A CONCORDÂNCIA VERBAL DE 3ª PESSOA DO PLURAL NO

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Universidade Federal do Rio de Janeiro
A CONCORDÂNCIA VERBAL DE 3ª PESSOA DO PLURAL NO PORTUGUÊS
EUROPEU
Fernanda Villares Vianna Barreto
2014
A CONCORDÂNCIA VERBAL DE 3ª PESSOA DO PLURAL NO PORTUGUÊS
EUROPEU
por
FERNANDA VILLARES VIANNA BARRETO
Curso de Pós-Graduação em Letras Vernáculas
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em Letras
Vernáculas da Universidade Federal do Rio
de Janeiro – UFRJ, como quesito para a
obtenção do Título de Mestre em Letras
Vernáculas (Língua Portuguesa).
Orientadora:
Profª
Rodrigues Vieira
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2014
Doutora
Silvia
Barreto, Fernanda Villares Vianna.
A concordância verbal de 3ª pessoa do plural no Português
Europeu/ Fernanda Villares Vianna Barreto. Rio de Janeiro: UFRJ/
Faculdade de Letras, 2014.
xiii, 124f.: il.
Orientadora: Professora Doutora Silvia Rodrigues Vieira
Dissertação (Mestrado) – UFRJ / Faculdade de Letras/
Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas, 2014.
Referências Bibliográficas: f.117-124.
1. Concordância Verbal. 2. Português Europeu.
3. Sociolinguística. I. Vieira, Silvia Rodrigues. II.
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras,
Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas. III. A
concordância verbal de 3ª pessoa do plural no Português Europeu
A concordância verbal de 3ª pessoa do plural no Português Europeu
Fernanda Villares Vianna Barreto
Orientadora: Professora Doutora Silvia Rodrigues Vieira
Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras
Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas.
Examinada por:
_________________________________________________
Presidente, Profa. Doutora Silvia Rodrigues Vieira
_________________________________________________
Profa. Doutora Ângela Marina Bravin dos Santos - UFRRJ
_________________________________________________
Profa. Doutora Silvia Figueiredo Brandão - UFRJ
_________________________________________________
Profa. Doutora Filomena de Oliveira Azevedo Varejão – PPG Letras Vernáculas
– UFRJ, Suplente
_________________________________________________
Profa. Doutora Danielle Kelly Gomes – UFF, Suplente
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2014
BARRETO, Fernanda Villares Vianna. A concordância verbal de 3ª pessoa do plural no
Português Europeu. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa. Rio de Janeiro:
Faculdade de Letras/ UFRJ. 2013.
RESUMO
O objetivo do presente trabalho é descrever os padrões de concordância verbal
de 3ª pessoa do plural do Português Europeu, a fim de verificar se a regra atuante é de
natureza categórica, semicategórica ou variável (cf. LABOV, 2003), levando-se em
consideração entrevistas orais realizadas com informantes das seguintes localidades de
Portugal: Oeiras, Cacém e Funchal.
O corpus, disponibilizado pelo Projeto Padrões de concordância em variedades
africanas, brasileiras e europeias do Português (ALFAL 21), conta com 18 entrevistas
de cada uma das localidades, organizadas segundo sexo, escolaridade e faixa etária de
cada informante, além de uma amostra complementar formada por 12 entrevistas. O
trabalho conta com o aporte da Teoria da Variação e Mudança (WEINREICH; LABOV;
HERZOG, 1968; LABOV, 1972, 1994, 2001, 2003), para determinar não só o estatuto
da regra, mas também os contextos envolvidos na realização ou não da marca de
pluralidade. Para o tratamento estatístico dos dados, utilizou-se o pacote de programas
Goldvarb-X. Realizou-se ainda, em uma subamostra com 9 informantes de Oeiras e 9
informantes de Funchal, a descrição fonética das terminações dos verbos de 3ª pessoa
do plural com baixa saliência fônica, para testar os contextos em que ocorre perda da
marca de concordância.
Considerando a totalidade dos dados, obteve-se o resultado de 2,2% de não
marcação de plural, o que indica que o fenômeno da concordância verbal no PE se
configura como uma regra semicategórica. Quantitativa e qualitativamente, os dados de
não concordância no Português Europeu – de praticamente todos os estratos sociais
controlados – são muito particulares e limitam-se a contextos muito específicos,
preferencialmente com sujeitos pospostos, com referentes inanimados, representados na
oração pelo relativo “que”, com verbos de baixa saliência fônica, inacusativos ou
copulativos, e, por vezes, influenciados pelo contexto fonético seguinte, iniciado por
som vocálico ou nasal.
Palavras-chave: Concordância verbal. Português Europeu. Sociolinguística.
BARRETO, Fernanda Villares Vianna. A concordância verbal de 3ª pessoa do plural no
Português Europeu. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa. Rio de Janeiro:
Faculdade de Letras/ UFRJ. 2013.
ABSTRACT
The objective of this paper is to describe the patterns of verbal agreement of 3rd
person plural European Portuguese in order to verify that the active rule is categorical,
semi-categorical or variable nature (cf. LABOV, 2003), taking into account oral
interviews with informants of the following locations in Portugal: Oeiras, Cacém and
Funchal.
The corpus provided by Project Patterns in African, Brazilian and European
Varieties of Portuguese (ALFAL 21), has 18 interviews in each city, organized
according to gender, education and age of each informant, plus a complementary sample
including 12 interviews. The work relies on the contribution of the Theory of Variation
and Change (WEINREICH; LABOV; HERZOG, 1968; LABOV 1972, 1994, 2001,
2003), to determine not only the status of the rule, but also the contexts involved in
making or not the plurality brand. For statistical treatment of the data, we used the
package Goldvarb-X programs. Also held, in a subsample of 9 informants from Oeiras
and 9 informants from Funchal, the phonetic description of the endings of verbs in the
3rd person plural low overhang phonics, to test the contexts in which there is loss of
concordance brand.
Considering the totality of the data, we obtained the result of 2.2% non-marking
plural, indicating that the phenomenon of verb agreement in EP is configured as a semicategorical rule. Quantitatively and qualitatively, the data of non-compliance in
European Portuguese - virtually controlled all social strata - are very private and are
limited to very specific contexts, preferably with subject after the verb, with inanimate
referents, represented in the prayer for the relative pronoun "que", with low protrusion
phonic verbs, unaccusative or copulative and sometimes influenced by the following
phonetic context, initiated by nasal or vowel sound.
Keywords: Verb agreement. European Portuguese. Sociolinguistics.
A meu pai, Celio,
o homem que me deu a vida,
ensinou-me a andar e que sei que,
se estivesse aqui, ficaria feliz em
ver que sigo caminhando.
AGRADECIMENTOS
À Professora Doutora Silvia Rodrigues Vieira, pela orientação não só durante o
mestrado, mas também durante toda a graduação. Agradeço os conhecimentos
transferidos, a paciência e compreensão, as conversas firmes e as encorajadoras.
À equipe do Projeto Padrões de concordância em variedades africanas, brasileiras e
europeias do Português (ALFAL 21), que com grande contribuição tornou esse trabalho
possível.
À Dani Coelho, pelo constante apoio, pelo carinho, amor e atenção, pelas noites mal
dormidas e pela enorme compreensão. Agradeço por ter sido sempre meu porto seguro
e, muitas vezes, meu único apoio.
À minha mãe e eterna professora, Regina, que me ensinou a falar e a tomar gosto pela
Língua. Agradeço pelo exemplo de profissional e pelas aulas inspiradoras na época do
colégio. Agradeço não só as aulas de Português, mas as aulas sobre a vida. A ela
agradeço por ter-me encorajado a começar essa etapa e também a terminá-la.
Aos meus irmãos e grandes companheiros, Carla, Renata e Bruno, pelos essenciais
momentos de descontração e por compreenderem meus muitos momentos de ausência.
A Luis, meu padrasto, que tantas vezes teve carinho e atenção de pai, pelas palavras de
força durante todo esse processo.
Aos meus amigos, em especial Marcella Vianna, Bia Mayo, Vivian Tinoco, Maurício
Alves, Pedro Monnerat, Gisela Carvalho, Pedro Dantas, Steffi Vigio e Renato Cruz, que
tantas vezes me deram palavras de apoio e compreenderam minha constante ausência.
SINOPSE
Estudo sobre a concordância verbal
de 3ª pessoa do plural na variedade
europeia do Português. Exame de
entrevistas sociolinguísticas. Uso dos
pressupostos
teórico-metodológicos
da Teoria da Variação e Mudança.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO..................................................................................................14
2. O PORTUGUÊS EUROPEU E AS ORIGENS DO PORTUGUÊS DO
BRASIL........................................................................................................19
3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA.........................................................................23
4. PRESSUPOSTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS...................................37
4.1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA........................................................37
3.1.1 O aporte sociolinguístico variacionista..........................................37
4.2 METODOLOGIA..................................................................................41
4.2.1
Descrição das localidades......................................................41
4.2.2
Caracterização do corpus.......................................................46
4.2.3
Etapas do trabalho.................................................................48
5. AS VARIÁVEIS...............................................................................................50
5.1 A VARIÁVEL DEPENDENTE...........................................................50
5.2 AS VARIÁVEIS INDEPENDENTES................................................51
5.2.1
Variáveis extralinguísticas..................................................51
5.2.1.1 Faixa etária................................................................51
5.2.1.2 Escolaridade..............................................................51
5.2.1.3 Sexo...........................................................................52
5.2.1.4 Localidade.................................................................53
5.2.2
Variáveis linguísticas...........................................................55
5.2.2.1 Posição do sujeito em relação ao verbo.....................58
5.2.2.2 Distância entre o núcleo do SN e o SV.....................60
5.2.2.3 Configuração morfossintática do SN sujeito.............61
5.2.2.4 Paralelismo no nível oracional..................................63
5.2.2.5 Animacidade do sujeito/referente..............................65
5.2.2.6 Saliência fônica.........................................................66
5.2.2.7 Tipo de verbo quanto à transitividade.......................69
5.2.2.8 Paralelismo no nível discursivo.................................71
5.2.2.9 Presença de elementos intervenientes........................72
5.2.2.10
Tempo verbal .......................................................74
6. RESULTADOS E ANÁLISE............................................................................76
6.1 Distribuição geral dos dados.................................................................76
6.2 Resultados de Oeiras e Cacém..............................................................82
6.2.1
Posição do sujeito em relação ao verbo.................................84
6.2.2
Presença do relativo que........................................................86
6.2.3
Animacidade do sujeito/referente..........................................87
6.2.4
Tipo de verbo quanto à transitividade...................................90
6.3 Resultados de Funchal...........................................................................92
6.3.1
Posição do sujeito em relação ao verbo.................................93
6.3.2
Configuração morfossintática do SN sujeito.........................96
6.3.3
Animacidade do sujeito/referente..........................................97
7. DESCRIÇÃO FONÉTICA DAS TERMINAÇÕES VERBAIS....................99
8. CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................................110
9. BIBLIOGRAFIA.............................................................................................117
ÍNDICE DE FIGURAS, GRÁFICOS, QUADROS E TABELAS
FIGURAS
Figura 1: Localização da cidade de Lisboa no mapa de Portugal................................. 43
Figura 2: Localização do Distrito da Ilha da Madeira no mapa de Portugal.................43
Figura 3: Localização do Concelho de Oeiras na cidade de Lisboa..............................44
Figura 4: Localização da freguesia de Oeiras no Concelho de Oeiras...........................44
Figura 5: Localização do Concelho de Sintra na cidade de Lisboa...............................45
Figura 6: Localização da Freguesia de Cacém no Concelho de Sintra..........................45
Figura 7: Localização do Concelho de Funchal no Distrito da Ilha da Madeira...........45
GRÁFICOS
Gráfico1: Percentuais de falta de concordância na totalidade do Corpus Concordância
(amostra básica mais complementar) em Oeiras, Cacém e Funchal...............................77
QUADROS
Quadro 1: Critérios de exclusão de dados nos estudos variacionistas sobre a
concordância verbal no PE..............................................................................................34
Quadro 2 : Estratificação do corpus de Funchal com códigos de identificação de cada
informante.......................................................................................................................46
Quadro 3: Estratificação do corpus de Cacém com códigos de identificação de cada
informante........................................................................................................................46
Quadro 4: Estratificação do corpus de Oeiras com códigos de identificação de cada
informante........................................................................................................................47
Quadro 5: Distribuição das gravações da amostra complementar com códigos de
identificação de cada informante.....................................................................................47
Quadro 6: Grupos de fatores controlados.......................................................................55
Quadro 7: Dados de não-concordância em Oeiras e Cacém..........................................82
TABELAS
Tabela 1: Características dos trabalhos sobre concordância verbal no PE: localidade,
estratificação social e porcentagem de falta de concordância obtida.............................32
Tabela 2: Distribuição dos dados de não-concordância nas três localidades do Corpus
Concordância (amostra básica).......................................................................................76
Tabela 3: Distribuição dos dados de não-concordância na totalidade do Corpus
Concordância (amostra básica mais complementar).......................................................77
Tabela 4: Índices de não concordância segundo a variável Escolaridade nas localidades
de Oeiras, Cacém e Funchal............................................................................................78
Tabela 5: Índices de não concordância segundo a variável Sexo nas localidades de
Oeiras, Cacém e Funchal.................................................................................................80
Tabela 6: Índices de não concordância segundo a variável Faixa etária nas localidades
de Oeiras, Cacém e Funchal............................................................................................81
Tabela 7: Índices de não concordância segundo a variável Posição do sujeito nas
localidade de Oeiras e Cacém..........................................................................................85
Tabela 8: Índices de não concordância segundo a variável Animacidade nas localidades
de Oeiras e Cacém...........................................................................................................89
Tabela 9: Índices de não concordância segundo a variável Escolaridade na localidade
de Funchal.......................................................................................................................93
Tabela 10: Índices de não concordância segundo a variável Sexo na localidade de
Funchal............................................................................................................................93
Tabela 11: Índices de não concordância segundo a variável Posição do sujeito na
localidade de Funchal......................................................................................................94
Tabela 12: Índices de não concordância segundo a variável Posição do sujeito na
amostra geral....................................................................................................................95
Tabela 13: Ìndices de não concordância segundo o cruzamento Tipo de verbo x Posição
do sujeito em relação ao verbo........................................................................................95
Tabela 14: Índices de não concordância segundo a variável Configuração
morfossintática do SN sujeito na localidade de Funchal................................................96
Tabela 15: Índices de não concordância segundo a variável Animacidade na localidade
de Funchal.......................................................................................................................97
Tabela 16: Índices de não concordância segundo a variável Animacidade na amostra
geral.................................................................................................................................98
Tabela 17: Regional diffusion of non-standard variants of 3PL in EP (BAZENGA,
2012 p. 14)……………………………………………………………………………...99
Tabela 18: Índices de não concordância segundo a variável Saliência fônica na amostra
geral...............................................................................................................................100
Tabela 19: Distribuição dos dados de baixa saliência fônica na subamostra de descrição
fonética de Oeiras e Funchal..........................................................................................103
Tabela 20: Índices dos tipos de ditongos padrão na subamostra de descrição fonética de
Oeiras e Funchal.....................................................................................................................104
14
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho está centrado no interesse pelo conhecimento dos padrões de
concordância do Português Europeu a partir dos pressupostos da Teoria da Variação e
Mudança. Vale ressaltar que a pesquisa está vinculada ao Projeto Estudo comparado
dos padrões de concordância em variedades africanas, brasileiras e europeias do
Português (ALFAL 21). Tal projeto, de cunho internacional, visa à comparação entre
variedades do português usadas no Brasil, na África e na Europa, tomando como foco a
concordância morfossintática.
Esta pesquisa, em particular, tem por objetivo analisar a concordância em
estruturas com sujeitos de 3ª pessoa do plural extraídos do corpus oral constituído pelo
referido
projeto.
Valendo-se
dos
recursos
metodológicos
oferecidos
pela
Sociolinguística Laboviana, pretende-se verificar se há de fato uma regra variável no
Português Europeu (doravante PE) e, se for o caso, demonstrar os fatores linguísticos e
extralinguísticos que presidem a variação.
Dentre os problemas dos quais o trabalho se ocupa, está a seguinte questão
central: a concordância verbal de 3ª pessoa plural configura na variedade europeia do
Português uma regra variável, semi-categórica ou categórica, de acordo com os
postulados de Labov (2003)?
Submetidas ao problema central formulado para a pesquisa, ao menos três outras
questões constituem objeto da investigação: (i) em que contextos, estruturais e sociais,
há cancelamento da marca de número de terceira pessoa do plural no corpus analisado?;
(ii) os contextos de não-concordância verificados são quantitativa e qualitativamente
comparáveis aos dados verificados em outras investigações sobre o fenômeno
desenvolvidos com amostras do Português do Brasil (doravante PB)?; e (iii) Quais são
as realizações fonéticas que estabelecem e oposição singular – plural? Para resolver
essas questões, a pesquisa conta com detalhada descrição dos dados coletados, além das
diferentes interpretações propostas por estudiosos brasileiros e portugueses em trabalhos
científicos sobre o tema da concordância.
O fenômeno da concordância verbal tem sido amplamente estudado com dados
brasileiros, pois “a não-realização da regra de concordância verbal, no português do
Brasil, constitui, sem dúvida, um traço de diferenciação social, de cunho
estigmatizante” (VIEIRA, 2011). No que diz respeito às variedades europeias, até onde
15
se sabe, o fenômeno não conta com os mesmos índices de não-marcação de plural do
PB. De qualquer modo, há uma carência de trabalhos variacionistas a respeito dos
padrões de concordância verbal na oralidade do PE, considerando especialmente
entrevistas semiespontâneas recentemente recolhidas. Dessa forma, justifica-se a
necessidade de atestar a concretização do fenômeno, com a finalidade de descobrir se a
regra da concordância verbal é de fato variável e em que contextos haveria o
cancelamento das marcas plurais.
Conta-se com alguns trabalhos com dados europeus mais recentes, ainda que
poucos, nos moldes variacionistas sobre o tema da concordância verbal de 3ª pessoa
plural no PE, descritos na seção de revisão bibliográfica. São eles: Varejão (2006),
Monguilhott (2009, 2010), Monte (2012), Rubio (2012), Brandão e Vieira (2012b) e
Bazenga e Vieira (2013).
A concordância verbal de terceira pessoa do plural no português
brasileiro (PB) vem sendo estudada, à luz da sociolinguística
variacionista, desde a década de 70 (...). No português europeu (PE),
estudos nos moldes labovianos já não são tão recorrentes como no PB,
embora alguns estudos sobre a concordância verbal de terceira pessoa
do plural já apontem variação (...) desde a década de 50.
(MONGUILHOTT, 2010. p. 1)
Alguns desses trabalhos, como o de Monguilhot (2009, 2010), apresentam a
questão da concordância verbal de 3ª pessoa do plural como um caso de variação no PE,
mas os últimos estudos sobre o tema, como o de Bazenga e Vieira (2013), propõem que
o fenômeno atue como semicategórico, ao menos na variedade continental do PE. Ao
que tudo indica, os contextos de cancelamento de plural no verbo não são os mesmos
para o PB e o PE. Sobre a comparação entre variedades do português (europeia,
brasileira e são-tomense), Bazenga e Vieira declaram o seguinte:
Os índices gerais permitem afirmar que as amostras do Português
Europeu, grosso modo, apresentam uma regra semicategórica de
concordância de 3ª pessoa, embora Funchal demonstre
comportamento no limite entre o semicategórico e o variável, nos
termos de Labov (2003). De outro lado, os índices de marcação de
plural nas demais variedades urbanas, tanto no Português de São
Tomé quanto no Português do Brasil, sinalizam o comportamento de
uma regra variável, com forte preferência pela concordância.
(BAZENGA; VIEIRA, 2013, p. 4)
16
Este trabalho – que fundamenta sua análise a partir do mesmo corpus estudado
por Bazenga e Vieira (2013) – particulariza-se em relação aos demais estudos por
investigar o fenômeno da concordância de 3ª pessoa do plural em amostra
contemporânea em três pontos de inquérito em Portugal, estratificada segundo a faixa
etária, a escolaridade e o sexo do informante, conforme se descreve na seção referente à
metodologia. Fica claro, desse modo, que, apesar de os trabalhos citados e devidamente
descritos na seção referente à revisão bibliográfica também se ocuparem da variedade
europeia, possuem outra configuração no que diz respeito ao corpus e/ou ao tratamento
dado.
Na realidade, o presente trabalho apresenta a mesma configuração e constitui
uma extensão do estudo recentemente publicado por Bazenga e Vieira (2013) no âmbito
do referido Projeto. Assim, aprofunda o trabalho citado e dele se diferencia nos
seguintes aspectos: (i) além da amostra básica do Corpus Concordância, analisa uma
amostra complementar, a fim de ampliar o número de dados em estudo e verificar se o
comportamento atestado se mantém ou se altera; (ii) além das variáveis linguísticas já
investigadas, acrescentam-se outros grupos de fatores que possam ter influência sobre
os padrões de concordância praticados; e (iii) apresenta, além da análise variacionista
provida pelo pacote de programas Goldvarb-X, uma descrição fonética da oposição
singular-plural em relação às desinências verbais efetivamente realizadas por falantes
portugueses.
A realização deste trabalho justifica-se pela existência de um amplo debate a
respeito das origens do Português do Brasil, considerando-se os altos índices de falta de
concordância em certas variedades. Tal debate é alimentado pela contraposição das
seguintes teses: a primeira defende a ideia de que o PB seria uma continuação do
português arcaico, tendo sofrido pequenas modificações, proposta que ficou conhecida
como tese da deriva (NARO; SCHERRE, 2007); a segunda interpreta características do
PB como decorrentes de um período de falares de base africana e/ou de uma
transmissão linguística irregular, típica de situações de contato (LUCCHESI et al.,
2009).
O desenvolvimento deste trabalho, em última instância, tem por propósito, por
meio da comparação dos resultados obtidos para o PE com os resultados amplamente
divulgados em pesquisas sobre o PB, contribuir para o debate acerca da constituição das
origens do português do Brasil, tendo em vista que os defensores da tese da deriva
17
normalmente advogam semelhança entre PB e PE no que se refere às motivações para a
não marcação de número nessas variedades.
Para cumprir os objetivos citados, a dissertação está organizada de modo a
retratar as fases de desenvolvimento da pesquisa.
No capítulo 2, referente à revisão bibliográfica, estão descritos os estudos já
realizados sobre o fenômeno da concordância verbal de 3ª pessoa do plural com dados
europeus recentes. Apresentam-se o comportamento geral do fenômeno na variedade
brasileira e uma descrição específica dos resultados obtidos nos estudos sobre a
variedade europeia com os quais se conta. O conhecimento de tais trabalhos é de
extrema importância, principalmente para a formulação das hipóteses que norteiam esta
investigação.
O capítulo 3 apresenta os pressupostos teórico-metodológicos que serviram de
base para a construção da pesquisa. Além do aporte sociolinguístico variacionista,
expõem-se, em seção particular, as visões contrastivas que formam o debate sobre a
origem da variedade brasileira do português. Na parte em que estão expostos os
procedimentos metodológicos, há a descrição do corpus e do projeto ao qual este
trabalho está atrelado, a exposição das etapas de desenvolvimento da pesquisa e também
a enumeração das construções que não foram consideradas na coleta de dados.
No capítulo 4, estão a apresentação e a exemplificação da variável dependente,
motivadora deste trabalho, além da descrição das variáveis independentes, formadas
pelos fatores de cunho social – Sexo, Escolaridade, Faixa etária e Localidade – e as
variáveis linguísticas. Apresentam-se as hipóteses que direcionaram o controle de cada
grupo de fatores, os fatores que os compõem, estando todos devidamente
exemplificados.
No capítulo 5, estão expostos e analisados os resultados obtidos para cada uma
das localidades em estudo, apontando-se o estatuto da regra no PE e a descrição do
comportamento das variáveis relevantes. Após a análise dos resultados quantitativos
obtidos, procede-se, no capítulo 6, à descrição fonética das terminações verbais
especificamente dos pares de baixa saliência fônica, a fim de contribuir com o
conhecimento morfofonológico da expressão da concordância em variedades europeias.
