33o Encontro Anual da ANPOCS GT 39: Teoria Política: para além da democracia liberal? Coordenadores: Álvaro de Vita (USP)/ Bernardo Ferreira (UERJ) (ALG)UMA(S) TEORIA(S) DA JUSTIÇA: a teoria política nos rastros da luta pela justiça social Marlise Matos (UFMG) Breno Cypriano (UFMG) Resumo: A teoria política contemporânea, como uma das ferramentas analíticas da política, depara-se com a temática da justiça social evocada por condições de desigualdade, pobreza e não-reconhecimento das diferenças no cenário político e na nova ordem global. O presente artigo, através de um esforço meta-teórico, desenvolve os seguintes pontos de análise: (i) a formatação do triângulo do “estudo da política”, demonstrando a relação entre ciência, teoria e filosofia política, a fim de demonstrar o atual estado da arte da teoria política contemporânea e os desdobramentos e impactos observados na história deste campo para o estudo de temáticas como a justiça social; (ii) a relação e formatação das teorias dedicadas aos estudos da justiça com a teoria política contemporânea; (iii) a corrente redistributiva da justiça; (iv) o enfoque da filosofia do reconhecimento e da política da diferença; (v) o paradigma redistribuiçãoreconhecimento; e, por fim, (vi) os novos desafios de escala colocados às teorias da justiça, frente à nova ordem global. Palavras-chave: Teoria política contemporânea; teorias da justiça; redistribuição; reconhecimento; representação. 1 Introdução – A teoria política frente às reivindicações pela justiça social As reivindicações por justiça social, hoje, mobilizam diversas organizações e movimentos sociais e tornaram-se, indiscutivelmente, tema central na agenda dos teóricos políticos. Deparamo-nos em diversos noticiários e observamos os inúmeros fóruns, passeatas, músicas e gritos que marcam a celebração das lutas ativistas na busca por justiça social, onde, cada vez mais, os ativistas “estão convencidos de que as instituições existentes e seus procedimentos normais somente reforçam o status quo” (Young, 2001, p. 670, tradução nossa). Após os sucessivos eventos no final da década de 80 no Leste Europeu, com a derrocada do socialismo, o mundo se rendeu à “vitória” do capitalismo, associando a sua expansão ao fenômeno da globalização financeiro-capitalista. O Estado capitalista moderno e democrático viu-se, então, no papel de desempenhar a função geral de manter a coesão e o contrato social numa sociedade atravessada por perversos sistemas de desigualdade e de exclusão: manter as desigualdades nos limites “aceitáveis” (inclusão social através das políticas estatais compensatórias), e estabelecer distinções entre “diferenças” “aceitáveis” e “não aceitáveis”. Antes mesmo destas ocorrências, a teoria política se deteve diante da emergência e interferência do Estado de Bem-Estar Social na cena política, simultânea ao fervor das lutas de classe e ao modelo fordista de produção, o que gerou inúmeras publicações preocupadas com a questão (re)distributiva, visto que em circunstâncias de escassez, egoísmo (como a negação do altruísmo perfeito) e pluralismo (como a negação da homogeneidade perfeita) apresentaram-se demandas por bens, tanto materiais quanto imateriais, que podiam suprimir as necessidades ou os desejos de todos. Portanto, “as ‘circunstâncias da justiça’ são sem dúvida as circunstâncias nas quais vivemos” (van Parijs, 1997, p. 207). Acontece que atualmente nos confrontamos com problemas modernos da democracia (a exemplo das disputas contemporâneas travadas, sobretudo, nas questões da igualdade, da liberdade, da fraternidade e da paz) para os quais não existem soluções modernas. Neste sentido, o estágio atual do liberalismo inerente à teoria democrática construído até aqui seria inadequado ou mesmo insuficiente para resolver tais problemas, por pautar-se ainda em fundamentos epistemológicos incompatíveis com a realidade apresentada. 2 A constatação de que a democracia liberal se perpetua como “a” forma de governo legítima nessa mudança de milênio precisaria ser repensada na perspectiva de uma inflexão em direção à sua própria radicalização. Destarte, o que Chantal Mouffe propõe, por exemplo, é questionar o consenso sobre tal legitimidade, levando-se em conta que alguns poucos teóricos radicais cumpririam esse papel (Mouffe, 2005, p. 12). Cláudia Faria (2008, p. 2) aponta que esse período de radicalização da tradição democrática moderna é marcado pelo abandono da “idéia de substituição completa da ordem política vigente”. Com tanto, salienta-se o papel decisivo das ciências sociais na formatação da normatividade social e na contribuição para a definição e delimitação de políticas públicas, acrescido do questionamento ao “melhor regime”, já que se deve considerar relevante para a construção democrática a presença das “diferenças” e do pluralismo real no processo político. Desta forma Foucault (2001) contribui para a compreensão desse papel a ser desempenhado pela ciência, já que para ele o surgimento das ciências sociais e humanas acontece “quando o homem se constitui na cultura Ocidental assim como ele deveria ser idealizado e como deveria ser entendido” (Foucault, 2001, p. 376, tradução nossa), e “como a arqueologia do nosso saber claramente mostra, o homem é uma invenção de data recente. E talvez esteja aproximando-se de seu fim” (Idem, p.422, tradução nossa), apontando-nos o caráter eminentemente “construído” das ciências. Além disso, outra questão que hoje se coloca como apresenta-nos Eleni Varikas (2006), é que os contornos das nossas formas de pensamento já não coincidem com as nossas fronteiras do território nacional. Ela apresenta-nos a importância da dimensão ou mesmo da expressão da contingência. Tomamos por referência aqui a constatação da presença de um momento pós-Westhphaliano (Fraser, 2005) nas relações político-sociais atuais, ou mesmo a constatação de processos transnacionais experimentados pela e através da globalização (Young, 2007). E mais, acenam-se várias outras escalas: subnacionalismos, regionalismos, localismos, só para citar algumas. Todas estas questões apontadas levam ao aprofundamento e engajamento da teoria política e da ciência da política em se dedicarem à análise de tais conjunturas e contextos históricos, além de definirem rumos diferenciados ao campo acadêmico. É possível perceber a crescente aposta em dimensões critico-emancipatórias, muitas vezes pretendidas por uma vertente acadêmica que se propõe radical e ancorada na interação 3 com a militância social. E, desta forma, ao campo referente aos estudos da política é demandado novos modelos epistemológicos e apostas em novos modelos teóricos. O pano de fundo da discussão meta-teórica