição tão grande quanto aquele que chega às vias de matar uma pessoa. Estamos cercados de seres como esses, cujo seu único objetivo é alcançar seus ideais, mesmo que, para isso, precise mentir, trapacear, ofender ou lesar alguém Fiorelli e Mangini trazem os principais campos de atuação dos psicopatas: Esses indivíduos encontram campo fértil no tráfico de drogas, no crime organizado em geral, na política, na religião; tornamse líderes carismáticos e poderosos. Mentira, promiscuidade, direção perigosa, homicídios e seqüestros compõem seus repertórios, em que não há sentimentos de culpa, pois os outros não passam de “otários” que merecem ser ludibriados na disputa por sexo, dinheiro, poder, etc. 21 Um exemplo em destaque é o cenário político, um verdadeiro “parque de diversões” para o psicopata. A política é solo fértil para que ele ponha em prática seus mais ocultos e altos anseios, já que a busca insaciável pelo dinheiro e pelo poder é propiciada em um só meio. Marietan, conceituado psiquiatra na Argentina, comenta: Os políticos importantes geralmente são psicopatas por uma simples razão: o psicopata adora poder. Utiliza as pessoas para obter mais e mais poder, e as transforma em coisas para próprio beneficio dele. Isto não quer dizer, logicamente, que todos os políticos ou todos os líderes sejam psicopatas, desde 21 FIORELLI, José Osmir; MANGINI, Rosana Cathya Ragazzoni. Psicologia jurídica p.108. 9 já, mas sim que o poder é um âmbito onde eles movem como peixe na água. 22 Aquele que a sociedade denomina apenas como corrupto, pode ser um claro exemplo de psicopata. Um político que usa recursos públicos para despesas pessoais, que utiliza cotas de passagens para viagens particulares, que recebe propina para praticar algo que vá contra o interesse público, pode sim ser um psicopata. Ainda sobre do comportamento dos portadores de personalidade antisocial, corrobora Fiorelli: Na empresa, o comportamento inclui cometer roubos, destruir o patrimônio, envolver-se em conflitos corporais, vadiar durante o período de trabalho, ausentar-se injustificadamente e sistematicamente. Na família, compreende a traição, a violência contra cônjuge e filhos, a ausência prolongada, dilapidação do patrimônio em aventuras relacionadas com o sexo, assédio sexual à empregada doméstica, etc. 23 Vale salientar que, tais características encontradas em determinada pessoa, não podem por si só defini-la como psicopata, o diagnóstico dessa patologia somente pode ser feito por profissional capacitado. A importância do conhecimento da sociedade acerca desse transtorno de personalidade consiste em tornar possível a observação de suas principais características, a fim de oferecer a oportunidade de precaução. A defesa de um mal só pode ser exercida quando há informação suficiente para “identificá-lo.” Jorge Trindade alerta, em sua obra, sobre a evolução do Transtorno de Conduta na infância para o Transtorno de Personalidade anti-social no adulto: Os manuais da psicopatia compilam diagnósticos de alteração de comportamento, geralmente encontrados pela primeira vez na infância e adolescência, como Transtorno de Conduta. Quando não tratados adequadamente, esses quadros tendem a evoluir para um transtorno de personalidade anti-social. 24 MARIETAN, Hugo. Disponível em: http://www.marietan.com.ar/material_psicopatia. Acesso em: 04/04/2011. 23 FIORELLI, José Osmir; FIORELLI, Maria Risa, MALHADAS JUNIOR, Marcos Julio Olivé. Psicologia aplicada ao direito. 2 ed. São Paulo: LTr, 2008. p.193. 24 TRINDADE, Jorge. Manual de psicologia jurídica para operadores do direito. p.213. 10 22 Deve-se despender atenção especial às crianças com distúrbios de comportamento, pois estas apresentam um alto risco de, no futuro, tornarem-se adultos com transtorno da personalidade. 25 Além da oportunidade de precaução, a sociedade com a obtenção de conhecimento que envolve o assunto, pode contribuir para a prevenção do desenvolvimento do transtorno de personalidade anti-social. Elucida Ferraz: Quando a criança começa a praticar suas ações anti-sociais (que se expressam pela via do furto, por um lado, ou pela via da destrutividade, por outro), o ambiente em que ela vive pode ajudá-la a suportar tais tendências, reconhecendo que ela tem direitos e, assim, pode redescobrir o objeto bom. Ocorre que essa situação, muitas vezes, não é atingida, favorecendo a consolidação das tendências destrutivas dentro da estrutura da personalidade. 