Por fim, no capítulo 7, estão em destaque as conclusões obtidas sobre o
fenômeno em estudo, em que são sintetizados os resultados e são feitas algumas
18
reflexões a fim de contribuir para o debate acerca da concordância na modalidade oral
da variedade europeia do Português.
19
2 O PORTUGUÊS EUROPEU E AS ORIGENS DO PORTUGUÊS DO BRASIL
O interesse em estudar o fenômeno da concordância verbal no Português
Europeu está relacionado à existência de um amplo debate a respeito das origens do
Português do Brasil, considerando-se os altos índices de falta de concordância em
algumas variedades brasileiras. Tal debate é alimentado pela defesa das seguintes teses:
(i) a de que o PB seria uma continuação do português arcaico, tendo sofrido pequenas
modificações, proposta que ficou conhecida como tese da deriva (NARO; SCHERRE,
2003); e (ii) as características do PB seriam decorrentes de um período de falares de
base crioula e/ou de uma transmissão linguística irregular, típica de situações de contato
(BAXTER; LUCCHESI, 1997; LUCCHESI, 2003; BAXTER, LUCCHESI; RIBEIRO,
2009). Dessa forma, as estruturas encontradas no PE devem ser comparadas tanto de
forma quantitativa quanto de forma qualitativa às estruturas do PB, a fim de subsidiar
uma ou outra hipótese.
Para Lucchesi (2003), tendo em vista que o PB passou por intenso contato com
línguas africanas – além das indígenas – durante séculos, muitas de suas características
estruturais seriam resultado de processos de mudança induzidos pelo contato entre
línguas. Essa situação de contato teria acontecido com uma grande população de adultos
(agentes) – na maioria das vezes falantes de línguas diferenciadas e mutuamente
ininteligíveis – que é forçada a adquirir uma segunda língua emergencialmente em
função de relações comerciais e/ou sujeição, ocorrendo, portanto, de modo consciente.
O contato entre a língua alvo e outras línguas pode resultar em uma língua
historicamente nova (um pidgin, ou ainda, uma língua crioula) ou na formação de uma
nova variedade histórica da língua que predomina na situação de contato. Essa nova
variedade, por possuir apenas função comunicativa, costuma apresentar forte
redução/simplificação em sua estrutura gramatical, o que se deve: 1) ao difícil acesso
dos falantes das outras línguas aos modelos da língua-alvo, sobretudo nas situações em
que os falantes da língua alvo são numericamente inferiores aos das demais línguas; 2)
ao fato de os falantes dessas outras línguas, por serem em sua maioria adultos, não
terem mais acesso aos dispositivos mentais da faculdade da linguagem, que atuam na
aquisição da língua materna; e 3) à ausência de uma ação normativizadora que oriente e
restrinja o processo de nativização.
20
O processo de transmissão linguística irregular, derivado da situação de contato,
acontece, segundo Lucchesi, em etapas. Inicialmente, com a prolongada situação de
contato, a variedade da língua alvo progressivamente assume novas funções na rede de
interação linguística; em seguida, converte em modelo para a aquisição como língua
materna pelas crianças (língua natural). Por necessidades funcionais, há então um
incremento da sua estrutura gramatical, ocorrendo a gramaticalização de itens lexicais
oriundos da língua alvo e a incorporação de dispositivos gramaticais das outras línguas
nessa nova variedade. No decorrer do processo, quanto menor o contato dos falantes
com a língua alvo, maior a possibilidade de formação de uma nova língua (crioula), e
quanto maior for o contato dos falantes com a língua alvo, maior a possibilidade de se
ter apenas uma variedade da língua alvo, que se torna o modelo.
Característica fundamental do processo de transmissão linguística irregular é que
a intensidade da erosão gramatical que se dá no momento inicial do contato determina a
intensidade do processo. Dessa forma, menor será a erosão, se maior for o contato com
a língua alvo, de modo que se torna menor a necessidade de recomposição da gramática;
e maior será a erosão, se menor for o contato com a língua alvo, tornando-se maior a
necessidade de recomposição da gramática.
Para Baxter e Lucchesi (2006, p. 206), os processos de transmissão linguística
irregular mais leves “marcaram profundamente a história das variedades populares do
português brasileiro”. Os autores elencam sete traços que, ainda hoje, se conservam nos
dialetos rurais e populares do país, dentre os quais está a redução/eliminação de
morfologia flexional do verbo e do nome, com consequências para os processos
sintáticos a ela relacionados.
Baxter e Lucchesi (1993, 1997) afirmam, ainda, que o fenômeno variável da
concordância, em que a variante zero é predominante em comunidades rurais afrobrasileiras isoladas, também pode ser encontrado, hoje, em todas as comunidades rurais
do Brasil.
Outro estudioso que se valeu do fenômeno da concordância para evidenciar suas
hipóteses foi Gregory Guy, que defende a ideia da crioulização prévia. Guy acredita que
o português popular brasileiro é marcado por tendências presentes nas línguas crioulas.
O autor leva em consideração o enorme contingente de escravos vindos para o Brasil.
21
Para argumentar em favor da tese da deriva, Naro e Scherre propõem que não há
estruturas novas no PB, induzidas pelo contato entre línguas ou pela nativização do
português entre os segmentos de falantes de outras línguas e seus descendentes. Todas
as estruturas alegadas como brasileiras teriam a existência confirmada em dialetos rurais
e não-padrão de Portugal. Para eles, o processo de transmissão linguística irregular não
desencadeou aqui processos novos de variação e mudança, mas apenas ampliou
fenômenos já (e ainda) existentes na variedade europeia. A variação maciça se deveria à
falta quase total de uma norma estável e geralmente aceita durante o período da
aquisição do português como primeira língua no Brasil. O que estaria relacionado à
história sociolinguística do Brasil é o espraiamento de estruturas e variações, e não a sua
criação.
Sobre o fenômeno da concordância no PE, Naro e Scherre afirmam que
A distribuição, ampla e geograficamente equilibrada, mostra que o
fenômeno não é apenas um exotismo, estranho à estrutura da língua.
(...) não sabemos qual é o nível de frequência de uso da concordância
variável (...), mas seguramente é muito mais baixo que no Brasil. A
variação na concordância representa uma deriva latente, de longo
prazo, documentada até mesmo na fase clássica do latim e das línguas
europeias que o precederam. (NARO; SCHERRE, 2003)
Scherre e Naro (2007), ao refletirem sobre a origem do PB, assumem ainda que
houve uma
CONFLUÊNCIA DE MOTIVOS: vemos a atração de forças de
diversas origens – algumas oriundas da Europa; outra da América;
outras, da África – que, juntas, se reforçaram para produzir o
português popular do Brasil. (SCHERRE; NARO, 2007 p. 25)
Sobre o debate, Mattos e Silva (2004), em tom consensual, afirma que os
africanos e afro-descendentes adquiriram a língua dos colonizadores portugueses
como L2, em um contato oral diversificado, multifacetado. Não havia a imposição
de uma norma de controle escolar e, em função disso, a “voz africana e dos afrodescendentes [...] reestruturou o português europeu que no Brasil começa a chegar em
1500 e sucessivamente ao longo do período colonial”, dessa forma ganhando força
no século XIX com a chegada de grandes contingentes de imigrantes portugueses.
Com o presente trabalho, pretende-se contribuir para o debate de modo a
esclarecer em que contextos há o cancelamento da marca de concordância no PE.
22
Seriam esses contextos os mesmos do PB? Com a vasta quantidade de dados
contemporâneos em análise, pretende-se demonstrar “o nível de frequência de uso da
concordância variável” no PE e os contextos dessa suposta variação. Desse modo, pretendese mostrar a configuração do fenômeno atualmente no PE, em termos quantitativos e
qualitativos.
23
3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Os estudos aqui descritos são alguns dos poucos com os quais se conta sobre a
análise da concordância verbal no Português Europeu contemporâneo. Os trabalhos
variacionistas a que se teve acesso foram os de Varejão (2006), Monguilhott (2009),
Monte (2012), Rubio (2012), Brandão e Vieira (2012b) e Bazenga e Vieira (2013).
Varejão (2006) analisou a concordância verbal de terceira pessoa do plural em
um corpus extraído de inquéritos coletados em Portugal, que fazem parte do Projeto
Corpus Dialetal com Anotação Sintática – CORDIAL-SIN. Teve como questão
motivadora de sua tese a dúvida se teria havido uma língua crioula na base da
estruturação do PB ou se os fenômenos variáveis estariam também no sistema do PE.
Para isso, a investigação se deu em áreas mais ou menos distantes dos grandes centros
urbanos e de vários pontos do continente português e das ilhas, pressupondo que a fala
não-urbana seria mais conservadora.
Dessa forma, a hipótese que se tinha era a de que, se o português mais
conservador apresentasse evidentes ausências de marcas de concordância verbal, a
pesquisa poderia contribuir com a argumentação de que tais estruturas não seriam
restritas ao PB, já que fariam parte do sistema da língua portuguesa, e constituiriam
fenômenos implicados em um antigo e mais geral quadro de mudança.
O corpus utilizado por Varejão contou com 120 informantes, sendo 75 homens e
45 mulheres analfabetos ou com pouca escolarização, nascidos na localidade em que
viviam. Como muitas das fichas dos informantes não estavam completas, não contendo
informações de idade e escolaridade, essas variáveis sociais não foram controladas.
Segundo a autora, partindo do objetivo de mostrar que, em relação à concordância
verbal, a fala lusitana popular e a brasileira seriam sensíveis à variação na mesma
medida de qualidade, foram descritos efetivamente os dados com ausência da marca de
concordância verbal de 3ª pessoa do plural.
Para atender aos propósitos do trabalho, foram excluídos da amostra os seguintes
casos: 1. verbos cujas formas de 3ª pessoa do singular e do plural apresentam realização
fonética idêntica ou de difícil distinção; 2. frases em que ocorre uma possível
concordância com um pronome expletivo; 3. Sequências de pergunta e resposta, nas
quais o informante repete a forma verbal da pergunta do inquiridor; 4. verbo na 3ª do
singular seguido de pronome se, ante a dupla possibilidade de interpretação sintática do
24
sujeito; e 5. sujeito com dois núcleos à direita do verbo, cuja concordância pode ocorrer
apenas com o núcleo mais próximo.
As demais ocorrências foram quantificadas segundo os seguintes grupos de
fatores: Saliência fônica da desinência verbal; Tipo de verbo; Forma verbal; Posição do
sujeito em relação ao verbo; Estrutura do SN sujeito; Estatuto sintático do verbo que
carrega as marcas de concordância.
Quanto aos resultados, do total de 2520 ocorrências, foram encontrados 223
dados com ausência da marca de plural e 2297 com marcas de concordância. Em termos
de porcentagem, a amostra apresentou aproximadamente 9% de ausência de marcas. A
autora observou que os casos de falta de concordância não estavam homogeneamente
distribuídos entre as 21 localidades em estudo. Em relação aos fatores sociais, foi
inviável quantificá-los, já que a amostra não foi estratificada segundo critérios
extralinguísticos, como escolaridade, faixa etária, dentre outros, e, além disso, as fichas
dos informantes não estavam completas, conforme já se informou.
As variáveis que se mostraram mais influenciadoras na falta de concordância
foram as seguintes: a Saliência fônica; o Tipo de verbo (verbo ser versus outros verbos);
Forma verbal; Posição do sujeito; Estrutura do SN sujeito; e Estatuto sintático do verbo
que carrega as marcas de concordância.
Em relação à saliência fônica, Varejão propõe que os dados confirmam a tese de
que o menor grau de diferenciação entre as formas verbais singular e plural favorece a
perda de marcas. Reunindo o verbo ser e outros verbos, do total de 223 dados, 128
(57%) pertenciam ao grupo da oposição menos saliente e 95 (43%) estavam entre os de
diferenciação mais saliente.
Outro fator observado foi o relativo à comparação entre o verbo ser versus
outros verbos. Em relação a essa variável, não se confirmou a hipótese de que a
presença do verbo ser estaria diretamente ligada à ausência de marcas de concordância.
Quanto à forma verbal, foram encontradas, entre os dados sem marca de
concordância, 112 ocorrências no presente, 90 no pretérito imperfeito e 21 distribuídas
entre o infinitivo e o pretérito perfeito. Dessa forma, foi possível observar que, nos
verbos no presente, houve maior perda das marcas de concordância em verbos menos
salientes, como fica/ficam, do que em formas mais salientes, como é/são. No tempo
pretérito imperfeito, foi frequente uso do verbo ser (era/eram), muito utilizado no
gênero textual descrição, que predomina nas entrevistas. Foram 58 ocorrências de
25
verbos no pretérito imperfeito contra 32 em outros tempos verbais. No pretérito
perfeito, houve apenas ocorrências com outros tipos de verbo, ficando impossibilitada a
comparação do efeito dessa forma verbal sobre os outros grupos. Já em relação ao
infinitivo, houve apenas uma ocorrência do verbo ser contra 6 de outros verbos, sempre
mais salientes.
A respeito ainda da forma verbal, foi confirmada a forte atuação da saliência
fônica, já que foi observado o fato de que as formas verbais do presente com maior
frequência de ausência de marcas estão em verbos diferentes de ser.
A variável Posição do sujeito em relação ao verbo confirmou a hipótese de que a
posição pós-verbal desfavorece a marcação da concordância. A partir dos resultados, a
autora propôs uma hierarquia na atuação do aspecto posição do sujeito, partindo da mais
favorável para a menos favorável em relação à ausência de marcas: 1. posição pósverbal, a mais favorável; 2. Sujeito expresso à esquerda próximo; 3. Sujeito plural
retomado por pronome relativo; 4. Expresso à esquerda distante; 5. Sujeito nulo com
antecedente próximo ou distante, a menos favorável.
Quanto à estrutura do SN sujeito, também foi feita uma hierarquização na ordem
de frequência da ausência de marcas de concordância nos verbos, sendo a estrutura em
que mais se faz notar essa ausência a de SN simples e a que menos apresenta a não
marcação a de sujeito constituído de núcleo mais complemento no plural.
Por fim, a partir da variável Estatuto sintático do verbo que carrega as marcas de
concordância, não se confirmou a hipótese de que o verbo ser apresente mais ausência
de marcas. Os resultados mostraram que outros tipos de verbos exibem mais ausência
de marcas, na posição principal (71%) ou na de verbo auxiliar (72%). Juntando esses
dois contextos verbais, das 223 ocorrências sem marcas de concordância, em 191 (86%)
o verbo ocupa o status de principal.
Varejão concluiu, a partir da análise dos dados, que, no PE popular, os principais
aspectos favoráveis à ausência de marcas de concordância verbal são a saliência fônica
e a posição do sujeito à direita do verbo. Além disso, a hipótese inicial de que o verbo
ser seria um aspecto interveniente no processo de perda de marcas verbais não se
confirmou, mas se evidencia ao contrapor esta variável com outras analisadas. A partir
da comparação com resultados de pesquisas realizadas sobre o PB, a autora conclui que
a ausência de marcas de concordância verbal de 3ª pessoa do plural ocorre nos mesmos
contextos tanto no PB quanto no PE popular.
26
Outro importante trabalho sobre a concordância verbal no PE é o de Monguilhott
(2009), que analisa o tema em amostras sincrônica e diacrônica. Os aportes teóricometodológicos utilizados são a Sociolinguística quantitativa e a Dialetologia
pluridimensional. Quanto à amostra sincrônica, a autora observou localidades urbanas e
não urbanas, tanto no PB (Santa Catarina) quanto no PE (Lisboa), a fim de controlar as
dimensões diatópica e diazonal. Além disso, foram também investigadas peças teatrais
de autores catarinenses e portugueses, diacronicamente.
O objetivo foi traçar o percurso histórico da variação da concordância verbal do
século XIX ao século XX. Além disso, buscou provar também que tanto o PB quanto o
PE apresentam um sistema de concordância obrigatória com sujeito posposto no século
XIX e de variação da concordância no século XX, apesar de a variação encontrar
maiores índices no PB.
Buscando verificar os contextos favorecedores para cada uma das variantes na
amostra contemporânea, foram investigados os seguintes grupos de fatores linguísticos:
1. Saliência fônica; 2. Paralelismo formal; 3. Tipo de verbo; 4. Posição do sujeito em
relação ao verbo; 5. Traço humano no sujeito; 6. Tipo de sujeito. Os grupos de fatores
extralinguísticos foram divididos entre sociais (Sexo; Idade/Escolaridade; Redes
sociais) e geográficos (Diatopia e Diazonalidade).
Com base nos resultados encontrados para o PE, identificaram-se os contextos
favorecedores da marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural: verbos
com sujeito com traço [+humano], verbos com sujeito antecedente, assim como visto no
trabalho de Varejão, verbos do tipo transitivo e intransitivo prototípico, verbos com
sujeito nulo cujo antecedente apresenta marcas de plural e verbos com sujeito do tipo
pronome pessoal.
Em relação aos resultados dos grupos de fatores extralinguísticos, geográficos e
sociais, constatou-se que, na amostra, os informantes que mostraram maior
favorecimento da marcação da concordância são os que possuem o seguinte perfil:
jovens com ensino superior, do sexo feminino, pertencentes a redes sociais bem
integradas e com muita mobilidade, moradores/nativos da Região Central, pertencentes
à zona urbana.
27
Um dos trabalhos variacionistas mais recentes sobre a concordância verbal de 3ª
pessoa do plural no Português Europeu é o de Monte (2011), que busca investigar a
variação encontrada no português falado na cidade de São Carlos, localizada no interior
de São Paulo/Brasil, e a variação encontrada no português falado em Évora, situada no
Alentejo, sul de Portugal. A pesquisa contou com 18 entrevistas entre informante e
documentador, distribuídas segundo sexo (masculino e feminino) e escolaridade (não
alfabetizados, Ensino Fundamental-EJA e Ensino Médio) para cada localidade.
Durante a coleta dos dados, para atender as finalidades da pesquisa, foram
excluídos da amostra os seguintes casos: formas verbais que no singular e no plural não
se distinguem na pronúncia; respostas em que se repete a forma verbal da pergunta feita
pelo documentador; verbo no plural com casa vazia do sujeito indeterminado; orações
com verbo ‘ter’ com valor existencial; sujeito representado pelo pronome indefinido
‘tudo’ remetendo a um SN de 3ª pessoa do plural; sujeito representado por substantivo
coletivo no singular; sujeito constituído por expressão partitiva; verbos no infinitivo
pessoal; sujeito composto quando está posposto ao verbo e com o núcleo mais próximo
no singular; e pronomes interrogativos.
Para a análise do fenômeno, foram estabelecidos os seguintes grupos de fatores
linguísticos: 1. Saliência fônica; 2. Paralelismo formal no nível oracional; 3. Posição do
sujeito/SN em relação ao verbo; 4. Traço semântico do sujeito/SN; 5. Distância entre o
sujeito/SN e o verbo em termos do número de sílabas; 6. Presença ou ausência do ‘que’
relativo ou complementizador; 7. Tipo estrutural do sujeito/SN; 8. Tipo de verbo: verbo
‘ser’ versus outros verbos. Como grupos de fatores sociais, foram usados o gênero e a
escolaridade.
Após a rodada do programa Goldvarb-X, obteve-se, para o PE, um total de 1440
ocorrências, em que apenas 100 (6,9%) traziam a variante zero de plural nos verbos. Os
grupos de fatores selecionados pelo programa em ordem de relevância foram os
seguintes: Posição do sujeito/SN em relação ao verbo, Traço semântico do sujeito/SN,
Tipo estrutural do sujeito/SN, Tipo de verbo (verbo ‘ser’ versus outros verbos),
Saliência fônica e Gênero.
A partir da análise das variáveis selecionadas pelo programa, Monte constatou
que o índice de frequência de concordância diminuiu de 95,1% para 77,4% quando o
sujeito estava posposto ao verbo, comportamento também verificado em outros
trabalhos aqui expostos.
28
Em relação ao traço semântico do sujeito/SN, os índices de marcação de plural
obtidos para sujeito com traço [+ humano / + animado] foram de 95,8% e para sujeito
com traço [- humano / - animado] de 82,4%, confirmando a hipótese de que sujeito
[animado e humano] favorece a concordância.
Quanto ao tipo estrutural do sujeito, o que obteve maior frequência de
concordância foi o pronome vocês, com 100% de marcas de plural. Em contrapartida, o
SN pleno composto obteve o menor índice de marcação de plural, 82,4%. Neste caso
foram 17 dados de SN pleno composto em que apenas 3 não possuíam a marca de
plural, sendo duas com o SN posposto e com o verbo ‘ser’, fatores que favorecem no PE
a não concordância.
O quarto grupo selecionado pelo programa Goldvarb foi o Tipo de verbo (verbo
‘ser’ versus outros verbos). Confirmou-se, com os resultados, a hipótese de que
sentenças com o verbo ‘ser’ inibem a marca explícita de plural. As sentenças com verbo
‘ser’ apresentaram 85,1% de marcação de plural e as sentenças com outros verbos
95,5%.
A Saliência fônica também se mostrou atuação relevante na concordância entre
verbo e sujeito; as chances de marcação de plural são maiores quando ocorre aumento
da saliência do material fônico na oposição singular/plural.
Apesar de os efeitos linguísticos serem mais fortes do que os sociais, a variável
Gênero também foi selecionada pelo programa, mostrando maior marcação de plural na
fala feminina. Esse foi o único estudo sociolinguístico sobre o tema que mostrou
relevância da variável gênero, o que precisa ser investigado em outros estudos com
dados europeus.
Outro recente trabalho sobre o tema aqui descrito é o de Rubio (2012). Esse
trabalho, sob a ótica da Sociolinguística Quantitativa de Labov, apresenta um estudo
comparativo da concordância verbal de primeira e de terceira pessoa do plural e o
estudo comparativo da alternância entre formas pronominais nós e a gente, em amostras
de língua falada do português brasileiro e europeu, sendo este – o que nos cabe
investigar – extraído do Corpus de Referência do Português Contemporâneo (CRPC).
As entrevistas utilizadas foram retiradas do sub-corpus oral espontâneo do CRPC e
foram coletadas por pesquisadores portugueses, entre as décadas de 1980 e 1990. Foi
utilizado para o PE um total de 133 entrevistas com duração média de 10 minutos. O
29
corpus está estratificado em faixa etária, sexo e escolaridade, mas não há equivalência
entre os estratos sociais. Há uma concentração maior de informantes na faixa etária
entre 36 e 55 anos (61 informantes), nas faixas de escolaridade 1 e 2 (45 informantes) e
no gênero masculino (68 homens e 65 mulheres).
Rubio controlou as seguintes variáveis sociais a fim de verificar a marcação de
plural em verbos de 3ª pessoa: Escolaridade, Faixa etária e Gênero. Como variáveis
linguísticas foram controladas a Posição do sujeito, o Traço semântico do referente do
sujeito, Paralelismo formal discursivo, Saliência fônica verbal, Paralelismo formal
oracional e Tipo morfológico do sujeito.
A partir da análise dos dados, o autor encontrou 93,7% de marcação de plural no
PE, apresentando, portanto, apenas 6,1% de não marcação. Dentre as variáveis
analisadas, três foram selecionadas pelo programa Goldvarb como influenciadoras na
não-marcação de plural dos verbos, sendo todas elas relacionadas ao sujeito: Posição do
sujeito, Traço semântico do referente do sujeito e Tipo estrutural do sujeito. Nenhuma
variável social foi selecionada, o que pode indicar que o fenômeno apresenta
comportamento estável nos diferentes estratos sociais.
Os resultados obtidos por Rubio evidenciaram a hipótese de que o sujeito
posposto favorece a não marcação de plural. O autor encontrou 76,8% de marcação do
plural na posição pós-verbal e 96% de marcação na posição pré-verbal (com distância
de 0 a 5 sílabas), o que confirma a hipótese de que sujeitos distantes de seus verbos ou
em posição pós-verbal desfavorecem a concordância verbal.