aqui desenvolvida é o tratamento especial dado à dimensão da justiça, seja ela pensada pelas demandas por redistribuição de bens materiais e não-materiais (Rawls, 2002; Dworkin, 2001; 2005; Sen, 2001), com base na “política de diferença” e lutas por reconhecimento (Honneth, 1992; 2003; Young, 2002; Fraser & Honneth, 2003), ou mesmo aliando o esforço analítico de conjugar ambas as percepções (Fraser, 2001). O triângulo1 que compõe o “estudo da política”: filosofia, teoria e ciência De maneira geral, o que entendemos como o “estudo da política”, “que é a mais antiga e a mais recente das Ciências Sociais” (Lipset, 1972, p. 11), corresponderia à teoria política e à disciplina da política, originários da clássica obra aristotélica A República, e também à ciência política, quando esta é institucionalizada como campo acadêmico na Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, em 1880 (Flammanng, 1992, p. 4). As análises históricas apontam que antes de assumir o caráter “científico”, o estudo voltado à política esteve presente em campos como a sociologia, psicologia e economia. Em conseqüência dessta transdisciplinaridade, as primeiras décadas do recém criado campo da ciência política, principalmente a década de 20, voltaram-se intensivamente para os métodos comportamentalistas ou psicológicos da análise política. Já na década de 30, houve “um retorno às considerações filosóficas de natureza normativa” (Lipset, 1972, p. 14). Entre as décadas de 50 e 70, os comportamentalistas celebravam o “declínio da Teoria Política”. Segundo Ball (2004), neste período “o positivismo forneceu critérios para a demarcação entre ciência e não-ciência (...) a Ciência Política deveria distinguir entre ‘fatos’ e ‘valores’. Em segundo lugar, ela deveria ser ‘empírica’ ao invés de ‘normativa’. E, por fim, ela deveria ser explicativa” (Ball, 2004, p. 13). Tal concepção científica converge com o projeto, que ao longo dos séculos XV até o XVIII foi sendo construído: o sistema cartesiano de racionalidade, que adota como elementos fundantes o “realismo metafísico”, o “objetivismo”, o “individualismo epistemológico” e o “sujeito 1 A idéia de triangulação está presente em Therborn (2007) para se tratar das vertentes teóricas (os “ismos”), correlacionando ciências sociais, filosofia e política. 4 cartesiano” (racional, calculador, objetivo, neutro, universal, transcendental). E ao o viés racionalista se acrescentam alguns “ismos” inexoravelmente influentes no pensamento e nas ciências ocidentais: o “racionalismo”, o “empirismo”, o “universalismo” e o “fundamentalismo” (Cf. Matos e Cypriano, 2008, p. 1-2). A visão cartesiana e racionalista, sob o domínio do positivismo e behaviorismo na ciência política, no período pós-guerra, colaborou, então, para reforçar as separações abissais entre os três vértices do triângulo do “estudo da política”. Sob este prisma, conseguimos, então, visualizar esses três campos: de acordo com Giovanni Sartori (1997) a noção de “ciência” seria per se de difícil definição, mas um parâmetro minimamente adequado seria a sua completa distinção da filosofia, que não pressupõe nenhum tipo de método, ao contrário da ciência que supõe o método científico. Por isso, “filosofia política pode ser definida com a reflexão filosófica sobre como organizar melhor nossa vida coletiva – nossas instituições políticas e nossas práticas sociais, como nosso sistema econômico e o nosso padrão de vida familiar” (Miller, 1998, tradução nossa). Já a compreensão de teoria política pauta-se fortemente nas relações que esta tem tanto com a filosofia quanto com a ciência política. Segundo Will Kymlicka (2006, p. 9), “teorias diferentes recorrem às nossas conceituadas convicções de maneiras diferentes”, por isso, o objetivo central da filosofia seria avaliar teorias rivais “para avaliar a força e a coerência dos seus argumentos a favor da correção de suas visões” (Idem, p. 10). Por outro lado, coloca-se que “a teoria não é um campo separado ou uma subdisciplina, uma forma de pensamento livre, de pesquisa, mas uma bússola guia para a investigação empírica” (Therborn, 2007, p. 127), mas que é limitada, já que “o olho teórico da ciência política é bastante fiel ao objeto, mas só percebe o objeto (estático ou fugidio?) desde que coadunado com o processo de percepção dos mecanismos sistemáticos” (Kiraly, 2008, s/n). Mais recentemente, sabe-se que a ciência política como disciplina passa por uma fase de maturação profissional, na qual cada vez mais há a especialização em subdisciplinas e que, ao mesmo tempo, ocorre uma integração entre os vértices do triângulo do estudo da política (Goodin and Klingemann, 1998). Mas restava, até então, como nos aponta Lipset, a dúvida “se a ciência política pode ou deve tentar formular um sistema teórico analiticamente distinto” (Lipset, 1972, p. 26). O que responderia esta questão é a própria delimitação do objeto desta ciência e teoria. Pela dificuldade de se qualificar o conceito de “ciência”, como também “política”, “[a] noção de ‘ciência política’ varia, 5 portanto, em função do que se entende por ‘ciência’ e por ‘política’”(Sartori, 1997: 157). Todavia, a definição do que é política mostra-se fundamental para a localização da teoria política no campo da Ciência Política. A concepção weberiana de “política como dominação” pautou várias das discussões acadêmicas sobre a política, que segundo Weber poderia ser entendida como “o conjunto de esforços feitos visando a participar do poder ou a influenciar a divisão do poder, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado” e, “o Estado consiste em uma relação de dominação do homem pelo homem, com base no instrumento da violência legítima” (Weber, 2006, p. 59-60). Mas, atualmente, a teoria política contemporânea, para Iris Young (1998), se caracterizaria, adversamente por sua adesão a alguns princípios arendtianos sobre a noção de política. Diferentemente da noção de política como uma competição entre elites por votos e influência2, sendo os cidadãos meramente consumidores primários e expectadores, a política para Hannah Arendt é entendida como ação participativa na vida pública. A política seria a expressão mais nobre da vida humana, por ser mais livre e original, culminando no espaço público toda a dimensão da pluralidade e os aspectos da vida coletiva. No entanto, para Arendt, um aspecto adverso à esfera política foi a própria emergência da era moderna, já que neste período histórico adveio a “destruição” do espaço político com a decorrente expansão da esfera do social (cf. Arendt, 2007). Como Young (1998) aponta, a discordância dos teóricos políticos quanto à visão pessimista de Hannah Arendt – que pondera