26 Verifica-se, deste modo, o importante papel da sociedade através da família, que deve estar atenta a tais aspectos, tanto no intento de reverter o quadro como de evitá-lo. Entretanto, quanto aos já portadores do transtorno de personalidade anti-social, é necessário que haja cautela, pois, como visto anteriormente, estes são perversos e possuem um eterno vazio emocional, fato que os torna indiferentes a punições, ao perigo, ao afeto e aos valores morais que regem as relações interpessoais. Fiorelli e Mangini destacam: Processos mentais responsáveis pelas funções da sociabilidade não se estruturam de forma adequada nesses indivíduos. Enquanto criminosos comuns desejam riqueza, poder e prestigio, os psicopatas manifestam crueldade fortuita. 27 A incapacidade de o psicopata vivenciar afetos e emoções o impulsiona a praticar atos de violência e crueldade, como uma forma de busca MORANA. Identificação do ponto de corte para escala PCL-R (Psychopathy Checklist Revised) em população forense brasileira: caracterização de dois subtipos da personalidade; transtorno global e parcial. p.70. 26 FERRAZ, Flávio Carvalho. A abordagem psicanalítica das tendências anti-social. In: COHEN, Claudio; SEGRE, Marco; FERRAZ, Flávio Carvalho (org). Saúde mental, crime e justiça. 2 ed. São Paulo: Editora da USP, 2006. p. 183 27 FIORELLI, José Osmir; MANGINI, Rosana Cathya Ragazzoni. Psicologia jurídica p.106. 11 25 incessante pela possibilidade de sentir e vivenciar algo que lhe dê verdadeiro prazer. Neste ínterim, encontra-se a sociedade que, ocupada em figurar no papel de vítima, deixa de perceber que também cabe a ela o papel de transformar os instintos anti-sociais do indivíduo em sociais, munindo-se dos sentimentos positivos que o ser humano é capaz de compartilhar, evidenciando a importância da família e dos vínculos afetivos, no período de formação da personalidade do indivíduo. 28 3. Do Tratamento e da Imputabilidade 3.1 Tratamento Um fator preocupante, quando se trata de psicopatia, é o tratamento, a possibilidade de encontrar um meio que diminua ou cure o transtorno de personalidade anti-social. Não há, até o momento, qualquer tratamento que tenha sido eficaz, apresentando resultados consideráveis e atingindo a “cura” do transtorno de personalidade anti-social. Os estudos realizados, ao longo dos séculos, apontam para a ausência de cura desse transtorno, vez que não é considerado doença e não é admitido por aqueles que o possuem. Alguns autores defendem a ideia de que os psicopatas não são tratáveis por qualquer tipo de terapia ou tratamento, porém, alguns estudos indicam que, após os 40 anos, a tendência é a diminuição da propensão de reincidência criminal. 29 Além da vulnerabilidade e da ineficácia dos tratamentos em psicopatas, há, também, o fator agravante no sentido de que, na maioria dos casos, há tentativa de manipulação, por parte do paciente. Muitas vezes, as sessões de psicoterapia desenvolvem habilidades no psicopata para a manipulação psicológica, eles não absorvem o tratamento, STEKEL, W. Atos impulsivos. Sao Paulo: Mestre Jou, 1968, pag. 457. 29 FIORELLI, José Osmir; MANGINI, Rosana C. Ragazzoni. Psicologia jurídica p.107. 12 28 mas o utilizam como oportunidade para conhecer métodos que os ajudem a aplicar essa manipulação nos outros. 30 A punição, como tentativa de reabilitação e conscientização, não funciona com indivíduos portadores de personalidade psicopática, pois estes não estabelecem vínculos duradouros e não aprendem com a experiência, tendem à reincidência criminal e à apresentação de justificativa racional para seus atos, nunca os considerando ilícitos. Fiorelli e Mangini corroboram: Os indivíduos psicopatas possuem padrão intelectual médio ou até elevado mas, paradoxalmente, não são influenciáveis pelas medidas educacionais ou são insignificantemente modificáveis pelos meios coercitivos ou de correção. 