Em relação ao segundo grupo de fatores selecionado, Traço semântico do
sujeito, a hipótese de que sujeitos com traço [+ animado] tendem a um maior índice de
emprego de formas de 3ª pessoa do plural se confirmou, tendo como resultado 97% de
concordância com sujeitos com traço [+humano] e 86,8% de concordância com sujeitos
com traço [-animado].
O último grupo de fatores selecionado pelo programa para o PE foi Tipo
estrutural do sujeito. Houve uma discrepância considerável de quase 30 pontos
percentuais de frequência entre a categoria que apresentou a menor frequência, SNpleno nu, com 70,6% de marcação de plural, e a categoria com maior frequência,
pronome pessoal, que teve resultado quase categórico na marcação de 3ª pessoa do
plural, com 99,4 de frequência.
30
Os próximos estudos a serem aqui abordados são os que mais se assemelham à
proposta da presente pesquisa. Brandão e Vieira (2012b) abordam o tema da
concordância nominal de número e verbal de terceira pessoa do plural em variedades
urbanas do Português Europeu (Cacém), do Português do Brasil (Nova Iguaçu) e do
Português de São Tomé. Os dados utilizados na pesquisa foram, para as variedades
brasileira e europeia, do Projeto Estudo comparado dos padrões de concordância em
variedades africanas, brasileiras e europeias do Português e, para a variedade africana,
do Corpus VARPOR. Cada ponto de inquérito em questão contava com 18 entrevistas
estratificadas segundo a escolaridade, a idade e o sexo do informante.
Foram controlados grupos de fatores linguísticos e sociais para avaliar a
realização das marcas de plural. Para a concordância verbal, foram considerados a faixa
etária, a escolaridade e o sexo como variáveis sociais. Como variáveis linguísticas,
foram testados os seguintes grupos de fatores: Posição do sujeito em relação ao verbo,
Distância entre o núcleo do SN e o SV, Presença de elementos intervenientes entre o SN
sujeito e o verbo, Configuração morfossintática do SN sujeito, Paralelismo no nível
oracional (entre sujeito e verbo), Animacidade do sujeito, Saliência fônica, Tempo
verbal e Transitividade verbal.
O resultado obtido para a concordância verbal no PE, em Cacém, foi de apenas
1,1% de não marcação de plural. Das 1.515 construções de 3ª pessoa do plural apenas
17 não apresentaram marca de concordância verbal. Os 17 dados, além de um de
infinitivo pessoal, foram analisados qualitativamente e estão distribuídos da seguinte
forma: (1) sete dados de estruturas com o verbo ser em construções predicativas; (2)
cinco dados de posposição do sujeito; (3) três dados em que o suposto referente sujeito
não se encontra adjacente ao verbo; e (4) dois dados em que o referente-sujeito foi
retomado por pronome cópia.
Com a análise desses dados, as autoras chegaram à conclusão de que, em termos
quantitativos, a falta de concordância no PE configura-se um caso de regra
semicategórica (Labov, 2003) e, em termos qualitativos, a falta de concordância está
concentrada em contextos linguísticos específicos, não ocorrendo na diversidade de
contextos verificados no PB e no PST.
O mais recente trabalho sobre o tema da concordância no PE é o de Bazenga e
Vieira (2013). Utilizaram-se, na pesquisa, dados do PB, do PE e dados da África,
31
relativos a São Tomé (PST). Para a variedade brasileira, os pontos de inquérito
utilizados foram Copacabana (COP) e Nova Iguaçu (NIG). Para a variedade europeia,
utilizaram-se dois pontos da Região Metropolitana de Lisboa, Oeiras (OEI) e Cacém
(CAC), e um ponto na Ilha da Madeira, Funchal (FNC).
O aporte teórico-metodológico utilizado foi o da Sociolinguística Variacionista
(WEINREICH; LABOV; HERZOG, 1968; LABOV, 1972, 2003) e, para a
determinação do estatuto da regra linguística, a proposta de Labov (2003).
Testou-se a atuação dos seguintes grupos de fatores sociais: Faixa etária, Sexo e
Escolaridade. De natureza estrutural, controlou-se a influência dos seguintes: (i) quanto
ao sujeito: Posição em relação ao verbo, Configuração morfossintática; Distância entre
o SN sujeito e o verbo; Paralelismo entre as marcas do SN sujeito e as do verbo
(paralelismo oracional); Traço semântico (animacidade); e (ii) quanto às formas
verbais: Saliência fônica; Transitividade; Paralelismo entre as marcas dos verbos em
série (paralelismo discursivo).
Como critério de recolha, as autoras atenderam ao pressuposto de que um
enunciado pode remeter a estruturas sintáticas diferentes, concluindo que nem sempre a
aparente falta de expressão mórfica de plural constitui de fato um caso de não
concordância. Dessa forma, foram excluídas da amostra as seguintes construções:
formas verbais de 3ª pessoa plural empregadas como recurso de indeterminação;
aparentes sujeitos de 3ª pessoa plural (expresso ou nulo) que remetem a constituintes
topicalizados; construções com verbo copulativo, que podem ser interpretadas como
apresentacionais; formas verbais infinitivas, dada a frequente ambiguidade na
referência, se pessoal ou impessoal; ocorrências de “ter” e “vir” no presente do
indicativo, por serem homófonas ou de difícil reconhecimento na maior parte das
ocorrências do corpus; construções cuja determinação da forma verbal como singular
ou plural é de definição duvidosa por motivos fonético-fonológicos, além das diversas
construções com coordenação, expressões partitivas, numéricas, títulos de obras, dentre
outras, cuja interpretação possa ser singular ou plural.
Encontrou-se um total de 7063 ocorrências distribuídas da seguinte forma: 1467
em Oeiras, 1185 em Cacém, 914 em Funchal, 1395 em Copacabana, 1365 em Nova
Iguaçu e 737 em São Tomé. A porcentagem de casos sem marca de número em cada
localidade foi: 0,9 em Oeiras; 0,8 em Cacém; 5,3 em Funchal; 7,9 em São Tomé; 11,9
em Copacabana; 21,8 em Nova Iguaçu.
32
Com os resultados obtidos, as autoras definem o PE como um caso de regra
semicategórica de concordância de 3ª pessoa, embora admitam que Funchal apresente
comportamento no limite entre o semicategórico e o variável, nos termos de Labov
(2003). Como os resultados da seleção estatística no PE não permitiram estabelecer a
lista de grupos de fatores relevantes, dada a limitada concretização da não concordância,
partiu-se para uma análise detalhada dos contextos em que não se concretizou a masca
de plural e, especificamente em Funchal, de alguns índices percentuais.
As autoras listam as estruturas mais comuns encontradas sem a marcação de
plural: (i) estruturas do tipo V SN compostas em sua maioria por verbos inacusativos;
(ii) presença de sujeitos com traço semântico [- animado]; (iii) presença de verbo
seguido de um fone (consoante nasal; vogal) que pode alterar a qualidade vocálica final
do verbo e não se configurar, possivelmente, uma forma verbal idêntica à do singular.
Concluiu-se com o estudo que o PE não partilha o mesmo perfil quantitativo
nem qualitativo do PB vernacular. Os contextos em que se constatou a suposta falta de
concordância no PE nada podem revelar do estatuto social dessa variedade.
Para melhor compreensão dos resultados dos trabalhos aqui expostos, foi
elaborada uma tabela com as características principais de cada trabalho e o percentual
de falta de concordância encontrado.
Variedade
Características sociais
Percentual
marcação
Portugal
Escolaridade: nula e até 4
P. popular
anos de escolarização
(Varejão, 2006)
Faixa etária: 18 a 35, 36 a
8%
55 e mais de 56 anos
Gênero:
masculino
e
feminino
Lisboa – PT
Escolaridade: fundamental
(Monguilhott, 2010)
e superior
9%
Faixa etária: 15 a 36, 45 a
76 anos
Gênero:
masculino
e
de
não
33
feminino
Évora – PT
Escolaridade: nula, Ensino
(Monte, 2012)
Fundamental-EJA e Ensino
Médio
Faixa
6,9%
etária:
não
controlada
Gênero:
masculino
e
feminino
Portugal
Escolaridade: 1 a 4, 5 a 8, 9
CRPC
a 11 e + de 12 anos
(Rubio, 2012)
Faixa etária: 16 a 25, 26 a
6,1%
35, 36 a 55 e + de 55 anos
Gênero:
masculino
e
feminino
Cacém – PT
Escolaridade: fundamental,
(Brandão e Vieira, 2012)
médio e superior
Faixa etária: 18 a 35, 36 a 1,1%
55, 56 a 70
Gênero:
masculino
e
feminino
Cacém
Escolaridade: fundamental, 0,8%
Oeiras
médio e superior
Funchal
Faixa etária: 18 a 35, 36 a 5,3%
(Bazenga e Vieira, 2013)
55, 56 a 70
Gênero:
masculino
0,9%
e
feminino
Tabela 1: Características dos trabalhos sobre concordância verbal no PE: localidade,
estratificação social e porcentagem de falta de concordância obtida.
É possível traçar semelhanças e diferenças entre os estudos descritos. Para
entender os índices e os contextos em que ocorre a falta de concordância no PE, é
necessário ver o perfil do corpus utilizado por cada estudo. Os perfis sociais dos
34
informantes de cada pesquisa são diversificados, visto que em alguns estudos, como o
de Varejão (2006) e o de Monte (2012), não há um preciso controle da variável faixa
etária, por exemplo. Esses trabalhos avaliam também a fala de indivíduos analfabetos, o
que não ocorre nos demais. Além disso, é preciso atentar para o fato de que os estudos
de Varejão (2006) e Rubio (2012) analisam sobretudo a fala de indivíduos em áreas não
urbanas, ao passo que Monguilhott (2009, 2010), Monte (2012), Brandão e Vieira
(2012b) e Bazenga e Vieira (2013) contemplam o falar de regiões urbanas,
exclusivamente ou não.
Outra importante observação a ser feita é sobre os critérios de exclusão de dados
utilizados por cada autor. Com base no quadro utilizado por Bazenga e Vieira (2013, p.
27), elaborou-se o quadro abaixo, que mostra os contextos estruturais excluídos de cada
pesquisa.
Contexto estrutural excluído da coleta de dados
Verbos na 3ª pessoa plural em contextos de
indeterminação do sujeito
Estrutura tradicionalmente chamada de passiva sintética
Estudo
sociolinguístico
Monguilhott (2010)
Monte
(2012)
Rubio
(2012)
Bazenga e
Vieira
(2013)
Monguilhott
(2010) Varejão
(2006)
Bazenga e
Vieira (2013)
Concordância semântica com nome singular (o pessoal)
Monguilhott
(2010)
Monte (2012)
35
Formas verbais homófonas do tipo tem/têm
Respostas em que se repete a forma verbal da pergunta
feita pelo documentador
Monte
(2012)
Varejão
(2006)
Rubio
(2012)
Bazenga e
Vieira
(2013)
Monte
(2012)
Varejão
(2006)
Orações com verbo ‘ter’ com valor existencial
Monte (2012)
Sujeito representado pelo pronome indefinido ‘tudo’
remetendo a um SN de 3ª pessoa do plural (os filhos e o
marido é tudo Benfica)
Monte (2012)
Sujeito constituído por expressão partitiva
Monte (2012)
Bazenga e Vieira (2013)
Verbos no infinitivo pessoal
Monte (2012)
Bazenga e Vieira (2013)
Sujeito composto e posposto ao verbo com o núcleo mais
próximo no singular (morreu a senhora e o patrão)
Monte
(2012)
Varejão
(2006)
Sujeito do tipo pronomes interrogativos
Monte (2012)
Frases em que ocorre uma possível concordância com um
pronome expletivo, do tipo ele falta-me umas peças ...
Varejão (2006)
36
Aparentes sujeitos de 3ª pessoa plural (expresso ou nulo)
que remetem a constituintes topicalizados
Bazenga e Vieira (2013)
Construções com verbo copulativo, que podem ser
interpretadas como apresentacionais
Bazenga e Vieira (2013)
Construções cuja determinação da forma verbal como
singular ou plural é de definição duvidosa por motivos
fonético-fonológicos
Bazenga e Vieira (2013)
Quadro 1: Critérios de exclusão de dados nos estudos variacionistas sobre a
concordância verbal no PE
Os trabalhos que apresentam maior detalhamento quanto aos critérios de recolha
de dados são os de Monte (2012) e Bazenga e Vieira (2013). Certamente, se a recolha
tivesse sido mais criteriosa nos outros estudos, os índices de marcação de plural no
verbo seriam maiores do que os obtidos. A questão é que, como dizem Bazenga e Vieira
(2013, p. 28), “há estruturas interpretadas como variáveis em um estudo, e não variáveis
em outro.”
Em relação aos grupos de fatores investigados, de forma geral, os estudos
mostram que o controle de variáveis como a configuração morfossintática do SN
sujeito, a animacidade do sujeito e o tipo de verbo é importante para a caracterização do
fenômeno, mas, sem dúvida alguma, a variável que se mostrou relevante em todas as
pesquisas foi a posição do sujeito em relação ao verbo, sempre mostrando a posição
pós-verbal como desfavorecedora da marcação de plural no verbo.
De modo geral, observadas as ressalvas feitas quanto à coleta de dados, os
estudos vêm apontando – ainda que tratem o fenômeno como variável - uma regra de
concordância bastante controlada no PE, em que a não-marcação de número se dá em
contextos bastante específicos.
37
4 PRESSUPOSTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
4.1 Fundamentação teórica
4.1.1 O aporte sociolinguístico variacionista
O trabalho apresentado tem como base a Teoria da Variação e Mudança (cf.
WEINREICH; LABOV; HERZOG, 1968; LABOV, 1972a, 1972b, 1994, 2003),
conhecida
também
como
Sociolinguística
Quantitativa
ou
Sociolinguística
Variacionista. Esse aporte teórico-metodológico parte do pressuposto de que a variação
é inerente à língua e não ocorre aleatoriamente, podendo ser sistematizada e
desencadear ou não uma mudança linguística. Essa abordagem científica tem como foco
a relação entre língua e sociedade, permitindo, para uma melhor compreensão da
concordância verbal – a variável dependente em questão –, observar os possíveis
condicionamentos linguísticos e extralinguísticos – as variáveis independentes – que a
motivam ou restringem.
Para investigar um determinado fato linguístico segundo a perspectiva variacionista,
é necessário atender a algumas exigências: as variantes devem ocorrer no mesmo
contexto e com o mesmo valor de verdade. Durante algum tempo, estudiosos
defenderam a aplicação da teoria apenas em estudos fonológicos, visto que, nesse caso,
são indubitavelmente atendidas as referidas exigências. Ocorre que, desde o início, o
Brasil já mostrou produtiva aplicação do modelo variacionista ao estudo de fenômenos
de outros níveis linguísticos, como o morfológico, sintático e semântico. Os estudos
sociolinguísticos levam em consideração fenômenos que apresentem formas alternantes
com o mesmo valor referencial ou, ao menos, a mesma comparabilidade funcional.
Paredes da Silva apresenta o que foi dito por Silva-Corvalán (1986) a respeito da
abertura do tratamento variacionista para outros níveis linguísticos que não só o
fonológico:
Segundo Silva-Corvalán (1986), o sucesso dos estudos de variação
fonológica de orientação laboviana motivou os sociolinguistas a
aplicar os mesmos métodos e técnicas à análise de casos de variação
na sintaxe. Parecia, à primeira vista, uma evolução natural na
aplicação do modelo. Se se encontra variação sistemática e
38
quantificável no campo da fonologia, por que não estender sua
procura à sintaxe, à semântica e até ao discurso?
(PAREDES DA SILVA, 2008, p.68)
Assim, a Sociolinguística mostra ser estruturado o aparente “caos” linguístico,
formado pelo confronto entre variantes linguísticas (duas ou mais maneiras de se dizer a
mesma coisa) motivado por variáveis linguísticas e extralinguísticas. Essas variáveis
refletem o ponto de partida de que se vale a Teoria, que é a relação entre língua e
sociedade. Essa relação era defendida pelos estruturalistas nas décadas de 20 e 30, sob
outra perspectiva, mas foi abandonada pela escola gerativo-transformacional,
especialmente em seus primeiros modelos. Para Chomsky (1965), o objeto dos estudos
linguísticos é o falante-ouvinte ideal, inserido em uma comunidade linguisticamente
homogênea. Já o objeto da Sociolinguística é a comunidade de fala, cuja
heterogeneidade linguística e social apresenta sistematicidade.
O marco inicial da sociolinguística é a obra de Weinreich, Labov e Herzog
(1968), em que se propõe o princípio da heterogeneidade ordenada. Constitui tarefa da
área, segundo os autores, resolver os chamados “problemas da mudança”, que são: a
restrição, em que se avalia que condições favorecem ou restringem as mudanças; a
transição, que tem por fim avaliar através de que percurso a mudança se realiza; o
encaixamento, que mostra como a mudança está encaixada na estrutura linguística e na
estrutura social; a avaliação, que determina em que medida a avaliação subjetiva do
indivíduo frente às variantes pode interferir no processo de mudança; e, por fim, a
implementação, que analisa o motivo de uma determinada mudança ocorrer em um
determinado lugar e um momento e não em outro lugar e outro momento.
William Labov, em vasta obra (1972, 1994, 2003, dentre outros), é considerado
o orientador dos trabalhos que se valem do tratamento da variação, por mais que não
tenha sido o primeiro sociolinguista, em termos latos, no cenário da investigação
linguística. Foi a obra de Labov que voltou a insistir na relação entre língua e sociedade
e na possibilidade de sistematização da variação existente na língua falada. O modelo de
análise proposto por ele é chamado de “sociolinguística quantitativa”, pois utiliza
sistematicamente índices quantitativos e tratamento estatístico dos dados.
Toda comunidade de fala, em que são frequentes as formas linguísticas em
variação, chamadas de variantes linguísticas, pode ser caracterizada segundo os usos
dessas formas e as avaliações que delas fazem seus usuários. Segundo Labov,
39
A comunidade de fala não é definida por nenhuma concordância
marcada no uso dos elementos linguísticos, mas sim pela participação
num conjunto de normas compartilhadas; estas normas podem ser
observadas em tipos de comportamento avaliativo explícito e pela
uniformidade de padrões abstratos de variação que são invariantes no
tocante a níveis particulares de uso. De igual modo, por meio de
observações do comportamento linguístico, é possível fazer estudos
detalhados da estrutura de estratificação de classe numa dada
comunidade. Verificamos que existem algumas variáveis linguísticas
correlacionadas com uma medida abstrata de posição de classe social,
derivada de uma combinação de vários indicadores não-isomórficos,
em que nenhuma medida única, menos abstrata, vai gerar correlações
igualmente boas.
(LABOV, 1972, p. 150)
As referidas variantes são, como já foi dito, as diversas formas alternativas que
configuram um fenômeno variável. Um conjunto de variantes forma uma variável
linguística, chamada, para fins de tratamento estatístico, de variável dependente. A
concordância entre o verbo e o sujeito constitui uma variável linguística (ou um
fenômeno variável), pois se realiza através de duas variantes, duas alternativas possíveis
e semanticamente equivalentes: a marca de concordância no verbo ou a ausência da
marca de concordância.
A variável é tida como dependente no sentido de que o emprego das variantes
não é aleatório, mas influenciado pelas variáveis independentes, que são os grupos de
fatores de natureza social ou estrutural. Dessa forma, as variáveis independentes ou
grupos de fatores podem ser de natureza interna ou externa à língua e podem ter
influência sobre seus usos, aumentando ou diminuindo sua frequência de ocorrência. Os
grupos de fatores são os parâmetros reguladores dos fenômenos variáveis,
condicionando positiva ou negativamente o emprego das formas variantes. As variantes
podem permanecer estáveis no sistema (continua havendo alternância no uso das formas
variantes) durante um período curto de tempo ou até por séculos, ou uma das formas
pode desaparecer, fenômeno que é chamado de mudança linguística.
É a Sociolinguística que investiga o grau de estabilidade ou de mutabilidade da
variação, diagnostica as variáveis que têm efeito positivo ou negativo sobre a
emergência dos usos linguísticos em alternância e prevê seu comportamento regular e
sistemático. A variação e a mudança são, portanto, contextualizadas. É importante
ressaltar que os condicionamentos que concorrem para o emprego das formas variantes
40
são muitos, agem simultaneamente e emergem de dentro ou de fora do sistema
linguístico.
As variáveis linguísticas podem ser de natureza fono-morfo-sintática, semântica,
discursiva e lexical. No conjunto de variáveis externas à língua, estão os fatores
inerentes ao indivíduo (como etnia e sexo), os propriamente sociais (como escolaridade,
nível de renda, classe social e profissão) e os contextuais (como o grau de formalidade
discursiva e tensão discursiva). O presente trabalho utiliza como variáveis
extralinguísticas a Faixa etária, a Escolaridade, o Sexo e a Localidade a que pertence o
indivíduo.
É necessário atentar para o fato de que “as variáveis, tanto linguísticas quanto
não-linguísticas, não agem isoladamente, mas operam num conjunto complexo de
correlações que inibem ou favorecem o emprego de formas variantes semanticamente
equivalentes” (MOLLICA, 2008, p. 27). O nível de escolarização elevado, por exemplo,
contribui para o aumento na fala e na escrita das variantes prestigiadas. No caso da
variável Localidade, pode influenciar no fenômeno o fato de ser uma zona com
características mais urbanas ou mais rurais.
Antes mesmo da descrição do comportamento das variáveis sociais, alguns
questionamentos, baseados em conclusões de avançados estudos que correlacionam as
variáveis Sexo, Idade e Escolaridade, devem ser feitos sobre a discussão acerca de um
efeito padronizado desses grupos de fatores. São elas: a) o grau avançado de
escolarização concorre para um comportamento linguístico ajustado ao padrão
considerado culto? b) o sexo feminino é mais conservador do ponto de vista da norma
considerada culta? Esses e outros pontos são problematizados quando correlacionamos
variáveis sociais a fenômenos de variação.
Este trabalho está pautado também nos postulados de Labov (2003), segundo o
qual existe uma tipologia de regras em que se encaixaria cada fenômeno,
caracterizando-o como uma regra variável, semicategórica ou categórica.
A regra de Tipo I é a regra categórica, que opera com 100% de frequência, não
havendo nenhuma violação no discurso natural. As regras categóricas existem em todas
as formas de comportamento social, mas são extremamente difíceis de serem
naturalmente detectadas, porque elas nunca são violadas e ninguém pensa sobre elas.
Linguistas têm descoberto e formulado regras desse tipo por muitos séculos. Segundo
Labov, são elas que formam a “espinha dorsal” da estrutura linguística.
41
A regra de Tipo II, chamada semicategórica, é a que demonstra raras e
reportáveis violações; são as regras que são geralmente ensinadas na escolas. Segundo
Labov, as regras semicategóricas são comumente encontradas no início ou no fim de
uma mudança linguística em progresso1, na qual a forma é rara o suficiente para ser
notada sempre que ocorre. Esse tipo de regra opera com frequência entre 95% e 99%.
A regra de Tipo III, regra variável, que opera com frequência entre 5% e 95%,
apresenta violações não reportáveis2, pois ocorre de maneira natural em cada
comunidade de fala.
É a partir dessa terminologia proposta por Labov (2003) que analisaremos o
fenômeno da concordância verbal de 3ª pessoa do plural no Português Europeu, que, em
princípio, parece apresentar um tipo de regra distinto do referente ao Português do
Brasil.