sobre a emergência dos movimentos sociais de massa e sobre a separação do social do político – faz com que se destaque a “politização do social”, atentando para o fato de que o ativismo cívico politiza o social (cf. Fraser, 1989). Iris Young discorre que essa noção da “politização do social” aparentemente organiza a recente produção da teoria política, já que “reflete sobre as condições da justiça social, ou expressa e sistematiza as políticas dos recentes movimentos sociais, ou teoriza sobre correntes de poder dentro e fora das instituições, ou questiona sobre as bases sociais da unidade política” (Young, 1998: 481). Sob estas condições apresentadas a teoria política, atualmente, estaria divida, então, em seis 2 Um exemplo é Schumpeter (1984), que aborda pontos como: a “visão da incompetência dos cidadãos médios para assuntos públicos e a necessidade de criação de partidos políticos no lugar da democracia direta” (Nóbrega Jr., 2005, pp. 2-3), além defender que é uma democracia em que os cidadãos são passivos, descapacitados para a vida pública, além de serem responsáveis em somente “produzir um governo” e nada mais (cf. Schumpeter, 1984). 6 diferentes formas de se expressar a “politização do social”: (i) teoria da justiça social e direitos de bem-estar social; (ii) teoria democrática; (iii) teoria política feminista; (iv) pós-modernismo; (v) teoria dos movimentos sociais e sociedade civil, e; (vi) debate entre liberalismo e comunitarismo. A teoria política contemporânea, da forma como foi heuristicamente colocada por Iris Young, deve ao seu ressurgimento, ao longo dos anos 70, a condição de estar “em adição e estreitamente relacionado com o movimento contra a guerra, [e com] os movimentos pelos direitos civis e feminista anteriores e contemporâneo a ele” (Ball, 2004, p. 15) e a sua prosperidade se deu “na medida em que ela lidou com problemas políticos reais e com os movimentos que eles suscitaram e originaram” (Idem, ibidem). A ascensão dos “novos movimentos sociais”, por produzirem uma “pluralidade de centros”, deslocou os processos de identidades sociais do determinismo monista classista para novas “bandeiras” relacionadas com questões de gênero, raça, ambientalistas, questões enfim relegadas a um segundo plano, ou não significativas politicamente, que de vez asseguraram um espaço no cenário político nacional (Cf. Doimo, 1995). Klaus Eder (2002) apontou que uma possível explicação para o desenvolvimento dos “novos movimentos sociais”, a partir da experiência dos movimentos operários na Europa, é que “a ênfase principal mudou da emancipação política para a justiça distributiva” (Eder, 2002, p. 181). Se para uma vertente acadêmica hegemônica, a cientificidade se vale pela “neutralidade”, para outras não. A partir do momento em que a fronteira entre a academia e a militância em novos movimentos sociais tornou-se mais fluida, devido ao cenário revolucionário da década de 70, o positivismo foi suplantado por uma ciência crítica, reflexiva. Diante dessa discussão sobre a validade científica, a objetividade (e não a neutralidade) e o poder de controle que a ciência pode ter sobre o objeto que passou a entender, a ciência política passou a ser, então, co-responsável pela delimitação da natureza dos sistemas políticos e da padronização ideal dos “cidadãos disciplinados”, da mesma forma como as ciências humanas tentam fixar o que deve ser o “humano” (como nos apontou Foucault). Terrell Carver (1996) assinala que na teoria política, sob o viés da “política da interpretação”, deve-se criticar o “eu” e o “um” da posição autoral e o “nós” da posição do leitor, além do universal e abstrato “homem” onipresente do discurso. A aposta que se tem feito, mesmo às resistências positivistas e tradicionais no interior da teoria e ciência política, é a aliança destas com um novo projeto 7 epistemológico. Linda Nicholson (1990) enfatiza que o feminismo, como uma das correntes que influenciou as mudanças correntes na academia, contestou a suposta neutralidade e objetividade da ciência, apontando que o que era supostamente “universal” correspondia, e era válido, aos homens de determinada cultura, raça e classe particulares. A aliança entre feminismo e pós-modernismo contribuiu para surgirem novos princípios do conhecimento, isto é, observou-se a emergência de uma nova epistemologia, que, por sua vez, deveria se ajustar aos seguintes princípios: No lugar do “objetivismo” teríamos a afirmação da reflexividade, de uma forma de pensamento relacionante e relacional, construído e construtor. Em acréscimo ao “individualismo metodológico” se propõe a afirmação da perspectiva multidimensional e, em alguns pontos, multicultural, focado sobre processos e processualidades dependentes de redes interdisciplinares, da conversação, da heterogeneidade e da dialogia. No lugar do “viés racionalista”, a afirmação da ciência (da empiria e das teorias) como mais um dos muitos discursos de verdade sobre o mundo, ciências que necessitam se rever constantemente para (re)incorporar outras dimensões éticas e estéticas de conhecimentos múltiplos, complexos com a necessária inclusão da maior participação democrática e pluralismo social, multicultural possível. No lugar da “neutralidade axiomática”, apresentamos a afirmação da contingência, da objetividade que só se torna possível através da (con)centração na percepção da pluralidade dos sentidos e significados que compõem complexamente todos os indivíduos/coletivos (inclusive e sobretudo os e as cientistas) que emitem enunciados com pretensões à verdade. E, finalmente, em contraposição ao “fundamentalismo”, a ênfase sobre o pluralismo, o multiculturalismo emancipatório das ciências, a prudência do conhecimento conseqüente, a diversidade, a complexidade e a multiplicidade dos estilos como alternativas, permanentemente em aberto, de sua própria resignificação. (Matos e Cypriano, 2008, p. 8-9) O caminho que à teoria política se apresenta como um grande desafio é o de estimular a aposta na possibilidade de se construir uma “nova cultura política” baseada, conforme define Santos (2008: 16), numa “racionalidade mais ampla e mais cosmopolita que a racionalidade moderna ocidental”; ou mesmo uma nova cultura política que “permita voltar a pensar e a querer a transformação social e emancipatória, ou seja, o conjunto dos processos econômicos, sociais, políticos e culturais que tenham por objetivo transformar as relações de poder desigual em relações de autoridade partilhada” (Idem, p. 14). Ainda que no debate sobre a teoria da justiça haja posições mais hegemônicas, pautadas no viés racionalista e cartesiano (como poderemos notar na distinção entre as posições dos liberais