31 No entanto, inobstante as dificuldades apresentadas, há indícios de que um meio social estruturado, juntamente com o efetivo apoio dos familiares, pode contribuir para a contenção das manifestações e consequências do transtorno: É importante destacar que o acompanhamento familiar e institucional, com orientação das pessoas, profissionais, ou não, que lidam com sujeitos com essas alterações graves da personalidade, é fundamental. Pode produzir mudanças significativas com relação à prevenção das conseqüências do comportamento. 32 Quando o transtorno já está confirmado e diagnosticado, a influência das ações da família é mínima, porém, se tal intervenção for praticada ainda na infância, quando manifestados os sinais de transtorno de conduta, são maiores as chances de melhora e de inibição da evolução do processo para o transtorno de personalidade anti-social na fase adulta. Essa observação destaca a necessidade do dispêndio na atenção da sociedade para essa patologia. Os pais que detêm o conhecimento acerca das características que envolvem o transtorno de conduta na infância, tornam-se MORANA. Identificação do ponto de corte para escala PCL-R (Psychopathy Checklist Revised) em população forense brasileira: caracterização de dois subtipos da personalidade; transtorno global e parcial. p.69. 31 PENTEADO, Conceição. Psicopatologia forense: breve estudo sobre o alienado e a lei. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1996. p. 44. 32 MORANA. Identificação do ponto de corte para escala PCL-R (Psychopathy Checklist Revised) em população forense brasileira: caracterização de dois subtipos da personalidade; transtorno global e parcial. p.70. 13 30 aptos a exercer a intervenção necessária para que, em ação conjunta com acompanhamento médico adequado, possam diminuir os reflexos desta conduta e, em uma remota, mas existente hipótese, eliminá-la. Por tal motivo, é imprescindível que os familiares e as pessoas de convívio próximo à criança não neguem ou ignorem a prática da conduta compatível a esse transtorno. Somente a percepção e intercessão precoce podem possibilitar chances de redução da progressão e melhoria dessa patologia. 3.2 Imputabilidade Nem todos os psicopatas cometem ilícitos penais, muitos figuram apenas no exercício de condutas não aceitas pela sociedade, defrontando-se com a moral. Todavia, aqueles que chegam ao patamar criminal, possuem tratamento diferenciado pelo judiciário, por não serem considerados imputáveis. A imputabilidade para Damásio consiste: Imputar é atribuir a alguém a responsabilidade de alguma coisa. Imputabilidade penal é o conjunto de condições pessoais que dão ao agente capacidade para lhe ser juridicamente imputada a prática de um fato punível. 33 Para Bittencourt: Imputabilidade é a capacidade ou aptidão para ser culpável, embora, convém destacar, não se confunda com responsabilidade, que é o princípio segundo o qual o imputável deve responder por suas ações. 34 As exceções no tocante à imputabilidade, ou seja, os classificados como inimputáveis, estão elencados no artigo 26, do Código Penal: Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. O que nos interessa, no entanto, é o disposto no parágrafo único do artigo, que traz a diminuição da culpabilidade, abrigando, dessa forma, os JESUS, Damásio E. Direito penal parte geral. 27ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 469. 34 Bittencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, 1. 164 ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 408. 14 33 indivíduos que estão entre o campo da doença mental e da normalidade, denominados como fronteiriços: Parágrafo único: A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. As personalidades psicopáticas estão entre o limite da doença mental e da normalidade psíquica, pois, apesar de deterem o entendimento do caráter ilícito de seus atos, não são capazes de controlá-los, tornando-se semiimputáveis, ou, com culpabilidade diminuída, enquadrando-se no parágrafo único do artigo 26 do Código Penal, e não no caput do mesmo. 