4.2 Metodologia
4.2.1 Descrição das localidades
Utilizou-se para este estudo o corpus constituído pelo projeto bilateral Estudo
comparado dos padrões de concordância em variedades africanas, brasileiras e
europeias, que conta com entrevistas de orientação sociolinguística. O projeto
anteriormente vinculado à CAPES e, atualmente, configurado como Projeto ALFAL 21,
visa à comparação entre variedades do Português presentes no Brasil, em Portugal e na
África. No Brasil, o projeto está integrado ao Programa de Pós-graduação em Letras
Vernáculas da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro e, em
1
Ao que tudo indica, conforme demonstra a própria análise da concordância aqui apresentada, nem
sempre o comportamento semicategórico se vincula a um fenômeno em mudança, hipótese que
necessita de aprofundamento para melhor compreensão.
2
A generalização feita por Labov a respeito da regra de Tipo III talvez não se aplique a todos os
fenômenos, como é o caso da concordância verbal, visto que a não realização da marca de plural no
verbo sofre estigma. Desse modo, o fato de a violação ser reportável ou não dependeria do estatuto da
variável.
42
Portugal, ao Grupo Fontes, conhecimento e modelização em Linguística, do Centro de
Linguística da Universidade de Lisboa (CLUL).
Segundo a elaboração do referido projeto, ao comparar as três variedades do
português citadas (África, Brasil e Europa) no que diz respeito a uma questão central
das gramáticas, busca-se estabelecer padrões variáveis de concordância, “associando-os
a variedades e subvariedades (desde o standard até outras variedades dialetais), dessa
forma contribuindo para determinar diferentes gramáticas em co-existência e em
concorrência,
em
cada
espaço
geográfico
onde
se
fala
português.”
(www.letras.ufrj.br/concordancia)
Comparando o PB com o PE e com o português de África
(PA), o projeto busca construir um quadro comparativo global que
permita:
(i)
traçar, do ponto de vista geográfico, intercontinental, isoglossas
de padrões de concordância (marcando a diferenciação e os continua
linguísticos);
(ii) determinar tendências de mudança linguística em curso ou que
se anunciam, através da análise de cada variedade e da comparação
entre variedades;
(iii) pôr hipóteses ou testar hipóteses prévias sobre a origem das
diferenças observadas, tendo em conta a história do português; e
(iv) testar hipóteses explicativas do conjunto dos fenômenos
observados, à luz dos princípios subjacentes a todas as gramáticas e
dos parâmetros específicos a subconjuntos de gramáticas
(www.letras.ufrj.br/concordancia)
Este trabalho, especificamente, utilizou as entrevistas realizadas em três
localidades distintas de Portugal, sendo estas Oeiras/Lisboa, Cacém e Funchal. As duas
primeiras localizam-se na porção continental do referido país, mais especificamente na
cidade de Lisboa, e a última, na porção insular, sendo a capital da Ilha da Madeira.
43
Figura 1: Localização da cidade de Lisboa
Figura 2: Localização do Distrito da
no mapa de Portugal3
Ilha da Madeira no mapa de Portugal
Oeiras é a sede do Concelho de Oeiras, composto por dez freguesias. Localiza-se
a 14 quilômetros de Lisboa, situando-se na margem direita do Rio Tejo. O Concelho de
Oeiras, por possuir localização privilegiada junto a Lisboa e também devido à dinâmica
de desenvolvimento, abriga hoje Parques de Tecnologia, com algumas (poucas)
atividades agrícolas e atividades industriais. Com o crescimento de seu território com
características marcadamente urbanas, constitui hoje um dos principais polos de
desenvolvimento da Área Metropolitana de Lisboa e do país.
Segundo a Câmara Municipal de Oeiras4, o Concelho de Oeiras é hoje detentor
dos seguintes indicadores: é o maior rendimento per capita em nível nacional; o 2º
maior poder de compra per capita de Portugal; o 2º maior Concelho na arrecadação de
impostos; possui a maior concentração de empresas de base tecnológica no país; maior
concentração de licenciados e doutorados no país; possui cinco estabelecimentos de
Ensino Superior; 26% da população com Ensino Superior – a mais alta taxa do país; e
possui a mais baixa taxa de desemprego da Área metropolitana de Lisboa. Com isso,
caracteriza-se por ser povoado por pessoas de alto poder aquisitivo e nível sociocultural
elevado. É o local onde estão presentes importantes institutos de pesquisa científica e
grandes empresas multinacionais, como Samsung, Peugeot, Nestlé, Fiat, General
Motors, Laboratórios Pfizer, L’oreal e Tetra Pak.
3
Fonte: www.ine.pt
4
Dados disponíveis no site da Câmara Municipal de Oeiras <http://www.cm-oeiras.pt>
44
Nas figuras abaixo, é possível localizar o Concelho de Oeiras, localizado na
cidade de Lisboa, e a freguesia de Oeiras, localizada no Concelho de Oeiras.
Figura 3: Localização do Concelho
de Oeiras na cidade de Lisboa
Figura 4: Localização da freguesia de
Oeiras no Concelho de Oeiras
Cacém é a maior freguesia pertencente à cidade de Agualva-Cacém, sendo esta
composta também pelas freguesias de Agualva, Mira Sintra e São Marcos. A cidade
Agualva-Cacém está localizada no Concelho de Sintra. Sintra, classificada pela
UNESCO como Paisagem Cultural e Patrimônio da Humanidade5, é marcada pela
passagem de muitos povos e culturas ao longo dos tempos. Cacém ainda abriga grande
concentração de imigrantes, sobretudo das ex-colônias africanas: Angola, Guiné, Cabo
Verde e outras. Devido ao grande crescimento populacional, toda a cidade de AgualvaCacém enfrenta problemas de cunho ambiental e urbanístico.
A população de Cacém possui menor poder aquisitivo e nível sócio-cultural
também inferior e, devido aos preços mais baixos das moradias, muitos moradores
optam por viver em Cacém, ainda que trabalhem em Lisboa ou em outra região de
Sintra. Como há grande facilidade de acesso ao sistema de trens urbanos, os moradores
de Cacém saem para trabalhar de manhã e só retornam à noite para dormir. Dessa
forma, Cacém apresenta características de “bairro-dormitório”.
Nas imagens abaixo, estão expostos o Concelho de Sintra, também localizado na
cidade de Lisboa, e a freguesia de Cacém, pertencente ao Concelho de Sintra.
5
Dados disponíveis no site da Câmara Municipal de Sintra <http://www.cm-sintra.pt>
45
Figura 5: Localização do Concelho
Figura 6: Localização da Freguesia de
de Sintra na cidade de Lisboa
Cacém no Concelho de Sintra
Por fim, Funchal, capital da Região Autônoma da Madeira, é o principal núcleo
populacional do Arquipélago. Por possuir o melhor porto, clima ameno e excelente
posição geográfica na costa sul (a mais produtiva da ilha), rapidamente teve um
fulgurante desenvolvimento urbano. Nessas condições, foi local de passagem das rotas
comerciais portuguesas, o que até hoje gera a grande circulação de comerciantes de
diversas localidades. Ao longo do século XIX, a Ilha da Madeira e, mais
especificamente, Funchal transformaram-se em mitos românticos europeus, fazendo que
a ilha recebesse a visita de grandes personalidades como rainha, imperadores e
princesas. Desde então e principalmente após a instalação do Porto do Funchal e do
Aeroporto de Santa Catarina, Funchal tornou-se um centro de turismo internacional,
atividade essa que sustenta sua economia atualmente.
Figura 7: Localização do Concelho de Funchal no Distrito da Ilha da Madeira
46
4.2.2 Caracterização do corpus
A amostra principal da qual se valeu este trabalho está composta por 54
transcrições de gravações de entrevistas de modelo sociolinguístico, sendo 18
informantes de cada uma das três localidades acima descritas. Os 18 informantes estão
organizados de acordo com as seguintes características sociais: sexo (masculino e
feminino); escolaridade (Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Superior); e faixa
etária (faixa A - 18 a 35 anos; faixa B - 36 a 55 anos; faixa C - 56 a 75 anos).
Os quadros abaixo mostram a organização do corpus e o código usado ao
decorrer do trabalho para indicar a que informante pertence cada exemplo.
Nível 1 de instrução
Nível 2 de instrução
Nível 3 de instrução
Idade / Sexo
Homem
Mulher
Homem
Mulher
Homem
Mulher
Faixa A
FNC A1H
FNC A1M
FNC A2H
FNC A2M
FNC A3H
FNC A3M
Faixa B
FNC B1H
FNC B1M
FNC B2H
FNC B2M
FNC B3H
FNC B3M
Faixa C
FNC C1H
FNC C1M
FNC C2H
FNC C2M
FNC C3H
FNC C3M
Escolaridade /
Quadro 2 : Estratificação do corpus de Funchal com códigos de identificação de cada
informante.
Escolaridade /
Idade / Sexo
Nível 1 de instrução
Nível 2 de instrução
Nível 3 de instrução
Homem
Homem
Homem
Mulher
Mulher
Mulher
Faixa A
CAC A1H CAC A1M CAC A2H CAC A2M CAC A3H CAC A3M
Faixa B
CAC B1H CAC B1M CAC B2H CAC B2M CAC B3H CAC B3M
Faixa C
CAC C1H CAC C1M CAC C2H CAC C2M CAC C3H CAC C3M
Quadro 3: Estratificação do corpus de Cacém com códigos de identificação de cada
informante.
47
Nível 1 de instrução
Nível 2 de instrução
Nível 3 de instrução
Idade / Sexo
Homem
Mulher
Homem
Mulher
Homem
Mulher
Faixa A
OEI A1H
OEI A1M
OEI A2H
OEI A2M
OEI A3H
OEI A3M
Faixa B
OEI B1H
OEI B1M
OEI B2H
OEI B2M
OEI B3H
OEI B3M
Faixa C
OEI C1H
OEI C1M
OEI C2H
OEI C2M
OEI C3H
OEI C3M
Escolaridade /
Quadro 4: Estratificação do corpus de Oeiras com códigos de identificação de cada
informante.
Além da amostra principal, utilizou-se também a amostra complementar
disponibilizada pelo Projeto, com a finalidade de expandir o número de dados e ter
resultados mais consistentes. Essa amostra complementar está composta por outras
entrevistas que não fazem parte da amostra básica pelo fato de já haver algum outro
informante que atendesse ao perfil desejado ou porque o informante não foi considerado
ideal por diversos fatores como: o informante nasceu em outra região e se mudou para a
localidade estudada quando era criança ou o informante era muito tímido e o tempo de
gravação acabou ficando inferior aos 30 minutos estabelecidos como tempo mínimo.
Escolaridade/Idade
NÍVEL 1
NÍVEL 2
NÍVEL 3
FAIXA A
CAC A1M c
CAC A2H c
FNC A3H c
FNC A2M c
FNC A3M c
FAIXA B
FAIXA C
OEI B1M c
OEI B2H c
FNC B2H c
OEI B3M c
------
------
CAC C1H c
FNC C1H c
FNC C1M c
Quadro 5: Distribuição das gravações da amostra complementar com códigos de
identificação de cada informante.
48
É importante salientar, ainda, os contextos considerados variáveis para a coleta
das ocorrências de verbos ligados a sujeitos de 3ª pessoa plural. Este trabalho, assim
como os outros no âmbito do Projeto, assume o pressuposto de que “um enunciado
pode remeter a estruturas sintáticas diferentes, o que implica assumir que nem sempre a
aparente falta de expressão mórfica de plural constitui efetivamente um caso de não
concordância” (BAZENGA; VIEIRA, 2013, p. 3). Nesse sentido, não compõem o
conjunto de dados as seguintes construções:
a) formas verbais de 3ª pessoa plural empregadas como recurso de indeterminação;
b) aparentes sujeitos de 3ª pessoa plural (expresso ou nulo) que remetem a
constituintes topicalizados;
c) construções com verbo copulativo, que podem ser interpretadas como
apresentacionais;
d) formas verbais infinitivas, dada a frequente ambiguidade na referência, se
pessoal ou impessoal;
e) ocorrências de “ter” e “vir” no presente do indicativo, por serem homófonas
ou de difícil reconhecimento na maior parte das ocorrências do corpus;
f) construções cuja determinação da forma verbal como singular ou plural é de
definição duvidosa por motivos fonético-fonológicos, além das diversas
construções com coordenação, expressões partitivas, numéricas, títulos de
obras, dentre outras, cuja interpretação possa ser singular ou plural.
4.2.3 Etapas do trabalho
A seguir, estão enumeradas as etapas metodológicas realizadas para a
concretização do presente trabalho.
a) Leitura da bibliografia que norteia a fundamentação teórica e a revisão
bibliográfica do trabalho apresentado.
49
b) Coleta de dados com sujeito de 3ª pessoa do plural da amostra básica.
c) Levantamento das possíveis variáveis linguísticas influenciadoras no fenômeno
em questão.
d) Codificação dos dados, segundo variáveis linguísticas e sociais.
e) Tratamento computacional dos dados com o pacote de programas GOLDVARBX.6
f) Coleta de dados com sujeito de 3ª pessoa do plural da amostra complementar.
g) Codificação dos dados, segundo as mesmas variáveis linguísticas e sociais.
h) Tratamento computacional dos dados da amostra completa (básica +
complementar) com o pacote de programas GOLDVARB-X.
i) Sistematização e interpretação dos resultados.
j)
Transcrição fonética das desinências finais dos verbos com baixa saliência
fônica considerando uma subamostra de entrevistas, composta pelos 9
informantes do sexo masculino de Funchal mais 9 de Oeiras.
k) Sistematização e interpretação dos resultados fonéticos.
l)
6
Redação do texto.
A Sociolinguística Variacionista ou Sociolinguística Quantitativa, como o próprio nome diz, prevê
tratamento estatístico dos dados. O GoldVarb-X é a ferramenta de análise multivariada utilizada para
analisar dados de variação sociolinguística. O programa indica os grupos de fatores significativos ao
fenômeno em ordem de relevância, apontando o peso relativo de cada fator em relação a uma das
variantes da variável dependente, aquela eleita como valor de aplicação. É preciso, porém, que o
pesquisador utilize a ferramenta de forma a auxiliar sua análise, que deve partir de hipóteses linguísticas
baseadas em teorias consistentes.
50
5 AS VARIÁVEIS
Faz-se necessária a descrição dos grupos de fatores, tanto de cunho social quanto
de cunho linguístico, que foram controlados e analisados neste trabalho com a
finalidade de mostrar os contextos que (des-)favorecem a marcação da concordância.
5.1 A variável dependente
A variável dependente, motivo desta pesquisa, constitui um grupo binário –
ausência ou presença da marca de plural de 3ª pessoa no sintagma verbal.
 concordância
(1) por exemplo se eu fosse sair à noite os meus pais mandavam estar por exemplo
à meia noite em casa (OEI A1H)
 não-concordância
(2) acho que não e acho que as pessoas ainda nem sequer estão a pensar nisso –
7
falou-se nisso quando foi aprovado e acabou - saiu algumas gramáticas
alteradas mas ninguém está a usar nada – acho que a grande complicação é por
exemplo quando chegamos à altura dos nossos filhos (OEI A3M)
7
Nas transcrições das entrevistas foram utilizados os seguintes códigos:
Pausa breve: Pausa longa: –
Pausas preenchidas: ah eh mmh
Hipótese do que se ouviu: /hipótese/
Incompreensão de palavras ou segmentos: ( )
Comentários do transcritor: (( ))
Interrogação: ?
Exclamação: !
Superposição, simultaneidade de vozes: Sublinham-se as duas falas sobrepostas
51
5.2 As variáveis independentes
5.2.1 Variáveis extralinguísticas
5.2.1.1 Faixa etária
A variável Faixa etária foi controlada com a intenção de testar o grau de
conservadorismo ou de inovação na fala dos portugueses. Parte-se do princípio de que
informantes mais velhos utilizem a variante mais conservadora, nesse caso, a aplicação
da regra de concordância. Os falantes mais novos, por sua vez, mais propensos à
inovação, apresentariam maiores frequências de cancelamento da marca de plural.
É a variável Faixa etária um dos recursos que permitem a análise do fenômeno
como um caso de mudança em progresso ou como variação estável. De todo modo, é
necessário atentar para o fato de que a predominância de uma determinada variante
linguística na fala dos mais jovens pode indicar duas possibilidades: a) a instalação
gradual de uma nova variante na língua (mudança linguística); ou b) uma diferenciação
linguística etária que se repete a cada geração.
Com o intuito de testar essas possibilidades, os informantes foram estratificados,
na amostra utilizada, de acordo com as seguintes faixas de idade:
A – 18 a 35 anos
B – 36 a 55 anos
C – 56 a 75 anos
5.2.1.2 Escolaridade
A escolaridade tem sido amplamente estudada e testada a fim de verificar o seu
grau de influência sobre os falantes quanto à apropriação da norma de prestígio. Silva &
Scherre (1996) apresentaram três tendências observadas quanto ao efeito da
escolarização sobre as formas padrão, próprias a estilos e gêneros mais formais:
52
a) Podem ocorrer casos em que os falantes entram na escola oscilando
entre um grande e um pequeno uso da variante padrão; a escola “poda” a
criança que não se amolda ao sistema de ensino. (...) Nesses casos, tratase de variantes estigmatizadas pela escola, que chegam a ser
sistematicamente corrigidas.
b) Em outros casos, em que a maioria dos falantes entra na escola sem usar
a variante padrão, esta é adquirida durante sua escolarização sem que
desapareça, porém, a variante não-padrão. Enquanto no primeiro ano
escolar só há indivíduos que tendem a usar a variante não-padrão, nos
últimos anos escolares há falantes que tendem a usar ambas as variantes.
(...) Algumas variantes não-padrão não chegam a ser estigmatizadas pela
escola, não sendo objeto de correção.
c) Finalmente, uma terceira modalidade ocorre quando os falantes entram
na escola apenas com a variante que se considera não-padrão, mas,
paulatinamente, substituem essa variante pela considerada padrão.
(SILVA; SCHERRE, 1996, p. 346, 348-349)
Pelo fato de o fenômeno da concordância ser amplamente trabalhado na escola
devido à estigmatização atribuída à falta de concordância, supõe-se que, quanto maior a
escolaridade, maior será a frequência de concordância apresentada por esses indivíduos.
Para isso, controlou-se a escolaridade da seguinte forma:
Nível 1 – ensino fundamental
Nível 2 – ensino médio
Nível 3 – ensino superior
5.2.1.3 Sexo
Ao analisar a dimensão extralinguística da variação, não se pode ignorar que a
maior ou menor ocorrência de certas variantes, principalmente das que envolvem o
binômio forma padrão/forma não-padrão, e o processo de implementação de mudança
estejam associados ao sexo/gênero do falante e também à forma de construção social
dos papéis masculino e feminino.
Diversos estudos sobre fenômenos em variação no português apontam o que se
pode chamar de maior consciência feminina do status social das formas linguísticas, isto
é, as mulheres demonstram maior preferência pelas variantes linguísticas mais
prestigiadas socialmente. Ademais, quando se trata de mudança linguística, as mulheres
53
parecem liderar os processos de mudança, estando, muitas vezes, uma geração à frente
dos homens. Ou seja, quando se trata de implementar na língua uma forma socialmente
prestigiada, as mulheres tendem a assumir a liderança da mudança. Ao contrário,
quando se trata da implementação de formas socialmente desprestigiadas, as mulheres
assumem uma atitude conservadora e os homens tomam a liderança do processo.
O que se tem generalizado até o momento é a maior sensibilidade feminina ao
prestígio social que comunidades atribuem a certas variantes linguísticas. No entanto, é
preciso considerar que o efeito da variável sexo isoladamente camufla outras questões
que devem ser examinadas. É necessário que a análise da correlação entre sexo e a
variação linguística faça referência não apenas ao prestígio atribuído pela comunidade
às variantes linguísticas, como também à forma de organização social da comunidade de
fala em estudo.
A consistência do padrão que aponta o conservadorismo linguístico
das mulheres emerge da análise de variações em comunidades de fala
ocidentais, que partilham diversos aspectos da organização
sociocultural. Esse padrão pode ser revertido, no entanto, quando se
consideram dados de comunidades de fala caracterizados por outros
valores culturais e outra forma de organização social.
(PAIVA,
2008, p.35)
Com o controle dessa variável, pretende-se verificar se a caracterização do
informante quanto ao sexo influencia na concretização da concordância e refletir sobre o
processo de socialização e os papéis que cada comunidade atribui aos homens e às
mulheres.
5.2.1.4 Localidade
A variável Localidade foi controlada com a finalidade de avaliar as “diferenças
linguísticas distribuídas no espaço físico, observáveis entre falantes de origens
geográficas distintas” (ALKMIM, 2001, p. 34), observando a influência da variação
diatópica na regra de concordância verbal no PE.
Pesquisas
sociolinguísticas
(LUCCHESI,
2009)
apontam
diferenças
significativas entre o falar de um indivíduo brasileiro que mora na zona urbana e de
outro que more na zona rural. Mostram, ainda, principalmente em relação ao fenômeno
da concordância, que os falantes da zona urbana ou da capital, quando comparados com
54
os da zona rural ou do interior, costumam preservar a forma padrão, enquanto os
falantes interioranos e da zona rural tendem a usar menos essa forma.
Estudos relativos ao PB vêm demonstrando com mais frequência a atuação dessa
variável no fenômeno da concordância, como é o caso do trabalho de Vieira (1995), que
investigou a concordância verbal de 3ª pessoa do plural em dialetos populares de três
comunidades pesqueiras da Região Norte-fluminense do Estado do Rio de Janeiro.
Após a análise de 18 inquéritos do arquivo sonoro do projeto APERJ, observou-se que
há diferença de comportamento linguístico entre os falantes das diferentes localidades
estudadas, pelo fato de a cidade estar mais ou menos afastada do litoral. São João da
Barra, localiza no litoral do Estado, apresentou menor tendência à não-concordância,
seguida de São Fidélis, consideravelmente afastada do litoral. A cidade que apresentou
maior tendência à não-concordância foi Itaocara, que está mais distante do litoral.
Motivou o controle dessa variável a suposição de que o comportamento do
fenômeno seria diferente nas três localidades controladas, pelo fato de elas possuírem
características sociais diferentes, como se retoma sinteticamente abaixo.
Oeiras, sede do Concelho de Oeiras, caracteriza-se por ser povoado por pessoas
de alto poder aquisitivo e nível sociocultural elevado. É o local onde estão presentes
grandes empresas multinacionais e importantes institutos de pesquisa científica.
Cacém, pertencente ao Concelho de Sintra, apresenta características de “bairrodormitório”, estando presente grande concentração de imigrantes, principalmente das
ex-colônias africanas. A população de Cacém possui menor poder aquisitivo e nível
sociocultural também inferior.
Por fim, Funchal, capital da Região Autônoma da Madeira, foi um dia local de
passagem das rotas comerciais portuguesas, trazendo até hoje a grande circulação de
comerciantes de diversas localidades. Sua economia hoje tem como base o setor
terciário, principalmente as atividades ligadas ao turismo.
Para cada uma das três localidades em estudo, conforme já se descreveu na
Metodologia, foram utilizadas 18 gravações (além das complementares), estratificadas
segundo sexo, escolaridade e idade. Cada informante tem, portanto, um código que
indica sua localidade, sua faixa etária, o nível de escolaridade que possui e o sexo.
55
5.2.2 Variáveis linguísticas
O quadro abaixo mostra as variáveis e seus respectivos fatores utilizados para o
controle linguístico do fenômeno. Após a rodada inicial, pela inexpressividade de
alguns contextos, foi necessário fazer uma recodificação amalgamando fatores, mas o
quadro abaixo mostra por completo as variáveis utilizadas em sua configuração inicial.