e comunitaristas), há uma crescente contribuição de teóricos que apostam em posicionamentos mais críticos e que se aliam a respostas não-modernas para 8 os problemas ainda modernos da justiça (pós-modernos, desconstrucionistas, feministas, ambientalistas, etc.). Cabe-nos, então, neste artigo apontar os possíveis enquadramentos teóricos para (alg)uma(s) teoria(s) da justiça social. Discussões sobre a justiça social na teoria política contemporânea As primeiras elaborações teóricas sobre a justiça social, e ainda grande parte delas, partem do parâmetro da distribuição de bens e oportunidades numa sociedade para qualificá-la como sendo justa, ou injusta. Deste modo, existiriam para van Parijs (1997) dois tipos de teorias da justiça: (i) as perfeccionistas, que procurando estimar o ideal de sociedade boa, para eles “a justiça consistirá (...) em recompensar adequadamente a virtude ou em assegurar que todos disponham de bens que correspondem a seu verdadeiro interesse, ainda que eles mesmos não escolhessem adquiri-los” (van Parijs, 1997, p. 207); (ii) as liberais, que se baseiam na rejeição de “qualquer hierarquização das diversas concepções da boa vida que podemos encontrar na sociedade ou, ao menos que atribuem um respeito igual a todas as que, dentre elas, são compatíveis com o respeito aos outros” (Idem, ibidem) e têm em mente quais seriam as condições de convivência entre indivíduos livres e racionais. Ainda, para Philippe van Parijs, aos modelos de teoria da justiça apresentadas surgem críticas advindas de posições marxistas e ecológicas, além das críticas oriundas de teorias comunitaristas, posicionando-se a favor de se pensar nas gerações futuras da sociedade, onde se deve ter em mente o desdobramento e impacto de ações presentes no futuro. Por isso, as posições críticas colocariam que uma sociedade justa é aquela que pensa no futuro. Diante destas colocações, percebemos que cada vertente teórica parte de um valor fundamental que é originariamente diferente, visto que “juntamente com o recurso mais antigo à ‘igualdade’ (socialismo) e à ‘liberdade’ (libertarismo), as teorias políticas agora recorrem aos valores fundamentais da ‘concordância contratual’ (Rawls), do ‘bem comum’ (comunitarismo), da ‘utilidade’ (utilitarismo), dos ‘direitos’ (Dworkin) ou da ‘androginia’ (feminismo)” (Kymlicka, 2006, p. 4). Então, devido a esta pluralidade de valores fundamentais no âmbito da teoria política e nas discussões sobre a justiça social, deve-se “renunciar a idéia de desenvolver uma teoria da justiça ‘monística’. Subordinar todos os outros valores a um único valor supremo parece algo quase fantástico” (Idem, 9 ibidem). Partindo-se desta questão, o alicerce de “uma” teoria da justiça é completamente questionado, visto o que ela pretende ser: Geralmente, uma teoria da justiça extrai algumas poucas premissas gerais sobre a natureza dos seres humanos, a natureza das sociedades e a natureza da razão, princípios fundamentais da justiça que se aplicam a todas ou a maior parte das sociedades - qualquer que seja sua configuração concreta e suas relações sociais. fiel ao significado de theoria, está refere-se à justiça. Com o fim de obter uma visão compreensiva, uma teoria da justiça supõe a existência de um ponto de vista que está fora do contexto social em que surgem as questões de justiça. (Young, 2002, p. 12, tradução nossa). Ainda que encontremos teorias sobre a justiça que sejam pautadas em valores epistemológicos relativos ao universalismo, racionalidade, fundamentalismo etc., hoje, as evidências que nos são apresentadas por meio de diversos indicadores sobre a desigualdades e a pobreza, além das manifestações e reivindicações do ativismo cívico, apontam para um diagnóstico diferenciado, recorrente em muitos autores e em distintas correntes da teoria política contemporânea: em situação explícita de maior complexidade política e social, as disputas por reconhecimento coexistem com aquelas oriundas das desigualdades materiais exacerbadas. Por sua vez, essas análises seriam orientadas por concepções da justiça que “são resultantes de diferentes concepções da sociedade, tendo como pano de fundo visões opostas sobre as necessidades e oportunidades naturais da vida” (Rawls, 2001, p. 32, tradução nossa). Tem sido cada vez mais recorrente encontrar as teorizações a respeito da justiça no pensamento social e político na contemporaneidade divididas em duas grandes correntes: por um lado estão aqueles que debruçam sobre o aspecto da redistribuição e, por outro lado, os teóricos do reconhecimento. Céli Pinto (2007) nos chama atenção que a primeira tradição – as discussões sobre a (re)distribuição – já estava incluída por um longo período na academia latino-americana sendo que a noção sobre o reconhecimento, por muito tempo ficou restrita aos partidos de esquerda e a um grupo específico de estudiosos norte-americanos e europeus. Em países como o Brasil, a temática do reconhecimento foi trazida especialmente pelos movimentos negro e feminista, mas mesmo assim, continua sendo um eixo teórico ainda pouco utilizado pelos estudos acadêmicos. Este panorama nos indica claramente a tematização dos movimentos sociais classistas confrontada com a dos movimentos sociais identitários. 10 Para melhor entendimento do que se entende pelos conceitos “redistribuição” e “reconhecimento”, Nancy Fraser (2003) demonstra as divergentes origens destes termos filosóficos: “redistribuição” derivaria da tradição liberal, que nas décadas de 70 e 80 foi acoplada por filósofos analíticos como John Rawls e Ronald Dworkin que desenvolveram teorias distributivas da justiça social; e “reconhecimento” derivaria sensivelmente da filosofia hegeliana que “designa uma relação recíproca ideal entre sujeitos na qual cada um vê o outro como seu igual e também como separado dele. Esta relação é apontada como constitutiva para a subjetividade: alguém torna-se um sujeito individual somente em virtude do reconhecimento, e sendo reconhecido por, outro sujeito.” (Fraser, 2003, p. 10, tradução nossa), sendo reconhecimento um termo readotado pelos neo-hegelianos importantes como Charles Taylor e Axel Honneth, que apontam como central a reivindicação pela “política da diferença”. Nancy Fraser ainda aponta que “vários teóricos liberais da justiça distributiva contendam que a teoria do reconhecimento abarca uma bagagem comunitária inaceitável, enquanto alguns filósofos do reconhecimento apontam o individualismo e consumismo da teoria redistributivista” (Idem, ibidem, tradução nossa). A seguir, apresentaremos em linhas breves e gerais as correntes redistributiva, do reconhecimento e do projeto de se aliar ambas as perspectivas. Como