35 Damásio conceitua este grupo: [...] diminuição da capacidade de entendimento e de vontade – caso de redução da pena ou de aplicação da medida de segurança: [...] entre a imputabilidade e a inimputabilidade existe um estado intermédio com reflexos na culpabilidade e, por conseqüência, na responsabilidade do agente. Situam-se nessa faixa os denominados [...] personalidades psicopáticas. 36 Os critérios existentes utilizados para a verificação da semiimputabilidade do agente são o biológico, o psicológico e o biopsicológico. 37 Atualmente, no Brasil, o sistema utilizado é o biopsicológico. O método biopsicológico é a reunião dos dois primeiros (biológico e psicológico), sendo que, neste, a responsabilidade somente é excluída, se o agente, em razão de enfermidade ou retardo mental, era, no momento da ação, incapaz de entender o processo ético-jurídico e de autodeterminação. 38 Com base no sistema vicariante, 39 depois de diagnosticado o transtorno e classificado o agente como semi-imputável, o juiz, primeiramente o PENTEADO, Conceição. Psicopatologia forense: breve estudo sobre o alienado e a lei. p. 47. 36 Jesus, Damásio E. de, 1935 – Direito penal parte geral. p. 502. 37 PENTEADO, Conceição. Psicopatologia forense: breve estudo sobre o alienado e a lei.p. 63. 38 Bittencourt, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral, 1. p. 412. 39 Na hipótese dos fronteiriços, isto é, de culpabilidade diminuída, é obrigatória, no caso de condenação, a imposição de pena, reduzida, para, somente num segundo momento, se comprovadamente necessária, ser substituída por medida de segurança 15 35 condenará com a diminuição proporcional da pena, para, depois, sendo necessário, substituí-la por medida de segurança. Quando há a substituição da pena imputada pela medida de segurança nos casos envolvendo psicopatas, esta será realizada no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, conforme determina o artigo 99 da lei nº 7210, de 11 de Julho de 1984: O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico destina-se aos inimputáveis e semi-imputáveis referidos no art. 26 e seu parágrafo único do Código Penal. Ocorre que, em grande parte dos casos de ilícitos penais, os psicopatas são julgados e condenados como imputáveis, cumprindo pena no regime prisional comum, ignorando o fato de possuírem o transtorno de personalidade anti-social. Apesar de não haver tratamento eficaz para esses indivíduos, o grau de periculosidade torna inviável sua permanência nas penitenciárias comuns, visto que, tais sujeitos, não aprendem com seus erros, e encontram, em ambientes como estes, um campo a mais para sua perversa atuação, colocando os demais detentos em situação desfavorável e de risco. Morana ressalta: A taxa de reincidência criminal é ao redor três vezes maior para os psicopatas do que para outros criminosos. Sendo que, para crimes violentos, a taxa é de quatro vezes maior para psicopatas quando comparados aos não psicopatas. 40 A maioria dos crimes cometidos por detentores da personalidade psicopática são acrescidos de extrema violência, incluindo multiplicidade de golpes, motivos torpes, crueldade na execução e falta de remorso. Essas características evidenciam a necessidade de uma medida específica. O tratamento especial e diferenciado consiste em adequar a medida coercitiva à capacidade de imputabilidade do agente, fazendo com que esta chegue o mais próximo possível de sua eficácia, o que é o caso da internação em hospital de custódia, que não só retira o psicopata do convívio em (princípio vicariante). (Bittencourt, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral, 1. p. 420.) 40 MORANA. Identificação do ponto de corte para escala PCL-R (Psychopathy Checklist Revised) em população forense brasileira: caracterização de dois subtipos da personalidade; transtorno global e parcial. p.06. 16 sociedade, como também, durante o período de internação, coibe o intento de prática de suas artimanhas, ação que não é possível em um estabelecimento penitenciário comum. Essa alusão entre as duas medidas gera controvérsias, conforme descrevem Fontana e Cohen: [...] observa-se, às vezes, um entendimento da sociedade de que a psicopatologia forense estaria protegendo o agente, ao concluir que este é semi-inimputável ou inimputável e, assim, orientando a Justiça para a internação em casa de custódia e Tratamento Psiquiátrico, ou de que o agente estaria sendo beneficiado por essa decisão visto que se “livraria” da penalização. Entretanto, pensamos que, na prática, ocorra o contrário, ou seja, maiores benefícios poderiam ser auferidos pelo agente penalizado com a redução da pena por diferentes motivos, enquanto a internação compulsória em Casas de Custódia e Tratamento pode transformar-se em verdadeira reclusão “perpétua”. 