GRUPOS DE FATORES
Posição do sujeito em relação ao verbo
Distância entre o núcleo do SN e o SV
Configuração
sujeito
morfossintática
do
FATORES
- sujeito explícito anteposto
- sujeito explícito posposto
- sujeito não-explícito
- zero sílaba
- 1 sílaba
- 2 sílabas
- 3-4 sílabas
- 5-6 sílabas
- mais de 6 sílabas
- sujeito não expresso
SN - pronome pessoal
- pronome demonstrativo
- pronome possessivo (precedido ou não
de artigo)
- quantificador indefinido
- quantificador numeral (precedido ou não
de artigo)
- SN sem SPrep encaixado
- SN com SPrep encaixado
- SN /pronome com uma oração
relativa/adjetiva
- SNs plenos/pronomes coordenados (com
ou sem oração relativa)
- Sujeito não expresso (oculto/desinencial)
- pronome relativo
Paralelismo
no
nível
oracional - vocábulo isolado no plural
(Características formais do sujeito da - morfema de plural explícito (-s) no
construção)
último elemento não-inserido em um
sintagma preposicional
- morfema de plural zero no último
elemento não-inserido em um sintagma
preposicional
56
- morfema de plural explícito (-s) no
último elemento inserido em um sintagma
preposicional
- morfema de plural zero ou forma nãomarcada de singular no último elemento
inserido em um sintagma preposicional
- numeral no último elemento não inserido
em um sintagma preposicional
- numeral no último elemento inserido em
um sintagma preposicional
- núcleos coordenados
- sujeito não expresso (oculto/desinencial)
- sujeito posposto
Animacidade do sujeito/referente
- [+ animado] [+ humano]
- [+ animado] [- humano]
- [- animado]
Saliência fônica
NÍVEL 1
- 1a. não envolve a mudança na qualidade
da vogal na forma plural - acréscimo de
nasalidade (come/comem)
- 1b. envolve mudança na qualidade da
vogal na forma plural - acréscimo da
semivogal [w] (fala/falam)
- 1c. envolve acréscimo de segmentos na
forma plural e possível mudança na
realização da consoante final do singular
(faz/fazem)
- 1d. (quer/querem)
NÍVEL 2
- 2a. envolve apenas mudança na
qualidade da vogal na forma plural
(dá/dão)
- 2b. envolve mudança na qualidade da
vogal na forma plural e queda da
semivogal da forma singular (vai/vão)
NÍVEL 3
- 3a. envolve acréscimo de segmentos sem
mudanças vocálicas na forma plural,
queda da
semivogal
da
forma
singular (comeu/comeram)
- 3b. envolve acréscimo de segmentos
com mudança vocálica na forma plural,
queda do ditongo. (falou/falaram)
- 3c. envolve acréscimo de segmentos com ou sem mudanças/acréscimos
vocálicas(os) - na forma plural, mudança
da
tonicidade
do
vocábulo
57
(disse/disseram)
NÍVEL 4
- 4a. envolve acréscimo de segmentos
com mudança na raiz e na tonicidade do
vocábulo (fez/fizeram)
- 4b. Mudança quase completa - caso
único (veio/vieram)
- 4c. Mudança completa - caso único
(é/são)
Tipo de verbo quanto à transitividade
- inergativo = intransitivo
- inacusativo
- transitivo – direto, indireto, relativo ou
circunstancial, transitivo direto e indireto,
transitivo bi-relativo / circunstancial,
transitivo direto e relativo, direto e birelativo, transitivo predicativo
- copulativo
Paralelismo no nível discursivo
- verbos precedidos de verbo com marca
formal de plural no discurso do
informante
- verbos precedidos de verbo com marca
zero de plural no discurso do informante
- verbos isolados ou primeiros de uma
série (não precedidos de verbos com
sujeitos plurais)
Presença de elementos intervenientes – - ausência de elementos
entre o sujeito e o verbo
- palavra negativa
- advérbio
- palavra negativa + advérbio
- advérbio + palavra negativa
- oração adverbial
- construções apositivas
- conjunção
- marcador discursivo
- pronome
- preposição
- predicativo do sujeito
- sujeito não expresso
- advérbio + preposição
- advérbio + marcador discursivo
- advérbio + pronome
- conjunção + advérbio
- conjunção + pronome
- palavra negativa + pronome
- marcador discursivo + pronome
- marcador discursivo + palavra negativa
58
Tempo verbal
- advérbio + palavra negativa + pronome
- conjunção + advérbio + pronome
- presente do indicativo em forma simples
- presente do indicativo em forma
perifrástica
- pretérito perfeito do indicativo
- pretérito perfeito composto do indicativo
- pretérito imperfeito do indicativo em
forma simples
- pretérito imperfeito do indicativo em
forma perifrástica
- pretérito mais que perfeito do indicativo
- pretérito mais que perfeito composto do
indicativo
- futuro do indicativo em forma simples
- futuro do indicativo em forma
perifrástica
- futuro do presente composto do
indicativo
- futuro do pretérito do indicativo
- futuro do pretérito composto do
indicativo
- presente do subjuntivo
- presente composto/pretérito perfeito do
subjuntivo
- imperfeito do subjuntivo
- imperfeito composto/pretérito mais que
perfeito do subjuntivo
- futuro do subjuntivo
- futuro composto do subjuntivo
- infinitivo
Quadro 6: Grupos de fatores controlados.
5.2.2.1 Posição do sujeito em relação ao verbo
Controlou-se essa variável a fim de testar a hipótese de que os sujeitos que
aparecem na posição pós-verbal tendem a favorecer a não marcação de plural do verbo,
hipótese que vem sendo comprovada em diversos trabalhos empíricos.
Monguilhott (2001), por exemplo, encontrou, em dados europeus, cerca de 29%
de não marcação de concordância de número entre sujeito e verbo na ordem VS, sem
distinção de escolaridade.
Berlinck (1997), considerando dados brasileiros, também apresenta resultados
que apontam maior tendência aos sintagmas nominais pospostos desencadearem falta de
59
concordância. A autora aponta que essa relação entre o sujeito em posição pós-verbal e
a não marcação da concordância tem servido de argumento à tese do caráter menos
‘subjetivo’ do sujeito. Pontes (1986) evidencia que o sujeito do sintagma posposto
apresenta características de objeto. Em um teste feito com alunos da Faculdade de
Letras da UFMG, a autora constatou que o sintagma posposto é considerado, muitas
vezes, como objeto por uma parcela de indivíduos que, por consequência, apresentam
dificuldade na marcação de concordância com esses tipos de sintagma.
Monte (2012) também discute o caráter não sujeito do sintagma nominal que
aparece em posição pós-verbal, citando um teste realizado pelo Ministério da Educação
de Portugal, em que 65% dos alunos que realizaram o teste identificaram um sujeito
posposto como objeto.
Desse modo, a posição do sujeito parece ser um princípio geral, recorrente em
muitos estudos, sendo um dos poucos contextos que caracterizam o fenômeno tanto no
PB quanto PE.
Segundo Castilho (2010),
a ordem VS é favorecida pelo sintagma nominal (1)
informacionalmente novo, textualmente mencionado pela primeira
vez, (2) semanticamente específico e não agentivo, (3) selecionado
por verbo monoargumental, (4) cujo Complementador (= sintagma
adjetival, sintagma preposicional e sentenças relativas) figure à direita
do núcleo nominal, (5) foneticamente “pesado”, isto é, que contenha
mais de sete sílabas. (CASTILHO, 2010, p. 292)
Na presente pesquisa, foram controlados os sujeitos em posição anterior ao
verbo, em posição posterior ao verbo e os sujeitos não explícitos, para que fossem
excluídos da leitura dos dados em momento oportuno.
Os exemplos abaixo mostram os fatores que compuseram esta variável:
a) sujeito anteposto
(3) não é medo é receio—a gente nunca sabe o que é que os filhos fazem (OEI
A1H)
b) sujeito posposto
60
(4) acho que não e acho que as pessoas ainda nem sequer estão a pensar nisso –
falou-se nisso quando foi aprovado e acabou - saiu algumas gramáticas
alteradas mas ninguém está a usar nada – acho que a grande complicação é por
exemplo quando chegamos à altura dos nossos filhos (OEI A3M)
c) sujeito não-explícito
(5) I-não é medo é receio—a gente nunca sabe o que é que os filhos fazem
D-pois
I-por vezes não contam não é? é só isso (OEI A1H)
5.2.2.2 Distância entre o núcleo do SN e o SV
Avalia-se a distância entre o núcleo do SN e o SV para testar a hipótese de que,
quanto maior a distância entre esses dois constituintes oracionais, maior seria a
probabilidade de cancelamento da marca plural.
Considerou-se o número de sílabas presentes entre o sujeito e o verbo. Segundo
Naro e Scherre (1999a), cada sílaba ocupa mais ou menos a mesma quantidade de
tempo entre o sujeito e o verbo, o que demonstra ser mais eficaz calcular a distância
dessa forma do que com palavras ou com outras unidades hierarquicamente superiores.
Os casos de sujeitos não-explícitos não foram considerados, visto que a não
realização formal desse constituinte impede, obviamente, o cálculo da distância.
a) 0
(6) se eu fosse sair à noite os meus pais mandavam estar por exemplo à meia noite
em casa (OEI A1H)
b) 1 – 3
61
(7) espero bem que mude- se não qualquer dia as pessoas já não saem à rua com
medo (OEI A1H)
c) 4 – 5
(8) eles hoje em dia consomem drogas muitos dizem eu sou mau- quero que me
respeitem (OEI A1H)
5.2.2.3 Configuração morfossintática do SN sujeito
O controle dessa variável está baseado nas distintas representações do SN
sujeito, que estão relacionadas a outras variáveis linguísticas, como a posição do sujeito
e o paralelismo no nível oracional, e podem, dessa forma, influenciar as marcas de
concordância presentes nos verbos.
Segundo Zilles (2000), o sujeito do tipo pronome pessoal apresenta forte
tendência a ocorrer na posição anterior ao verbo, característica que, como comprovada
em trabalhos sobre o tema da concordância, contribui para a marcação de plural nos
verbos. Já os sujeitos do tipo SN pleno (simples ou composto) ou pronome indefinido
possuem posição menos fixa, podendo ocorrer em posição posterior ao verbo, que é
prototipicamente a posição que desfavorece o uso da concordância verbal de 3ª pessoa
do plural.
No caso de sujeitos compostos, há duas possibilidades: podem ter núcleos
coordenados no plural ou no singular. Quando o núcleo mais próximo à forma verbal
está no plural, aumentariam as possibilidades de ocorrer concordância verbo/sujeito.
Para testar essas hipóteses, foram controlados os fatores expostos em tabela
anterior e aqui exemplificados:
a) pronome pessoal
62
(9) porque se baterem é pior- porque eles ficam-- tornam-se-- como hei-de dizer?
revoltados (OEI A1H)
b) pronome demonstrativo
(10) gostava de conhecer mesmo Itália- Veneza- o Japão- deve ser fantástico
também--e- e estes são os principais depois pronto- uma daquelas viagenzinhas
ao Brasil (OEI A2H)
c) pronome possessivo (precedido ou não de artigo)
(11) Há sempre muitos compromissos sociais há festas de aniversário de uma ou de
outra ou alguém vai dormir a nossa casa ou as minhas vão lá dormir a casa das
amigas. (OEI B1M)
d) quantificador indefinido
(12) e por que é que foram todos ali - os problemas e por ver como de facto é
vantajoso tentar (OEI A3H)
e) quantificador numeral (precedido ou não de artigo)
(13) muito novos pronto eles vieram acabaram por se encontrar cá são os dois da
mesma terra ah mas vieram trabalhar (OEI B2H)
f) SN (núcleo do tipo nome) sem SPrep encaixado
(14) não temos essas coisas que as pessoas procuram hoje em dia pra se pra se
divertirem (CAC A1M)
g) SN (núcleo do tipo nome) com SPrep encaixado
63
(15) as pessoas de Cascais não podem ir para Lisboa sem passar primeiro pelo
hospital de Cascais (OEI B1M)
h) SN /pronome com uma oração relativa/adjetiva
(16) quando a carrinha da polícia vai a passar há senhoras que- senhoras que ( )
pronto senhoras que são relativamente normais dizem ah olha a grande olha a
grande que é a polícia aquela carrinha grande da polícia. (OEI A2H)
i) SNs plenos/pronomes coordenados (com ou sem oração relativa)
(17) portanto todas estas misturas e todas estas coisas acabam por provocar alguma
( ) na pronto na na maneira de nós – do do nosso dia-a-dia ah e provoca alguns
desequilíbrios na própria comunidade não é? (OEI B2H)
j) Sujeito não expresso (oculto/desinencial)
(18) por exemplo se eu fosse sair à noite os meus pais mandavam estar por exemplo
à meia noite em casa e eu às vezes não conseguia estar a essa hora e não tinha
meios de comunicar- ficavam preocupados (OEI A1H)
k) pronome relativo
(19) havia pais que davam uma liberdade enorme aos filhos (CAC C2H)
5.2.2.4 Paralelismo no nível oracional
Com o estudo desta variável, objetivou-se verificar se há correlação entre o tipo
de marca existente no sujeito e o tipo de marca existente no verbo. Partiu-se do
princípio geral do paralelismo (SCHERRE, 1988) de que “marcas levam a marcas e
zeros levam a zeros”, supondo que marcas explícitas de plural no referente levem à
presença de marcas de plural no SV. Busca-se ainda verificar se o traço semântico de
64
pluralidade contido nos SNs constituídos por numeral exerce alguma influência sobre a
concordância verbal.
Anteriormente ao estudo de Scherre (1988), outros trabalhos como os de Omena
(1978) e de Emmerich (1984) já observavam o efeito da repetição. Investigações
posteriores, como as de Scherre (1991; 1997); Scherre e Naro (1991); Naro e Scherre
(1996), também avaliaram o efeito dessa variável. Scherre (1998) explica que
A própria repetição das variantes de uma mesma variável dependente
no discurso tem se evidenciado como uma restrição importante na
análise de fenômenos variáveis de todos os subsistemas lingüísticos
em diversas línguas. Esta restrição ou variável independente ocorre
entre as cláusulas (plano discursivo), no interior da oração (plano
oracional), no interior do sintagma (plano sintagmático), e entre
palavras e no interior da palavra (plano da palavra). (SCHERRE, 1998
p. 30)
Nessa variável, não foram controlados os casos de sujeitos não-expressos e de
sujeitos pospostos, já que não é possível verificar a influência do paralelismo no nível
oracional nesses tipos de construção. No caso de sujeitos pospostos, a marca do SN
sujeito, vindo após o verbo, não poderia influenciar a concordância e, no caso de
sujeitos não-expressos, a não realização formal do SN anula a hipótese de uma marca
influenciar a outra.
a) vocábulo isolado no plural
(20) depois eles vêem que ele é uma criança (OEI A1H)
b) morfema de plural explícito (-s) no último elemento não-inserido em um
sintagma preposicional
(21) não sei se foi por causa do euro- em que os preços foram para o dobro (OEI
A1H)
c) morfema de plural zero no último elemento não-inserido em um sintagma
preposicional
65
(22) as brincadeira era poucas (FNC C1M)
d) morfema de plural explícito (-s) no último elemento inserido em um sintagma
preposicional
(23) muitos dos meus amigos estão ligados (CAC A2H)
e) morfema de plural zero ou forma não-marcada de singular no último elemento
inserido em um sintagma preposicional
(24) porque os do tempo da infância estavam estavam mais associados ao local
onde vivia que já não vivo (OEI B3H)
f) numeral no último elemento não inserido em um sintagma preposicional
(25) quatro são iguais não é equivalente (CAC B1M)
g) núcleos coordenados
(26) ela e e o Júlio são diferentes (OEI A1M)
5.2.2.5 Animacidade do sujeito/referente
O controle da variável Animacidade do sujeito/referente teve por objetivo testar
a influência de traços semânticos do tipo [+/- humano] e/ou [+/- animado] do referente,
investigada em outros estudos.
O estabelecimento dessa variável teve como motivação a hipótese de que o traço
[+ animado] favorecesse a concordância, tendo em vista a possibilidade de o sujeito
constituir, por exemplo, o agente da oração e, assim, estabelecer uma relação mais
íntima com o verbo, que muitas vezes carrega traços dinâmicos, como os típicos de
ações, eventos e processos. Dessa forma, os sujeitos com traço [- humano] e [- animado]
66
seriam os que mais induziriam a falta de concordância. O controle dessa variável foi
feita com os seguintes fatores:
a) [+ animado] [+ humano]
(27) as pessoas pensavam que estavam a ser atacadas (OEI A1H)
b) [+ animado] [- humano]
(28) de maneira que quando aparecem cães (OEI C2M)
c) [-animado]
(29) comunidade neo-catecumenal ajuda-me a perceber que as coisas não são
relativas (OEI A2H)
5.2.2.6 Saliência fônica
O princípio da saliência fônica, proposto por Lemle e Naro (1977), consiste,
segundo Scherre (1998), em estabelecer que as formas cuja diferenciação seja maior, as
mais salientes, são mais prováveis de serem marcadas. Para o estabelecimento dos
fatores da variável, considera-se: (1) a força da acentuação e (2) a diferenciação material
em termos fonológicos, com a hipótese de que, quanto maior o nível de saliência fônica,
maior a possibilidade de realização da concordância verbal.
a perda das marcas de concordância, em sintagmas nominais e verbais,
se difunde na morfologia afetando primeiro e mais frequentemente as
formas nas quais as consequências da perda são foneticamente menos
notáveis, do ponto de vista ou do ouvinte ou do falante ao monitorar
seu próprio discurso (NARO; LEMLE, 1977, p.263)
Para o presente trabalho, aplicou-se, inicialmente, aos dados europeus, a escala
de saliência fônica que é normalmente aplicada aos dados brasileiros, apesar de não
parecer adequada ao PE. A escala será, então, retomada no capítulo 6, de modo a
67
investigar se as desinências finais dos verbos em 3ª pessoa do plural são realizadas
foneticamente da mesma maneira que no PB.
 NÍVEL 1
a) não envolve a mudança na qualidade da vogal na forma plural - acréscimo de
nasalidade (vive-vivem)
(30) tou convencido que essas pessoas vivem a:: não vivem ou seja eu acho
que vivem em zonas ou passam por zonas onde não se apercebem da miséria
(CAC C2H)
b) envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural - acréscimo da
semivogal [w] (fala/falam)
(31) eles mostram que realmente a igreja está muito viva através do Espírito
Santo que eles invocam a cada momento (CAC C2M)
c) envolve acréscimo de segmentos na forma plural e possível mudança na
realização da consoante final do singular (faz/fazem)
(32) as pessoas de idade já não fazem isso (FNC C2M)
d) envolve acréscimo de segmentos na forma plural e possível mudança na
realização da consoante final do singular (quer/querem)
(33) e se eles optarem por carreira de futebolista ainda melhor- ganham bem
(OEI A1H)
 NÍVEL 2
e) envolve apenas mudança na qualidade da vogal na forma plural (dá/dão)
68
(34) se eu precisar de ajuda eles estão lá para me ajudar (OEI A1H)
f) envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural e queda da semivogal
da forma singular (vai/vão)
(35) Agosto e Setembro as pessoas vão de férias quando vêm das férias ah é
quando tentaram ver se o casamento estava certo (OEI A1M)
 NÍVEL 3
g) envolve acréscimo de segmentos sem mudanças vocálicas na forma plural,
queda da semivogal da forma singular (comeu/comeram)
(36) boa pergunta- como é que eles se conheceram-- ah! já já sei (OEI A2H)
h) envolve acréscimo de segmentos com mudança vocálica na forma plural, queda
do ditongo (falou/falaram)
(37) só que muitas pessoas recomendaram-me a ir pali e eu fui pali e pronto
mesmo sendo mais longe da minha casa (CAC A2H)
i) envolve acréscimo de segmentos - com ou sem mudanças/acréscimos
vocálicas(os) - na forma plural, mudança da tonicidade do vocábulo
(disse/disseram)
(38) a primeira vez que eu fumei foi com eles que eles sempre- sempre me
disseram desde desde pequeno que se quisesse experimentar fumar ou e e issosim fumar a- ele que- que fosse ao pé deles (OEI A2H)
 NÍVEL 4
j) envolve acréscimo de segmentos com mudança na raiz e na tonicidade do
vocábulo (fez/fizeram)
69
(39) os portugueses também já fizeram isso (OEI A3H)
k) Mudança quase completa - caso único (veio/vieram)
(40) os meus pais vieram muito novos para cá (OEI B2H)
l) Mudança completa - caso único (é/são)
(41) as minhas festas de Natal nunca são com a minha família (CAC A2H)
Tendo em vista que a saliência fônica está diretamente relacionada à forma
como são produzidos/realizados os verbos, é necessário avaliar se a cadeia de saliência
fônica estudada e aplicada para o PB é de fato eficiente para o controle dos verbos no
PE. Ainda não há estudo que faça uma descrição fonética dos verbos de 3ª pessoa do
plural no PE. Para isso, é preciso recorrer às gravações, para que sejam analisadas as
desinências finais dos verbos referentes a sujeitos de 3ª pessoa do plural. Haveria no PE
alguma realização fonética diferenciada do PB? Em seção posterior à dos resultados
variacionistas, serão descritas foneticamente as desinências finais dos verbos de baixa
saliência fônica em uma subamostra em dois pontos de inquérito do PE, Funchal e
Oeiras.
5.2.2.7 Tipo de verbo quanto à transitividade
Para o controle dessa variável, utilizou-se a divisão e classificação dos verbos
em intransitivos, inacusativos, transitivos e copulativos, conforme se esclareceu na
metodologia.
Os verbos monoargumentais apresentam características particulares, de forma
que os inacusativos só exibem uma posição temática, a de argumento interno e este não
recebe caso acusativo. Considera-se, dessa forma, que o verbo de uma construção
intransitiva seleciona apenas um argumento externo, enquanto o verbo de uma
70
construção inacusativa seleciona um argumento interno, argumento que recebe
normalmente a função temática de tema.
Controlou-se também o verbo das construções transitivas, em que são
selecionados um argumento interno e um externo necessariamente. Controlaram-se,
ainda, os verbos cópula, dos quais foram excluídos os casos de verbo ser que podem ser
interpretados como apresentacionais.
O controle dessa variável permite-nos observar a particularidade das construções
copulativas no Português Europeu, em especial as construções com o verbo ser, que tem
demonstrado comportamento diferenciado em outros estudos (MONTE, 2012;
BAZENGA; VIEIRA, 2013). Além disso, avalia-se também a hipótese de que os verbos
inacusativos, relacionados à posição de sujeito pós-verbal, favoreceriam a não
realização da concordância verbal.
O controle dessa variável valeu-se da seguinte subdivisão:
a) inergativo ou intransitivo
(42) umas aprendem e mudam de mentalidades outros não- quando trabalham mas
continuam na mesma (OEI A1H)
b) inacusativo
(43) sim sim sim passa mesmo no centro do Cacém e depois a partir da estação
existe os autocarros para os diversos sítios (CAC A3M)
c) transitivo – direto, indireto, relativo ou circunstancial, transitivo direto e
indireto, transitivo bi-relativo / circunstancial, transitivo direto e relativo, direto
e bi-relativo, transitivo predicativo
(44) os miúdos precisam de controle e se nós não os controlarmos podemos temos
sempre o risco de os perder (OEI A3H)
(45) eles utilizam mais essa essa linguagem (OEI A3H)
71
(46) e eles dão dinheiro aos bancos para não fecharem e as empresas fecham (OEI
A1H)
d) copulativo
(47) sim os temas são diferentes o tema de conversa normalmente é diferente (CAC
A3M)
5.2.2.8 Paralelismo no nível discursivo
A variável paralelismo no nível discursivo, assim nomeada por ultrapassar o
nível da oração e formar relação entre orações de uma sequência, consiste na repetição
de formas verbais no discurso. Essa variável controla a influência da marca de um SV
sobre o SV seguinte.
Foi utilizado um grupo de fatores reduzido, em função dos poucos exemplos de
séries discursivas no corpus. Dessa forma, controlou-se apenas a marca de um verbo de
3ª pessoa sobre outro de 3ª pessoa do plural, na fala do próprio informante. Outros
estudos controlam essa variável de forma mais detalhada, como o de Vieira (1995),
controlando a influência de marcas do discurso do entrevistador, no discurso do
informante e de marcas de referentes distintos.