anunciado desde o início deste trabalho, vamos apresentar questões sobre a ordem política contemporânea, e iluminar alguns elementos que refletem como os projetos tomam novos rumos frente às questões contingenciais que a nova ordem proporciona e, como veremos, apontam para novas escalas da justiça social. A “opção” pela redistribuição A percepção das desigualdades a partir do paradigma (re)distributivo está fortemente vinculada à corrente do liberalismo (o econômico e o político). De forma muito breve, entende-se que a luta pela redistribuição material remonta, pelo menos, à era fordista do capitalismo. Parte substantiva e significativa dos problemas estava na resolução das desigualdades que, por sua vez, se daria (se dá) através de um sistema que tornasse possível operar uma lógica mais eqüitativa de distribuição de bens ou de recursos delegados a certas estruturas institucionais sociais e econômicas. O liberalismo 11 igualitário - uma das correntes mais propositivas nesta discussão - como apresentado por Ogando (2006) tem como objetivo: [E]stabelecer uma sociedade democrática e justa, que garanta os direitos básicos iguais e uma distribuição eqüitativa de recursos como renda, riqueza, oportunidades educacionais e ocupacionais [...] O Liberalismo igualitário adota um discurso sobre a distribuição que inclui a distribuição de benefícios sociais e materiais e, também, elementos de cunho não material como direitos, oportunidades, poder e auto-respeito. (Ogando, 2006, p.18). Nos anos 70 e 80, certas correntes do liberalismo, a exemplo das obras de Rawls (2002 [1971]), Dworkin (2001 1985]; 2005) e Sen (1973; 2001), desenvolveram sofisticadas teorias a respeito da justiça distributiva, buscando sintetizar a ênfase liberal na liberdade individual com o pressuposto do igualitarismo oriundo da social democracia. Cada uma dessas correntes conceituou a natureza das injustiças socioeconômicas à sua própria forma: John Rawls via a justiça como uma escolha justa entre aqueles princípios que governam a distribuição dos bens primários; Ronald Dworkin, por sua vez, afirmava que a justiça requer igualdade de recursos, e Amartya Sen via que a justiça social teria passado a requerer que se assegurassem aos indivíduos iguais capacidades (capabilities to function). Todas estas proposições teóricas a respeito da justiça social denunciam um comprometimento explícito com as dimensões morais do igualitarismo. A obra de Rawls significou para a teoria política, sem dúvida, o ponto de virada (turning-point), retomando-se uma intensa produção no campo acadêmico (Young, 1998; Delacampagne, 2001; Ball, 2004). Para Bhikhu Parekh (1998), a obra A Theory of Justice “simbolizou o renascimento da filosofia política” (Parekh, 1998, p. 503, tradução nossa). John Rawls (2002) se propõe discutir a justiça como eqüidade (justice as fairness) e neste percurso generaliza e leva a um nível mais alto de abstração o conceito tradicional de contrato social (baseado em Locke, Rousseau e Kant). Assim, os princípios da justiça seriam objetos de consenso social, em “que as pessoas livres e racionais, desejosas de favorecerem os seus próprios interesses e colocadas numa posição inicial de igualdade, aceitariam, e que definiriam os termos fundamentais da sua associação” (Rawls, 2002, p. 12). Logo, a eqüidade pode ser finalmente alcançada, na justa medida em que seja considerada uma das características da situação de partida. Por isso, na posição original, 12 sob a condição hipotética do construto de um “véu da ignorância” (que garantiria que originalmente ninguém seja favorecido ou desfavorecido) pactuam-se os dois princípios básicos da justiça como equidade: Primeiro: cada pessoa deve ter um direito igual ao mais abrangente sistema de liberdades básicas iguais que sejam compatíveis com um sistema semelhante de liberdade para as outras. Segundo: as desigualdades sociais e econômicas devem ser ordenadas de tal modo que sejam ao mesmo tempo (a) consideradas como vantajosas para todos dentro dos limites do razoável, e (b) vinculadas a posições e cargos acessíveis a todos. (Rawls, 2002, p. 64). 3 Sob o valor fundamental dos direitos, Ronald Dworkin (2001) coloca que os direitos individuais têm uma importância fundamental no marco do liberalismo, já que eles funcionam como garantias de liberdades para o indivíduo, ou seja, como obstáculos a diferentes formas de coação ou dominação. Tais direitos “são necessários para proteger o igual interesse e respeito” e funcionam “como trunfos nas mãos dos indivíduos”, oferecendo-lhes instrumentos de resistência a ingerências indevidas em suas esferas de liberdade. Nesse caso, a democracia representativa e o mercado econômico, no marco do liberalismo igualitário de Dworkin, serviriam como uma base na constituição de um esquema de distribuição de bens, recursos e oportunidades, operacionalizando o cálculo por uma divisão igualitária dos recursos sociais (Dworkin, 2001, p. 289). Para Dworkin (2005, p. 15) “justiça é um importante ideal moral e político” e por isso, como parte das teorias tradicionais baseia-se no conceito de bem-estar (também esse um conceito moral e político), caberia o questionar se a “melhor” teoria deveria pautar-se então nesta perspectiva sobre o bem-estar. Para compreender melhor esta afirmação, por exemplo, o autor aponta os argumentos teleológicos da corrente utilitarista para apontar que estes se baseiam numa afirmação de que o bem-estar é “inerentemente bom em si” (Idem, p. 76). Em contrapartida, o autor, baseando-se no ideal político da igualdade apresenta-nos seus dois princípios que agiriam em conjunto: 3 Um dos críticos mais conhecidos de Jonh Rawls foi Robert Nozick (1991), assumindo uma posição libertária, que postula a defesa do Estado mínimo e do livre mercado. A concepção deste autor sobre a justiça é processual, em vez de distributiva. O seu pressuposto é que a não existência da cooperação social leva às reivindicações por justiça social. Nozick faz severas críticas à posição original e ao principio da diferença defendidos por Rawls, já que questiona ao princípio de grupos nessa posição e não de indivíduos; duvida com relação se aos menos dotados conseguiriam cooperação dos mais dotados; simetria perturbada pela idéia de quanto cada um ganharia com a cooperação. 