41 Por fim, verifica-se que há uma medida diferenciada para os psicopatas, porém, nem sempre é utilizada, tendo em vista que, de acordo com o artigo 98 do Código Penal 42 , o acolhimento da aplicação é facultado ao juiz, podendo este acatar o diagnóstico de transtorno de personalidade anti-social, apresentado por perito capacitado, ou não. Considerações Finais A psicopatia é um transtorno de personalidade que, embora seja estudado desde os primórdios, permanece cercada de dúvidas e incertezas, representando um desafio para a psiquiatria forense e para o Direito. A perversidade e a frieza demonstradas por indivíduos acometidos dessa patologia chocam a grande massa da sociedade que, desprevenida, torna-se vitima diária de seus estratagemas. FONTANA-ROSA, Júlio César; COHEN, Claudio. Psicopatologia forense na esfera penal. In: COHEN, Claudio; SEGRE, Marco; FERRAZ, Flávio Carvalho (org). Saúde mental, crime e justiça. 2 ed. São Paulo: Editora da USP, 2006. p. 117. 42 Art. 98 - Na hipótese do parágrafo único do art. 26 deste Código e necessitando o condenado de especial tratamento curativo, a pena privativa de liberdade pode ser substituída pela internação, ou tratamento ambulatorial, pelo prazo mínimo de 1 (um) a 3 (três) anos, nos termos do artigo anterior e respectivos §§ 1º a 4º. 41 17 Devido à falta de conhecimento acerca do assunto, é indispensável que o tema seja abordado em segmentos sociais, acadêmicos, jurídicos, etc. Só assim, esclarecer-se-ão alguns pontos obscuros que ainda estão “escondidos” na conduta do psicopata, nas questões concernentes à imputabilidade do portador desse transtorno, no tratamento disponibilizado pela psiquiatria e psicologia e sua eficácia, bem como nas relações familiares conflitantes com o portador de personalidade psicopática. Um dos fatores que mais desanimam a psiquiatria e a psicologia, em relação aos portadores de transtornos de personalidade anti-social, é o fato de não haver nenhum tratamento efetivo e reconhecido especificamente para esse estado, pois é comprovado que os psicopatas não estabelecem vínculos, não aprendem com a experiência e manipulam as pessoas. Indubitavelmente, faz-se mister assinalar que, o conhecimento disponível sobre a psicopatia e seus caminhos, na maioria das vezes imperceptíveis, constitui-se em limites tênues, sutis; o que necessita um entendimento mais aprofundado das áreas que operam diretamente com os indivíduos de personalidade psicopática. É imprescindível que o estudioso do Direito tenha conhecimentos na área da Psiquiatria Forense, pois só assim terá condições de poder avaliar se um diagnóstico é confiável ou se há necessidade de consultar outro profissional, e, assim, constatar se deve aplicar a medida de segurança. Devido à complexidade que a Psicologia e a Psiquiatria encontram em realizar um diagnóstico preciso e proporcionar um tratamento eficaz, e à dificuldade com que o Direito se depara nos casos em que a transgressão da lei é praticada por um psicopata, revela-se necessária a continuidade dos estudos concernentes à psicopatia, sob a ótica forense e psicológica, bem como a outras áreas do conhecimento humano que estejam diretamente ligadas ao tema proposto neste artigo. 18 Referências ALTHUSSER, L. Freud e Lacan, Marx e Freud. Rio de Janeiro: Graal, 2000 BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, 1. 164 ed. São Paulo: Saraiva, 2011. COHEN, Claudio; FONTANA-ROSA, Júlio César. Psicopatologia forense na esfera civil. In: COHEN, Claudio; SEGRE, Marco; FERRAZ, Flávio Carvalho (org). Saúde mental, crime e justiça. 2 ed. São Paulo: Editora da USP, 2006. FERRAZ, Flávio Carvalho. A abordagem psicanalítica das tendências antisocial. 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