No presente trabalho, a variável paralelismo no nível discursivo foi controlada
da seguinte forma:
a) verbos precedidos de verbo com marca formal de plural no discurso do
informante
(48) as coisas aumentaram mas os ordenados também aumentaram podem não ter
tido a mesma o mesmo crescimento mas não se pode comprar (CAC A3M)
b) verbos precedidos de verbo com marca zero de plural no discurso do informante
72
(49) com a minha idade os meus pais já tavam casados- já já me tava a ter quasejá trabalhavam (OEI A2H)
(50) as brincadeiras com o meu irmão basicamente era andarmos à porrada
((risos)) e continuam a ser... (CAC A2H)
c) verbos isolados ou primeiros de uma série (não precedidos de verbos com
sujeitos plurais)
(51) sim...ao futebol principalmente... eu não gosto de futebol...mas...sou mais
chegado ao básquete por exemplo...sim...pode-se dizer que as pessoas são muito
chegadas aos desportos (CAC A2H)
5.2.2.9 Presença de elementos intervenientes entre o sujeito e o verbo
Controlou-se essa variável a fim de observar a presença ou ausência de
elementos entre o sujeito sintático e o verbo. No caso de haver elementos intervenientes,
foram controlados os tipos de elementos: palavra negativa, advérbio, preposição etc.
O comportamento dessa variável está relacionado à distância entre o sujeito e
verbo, mas principalmente ao grau de integração estabelecido no vínculo gramatical e
cognitivo entre os referentes que estão em relação de concordância.
Com essa variável, objetivou-se determinar quais estruturas morfossintáticas
presentes entre o sujeito e o verbo influenciariam na não marcação de concordância.
Além das estruturas simples, controlou-se a combinação de termos, como vemos
exemplificado abaixo:
a) ausência de elementos
(52) na sociedade também cada vez as empresas exigem mais das pessoas (OEI
A3H)
b) palavra negativa
73
(53) mas vai haver um tempo em que eles não vão querer aceitar isso (CAC
B3M)
c) advérbio ou locução adverbial
(54) os meus pais neste momento tão separados (CAC A1M)
d) palavra negativa + pronome
(55) A diferença é que as pessoas não se conhecem o suficiente pra casar (CAC
C1H)
e) oração adverbial
(56) os dois primeiros presidentes da república se não estou em erro eram
açorianos (FNC A3H)
f) conjunção
(57) eles pôem umas etiquetas com côres e em função das côres eles então
atendem ou não mais rápidamente... (CAC B3H)
g) marcador discursivo
(58) por acaso os meus filhos ah são duas crianças que nunca tiveram
problemas em matemática nem a Inglês (CAC B2M)
h) pronome
(59) eu acredito que os pais lhe dão uma boa educação mas tem a ver com feito
da criança (CAC B3M)
i) predicativo do sujeito
74
(60) e pomo-nos todos a cantar é muito divertido... são muito divertidas as
nossas festas (CAC A2H)
5.2.2.10
Tempo verbal
O controle desse grupo de fatores se deu na tentativa de testar quais os tempos
verbais que levariam, em maior ou menor escala, à não marcação da concordância
verbal. É necessário salientar que essa variável está relacionada à saliência fônica, já
que os diferentes tempos verbais apresentam desinências mais ou menos salientes em
suas formas no singular e no plural. Buscou-se ainda avaliar, no corpus em estudo,
algumas hipóteses testadas em outros trabalhos sobre o tema. Segundo o estudo de
Vieira (1995), sobre a concordância verbal em dialetos populares no PB,
Os tempos verbais apresentam tendência à não-concordância, na
seguinte ordem: presente do subjuntivo, futuro do subjuntivo, presente
do indicativo, pretérito do indicativo e futuro do indicativo em forma
perifrástica. (VIEIRA, 1995, p.132)
Os dados abaixo mostram os tempos verbais encontrados no corpus:
a) presente do indicativo em forma simples
(61) as pessoas aprendem com os pais (OEI A1H)
b) pretérito perfeito do indicativo
(62) os meus pais vieram pra cá (CAC A1M)
c) pretérito imperfeito do indicativo em forma simples
(63) o meu filho que às vezes trazia ditados que chegavam com dezanove quinze
(CAC B1M)
75
d) futuro do indicativo em forma simples
(64) claro que se fôr um Português puro e duro por vezes não falarão tão bem
(CAC B3H)
e) futuro do indicativo em forma perifrástica
(65) eles vão perguntar...porque a curiosidade da criança é perguntar (CAC
B1M)
76
6 RESULTADOS E ANÁLISE
6.1 Distribuição geral dos dados
Os resultados serão apresentados e analisados na ordem em que aconteceram os
procedimentos metodológicos. Em princípio, trabalhou-se apenas com a amostra básica,
que conta com 18 informantes de cada uma das três localidades. Obteve-se com esse
conjunto de dados um total de 3.450 ocorrências de verbos ligados a sujeitos de 3ª
pessoa do plural, sendo 1.335 provenientes de Oeiras, 1.183 de Cacém e 932 de
Funchal.
Na tabela abaixo, apresenta-se a distribuição dos casos de não marcação de
pluralidade em cada uma das localidades e suas respectivas porcentagens.
Nº de ocorrências
%
Oeiras
13/1.335
1,0
Cacém
9/1.183
0,8
Funchal
58/932
6,2
Total
80/3.450
2,3
Tabela 2: Distribuição dos dados de não-concordância nas três localidades do Corpus
Concordância (amostra básica)
Apenas considerando a amostra básica, já é possível perceber o baixo índice de
falta de concordância na variedade europeia do Português. Dentre as 3.450 ocorrências
de verbos com sujeito na 3ª pessoa do plural, apenas 80 não apresentaram a marcação de
plural no verbo, obtendo-se, portanto, o índice de 2,3% de falta de concordância verbal
na etapa inicial de quantificação de dados da pesquisa.
Enquanto Oeiras e Cacém apresentam comportamento semicategórico, com
pouquíssimos dados sem a marcação de plural, Funchal demonstra comportamento
aparentemente variável, apesar de possuir também alta concretização da concordância
de número. Após a rodada com a amostra básica, uniram-se a esses dados os
77
provenientes da amostra complementar, descrita na seção de metodologia. Essa amostra
contou com 717 ocorrências, cujo comportamento confirmou e até acentuou,
especialmente em Oeiras, a alta realização da marca de número no PE. A localidade de
Oeiras demonstrou comportamento que chama atenção pelo fato de, entre seus 227
dados, não haver qualquer caso de falta de concordância.
Obteve-se, por meio da junção da amostra básica com a complementar, o total
de 4.165 ocorrências, dentre as quais 92 não apresentaram marcação de plural no verbo,
o que indica 2,2% de falta de concordância, quando somadas as três localidades em
estudo. A distribuição dos dados ocorreu da seguinte forma:
Nº de ocorrências
%
Oeiras
13/1.612
0,8
Cacém
12/1.329
0,9
Funchal
67/1.226
5,5
Total
92/4.167
2,2
Tabela 3: Distribuição dos dados de não-concordância na totalidade do Corpus
Concordância (amostra básica mais complementar)
Gráfico1: Percentuais de falta de concordância na totalidade do Corpus Concordância
(amostra básica mais complementar) em Oeiras, Cacém e Funchal
78
Com a totalidade dos dados estudados, não houve alterações relevantes na
concretização do fenômeno em estudo. Dessa forma, partindo-se, na presente
investigação, do corpus ampliado, é possível afirmar que, de modo geral, a variedade
europeia do português possui regra semicategórica de concordância de 3ª pessoa, ainda
que Funchal esteja no limite entre o semicategórico e o variável (cf. LABOV, 2003),
como já haviam atestado Vieira e Bazenga (2013), no artigo com os primeiros
resultados do Projeto.
Para a melhor compreensão do fenômeno sociolinguístico, procedeu-se à análise
dos resultados referentes às variáveis sociais. Como os índices percentuais de Funchal
se diferenciam dos de Cacém e Oeiras, optou-se por apresentar os resultados das
variáveis sociais referentes a cada uma das três localidades e não da amostra como um
todo. Assim, evita-se que os índices referentes a Funchal influenciem os relativos a
Cacém e Oeiras, localidades que, em conjunto, tiveram apenas 25 casos de falta de
concordância.
A variável escolaridade não demonstrou relevância na totalidade dos dados da
presente investigação. Apenas em Funchal houve aumento gradativo do uso da marca de
plural no verbo de acordo com o crescimento do nível de escolaridade, ou seja, quanto
maior o nível de escolaridade, maior a concretização da concordância. Os índices
alcançados pelas outras variedades não demonstram discrepância de um nível de
escolaridade para outro.
Nível fundamental
Nível médio
Nível superior
(5 a 8 anos)
(9 a 11 anos)
(12 a 15 anos)
6/494
2/420
5/698
1,2%
0,5%
0,7%
4/461
3/450
5/416
0,8%
0,7%
1,2%
34/335
12/303
21/588
10,1%
4,0%
3,6%
Oeiras
Cacém
Funchal
Tabela 4: Índices de não-concordância segundo a variável Escolaridade nas localidades
de Oeiras, Cacém e Funchal
79
Na realidade, a diferença mais evidente em Funchal refere-se ao índice maior de
não concordância na fala dos informantes da mais baixa escolaridade (10,1%), em
contraposição às taxas verificadas para os níveis médio e superior (4,0% e 3,6%,
respectivamente), quase idênticos. Uma das hipóteses que se tem para o fato de haver
diferenças entre o português europeu continental e o insular é o fato de Funchal ser alvo
de intensa migração interna, de modo que, além de receber muitos turistas, a própria
população rural, concentrada nas periferias, contribui com atividades e serviços na
cidade (cf. VIEIRA; BAZENGA, 2013). O grande fluxo de pessoas circulando no local
parece dar abertura à adoção da forma inovadora.
Ainda que Funchal tenha apresentado essa particularidade quanto ao
comportamento da variável escolaridade, os resultados europeus como um todo são
fortemente contrastantes com o que ocorre no Português do Brasil. Estudos sobre a
concordância verbal na variedade brasileira têm demonstrado forte influência da
escolaridade na concretização da marcação de plural no verbo, que chega a criar o que
Lucchesi (2009) considera um caso de polarização sociolinguística: enquanto a fala
urbana e escolarizada chega a índices de mais de 90% de marca, a fala rural e não
escolarizada chega a registrar, em comunidades isoladas, 16% de concordância.
O estudo de Vieira e Bazenga (2013), por exemplo, que utilizou para a variedade
brasileira as localidades de Nova Iguaçu e Copacabana, ambas urbanas, também
demonstrou, a partir dos resultados, que o fenômeno da concordância está altamente
atrelado ao grau de escolarização. Em Copacabana, por exemplo, os informantes de
Nível fundamental apresentaram 72,9% de concordância, os de Nível médio obtiveram
89% e os de Nível superior, 97,8% de marcação de plural no verbo.
De qualquer forma, há de se levar em consideração que o nível de escolarização
está atrelado a outros fatores sociais. Como bem diz Bortoni-Ricardo (2004, p. 48), “os
anos de escolarização de um indivíduo e a qualidade das escolas que frequentou
também têm influência em seu repertório sociolinguístico. Observe-se que esses fatores
estão intimamente ligados ao estatuto socioeconômico”. Ainda sobre o efeito da
escolarização, Paiva e Scherre fazem a seguinte reflexão:
É possível também que a influência da variável escolaridade reflita, na
verdade, a ação da variável classe social. Se assim for, as
consequências são ainda mais perversas: não se modificam variantes
linguísticas, mas, sim, se excluem os indivíduos que não possuem
80
determinadas variantes linguísticas. (PAIVA; SCHERRE,
1999,
p. 217-218)
Sem dúvida, é preciso conhecer melhor a realidade sociocultural e econômica,
em que se inclui a escolaridade portuguesa, especialmente em Funchal, para que se
interprete melhor o comportamento dos dados dessa comunidade quanto à falta de
concordância. Observando exclusivamente os resultados da presente pesquisa, é
possível perceber que as variedades do PE, em relação ao comportamento da variável
escolaridade, mesmo a insular, estão longe de se assemelhar à variedade brasileira, em
que nitidamente quanto maior a escolarização, maior é a concretização da concordância
verbal, tendência confirmada em diversas amostras no país.
Outro grupo de fatores de natureza extralinguística que demonstrou irrelevância
em relação ao fenômeno na variedade europeia foi a variável sexo. Há uma pequena
diferença em pontos percentuais entre a concretização da concordância entre homens e
mulheres, segundo a qual as mulheres, ao contrário da hipótese inicialmente formulada,
registram índices um pouco maiores de não marcação de plural.
Oeiras
Cacém
Funchal
Homens
Mulheres
3/765
10/847
0,4%
1,2%
4/634
8/693
0,6%
1,2%
27/639
40/587
4,2%
6,8%
Tabela 5: Índices de não-concordância segundo a variável Sexo nas localidades de
Oeiras, Cacém e Funchal
81
Também no que se refere à faixa etária, a diferença de comportamento é muito
pequena.
Faixa A
Faixa B
Faixa C
(18 a 35 anos)
(36 a 55 anos)
(56 a 75 anos)
2/507
5/616
6/489
0,4%
0,8%
1,2%
6/445
4/493
2/389
1,3%
0,8%
0,5%
18/442
25/318
24/466
4,1%
7,9%
5,2%
Oeiras
Cacém
Funchal
Tabela 6: Índices de não-concordância segundo a variável Faixa etária nas localidades
de Oeiras, Cacém e Funchal
A pouca diferença percentual entre as faixas de idade e os baixos índices
encontrados para a ausência de marcação de pluralidade impedem, nesse caso, que se
avalie a concordância como um caso de variação estável ou de mudança em progresso.
Assim como as outras variáveis sociais analisadas, a faixa etária não parece ser
determinante no processo de marcação de plural no verbo na amostra analisada.
Ainda que o corpus tenha se ampliado, julgou-se inapropriado realizar o
tratamento estatístico – por meio da rodada multivariada do Programa Goldvarb-X –
para a análise de Oeiras e Cacém, visto não terem sido detectados nessas localidades
índices condizentes com o que Labov (2003) propôs como uma regra variável, que
seriam da faixa de 5 a 95% em uma variedade de contextos. Dessa forma, optou-se por
considerar separadamente Funchal das demais localidades.
Para a apresentação dos resultados, será feita, portanto, uma análise qualitativa
dos 25 casos de falta de concordância de Cacém e Oeiras, observando os contextos em
que há o cancelamento da marca de plural no verbo; adicionalmente, utilizam-se os
resultados de uma rodada multivariada, que foi feita experimentalmente com o total de
dados obtidos na pesquisa, apenas como confirmação das tendências verificadas. Logo
após, Funchal será analisado separadamente, com base no tratamento estatístico das
ocorrências.
82
6.2 Resultados de Oeiras e Cacém
Tomando por base o quadro com as ocorrências de cancelamento da marca de
plural exposto em Vieira e Bazenga (2013), apresentam-se aqui os 25 dados em que não
houve concretização da concordância em Cacém e Oeiras.
OEI A3H
(66) estes óculos estão a estão a cinquenta euros mas querem aumentálos para sessenta e cinco - então metem o preço em cima sessenta e
cinco euros e depois metem riscado os os cinquenta euros tipo a dizer
que está em promoção
OEI A3M
(67) saiu algumas gramáticas alteradas mas ninguém está a usar nada –
acho que a grande complicação é por exemplo quando chegamos à
altura dos nossos filhos
OEI B1M
(68) ah as coisas que a gente conhece também não é coisas assim é os
carros
OEI B1M
(69) é muito chata porque eu já sabia de quem era não sabia de quem
era os carros mas sei sei que é dos vizinhos não é?
OEI B1M
(70) está assim um bocado a situação que aparece pessoas que a gente
pensa às vezes que nem que não precisam
OEI B2M
(71) há coisas que noto que leva muito tempo para se conseguir uma
consulta hum hum
OEI B3M
(72) antigamente as pessoas tinham mais mais tempo mais tempo
porque tava mais em casa am eram mais presentes
OEI C1H
(73) os hábitos que não me agrada muito a é é é- neste momento que
estamos a atravessar
OEI C1M
(74) para esses há crise e também aquelas pessoas que vieram de fora
também chegou aqui também não têm nada não é?
OEI C1M
(75) portanto continua os tempos a evoluir cada vez mais não é?
OEI C2H
(76) pelo menos por aquilo que me dizem e por aquilo que vejo ah coisas que- no meu tempo- era muito diferente-
OEI C3M
(77) e eles são cumpridores (...) quando têm que estudar não- primeiro
estudam- o que é bom também ( D-isso é óptimo) nunca foge nem
pouco mais ou menos não é?
OEI C3M
(78) os livros dantes eram um bocado agora agora vejo a diferença acho
83
achava que era era um bocado massudos não é?
CAC A1M
(79) tem umas feiçõezinhas que identifica logo que elas são brasileiras...
CAC A3M
(80) muito poucas muito poucas mesmo ah.. especificamente no Cacém
temos
alguns
não
existe
cinema
não
existe
teatro
não
existe…exposições esse tipo de não existe…
CAC A3M
(81) e depois a partir da estação existe os autocarros para os diversos
sítios
CAC B1M
(82) vai ver a bola...claro juntamente com outros amigos que se junta a
ver a bola...
CAC B2M
(83) oitenta mil escudos equivale neste momento a quatrocentos
euros...
CAC B3M
(84) é assim a de antigamente tinha as suas partes chatas que era
aquelas regras completamente absurdas
CAC B3M
(85) os meus pais não nos deixavam ir pra rua brincar não nos deixava se
calhar receber amigos em casa
CAC C1H
(86) chegou ao fim do mês não pagou aquela/quinhentos euros só pagou
trezentos fica os outros duzentos a pagar
CAC C3H
(87) existe vários tipos de população relativamente à classificação que
deveremos desenvolver aplicar
CAC A1M
(88) existe brancos portugueses que fazem asneiras...
CAC A2H
(89) corridas online que é chamado os picanços online
CAC A2H
(90) é só instalar o jogo e copiar o próprio jogo e pronto e fica os níveis
todos feitos e aquilo a gente não perde nada.
Quadro 7: Dados de não-concordância em Oeiras e Cacém
Em relação aos dados de Cacém e Oeiras, apresentam-se, a seguir, os principais
fatores que parecem estar relacionados à ausência da marca de plural nos 25 dados
apresentados.
84
6.2.1 Posição do sujeito em relação ao verbo
De modo geral, para o fenômeno da concordância verbal, a posição do sujeito
vem-se destacando como uma das principais variáveis a relacionar-se com o fenômeno.
Dos 25 casos expostos, 10 apresentam sujeito posposto, o que indica que, de todas as
ocorrências obtidas sem marca, 40% – praticamente a metade – são casos de sujeito
posposto. Os exemplos abaixo permitem observar melhor o contexto:
(67) saiu algumas gramáticas alteradas mas ninguém está a usar nada – acho que a
grande complicação é por exemplo quando chegamos à altura dos nossos filhos (OEI
A3M)
(69) é muito chata porque eu já sabia de quem era não sabia de quem era os carros
mas sei sei que é dos vizinhos não é? (OEI B1M)
(70) está assim um bocado a situação que aparece pessoas que a gente pensa às vezes
que nem que não precisam (OEI B1M)
(75) portanto continua os tempos a evoluir cada vez mais não é? (OEI C1M)
(80) muito poucas muito poucas mesmo ah.. especificamente no Cacém temos alguns
não existe cinema não existe teatro não existe…exposições esse tipo de não existe…
(CAC A3M)
(81) e depois a partir da estação existe os autocarros para os diversos sítios (CAC
A3M)
(86) chegou ao fim do mês não pagou aquela/quinhentos euros só pagou trezentos fica
os outros duzentos a pagar (CAC C1H)
(87) existe vários tipos de população relativamente à classificação que deveremos
desenvolver aplicar (CAC C3H)
(88) existe brancos portugueses que fazem asneiras... (CAC A1M)
(90) é só instalar o jogo e copiar o próprio jogo e pronto e fica os níveis todos feitos e
aquilo a gente não perde nada. (CAC A2H)
85
Observando os exemplos, parece haver uma relação entre fatores nos poucos
dados de não concordância verificados. Dessa forma, compreende-se ser importante
confrontar as variáveis Posição do sujeito em relação ao verbo e Tipo de verbo, visto
que elas estão intimamente relacionadas.
Em primeiro lugar, é necessário ressaltar a presença do verbo inacusativo: dos
10 dados de sujeitos pospostos levantados, 6 são de verbos inacusativos. Além disso,
dentre esses 6 casos, 4 são do verbo existir. Como se pode observar, além de serem
poucos os casos de não marcação de pluralidade, eles ocorrem em contextos muito
particulares. Já a respeito dos verbos copulativos, também usualmente responsáveis por
influenciar a não-concordância, dentre os 10 casos de verbos sem marcação de plural
com sujeito posposto, 4 são de verbos copulativos.
No que se refere à posição do sujeito, embora se tenha observado que a metade
dos dados de ausência de marca plural ocorra com sujeitos pospostos, essa influência
efetiva-se de forma discreta na amostra como um todo. A tabela abaixo mostra o
comportamento da variável no conjunto dos dados nas duas localidades ora em análise,
das quais foram retirados os exemplos citados.
Oeiras
Cacém
Anteposto
Posposto
5/873
4/45
0,6%
8,9%
5/829
6/55
0,6%
10,9%
Tabela7: Índices de não concordância segundo a variável Posição do sujeito nas
localidades de Oeiras e Cacém
Os resultados revelam que o contexto de sujeito posposto apresenta muito mais
casos de não concordância – chegando a configurar um contexto com discreta variação
– do que o de sujeito anteposto ao verbo – praticamente invariável. Ainda assim, apenas
cerca de 9 a 11% dos casos de verbos em posição pós-verbal registram falta de
86
concordância. A concordância suplanta claramente a não concordância também nesse
contexto.
6.2.2 Presença do relativo que
De acordo com a Gramática Tradicional, quando o sujeito está representado na
oração por um pronome relativo, o verbo deve concordar com o antecedente desse
pronome, porém os estudos da concordância têm demonstrado que a presença do
relativo parece desviar o foco do referente, levando à não marcação de pluralidade.
Além disso, está ainda relacionada a essa variável a distância entre o verbo e o referente
com o qual deve concordar. Quanto mais distante está o verbo, maior costuma ser o
apagamento da desinência plural.
Os contextos abaixo representam os dados em que há a presença do relativo na
função de sujeito, dentre os 25 casos sem marcação de plural no verbo, na amostra
continental do PE, ou seja, do total de casos sem concordância, 28% possuem o
pronome relativo.
(71) há coisas que noto que leva muito tempo para se conseguir uma consulta hum hum
(OEI B2M)
(73) os hábitos que não me agrada muito a é é é- neste momento que estamos a
atravessar (OEI C1H)
(76) pelo menos por aquilo que me dizem e por aquilo que vejo ah - coisas que- no meu
tempo- era muito diferente- (OEI C2H)
(79) tem umas feiçõezinhas que identifica logo que elas são brasileiras... (CAC A1M)
(82) vai ver a bola...claro juntamente com outros amigos que se junta a ver a bola...
(CAC B1M)
(84) é assim a de antigamente tinha as suas partes chatas que era aquelas regras
completamente absurdas (CAC B3M)
(89) depois temos também corridas online que é chamado os picanços online (CAC
A2H)
87
Há, entre os casos com pronome relativo, por vezes, a presença do verbo
copulativo ser. São 3 casos de verbo ser no total de 7 dados. Nesses dados, os verbos
copulativos, relacionados também ao pronome relativo, parecem influenciar
conjuntamente na falta de marcação da concordância.
De todo modo, ainda que em quantidade restrita de dados, a presença do relativo
que, nos exemplos mencionados, parece constituir influência sobre o fenômeno pelo
fato de a relação entre o SN e o verbo ser mediada por uma forma singular, não
pluralizável. Os estudos de Monte (2012) e Bazenga e Vieira (2013) sobre o PE
também controlaram a presença do relativo que e registraram ligeiro aumento na
aplicação da concordância, quando o verbo não se relacionava ao seu referente através
do relativo.