13 O primeiro princípio requer que o governo adote leis e políticas que garantam que o destino de seus cidadãos, contanto que o governo consiga atingir tal meta, não dependa de que eles sejam – seu histórico econômico, sexo, raça ou determinado conjunto de especializações ou deficiências. O segundo princípio exige que o governo se empenhe, novamente se o conseguir, por tornar os cidadãos sensíveis às opções que fizeram. (Idem, p. XVII) Diante desses dois princípios, nota-se que as decisões políticas não devem reproduzir nenhuma concepção que se refira ao que é o bem-viver (neutralidade nessa questão), por isso, tais decisões precisariam se afastar de idéias substantivas do bem ou do que confere valor à vida. Dworkin propõe, então, que fundamentemos a justiça numa ética, na qual “somos responsáveis pelas conseqüências das escolhas que fazemos com base nessas convicções, nessas preferências ou nessa personalidade” (Idem, ibidem). Amartya Sen (2001), por sua vez, critica aquelas posições que procuram avaliar a igualdade em termos de recursos, como é o caso da teoria de John Rawls sobre os bens primários e a defesa da “igualdade de recursos” e a de Ronald Dworkin, que focaria na dimensão substantiva que ambas noções apresentam, pois mirariam na liberdade dos indivíduos, mas falham ao ignorar que as pessoas têm diferentes níveis de capacidade4. Destarte, o autor propõe um referencial teórico que negocia as relações entre liberdades, direitos e obrigações, pautando-se no que as pessoas poderiam ter, ser e fazer, ou seja, num eixo que aglutinaria as capacidades e os funcionamentos humanos. Para o autor, as diferentes concepções de justiça pautam-se em diferentes concepções sobre a igualdade, por isso, segundo ele “a igualdade de liberdade para buscar nossos fins não pode ser gerada pela igualdade na distribuição de bens primários. Nós temos de examinar as variações interpessoais na transformação de bens primários (e recursos, mais genericamente) em respectivas capacidades para buscar nossos fins e objetivos” (Sen, 2001, p. 143). Por fim, no debate entre o liberalismo e o comunitarismo5, este último critica a pretensão ao universalismo liberal e a abstração formal contidos nas teorias políticas 4 Dworkin (2005) responde às críticas de Sen, colocando que a classificação objetiva dos “funcionamentos” “não é necessária nem útil” (Dworkin, 2005, p. 426). Sobre o conteúdo completo das respostas, ver Dworkin, 2005, p. 420-427. 5 Um comunitarista que defende a idéia distributiva é Michael Walzer (2001), já que para ele “a sociedade humana é uma comunidade distributiva” (Walzer, 2001, p. 17, tradução nossa) e que nenhum aspecto da vida humana possa ser omitido nas análises distributivas, por isso enfatiza que “a idéia de justiça distributiva possui uma relação tanto como o ser, como com o fazer, como com o ter, com a produção tanto como o consumo, com a identidade e o status tanto com o país, o capital ou as possessões pessoais” (Idem, ibidem, tradução nossa). Na obra deste autor nota-se a preocupação em demonstrar que há várias noções de bem comum, nas variadas esferas da vida. 14 liberais, mesmo as contemporâneas, que, por sua vez, consideraria os indivíduos apenas como indivíduos, ignorando ou mesmo tratando como irrelevante, a sua afiliação social ao grupo, ou seja, seu pertencimento grupal. Passemos à discussão do reconhecimento. A outra corrente: reconhecimento e “política da diferença” A discussão sobre reconhecimento estaria, em contrapartida, na base conceitual e teórica das várias nuances oriundas da corrente do comunitarismo na teoria política. Young (1998 [1996]) nos coloca que uma das características do comunitarismo seria destacar o campo social como uma prioridade para o político, como sendo algo constitutivo do e no político. Para a autora, esta corrente pode ser interpretada como a “politização do social”, pois pretende ancorar em contextos sociais, culturais e simbólicos particulares, os valores políticos da justiça social, dos direitos e da liberdade. No caso do reconhecimento, para uma compreensão mais substantiva relativa ao tema da injustiça social seria relevante destacar a esfera cultural/simbólica, estando essa vinculada a diferentes e alternativos padrões sociais de apresentação, interpretação (significação) e comunicação. As questões de justiça resultariam, por sua vez, de variações culturais pré-existentes, benéficas (ou não), que o esquema interpretativo hegemônico e frequentemente injusto teria transformado em uma hierarquia assimetricamente valorada. O termo reconhecimento vai designar uma relação recíproca ideal entre os sujeitos na qual cada um vê ao outro como um seu igual, mas também como separado e diferente de si (Fraser, 2003, p. 10). Vários autores citam Charles Taylor e Axel Honneth como importantes representantes desta perspectiva teórica: a política identitária (Fraser, 2003; Ogando, 2006). Esta vertente considera que nossa identidade é formada pelo e através do reconhecimento ou pela ausência e/ou distorção dele (o reconhecimento sendo, portanto, uma categoria moral fundamental). Segundo Charles Taylor (1997), as demandas e a necessidade por reconhecimento seriam visíveis em movimentos nacionalistas e “em uma variedade de formas, nas políticas de hoje, em nome da minoria ou grupos ‘subalternos’, em algumas formas de feminismo e no que é chamado de política do multiculturalismo” (Taylor, 1997, p. 98, tradução nossa). Taylor caracteriza o não-reconhecimento ou o falso reconhecimento como formas de opressão, de aprisionamento da pessoa a uma existência falsa, distorcida e reduzida. Sobre “política da diferença” o autor quer ressaltar que “o 15 que nos é pedido é reconhecer a unicidade identitária deste indivíduo ou grupo, sua distinguibilidade de qualquer outra pessoa” (Idem, p. 105, tradução nossa). Por isso, a “política da diferença” engloba diversas denúncias de discriminação e recusas ao enquadramento de cidadãos de “segunda-classe”. Axel Honneth (1992), por sua vez, vai alegar que devemos a nossa integridade pessoal e social à aprovação ou ao reconhecimento que recebemos de outras pessoas. O desrespeito, a negação ou distorção do reconhecimento impediriam que o sujeito desenvolvesse todas as particularidades de sua identidade subjetiva e viesse a se tornar, em plenitude, um ser com auto-confiança, auto-estima e auto-respeito (Cf. Ogando, 2006). A posição de Axel Honneth, seguindo a tradição hegeliana, é a de tratar a questão relativa à justiça numa forma alternativa que prioriza o “monismo normativo” do reconhecimento, que segundo o autor procuraria subsumir a problemática da redistribuição com tal fórmula por ele proposta. Para Honneth “a base da interação seria antes o conflito e a gramática moral desse conflito consistiria, como veremos, na luta por reconhecimento” (Werle & Melo, 2007, p. 12). De modo muito resumido, Honneth propõe, portanto, “desenvolver o paradigma da comunicação em direção aos pressupostos sociológicos ligados à teoria da intersubjetividade, no sentido de explicitar as expectativas morais do