É POSSÍVEL AMAMENTAR DEPOIS DE UMA CIRURGIA MAMÁRIA? Que impacto tem as diferentes abordagens e técnicas cirúrgicas na anatomofisiologia da mama e na psicossociologia da paciente? E que repercussões num futuro aleitamento materno? AFP Os benefícios do aleitamento materno (AM) são amplamente reconhecidos e não se cingem apenas às crianças amamentadas, mas estendem-se à mãe, à própria família e à sociedade. De igual modo e noutro contexto, a cirurgia mamária, nas suas distintas indicações fisiopatológicas, é uma das principais intervenções cirúrgicas a que a mulher se submete, frequentemente, numa faixa etária jovem e em idade fértil. É por isso importante compreender o impacto das diferentes abordagens e técnicas cirúrgicas, integradas em contextos clínicos específicos, na anatomofisiologia da mama e na psicossociologia da paciente, com repercussões num futuro AM. Aleitamento materno Temos assistido a um aumento estável do AM, gradual (60% em 1993-94 para 77% entre 200506, nos EUA). As recomendações actuais são aleitamento exclusivo até aos 6 meses e posteriormente em associção à alimentação complementar até aos 2 anos. A amamentação vai depender de questões fisiológicas, escolha pessoal, condições socioculturais e da influência dos profissionais de saúde. A cirurgia mamária pode alterar a integridade da estrutura mamária, podendo dificultar o processo de AM. Cirurgia mamária Nos dias de hoje a mama é o principal alvo de intervenção cirúrgica na população feminina jovem, por vários motivos: pressão social, cultura da imagem, idade jovem, construção “tardia” da nova família, indefinição futuro. Ao submeterem-se a uma cirurgia plástica da mama, apenas algumas mulheres têm a preocupação com uma futura possibilidade de amamentação. Principais intervenções na mama - Mamoplastia de Aumento – o procedimento cirúrgico estético mais realizado em todo o mundo. - Mamoplastia de Redução/Mastopexia. - Cirurgia Oncológica da Mama. Indicações cirúrgicas - Hipoplasia mamária - Assimetria mamária - Hipertrofia mamária/gigantomastia/hipertrofia virginal juvenil - Ptose mamária - Neoplasia mama É importante a seleção do procedimento adequado que se relaciona para além das questões técnicas com antecedentes pessoais/familiares e com o desejo de ser mãe e de amamentar. Aleitamento materno no pós-cirurgia mamária Na literatura existe uma ampla variabilidade de resultados: - Integridade das unidades funcionais glandulares até ao mamilo: Fator limitativo parece ser a conecção do complexo areolomamilar com uma porção significativa de ductos e lóbulos. Se esta conexão estiver patente e for suficiente então a lactação é possível - Quantidade e localização do tecido glandular remanescente pós cirurgia: o corpo mamário é um sistema complexo formado por glândulas mamárias, gordura e tecido conjuntivo. No meio deste complexo encontra-se um conjunto de unidades funcionais conhecidas como lóbulos mamários, que são representados por ductos (entre 15 a 20 lobulos). Estes ductos se abrem nos mamilos na forma de poro mamilar, com calibre reduzido, cada um cerca de 0,5 mm de diâmetro, e são responsáveis pela saída do leite pelo mamilo. Antes de alcançar o mamilo, estes ductos formam ampolas que servem para armazenar todo o leite produzido nos intervalos entre as mamadas. - Sensibilidade CAM – lesão dos nervos comprometer o arco reflexo decorrente da estimulação mamilar pelo lactente (os dados reportam cerca de 8%). - Invaginação mamilar pós cirúrgica: em 17 % casos pode ocorrer. Portanto há obviamente influencia da cirurgia da mama sob o aleitamento materno, no entanto os estudo mostram que apesar de todas as alterações pós–operatórias na mama, o AM ocorre em todos os grupos de mulheres submetidas aos diferentes procedimentos. Parecem influir no sucesso do AM, a informação pré-operatória adequada, a motivação (funcional vs estética) da paciente e o contexto sociocultural. Particularizando... 1) A mamoplastia de aumento: É das cirurgias estéticas mais realizadas a nível mundial: 60% entre os 19 e 34 anos. Há uma série de variáveis a equacionar (tipo de implante, tipo de incisão, abordagem cirúrgica da bolsa onde vai ficar a prótese, tipo de bolsa (subglandular, submuscular). Há de facto uma redução média na quantidade de leite produzida pelas mulheres submetidas a mamoplastia de aumento o que compromete particularmente o AM nesta população. Causas relacionadas com paciente: mama hipoplasica, mulheres magras com desiquilíbrio hormonal, preocupação estética mais acentuada. Causas cirúrgicas: - Incisão periareolar - de um grupo de 42 mulheres, 64% tinham lactação insuficiente comparadas com 3% das não operadas. Eventualmente, pois é ainda controverso, pela alteração mais acentuada da sensibilidade CAM, pelo menos numa fase inicial. 21-23. - O implante – pela pressão que condiciona dor, atrofia glandular e bloqueio dos ductos Como prevenir e minimizar as complicações: - Redução da contratura capsular (tipo de implante/ sua localização/ irrigação com AB - Minimizar complicações (drenagem, minimizar risco de hematomas) - Informar e esclarecer (benifícios do aleitamento, riscos e complicaões inerentes à cirurgia) sobre a interferência no futuro AM e sobre os benefícios do mesmo - essa interferência pode ser minimizada (técnica cirurgica correta e bom apoio psicológico) mas não eliminada ou evitada de todo 2) Mamoplastia de redução: Um dos procedimentos mais requisitados em todas as faixas etárias, pelo alivio sintomático, correção postural e melhoria da aparência. Estudos mostram que depois de iniciado o AM tem a mesma durabilidade que com a mama não operada, o mais difícil é iniciar a lactação. Idade materna entre 35-39 anos, nível educacional médio, aconselhamento pelos profissionais de saúde contribuem para o sucesso do AM pós redução mamária. Em resumo: - Maior consciência da importância do aleitamento materno; - A expectativa de um AM bem sucedido é cada vez mais elevada; - Informação relativamente à interferência de uma cirurgia mamária no aleitamento é insuficiente; - O Aleitamento materno pós cirurgia mamária deve ser encorajado. Mamoplastia de aumento: - Há um impacto negativo da Mamoplastia de aumento sobre o aleitamento materno; - Impacto da abordagem cirúrgica sobre a sensibilidade do CAM é controverso, verificando-se contudo maior risco de lesão ductal com a via periareolar. Mamoplastia de redução: - A capacidade de amamentação não depende da quantidade de tecido excisado nem da sensibilidade mamilar; - As técnicas cirúrgicas permitem preservar a integridade e a continuidade das unidades funcionais glandulares com o CAM. - O AM é possivel e recomendado. - As principais causas de insucesso foram o desencorajamento pelos profissionais de saúde e a insuficiência da lactação. 3) Cirurgia oncológica da Mama: - Abordagem da possível gravidez e amamentação é essencial no contexto oncológico da mama; - Não há evidência que suporte a privação destes dois processos; - Impacto positivo na qualidade de vida, autoestima. Por Ana Silva Guerra, Médica e Cirurgiã Plástica na Clínica Europa artigo do parceiro: Nuno Noronha