6.2.3 Animacidade do sujeito/referente
Diferentemente dos pronomes de primeira e segunda pessoas – que são dêiticos,
remetendo necessariamente ao falante e ao ouvinte, respectivamente, como instâncias
do discurso, e, portanto, para entidades animadas –, os pronomes de terceira pessoa,
tanto quanto os substantivos, podem remeter indiferentemente a referentes animados ou
não animados.
Subordinado ao traço [± animado] está o [± humano], visto que um referente
animado não precisa ser necessariamente humano. Embora tenham sido controlados
inicialmente esses dois traços em separado, optou-se, pela improdutividade do fator [+
animado] [- humano], por fazer uma recodificação, amalgamando os fatores [+
animado] [+ humano] e [+ animado] [- humano]. Dessa forma, controlou-se apenas a
oposição entre sujeitos animados e inanimados.
Nas localidades de Oeiras e Lisboa, foram encontrados 17 casos de sujeito
inanimado dentre os 25 casos sem concordância, o que representa um percentual de
68%. Apenas 8 dados, dentre os que não possuem a marca de pluralidade, são de sujeito
animado. Os 17 casos com traço [- animado] são aqui listados:
88
(66) estes óculos estão a estão a cinquenta euros mas querem aumentá-los para
sessenta e cinco - então metem o preço em cima sessenta e cinco euros e depois metem
riscado os os cinquenta euros tipo a dizer que está em promoção (OEI A3H)
(67) saiu algumas gramáticas alteradas mas ninguém está a usar nada – acho que a
grande complicação é por exemplo quando chegamos à altura dos nossos filhos (OEI
A3M)
(68) ah as coisas que a gente conhece também não é coisas assim é os carros (OEI
B1M)
(69) é muito chata porque eu já sabia de quem era não sabia de quem era os8 carros
mas sei sei que é dos vizinhos não é? (OEI B1M)
(71) há coisas que noto que leva muito tempo para se conseguir uma consulta hum hum
(OEI B2M)
(73) os hábitos que não me agrada muito a é é é- neste momento que estamos a
atravessar (OEI C1H)
(75) portanto continua os tempos a evoluir cada vez mais não é? (OEI C1M)
(76) pelo menos por aquilo que me dizem e por aquilo que vejo ah - coisas que- no meu
tempo- era muito diferente- (OEI C2H)
(77) os livros dantes eram um bocado agora agora vejo a diferença acho achava que
era era um bocado massudos não é? (OEI C3M)
(80) muito poucas muito poucas mesmo ah.. especificamente no Cacém temos alguns
não existe cinema não existe teatro não existe…exposições esse tipo de não existe…
(CAC A3M)
(81) e depois a partir da estação existe os autocarros para os diversos sítios (CAC
A3M)
8
Observa-se, em alguns casos, a possível influência do contexto fonético posterior ao verbo em relação
à não marcação de pluralidade. Os exemplos sugerem que, em situação de sândi externo, o encontro da
desinência final dos verbos com vogais e nasais iniciando a palavra seguinte favoreceria o cancelamento
da marca de número.
89
(83) oitenta mil escudos equivale neste momento a quatrocentos euros... (CAC B2M)
(84) é assim a de antigamente tinha as suas partes chatas que era aquelas regras
completamente absurdas (CAC B3M)
(86) chegou ao fim do mês não pagou aquela/quinhentos euros só pagou trezentos fica
os outros duzentos a pagar (CAC C1H)
(87) existe vários tipos de população relativamente à classificação que deveremos
desenvolver aplicar (CAC C3H)
(89) corridas online que é chamado os picanços online (CAC A2H)
(90) é só instalar o jogo e copiar o próprio jogo e pronto e fica os níveis todos feitos e
aquilo a gente não perde nada. (CAC A2H)
No total da amostra de Cacém e Oeiras, o grupo de fatores Animacidade do
sujeito apresentou comportamento curiosamente idêntico nas duas localidades, em que
apenas 0,3% dos verbos acompanhados de sujeitos animados e 3,6% dos verbos
relacionados a sujeitos inanimados não apresentaram concordância.
Oeiras
Cacém
Animado
Inanimado
4/1362
9/250
0,3%
3,6%
3/1074
9/253
0,3%
3,6%
Tabela 8: Índices de não concordância segundo a variável Animacidade nas localidades
de Oeiras e Cacém
Em termos quantitativos, embora a não concordância seja pouquíssimo
produtiva tanto com sujeitos animados, quanto com inanimados, cabe observar que o
percentual de ausência de plural com sujeitos inanimados é muito maior, já que passa de
90
apenas 0,3% para 3,6%. Quando se analisaram qualitativamente os 25 casos que não
apresentaram plural no verbo, percebeu-se, como já se observou, a nítida predominância
de referentes de sujeitos com o traço [- animado].
6.2.4 Tipo de verbo quanto à transitividade
A hipótese que se tinha era a de que os verbos inacusativos desfavoreceriam a
marcação de concordância, diferentemente dos verbos transitivos, que, em hipótese,
seguiriam a tendência geral da variedade, que é a de alta marcação de plural no verbo.
A hipótese se confirmou nas amostras de Cacém e Oeiras, em que os poucos
casos de falta de concordância são constituídos, em sua maioria, por verbos inacusativos
e copulativos, como nos casos extraídos abaixo. São 8 verbos copulativos (32%) e 7
verbos inacusativos (28%), dentre os 25 casos de não marcação plural.
a) copulativos
(66) estes óculos estão a estão a cinquenta euros mas querem aumentá-los para
sessenta e cinco - então metem o preço em cima sessenta e cinco euros e depois metem
riscado os os cinquenta euros tipo a dizer que está em promoção (OEI A3H)
(68) ah as coisas que a gente conhece também não é coisas assim é os carros (OEI
B1M)
(69) é muito chata porque eu já sabia de quem era não sabia de quem era os carros
mas sei sei que é dos vizinhos não é? (OEI B1M)
(76) pelo menos por aquilo que me dizem e por aquilo que vejo ah - coisas que- no meu
tempo- era muito diferente- (OEI C2H)
(78) os livros dantes eram um bocado agora agora vejo a diferença acho achava que
era era um bocado massudos não é? (OEI C3M)
(84) é assim a de antigamente tinha as suas partes chatas que era aquelas regras
completamente absurdas (CAC B3M)
(86) chegou ao fim do mês não pagou aquela/quinhentos euros só pagou trezentos fica
os outros duzentos a pagar (CAC C1H)
91
(90) é só instalar o jogo e copiar o próprio jogo e pronto e fica os níveis todos feitos e
aquilo a gente não perde nada. (CAC A2H)
b) inacusativos
(67) saiu algumas gramáticas alteradas mas ninguém está a usar nada – acho que a
grande complicação é por exemplo quando chegamos à altura dos nossos filhos (OEI
A3M)
(70) está assim um bocado a situação que aparece pessoas que a gente pensa às vezes
que nem que não precisam (OEI B1M)
(74) para esses há crise e também aquelas pessoas que vieram de fora também chegou
aqui também não têm nada não é? (OEI C1M)
(80) muito poucas muito poucas mesmo ah.. especificamente no Cacém temos alguns
não existe cinema não existe teatro não existe…exposições esse tipo de não existe…
(CAC A3M)
(81) e depois a partir da estação existe os autocarros para os diversos sítios (CAC
A3M)
(87) existe vários tipos de população relativamente à classificação que deveremos
desenvolver aplicar (CAC C3H)
(88) existe brancos portugueses que fazem asneiras... (CAC A1M)
c) intransitivos
(77) e eles são cumpridores (...) quando têm que estudar não- primeiro estudam- o que
é bom também ( D-isso é óptimo) nunca foge nem pouco mais ou menos não é? (OEI
C3M)
92
6.3 Resultados de Funchal
Como a variedade madeirense apresentou comportamento diferente do das
demais localidades, configurando-se como uma regra no limite entre o semicategórico e
o variável, foi possível proceder ao tratamento estatístico dos dados, analisando,
portanto, as variáveis selecionadas pelo programa Goldvarb-X. São elas:
1) Escolaridade
2) Sexo
3) Posição do sujeito em relação ao verbo
4) Configuração morfossintática do SN sujeito
5) Animacidade do sujeito
Com os grupos de fatores selecionados pelo programa e a análise qualitativa dos
fatores que supostamente influenciaram os 25 casos de falta de concordância em Cacém
e Oeiras, é possível perceber que há muito mais semelhanças do que diferenças entre o
comportamento dessas localidades e o de Funchal em termos estruturais. As condições
percebidas como atuantes nos exemplos foram também selecionadas pelo Programa
para a subamostra de Funchal. Verificou-se, apenas, uma discreta diferença no controle
do fenômeno entre a variedade insular e a variedade continental: no que diz respeito à
variável configuração morfossintática do sujeito, foi possível analisar, nas ocorrências
de Cacém e Oeiras, apenas a presença do pronome relativo que.
Assim sendo, a particularidade de Funchal refere-se especificamente aos índices
gerais de marcação de pluralidade, que são menores, e ao fato de haver comportamento
diferenciado quanto ao condicionamento externo à língua. Os grupos de fatores
extralinguísticos, selecionados pelo programa para Funchal, não demonstraram qualquer
relevância nas amostras de Cacém e Oeiras. Em Funchal, conforme já se descreveu, os
resultados confirmam que os indivíduos pouco escolarizados e as mulheres realizam
menos a marca de plural do que os demais. Como os fatores extralinguísticos já foram
analisados na seção referente à distribuição geral dos dados, abaixo estão apenas as
tabelas que mostram os pesos relativos dos fatores sociais Escolaridade e Sexo, que
93
confirmam as tendências descritas anteriormente com base em percentuais. Trataremos,
em seguida, nesta seção, exclusivamente dos grupos de fatores linguísticos selecionados
pelo programa.
Aplic./Total
%
PR
Nível fundamental
34/335
10,1%
.84
Nível médio
12/303
4,0%
.53
Nível Superior
21/588
3,6%
.27
Tabela 9: Índices de não concordância segundo a variável Escolaridade na localidade de
Funchal
Aplic./Total
%
PR
Homens
27/639
4,2%
.38
Mulheres
40/587
6,8%
.63
Tabela 10: Índices de não concordância segundo a variável Sexo na localidade de
Funchal
6.3.1 Posição do sujeito em relação ao verbo
A variável linguística que demonstrou maior relevância na amostra de Funchal
foi a Posição do sujeito em relação ao verbo. Como é possível perceber pelos dados da
tabela a seguir, construções com o sujeito posposto ao verbo apresentam maiores
94
índices de falta de concordância do que as construções em que o sujeito aparece
anteposto ao verbo.
Aplic./Total
%
PR
Anteposto
29/767
3,8
.43
Posposto
29/60
48,3
.97
Tabela 11: Índices de não concordância segundo a variável Posição do sujeito na
localidade de Funchal
Abaixo estão alguns exemplos da não realização da concordância atrelada à
posposição do sujeito nos dados de Funchal:
(91) por exemplo um lego e tiver lá as estradinhas mas mas pra quê que serve as
estradinhas se não há investimento em que há nem as infra-estruturas necessárias
(FNC A3H)
(92) se ajuda a a que a que na nas nações unidas não exista dois textos um escrito em
português de portugal outro do brasil acho que é importante (FNC A3H)
(93) voltou a se provar que existia ainda substâncias do codipron (FNC B2H)
Como já se demonstrou anteriormente, a variável posição do sujeito não
influenciou apenas a variedade insular, mas a amostra como um todo. Na tabela abaixo,
é possível ver o comportamento da variável, que foi uma das selecionadas pelo
programa Goldvarb X – numa rodada com as três localidades – como as que mais
influenciam a falta de concordância. Em 160 ocorrências de sujeito posposto em toda a
amostra, 39 não possuem marca formal de plural no verbo, o que indica 24,4% de
cancelamento da marca. O peso relativo de .94 demonstra a grande influência da ordem
VS na falta de concordância. Os resultados vão ao encontro da hipótese de que o sujeito
posposto é, muitas vezes, interpretado como objeto do verbo, por ser, na realidade, um
argumento interno, não trazendo a marca de plural.
95
Aplic./Total
%
PR
Anteposto
39/2469
1,6
.45
Posposto
39/160
24,4
.94
Tabela 12: Índices de não concordância segundo a variável Posição do sujeito na
amostra geral
Nos estudos sobre a concordância no PE, a posição pós-verbal do sujeito
costuma ser citada como influenciadora na falta de concordância. Em todos os estudos
descritos na seção de revisão bibliográfica, há a confirmação desse grupo de fatores
como relevante para a concretização do fenômeno.
Conforme já se discutiu, está relacionado à posição do sujeito o tipo de verbo na
perspectiva sintática. Com os verbos inacusativos, por exemplo, os sujeitos costumam
aparecer em posição pós-verbal. Dessa forma, tornou-se necessário o cruzamento das
duas variáveis em questão, para esclarecer como se dá, na distribuição dos dados, a
interface entre esses grupos de fatores. Confirmou-se, assim, a predominância dos
verbos inacusativos, no caso sem marcação de plural, na posição posterior ao verbo.
Transitivos
Copulativos
Inacusativos
Intransitivos
Sujeito anteposto
Sujeito posposto
15/1581
5/49
0,9%
10,2%
15/537
9/27
2,8%
33,3%
5/134
22/62
3,7%
35,5%
4/217
3/22
1,8%
13,6%
Tabela 13: Ìndices de não concordância segundo o cruzamento Tipo de verbo x Posição
do sujeito em relação ao verbo.
96
Assim como na análise qualitativa dos dados de Cacém e Oeiras, a amostra de
Funchal também demonstrou altos índices de falta de concordância com os verbos
inacusativos e copulativos, especialmente com sujeito posposto. Ao que tudo indica, a
posição do sujeito é a influência preponderante na aplicação da ausência da marca de
número plural.
6.3.2 Configuração morfossintática do SN sujeito
Em relação à variável Configuração morfossintática do SN sujeito, foi
necessário fazer recodificações e amalgamar alguns dos fatores (descritos no capítulo
4), pela inexpressividade quantitativa revelada nos resultados iniciais e para que fosse
possível prosseguir com a análise estatística. A tabela a seguir apresenta os resultados
considerando os fatores devidamente amalgamados.
Aplic./Total
%
PR
3/231
1,3
.21
36/377
9,5
.57
6/41
14,6
.83
Sujeito não expresso (oculto/desinencial)
9/399
2,3
.42
pronome relativo
13/178
7,3
.82
pronome pessoal + pronome possessivo +
pronome
demonstrativo
+
quantificador
indefinido + quantificador numeral
SN (núcleo do tipo nome) sem SPrep
encaixado
SN (núcleo do tipo nome) com SPrep
encaixado + SN/pronome com uma oração
relativa/adjetiva
+
SNs
plenos/pronomes
coordenados (com ou sem oração relativa)
Tabela 14: Índices de não concordância segundo a variável Configuração
morfossintática do SN sujeito na localidade de Funchal
97
Assim como nos casos de Oeiras e Cacém, o pronome relativo se mostrou
desfavorecedor à aplicação da regra de concordância. Além disso, os SNs mais
complexos (como nos exemplos a seguir), aqueles que apresentam um SPrep encaixado,
uma oração relativa ou até SNs ou pronomes coordenados, também favorecem a falta de
concordância, possivelmente por atenuar a relação do referente plural com o verbo,
aumentar a distância entre o núcleo do SN e o SV e também pelo fato de o último
elemento inserido no SPrep ou na oração relativa poder estar no singular. Dessa forma,
o foco no núcleo do SN plural se perderia, seja pela presença de outras informações,
seja pela proximidade de outros SNs com o SV ou pelo fato de o último elemento
coordenado estar no singular, o que desfavoreceria a concordância.
(94) as pessoas do de lisboa não são frias (FNC C2M)
(95) ela e ele tava [estavam] (FNC C1M)
6.3.3 Animacidade do sujeito/referente
A variável Animacidade, assim como nos casos de Cacém e Oeiras, comprova
com seus resultados a hipótese de que os sujeitos inanimados contribuem para a falta de
concordância. Os exemplos desse caso podem ser vistos após a tabela.
Aplic./Total
%
PR
Animado
26/981
2,7
.42
Inanimado
41/245
16,7
.75
Tabela 15: Índices de não concordância segundo a variável Animacidade na localidade
de Funchal
(96) as mercearias na altura fechava às onze (FNC B1M)
(97) as tabuadas era salteade (FNC B1M)
98
Na análise multivariada com todas as ocorrências das três localidades, confirmase em índices probabilísticos a influência exercida pelo traço [- animado], apresentando
esse fator o peso relativo de .80.
Aplic./Total
%
PR
Animado
33/3384
1,0
.42
Inanimado
59/689
7,9
.80
Tabela 16: Índices de não concordância segundo a variável Animacidade na amostra
geral.
99
7 DESCRIÇÃO FONÉTICA DAS TERMINAÇÕES VERBAIS
Segundo Mota, Miguel e Mendes (2012), a falta de concordância acontece
quando a forma verbal relativa à 3ª pessoa do plural é homófona à da 3ª pessoa do
singular. Nos verbos regulares, na maioria dos paradigmas verbais, a diferença entre as
duas formas consiste na presença de um ditongo nasal vs. de uma vogal. As autoras
apontam ainda que, em variedades rurais não standard no PE, ocorrem as seguintes
variantes de flexão para verbos com vogal temática –A, como lavam: (i) com ditongo
nasal: lav[a], lav[e]; (ii) com vogal nasal: lav[a], lav[o], lav[u], lav[e], lav[i]; (iii) com
vogal oral: lav[u], lav[].
A tabela abaixo, pertencente ao trabalho de Bazenga (2011, p. 14), mostra as
desinências verbais canônicas para a 3ª pessoa do plural no PE e como foram realizadas
em algumas localidades descritas nos trabalhos de Rodrigues e Mota (2008) e Bazenga
(2010).
Corpus – PE1
(Rodrigues & Mota,
2008)
Northern EP dialects
Standard 3PL
variants
[ã]
Present tense
(1st conj.)
[ã]
Present tense
(2nd, 3rd conj.)
[ã]
Past Imperfect
Tense
(1st, 2nd, 3rd
conj.)
[ã]
Past Perfect
Tense
(1st, 2nd, 3rd
conj.)
Corpus BBAA
(Rodrigues & Mota,
2008)
Central Southern EP
dialects
Corpus –
Funchal
(Bazenga,
2010)
Insular EP
dialect
Non-standard 3PL variants / Tokens
[] / 4
[u] / 1
[] / 1
[ã] / 27
[j] / 1
[i] / 12
[]~ / 3
[] / 4
[u] / 1
[] / 1
[] / 5
[u] / 2
[ã] / 8
[i]
[e]
[a]
[e]
/ 45
/ 35
/ 12
/ 33
[u]~[u] / 6
100
Tabela 17: Regional diffusion of non-standard variants of 3PL in EP (BAZENGA,
2012 p. 14)
Tendo percebido as especificidades da pronúncia portuguesa quanto a
determinadas terminações verbais, apresenta-se, aqui, uma breve descrição fonética
acerca das oposições singular e plural especialmente dos pares verbais de baixa
saliência fônica, aqueles que mais evidentemente demonstrariam comportamento
distinto do previsto na escala de saliência fônica empregada normalmente em estudos
sobre o Português do Brasil.
A variável saliência fônica não foi selecionada como relevante quanto ao
emprego de plural nos verbos da variedade europeia. Os índices abaixo são os
resultados absolutos e percentuais referentes aos fatores usualmente controlados, que
tiveram que ser amalgamados para melhor controle quantitativo.
Aplic./Total
%
come/comem; sai/saem
24/614
3,9
fala/falam
49/1787
2,7
faz/fazem
0/121
0
quer/querem
0/117
0
dá/dão
2/395
0,5
vai/vão
1/201
0,5
comeu/comeram; foi/foram; viu/viram
5/171
2,9
falou/falaram
3/207
1,4
101
disse/disseram; quis/quiseram
0/17
0
fez/fizeram; teve/tiveram
0/58
0
veio/vieram
0/17
0
10/462
2,2
é/são
Tabela 18: Índices de não concordância segundo a variável Saliência fônica na amostra
geral.
Com os índices encontrados para a variável Saliência fônica, é possível perceber
que não há um comportamento regular dos dados em relação à hipótese inicialmente
formulada. Em pares de média (faz/fazem; quer/querem) ou de alta (disse/disseram;
quis/quiseram; fez/fizeram; teve/tiveram; veio/vieram) diferenciação nas formas
singular-plural, ocorrem índices categóricos de concordância. Além disso, nesses pares,
praticamente todos os exemplos encontrados são de sujeitos pospostos, o que indica que
não se trata mesmo de uma motivação da saliência em si. Os dados da oposição é/são
são obviamente diferentes dos demais por constituírem construções copulativas, como
já se observou na análise variacionista.
Embora não se tenha atestado a efetiva atuação da escala de saliência proposta,
já que a posição do sujeito e o tipo de construção estavam coatuando nitidamente, os
dados europeus mostram que, excetuando-se essas influências, é nos pares de baixa
saliência fônica que está a maior concentração dos dados de ausência de plural. Desse
modo, a descrição da pronúncia das terminações verbais permite não só aferir o
contexto fonético-fonológico em que se dá a não realização da marca de plural, mas
também avaliar se a escala proposta para o PB se ajusta aos dados do PE.
Neste trabalho, fez-se tão-somente uma primeira observação das pronúncias das
terminações verbais, a título de análise complementar, de modo a confirmar ou não a
hipótese de que o componente fonético-fonológico precisa ser investigado de forma
mais detalhada em investigações futuras. É preciso deixar claro que a tarefa de ouvir,
descrever e analisar as terminações verbais é complexa, ainda mais quando se trata de
102
uma pronúncia não familiar à audição do pesquisador. Nesse caso, assume-se aqui a
necessidade de dar prosseguimento ao trabalho futuramente com o auxílio de
pesquisadores europeus que utilizem a fonética perceptiva, estando eles já habituados e
familiarizados com a pronúncia estudada. Além disso, o uso da fonética acústica
também será de grande valia, visto que conta com ferramentas que podem sanar
possíveis dúvidas. Espera-se que uma descrição pormenorizada sobretudo do timbre
vocálico em cada par opositivo poderá contribuir para determinar, de forma acurada, a
diferenciação ou a ausência de diferenciação entre as formas singular e plural.
Como a descrição de cunho fonético-fonológico não constitui o foco principal da
pesquisa e em função dos limites naturais do trabalho, optou-se por tratar da questão em
uma subamostra do Corpus Concordância. Foi realizado o levantamento das desinências
finais dos verbos de 3ª pessoa do plural em 9 entrevistas de informantes do sexo
masculino em Oeiras e 9 entrevistas de informantes do sexo masculino em Funchal.
Assim, atentando para o mesmo perfil do informante, a descrição contempla tanto o
Português continental quanto o insular, nas duas capitais correspondentes.