reconhecimento inseridas nos processos cotidianos de socialização, de construção da identidade, de integração social e reprodução cultural”(Idem, p.12-13), ou seja, para o autor a justiça como reconhecimento prevê a existência deste numa dinâmica de reconhecimento intersubjetivo através de diferentes modos: o afetivo (que se daria no plano individual e das necessidades concretas através do amor familiar), o cognitivo (que seria operacionalizado no plano da pessoa enquanto busca de autonomia forma e perpetrado através da sociedade civil e das leis) e o racional (dado no plano do sujeito e compondo sua particularidade especialmente através da intuição intelectual). Outra importante concepção de justiça é feita por Iris Young (2002 [1990]) já que desde sua obra primordial, Justice and the Politics of Difference, defende que: “no lugar de centrar-se na distribuição, uma concepção de justiça deveria começar pelos conceitos de dominação e opressão” (Young, 2002, p.12, tradução nossa), além da necessidade de enfatizar o “viés de grupo”, já que “a justiça social requer reconhecer e atender explicitamente a essas diferenças de grupo para socavar a opressão” (Idem, ibidem). Sem renunciar ao discurso racional sobre a justiça, mas contrária ao se fazer uma teoria universal, transcendental e fechada, Iris Young propõe uma discussão reflexiva sobre a 16 justiça na qual enfatiza as diferentes práticas sociais e políticas que precedem e reflexionam a sua análise. A autora, por sua vez, propõe uma “política da diferença”, que teria como meta a promoção da igualdade entre grupos cultural e socialmente diferenciados, que se respeitariam mutuamente em suas diferenças6. A política da diferença tem como pressuposto que uma “sociedade sem diferenças entre grupos não é possível nem desejável” e que os laços e valores que unem as pessoas a tradições e práticas culturais são dimensões importantes da vida social. Desta forma, sua construção teórica implica reconsiderar as “regras do jogo” sempre que elas implicarem em uma homogeneização das diferenças, que tenderia segundo Young, sempre a se realizar como a universalização da cultura dominante. Nesse sentido, a política da diferença teria como um de seus efeitos a relativização da cultura dominante. Importante notar, entretanto, que Young não propõe, como faz Taylor, que a diferença seja tratada como um valor em si mesmo, devendo haver uma “valorização da diferença pela diferença”; ela defende que a correção das desigualdades que atingem certos grupos sociais deve ser realizada por meio de mudanças de cunho basicamente institucional (daí a ênfase da autora no contexto institucional), que incluem a “representação desses grupos na elaboração de políticas públicas e a eliminação da hierarquia de recompensas que força todos a competirem por posições escassas nas posições mais valorizadas na sociedade” (Idem, p. 282, tradução nossa). Paradigma redistribuição-reconhecimento Nancy Fraser e Axel Honneth (2003), em debates acirrados, apontaram para a seguinte mudança: o fato de a luta pelo reconhecimento parecer suplantar a luta por redistribuição. Para Nancy Fraser haveria a necessidade de associar ambos os tipos de reivindicações a partir de uma análise que incide em um “dualismo perspectivo”, 6 A corrente do feminismo que influenciou a proposta da “política da diferença” por Iris Young foi o “feminismo ginocêntrico”, que enfatizou a heterogeneidade dentro das mulheres, “as diferenças na diferença”, valorizando as experiências femininas, corporais, sobretudo, e definindo a “opressão das mulheres como a desvalorização e repressão de suas experiências por uma cultura masculinista que exalta a violência e o individualismo” (Young, 1990, p. 73). Dentro dessa corrente é que encontraremos os trabalhos sobre a “ética do cuidado” (Gilligan, 1982; Chodorow, 1978), que segundo Judith Squires debate com a “ética da justiça”, ressaltando que as feministas criticam a imparcialidade de primeira ordem assumida pelos teóricos da justiça. 17 propondo uma concepção de justiça “bi-dimensional” (Fraser & Honneth, 2003, p. 3, tradução nossa). Atualmente, a partir de considerações teóricas mais recentes, a autora já considera uma terceira dimensão da justiça social, aquela propriamente política, que seria a representação (Fraser, 2003; 2005). Desde já, previamente, vale lembrar sobre a filiação pessoal da autora à teoria marxista (ponto que servirá de alicerce para o debate) e à teoria crítica, já que os aspectos sobre o materialismo histórico dialético deverão ser considerados em sua própria envergadura metodológica como um pensamento dual/binário7. Nancy Fraser procurou na sua trajetória acadêmica conciliar aspectos das duas vertentes em que se dividiram boa parte dos pensadores: os separatistas e os comunicativos. Para Fraser (2004), a idéia de conciliação frente ao projeto de polarização, colaborou de modo a permitir em seus trabalhos o estabelecimento da “relação entre teoria crítica e pós-estruturalismo, feminismo e pós-modernismo” (Fraser, 2004, p. 126, tradução nossa). O ecletismo teórico pode ser percebido no enquadramento teórico proposto pela autora, acrescentando que, sem dúvida, ela leva em consideração os fatores políticos, sociais e econômicos observáveis nas diversas conjunturas globais. Uma das preocupações recorrentes de Fraser no artigo Da Redistribuição ao Reconhecimento? Dilemas da justiça na era pós-socialista é relativa ao enfraquecimento do debate distributivo diante das condições existentes e atuantes no mundo “póssocialista”, visto o abrandamento dos movimentos sociais classistas frente aos “novos” movimentos sociais identitários (como o movimento feminista, negro, homossexual, só para citar alguns), viria tomando grandes proporções e estaria a reforçar os aspectos referentes ao reconhecimento. Segundo a autora “a luta pelo reconhecimento tornou-se rapidamente a forma paradigmática de conflito político no fim do século XX” (Fraser, 2001, p. 245), o que poderia vir a substituir os interesses de classe como fator mobilizador das lutas sociais e política. Com propósitos heurísticos, coloca-se, portanto, em contraposição as condições materiais, da economia política, com as condições simbólicas, da cultura. Para Fraser, na 7 Em Matos & Cypriano (2008) apresentamos o debate entre Nancy Fraser e Iris Young e apontamos que base dessa discussão diz sobre as teorias de sistemas duais, amplamente utilizadas pelas feministas marxistas e socialistas. Nestas teorias o patriarcado e o capitalismo eram considerados os grandes sistemas de opressão e, conseqüentemente, gênero e classe deveriam estar em interseção neste modelo teórico. Muitas crítica surgiram, visto