Conforme já se informou, foram analisados os verbos que possuem pequena
diferença na realização fônica entre suas formas singular e plural. Desse modo, a partir
da escala de saliência fônica utilizada nesta pesquisa, foram observadas as formas
verbais compreendidas nos seguintes casos:
a) não envolve a mudança na qualidade da vogal na forma plural - acréscimo
de nasalidade (vive-vivem)
b) envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural - acréscimo da
semivogal [w] (fala/falam)
c) envolve acréscimo de segmentos na forma plural e possível mudança na
realização da consoante final do singular (faz/fazem)
d) envolve acréscimo de segmentos na forma plural e possível mudança na
realização da consoante final do singular (quer/querem)
103
Da subamostra de Funchal, foram transcritas as desinências de 298 formas
verbais e, na de Oeiras, 418, totalizando 716 ocorrências de baixa saliência fônica
analisadas, distribuídas pelas localidades e pelos níveis de saliência da seguinte forma:
OEIRAS
FUNCHAL
a) vive/vivem
76/418
77/298
b) fala/falam
297/418
206/298
c) faz/fazem
24/418
9/298
d) quer/querem
21/418
6/298
Tabela 19: Distribuição dos dados de baixa saliência fônica na subamostra de descrição
fonética de Oeiras e Funchal
Como resultado geral, observou-se, de acordo com a intuição da percepção
auditiva brasileira, que haveria predominância, nas duas variedades, do uso das formas
ditongadas [] – típica dos verbos com vogal temática -A – e [] – típica dos verbos
com vogal temática -E ou -I –, consideradas padrão, em exemplos como:
(98) as pessoas aprendem com os pais (OEI A1H)
(99) eles não viviam comigo- mas pronto (OEI A2H)
(100) centenas ou milhares de indivíduos que dependiam dele (FNC B3H)
Nos dados de Oeiras, apenas um, apresentado a seguir, não foi realizado com
o referido ditongo. Já em Funchal, houve certa variabilidade na realização das
terminações verbais em termos fonéticos, estejam elas realizadas como na forma
singular, como um ditongo não padrão ou como vogal nasal. A tabela abaixo mostra o
número de dados e os percentuais de uso das formas [] e [], consideradas padrão.
104
a) vive/vivem
b) fala/falam
c) faz/fazem
[]
[]
[]
d) quer/querem []
OEIRAS
FUNCHAL
76/76
72/77
100%
93,5%
296/297
182/206
99,7%
88,3%
24/24
9/9
100%
100%
21/21
6/6
100%
100%
Tabela 20: Índices dos tipos de ditongos padrão na subamostra de descrição fonética
de Oeiras e Funchal
Os casos que fugiram à forma padrão encontram-se em diferentes tipos de
estruturas quanto aos contextos fonéticos da palavra seguinte, contextos que
possivelmente exerceram influência sobre a pronúncia das terminações verbais. O
primeiro a ser comentado é a utilização da desinência de 3ª pessoa do singular, que,
nos dados em estudo, foi percebida como sinalizando ausência da marca de
concordância. São 12 ocorrências desse tipo, em que apenas uma é de Oeiras.
(73) os hábitos que não me agrada muito a é é é - neste momento que estamos
a atravessar (OEI C1H)
(102) coisas que não acontece (FNC B1H)
(103) há situações que nos põe um sorriso na boca (FNC B1H)
(104) as próprias feições das pessoas _ acho que muda de zona p’ra zona
(FNC B1H)
(105) as patas roda de volta (FNC C1H)
105
(106) [mulheres] puxava as saias (FNC C1H)
(107) aqueles canteires que trazia a mercadoria (FNC C1H)
(108) trazia batata trazia semilhas (FNC C1H)
(109) voltou a se provar que existia ainda substâncias do codipron (FNC B2H)
(110) muito mais quando existe armas de fogo (FNC B2H)
(111) quando existe ameaças (FNC B2H)
(112) só quando era colunas de opinião (FNC B3H)
Esses casos, em que não ocorre a variante padrão ditongada, podem ser
distribuídos pelos seguintes contextos:
a) [] e [] seguidos de vogal:
(103) há situações que nos põe um sorriso na boca (FNC B1H)
(106) [mulheres] puxava as saias (FNC C1H)
(107) aqueles canteires que trazia a mercadoria (FNC C1H)
(109) voltou a se provar que existia ainda substâncias do codipron (FNC B2H)
(110) muito mais quando existe armas de fogo (FNC B2H)
(111) quando existe ameaças (FNC B2H)
b) [] seguido de nasal:
(101) os hábitos que não me agrada muito a é é é (OEI C1H)
c) [] seguido de pausa:
(102) coisas que não acontece (FNC B1H)
d) [] seguido de consoante não-nasal:
106
(104) as próprias feições das pessoas _ acho que muda de zona p’ra zona
(FNC B1H)
(105) as patas roda de volta (FNC C1H)
(108) trazia batata trazia semilhas (FNC C1H)
(112) só quando era colunas de opinião (FNC B3H)
É preciso assinalar, aqui, que, especialmente no contexto seguido de consoante
nasal ou de som vocálico, a mera percepção auditiva da terminação verbal não permite
assegurar se a qualidade vocálica em questão – aqui identificada como não plural – é,
de fato, idêntica à da realização da forma no singular. Sem dúvida, recursos de uma
análise acústica poderiam colaborar com essa determinação.
Além dos casos tidos como sem a marca de concordância, ocorreu também
outra forma não-padrão. Percebeu-se a utilização da variante [e], na amostra de
Funchal, para verbos com VT /a/, que possuem como terminação canônica da 3ª pessoa
do plural a forma [ã]. Esse fato – que também foi registrado por Vieira & Bazenga
(2013) – se concretizou em 11 ocorrências da amostra insular. O fato de essa forma não
ter sido encontrada na variedade continental confirma o comportamento diferenciado do
Português que a Ilha apresentou na análise multivariada.
(113) tinha alguns sargues que erem [eram] muite velhes (FNC C1H)
(114) erem [eram] muite grandes (FNC C1H)
(115) punhem [punham] em terra gastava no calhau (FNC C1H)
(116) naquele tempo ai mulheres nem usavem [usavam] cuecas (FNC C1H)
(117) erem [eram] as saias compridas pa mijar em pé (FNC C1H)
(118) as mulheres esticavem [esticavam] a perna (FNC C1H)
(119) eles vinhem [vinham] em cima da gente (FNC C1H)
(120) os vizinhes não faziem [faziam] case (FNC C1H)
(121) aqueles carres que andem [andam] de noite (FNC C1H)
(122) na festa eles davem [davam] um pão grande (FNC C1H)
(123) trabalhavem [trabalhavam] pra_ um era barbeiro (FNC C1H)
107
Por último, estão os dados em que a desinência final do verbo foi representada
por uma vogal com traço de nasalidade, mas em que não há ditongação.
a) []
(124) algumas mulheres ehhhh quando encontravam um marido (FNC C2H)
(125) os homens encontravam uma mulher (FNC C2H)
(126) melhor do que viviam no dia anterior (FNC B3H)
(127) também não convinham de maneira alguma (FNC C2H)
(128) eles já não _ já não se deixam (FNC B1H)
b) []
(129) eles lá recolhem as pessoas (FNC A1H)
(130) há situações que nos põem um sorriso na boca (FNC B1H)
Dentre os 30 casos em que não foi usada a forma padrão ditongada, 20 estão
diante de um segmento nasal ou de uma vogal, o que demonstra a forte influência do
sândi externo na realização dessas terminações verbais.
Partindo-se da hipótese de que a forma verbal “quer” e outras formas no
infinitivo poderiam possuir, na pronúncia portuguesa, a inserção do segmento vocálico
[] ao fim (como em “quere”, “saire”), optou-se por ouvir dados também no singular
para observar se verbos como o par quer/querem estariam, na fala portuguesa,
pronunciados consoante o mesmo grau de saliência fônica da oposição come/comem.
Como esse interesse surgiu com o desenvolvimento do trabalho e não constitui foco
principal da investigação, percebe-se a necessidade de fazer dessa questão um trabalho à
parte, tendo em vista que, nesse caso, é necessário coletar e analisar também vasta
quantidade de dados no singular.
Na pequena quantidade de dados observados, a hipótese aparentemente se
confirmou pela percepção auditiva de um suposto segmento vocálico em vocábulos
108
como os destacados nos exemplos abaixo, o que precisa ser confirmado em análise
específica do fenômeno:
(131) antes da idade ele quer sair pode sair comigo não com os amigos (FNC A1H)
(132) se ele ler porque o pai obriga ele não quer ler ou se for estimulado por obrigação
(FNC B3H)
(133) o que eu gostava de seguir? (FNC A2H)
(134) querer quero _ agora conseguir (FNC A2H)
(135) quando há jogos no liceu tipe costuma ir lá antes dos jogos (FNC A2H)
Seguindo essa análise dos dados europeus, a presente descrição sugere que
investigações futuras da concordância devam investigar a variável saliência fônica a
partir da efetiva realização fonética dos pares verbais. Com base nos resultados obtidos
neste trabalho, propõe-se que uma nova escala de saliência fônica deve ser estabelecida,
de modo que o par quer/querem (quer[]/quer[]) poderia ser classificado, por exemplo,
junto com verbos como vive/vivem (viv[]/viv[]). Ademais, as pronúncias dos
ditongos não padrão deveriam estar acomodadas separadamente daquelas consideradas
padrão. Os casos de faz/fazem ficariam separados, tendo em vista que a pronúncia de
poucos vocábulos do tipo faz no corpus analisado não revelou a presença de um som
vocálico como parece ser o caso de quer, o que obviamente deve ser investigado com
mais profundidade em número maior de ocorrências. Dessa forma, os dados de baixa
saliência se reorganizariam supostamente da seguinte forma:
a) Mudança na qualidade da vogal na forma plural - Ditongo tradicional []
vive/vivem; quere/querem
b) Mudança na qualidade da vogal na forma plural - Ditongo tradicional []
canta/cantam
109
c) Mudança na qualidade da vogal na forma plural - Ditongo não padrão [e]
canta/cantem
d) Acréscimo de segmentos na forma plural e mudança na realização da consoante
final do singular – Ditongo padrão []
faz/fazem
110
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo sobre o comportamento do fenômeno da concordância verbal de 3ª
pessoa do plural na variedade europeia do Português, considerando as localidades de
Cacém, Oeiras e Funchal, constatou alta produtividade da marcação de plural,
demonstrando que a ausência de marca de concordância se dá em contextos
morfofonológicos e morfossintáticos bastante específicos.
A amostra básica, que contava com 18 informantes de cada uma das três
localidades, e a amostra complementar, com 12 informantes, registraram o índice de
apenas 2,2 % de ausência de marca plural, o que, segundo Labov (2003), caracteriza o
fenômeno não como variável, mas como semicategórico, visto não alcançar sequer a
marca de 5% de uma das formas alternantes.
A partir das primeiras rodadas multivariadas dos dados no programa GoldvarbX, ficou claro que, apesar de, em conjunto, as localidades em estudo apresentarem
baixíssimo índice de falta de concordância, a variedade madeirense se diferencia das
demais, pois apresenta comportamento no limite entre o semicategórico e o variável na
marcação da concordância, como já haviam apontado Vieira e Bazenga (2013),
valendo-se apenas da fala de informantes da amostra básica.
Dessa forma, optou-se por avaliar separadamente as ocorrências do português
continental e as da variedade insular. Analisando-se qualitativamente os 25 dados em
que não se registrou a marca de plural nas amostras de Cacém e Oeiras, foi possível
apresentar os raros contextos em que o verbo não concordou com seu referente, o que
pôde ser confirmado, em alguns casos, pelos índices percentuais relativos às variáveis
em questão.
As variáveis sociais controladas – nível de escolaridade, faixa etária e sexo –
nada revelaram sobre o valor social do fenômeno da concordância nos dados do PE
tomados em conjunto e principalmente nas variedades continentais, isto é, não
demonstraram influência sobre os resultados explicitados. A única constatação que se
obteve a respeito da caracterização social da concordância no PE é o fato de, apenas em
Funchal, os informantes com menor nível de escolaridade e as mulheres serem
responsáveis por maiores índices de cancelamento da marca de plural (e também pela
produção da maior parte das desinências verbais não padrão). Sem dúvida, esse
resultado sinaliza o vasto campo de investigação que precisa ser explorado acerca do
111
Português Madeirense, em relação não só aos usos linguísticos praticados nos dias
atuais, mas também à sua constituição histórica particular.
A variável escolaridade demonstrou maior aplicação da regra de concordância
por falantes com maior grau de escolaridade. Os informantes com nível fundamental
obtiveram 10,1% de falta de concordância. Em contrapartida, os de nível médio e
superior atingiram os índices de 4% e 3,6%. Ao que parece, a escolaridade constitui
fator importante na diferenciação entre os menos escolarizados, de um lado, e os demais
indivíduos, medianamente ou muito escolarizados.
Ainda sobre a caracterização social do fenômeno na variedade insular, apesar de
pequenas diferenças percentuais, as mulheres parecem liderar o uso da forma inovadora
e estigmatizada. Enquanto os homens apresentaram 4,2% de falta de concordância, em
Funchal, as mulheres apresentaram 6,8%. Levando-se em consideração as configurações
sócio-culturais e sócio-históricas da comunidade de Funchal, em que o acesso a bens
culturais é mais restrito e a economia é centrada no setor terciário, principalmente
relacionada ao turismo, é curioso o comportamento diferenciado das mulheres, que
contraria a hipótese de que elas estariam à frente do uso da forma conservadora e de
prestígio.
Em relação às características socioeconômicas e culturais de Cacém e Oeiras,
constatou-se que o fato de estarem localizados em região aproximada ou na própria
cidade de Lisboa, que é considerada, juntamente com Coimbra, o berço da norma
padrão culta do português europeu, faz com que tenham comportamento mais
conservador em relação ao fenômeno. É fato que a freguesia de Oeiras se destaca de
Cacém por ser o local, dentre os três em estudo, de maior poder aquisitivo, em que estão
instaladas grandes empresas multinacionais e importantes universidades e centros de
estudos, além de não ser rota principal de turistas, o que faz com que os usos locais,
conservadores, se mantenham de certa forma afastados da influência de formas
inovadoras trazidas por visitantes.
Cacém, por sua vez, ainda está em desenvolvimento, apresentando constante
crescimento urbano e populacional. Devido a isso, recebe estrangeiros que, atraídos por
menores custos residenciais, fazem da freguesia uma espécie de “bairro dormitório”.
Durante o dia, saem do Cacém para irem trabalhar em Lisboa e regiões próximas,
retornando a suas casas apenas à noite para dormir. De qualquer forma, ainda que com
características distintas de Oeiras, pelo fato de estarem localizados na porção
112
continental de Portugal e próximos à capital, parecem manter, de forma geral, as formas
linguísticas de prestígio, ao menos no que se refere, não só ao fenômeno da
concordância verbal, mas também, como demonstram outros estudos científicos, à
concordância nominal (BRANDÃO; VIEIRA, 2012) e à implementação da forma nós
de 1ª pessoa do plural (VIANNA, 2009).
Em relação aos contextos relacionados aos poucos casos de ausência de marca
plural encontrados em Cacém e Oeiras, embora não se possam atestar efetivas restrições
ao fenômeno, por não se postular aqui a existência de uma regra variável, observaramse os contextos envolvidos em tais dados, quais sejam: a Posição do sujeito em relação
ao verbo; a Presença do relativo que, a Animacidade do referente e o Tipo de verbo na
perspectiva sintática.
Dentre as 25 ocorrências em que a forma verbal apareceu no singular, 10
possuíam o sujeito em posição pós-verbal. Esse resultado dá relevância à hipótese de
que o sujeito, quando aparece em posição posterior ao verbo, é, por vezes, interpretado
como objeto, justificando, portanto, a não marcação de plural no verbo. É importante
salientar ainda que, relacionado à posição do sujeito está o tipo de verbo. Desses 10
dados com sujeito posposto, 6 possuíam verbo inacusativo, que costuma aparecer em
ordem VS. Os outros 4 casos são de verbos copulativos, que devido, muitas vezes, à
dúvida sobre o referente criado na relação entre o sujeito e o predicativo, levam à falta
de concordância. De todo modo, o estudo sugere que é a posição do sujeito em si o fator
desencadeador da não marcação de pluralidade, o que apenas se correlaciona mais com
determinado tipo de verbo.
O segundo contexto analisado nos dados da amostra continental do PE foi a
presença do relativo que, que foi controlada a partir da variável Estrutura
morfossintática do SN sujeito.
Com a observação desse fator, constatou-se que a
presença do relativo que, não pluralizável e em posição interveniente entre o verbo e seu
referente, leva à não marcação de plural no verbo por ‘desviar’ o foco em relação ao
referente. Registraram-se 8 ocorrências, nas 25, em que o relativo que exercia a função
de sujeito sintático.
Nas mesmas 25 ocorrências, a variável Animacidade do sujeito/referente
também pareceu relevante, pois 17 dados possuíam o traço [-animado]. Assim como nos
estudos de Monguilhott (2009), Monte (2012), Rubio (2012) e Bazenga e Vieira (2013),
os sujeitos inanimados demonstraram ser desfavorecedores da concordância.
113
A respeito do Tipo de verbo, os copulativos e os inacusativos, com 8 e 7
ocorrências respectivamente, demonstraram predominância nos casos de não marcação
de plural no verbo, assim como já se mencionou na análise dos sujeitos pospostos,
contexto que constitui o fator preponderante para a ausência da marca de plural.
Diferentemente das amostras de Cacém e Oeiras, que obtiveram apenas 0,8 e
0,9% de falta de concordância, respectivamente, Funchal apresentou 5,5% de não
marcação, o que permitiu que fosse dado seguimento ao tratamento estatístico dos
dados. As variáveis selecionadas pelo programa Goldvarb-X como relevantes para o
fenômeno na variedade madeirense foram as seguintes: Escolaridade, Sexo, Posição do
sujeito em relação ao verbo, Configuração morfossintática do SN sujeito e Animacidade
do sujeito/referente.
A análise variacionista confirmou o comportamento das variáveis sociais já
discutido: mulheres e indivíduos menos escolarizados de Funchal realizariam menos a
marca de plural nos verbos.
A variável Posição do sujeito em relação ao verbo demonstrou o mesmo
comportamento observado em Cacém e Oeiras, com a diferença de possuir índices
significativos. Dentre os sujeitos pospostos, 48,3% não possuíam concordância
verbo/sujeito.
O comportamento da variável referente à configuração morfossintática do SN
sujeito reforçou o fato de o relativo que favorecer a não concordância. Além disso, os
SNs que apresentam um SPrep encaixado ou uma oração relativa ou, ainda, núcleos
coordenados também favoreceram a ausência da marca de pluralidade.
Por último, a Animacidade do referente confirmou a hipótese de que os sujeitos
com traço [+ animado] favorecem a concordância, enquanto o traço [- animado]
desfavorece a mesma. Os sujeitos inanimados não concordaram com o verbo em 7,9%
dos casos, enquanto os animados apresentaram apenas 1% de não concordância.
Além da análise qualitativa das ocorrências e do tratamento estatístico dos
dados, optou-se por descrever, apenas com base na percepção auditiva, a pronúncia das
terminações dos verbos que apresentam particularidades fonéticas relativas à distinção
entre suas formas singular e plural, o que geraria diferença na escala de saliência fônica
que foi proposta para as amostras brasileiras e é utilizada também para o PE. Essa
descrição, de caráter preliminar, teve por motivação as especificidades apontadas na
pronúncia portuguesa quanto a determinadas terminações verbais.
114
Com o levantamento das desinências, constatou-se a preferência pela utilização
das formas ditongadas [] e [], em verbos como fala/falam, vive/vivem, faz/fazem e
quer/querem. De 716 ocorrências, sendo 418 de Oeiras e 298 de Funchal, 29 em
Funchal e apenas 1 em Oeiras não utilizaram as formas padrão ditongadas. Dentre
essas 30, estavam 12 casos de realizações apenas de vogais, o que costuma ser
considerado falta de concordância, 11 casos em que o ditongo não padrão [e] foi
utilizado em verbos com vogal temática /a/, e 7 em que as desinências estavam
representadas apenas por uma vogal nasal.
Observou-se, ainda, que, dos 30 casos em que não foi utilizada a terminação
ditongada, 20 estão diante de um segmento nasal ou de uma vogal, o que demonstra a
forte influência do sândi externo na realização dessas terminações verbais. Esses
contextos favorecem, ao que tudo indica, o enfraquecimento da realização fonética
plena na forma dos citados ditongos decrescentes.
A descrição fonética das terminações verbais permitiu, ainda, sugerir que a
escala de diferenciação entre as formas singular e plural merece ser reformulada em
função das características particulares da variedade em análise. Observados
especialmente os baixos graus de saliência fônica, que foram propostos em Lemle e
Naro (1977) para dados da variedade brasileira, propõe-se que os pares verbais precisam
ser realocados em função das terminações verificadas nas variedades europeias. Desse
modo, o par quer/querem, por exemplo, poderia ser analisado em conjunto com
come/comem, já que a forma singular quer parece ser pronunciada com a vogal [] ao
final, como ocorre em come. Além disso, devem constar na escala de saliência fônica os
verbos que são realizados com a variante não padrão [e], como em canta/cantem. Dessa
forma, a escala de saliência fônica atenderia melhor ao perfil da variedade europeia do
Português.
De todo modo, cabe ressaltar que a descrição fonética preliminarmente realizada
na presente pesquisa constituiu apenas uma observação preliminar das pronúncias das
terminações verbais, a título de análise complementar, de modo a confirmar ou não a
hipótese de que o componente fonético-fonológico precisa ser investigado de forma
mais detalhada em investigações futuras. Nesse sentido, contar com a audição das
formas verbais por parte de investigadores portugueses e com uma análise de natureza
acústica constituem recursos fundamentais em investigação futura.
115
Em linhas gerais, os resultados do presente trabalho, somando-se às
contribuições de outros estudos sobre o tema – como o de Varejão (2006), Monguilhott
(2009, 2010), Monte (2012), Rubio (2012), Brandão e Vieira (2012b) e Bazenga e
Vieira (2013) –, apresentam evidências de que existem diferentes padrões de
concordância na língua portuguesa: um variável, apontado em estudos sobre o
Português do Brasil e o Português de São Tomé, por exemplo; e outro semicategórico,
como observado no Português Europeu, sobretudo nas amostras continentais.
Embora o estudo tenha detectado algumas restrições, atuantes principalmente na
amostra de Funchal (localidade cujas características socioculturais, históricas e também
linguísticas também precisam ser mais bem estudadas em trabalhos futuros), que
funcionam em praticamente todas as amostras brasileiras – como a posição e a
constituição formal do sujeito e a animacidade do referente –, entende-se, assim como
propuseram Brandão e Vieira (2012b), que essas variáveis não são reveladoras do que
seria o PB e o PE em particular. Antes, parecem ser princípios gerais, possivelmente de
natureza cognitiva/processual, que poderiam ser verificados em línguas diversificadas,
independentemente de suas origens comuns ou de suas semelhanças tipológicas.
O fato é que, quantitativa e qualitativamente, os dados do Português Europeu –
de praticamente todos os estratos sociais controlados na presente investigação – são
muito particulares, configurando um quadro semicategórico de concordância e os
poucos dados de não realização da marca se limitam a contextos muito específicos,
preferencialmente com sujeitos pospostos, com referentes inanimados, representados na
oração pelo relativo “que”, com verbos de baixa saliência fônica, inacusativos ou
copulativos, e, ainda, influenciados pelo contexto fonético seguinte, iniciado por som
vocálico ou nasal. Essa realidade nem de perto se assemelha à ampla variação detectada
no Português do Brasil, em qualquer tipo de construção, variedade em que se delimita
um contínuo de realização de plural, que vai da alta preferência pela concordância em
comunidades de fala urbana e de alta escolaridade até a alta produtividade da não
concordância, como se verifica em comunidades rurais e/ou de baixa escolaridade, o
que ocorre inclusive em ordem direta e com verbos de alta saliência fônica, como em os
menino estudou aqui.
Tendo o PE contextos tão específicos de não marcação da concordância, sendo
estes, inclusive, de caráter universal, nada se pode dizer a respeito do estatuto social da
116
variedade. Dessa forma, os resultados obtidos não corroboram a hipótese de que teria
havido a expansão das estruturas europeias para a constituição do Português do Brasil.
Espera-se, por fim, que o presente trabalho, desenvolvido no âmbito do Projeto
Estudo comparado dos padrões de concordância em variedades africanas, brasileiras e
europeias do Português (ALFAL 21), possa contribuir para a compreensão do
fenômeno da concordância verbal na variedade europeia, fornecendo vasta quantidade
de dados retirados de amostras contemporâneas e estratificadas de acordo com os
pressupostos da Sociolinguística Variacionista.
117
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