que há a dificuldade de relacionar estes dois sistemas e que teorias como esta dicotomizam as discussões sobre a opressão (ver Young, 1990). Young (1997) aponta que o projeto teórico de Fraser corresponderia uma teoria de sistema dual. 18 idéia de um continuum, devem-se polarizar essas condições e alocar os movimentos sociais de acordo com suas dimensões reinvindicatórias, onde a autora procura por tipos ideais que representem os pólos desse continuum. Assim, a luta do proletariado se enquadraria como “tipo ideal” de luta pela redistribuição e os movimentos homossexuais se encaixariam no pólo do “tipo ideal” relativo ao reconhecimento. A autora ressaltou que: As situações são bastante claras nos dois extremos de nosso espectro conceitual. Quando lidamos com coletividades que se aproximam do caso da classe operária explorada, lidamos com injustiças distributivistas que exigem curas redistributivistas. Quando lidamos com coletividades que se aproximam de um tipo ideal de sexualidade menosprezada, enfrentamos injustiças de nãoreconhecimento que exigem remédios de reconhecimento. No primeiro caso, a lógica do remédio é homogeneizar os grupos sociais, No segundo caso, ao contrário, é de valorizar a peculiaridade do grupo, reconhecendo sua especificidade. (Fraser, 2001, p. 259) Hoje em dia há grupos que tanto reivindicam reconhecimento, quanto redistribuição, grupos raciais e aqueles orientados para a questão de gênero, que foram categorizados como “coletividades (am)bivalentes” por combinarem características da classe explorada com características da sexualidade social e culturalmente menosprezada. Portanto, o paradigma que se adequaria melhor às demandas ativistas por justiça social seria o da redistribuição-reconhecimento, já que “justiça hoje requer tanto redistribuição quanto reconhecimento” (Fraser, 2004, p. 126, tradução nossa). Devemos ressaltar, no entanto, que a noção de reconhecimento de Nancy Fraser procura se afastar da relação exclusiva de reconhecimento com “políticas de identidade” (relação esta estabelecida pela filosofia do reconhecimento e pelos teóricos da “política da diferença”). O modelo baseado na identidade reificaria, segundo Fraser, as identidades grupais e enviesaria o tratamento do não-reconhecimento como um dano cultural autônomo. Desta forma, o reconhecimento para a autora deveria ser tratado “uma questão de status. O que requer reconhecimento não é uma identidade específica de grupo mas o status de membros individuais do grupo como parceiros por inteiro na interação social” (Idem, p. 129, tradução nossa). 19 Considerações Finais – Justiça social: o que se conseguirá com a representação? Segundo Nancy Fraser, o papel da teoria política seria o de idealizar arranjos institucionais que possam remediar as condições de má-distribuição e do nãoreconhecimento (Idem, p. 126). Para algumas correntes, diferentemente, ao se basearem nas condições democráticas modernas, elas indicariam o predomínio do caráter competitivo de seleção entre as elites políticas8 o que, por sua vez, corroboraria para a distribuição do poder político, pois seria “um recurso crucial para a redistribuição de quaisquer outros bens sociais, na sociedade” (Vita, 2004, p. 74). Assim, Álvaro de Vita, por sua exclusiva preocupação com o caráter redistributivo da justiça social, sugere que não se deva negligenciar a importância da competição política, já que “pode ocorrer que as oportunidades, que mesmo uma competição política desigual abre, não estejam sendo aproveitadas, na medida necessária, por aqueles que estão (ou deveriam estar) mais comprometidos com a justiça social” (Idem, p. 92). Vita se propõe então a relacionar o caráter competitivo da democracia com as concepções epistêmicas da democracia deliberativa. Ainda assim, as proposições que o autor faz aproximam-se bastante do cerne das posições defendidas pelo liberalismo igualitário: a atenção à competição em condições de igualdade por bens, recursos e oportunidades, sem que atributos aleatórios, não-escolhidos, adscritivos, funcionem como um obstáculo injusto à perseguição dos anseios dos indivíduos. Diante disto, mesmo que teóricos do liberalismo igualitário como Dworkin (2001), enfatizem o papel central da democracia representativa e que seus referenciais tenham sido de alguma forma afetados pelo ativismo cívico, ainda assim acreditamos que os elementos epistemológicos adotados por esta corrente obscurecem a imagem que a realidade social mostra. Ao aliarmos as questões teórico-normativas desta corrente com análises empíricas sobre a representação eleitoral de grupos minoritários, a abordagem liberal igualitária seria deficiente por não ser capaz de desafiar os principais impedimentos culturais e econômicos à participação e representação política (Cf. Assis, Cypriano & Rezende, 2008). Atualmente, nota-se que os desdobramentos das discussões sobre justiça social aqui apresentada, colocam à teoria política contemporânea o desafio de se repensar a 8 Para Álvaro de Vita (2004), Scgumpeter (1984), Downs (1999) e Dahl (1997) dariam centralidade ao modelo de competição nos seus modelos democráticos. 20 dimensão propriamente representativa da política. Uma vez que a representação com base eleitoral não contempla de forma inclusiva toda a sociedade, deveríamos lançar mão de procedimentos que possam incluir os “novos eleitores” e grupos que demandam representação na arena política (Avritzer, 2007; Warren & Urbinati, 2008). Como nos foi apresentado na teoria política moderna (de Hobbes a Hanna Pitkin), a noção de autorização pautou-se na consolidação do Estado Moderno e foi exclusivamente vinculada às noções de territorialidade e monopólio de ação (Avritzer, 2007, p. 445-447). Por isso, os limites impostos pelas fronteiras territoriais passaram a ser tratados hoje como entraves à justiça social. Através da preocupação com a questão da justiça numa perspectiva global/transnacional (ou pós-Westhphaliana), a utilização de uma nova categoria por Nancy Fraser (2005) foi o recurso teórico primordial à suposta virada “pós-nacional” na teoria contemporânea. A representação permitiria problematizar as estruturas do governo e os processos de tomada de decisão, “que pelas lentes das disputas por democratização, a justiça inclui uma dimensão política, enraizada na constituição política da sociedade e que a injustiça correlata é a representação distorcida ou a afonia política” (Fraser, 2005, p. 128-129, tradução nossa). Fraser afirma que no caso da justiça abnormal, isto é, uma justiça não típica, desviante, dever-se-ia agora utilizar “uma abordagem que combine uma ontologia social multidimensional com um monismo normativo” (Idem, p. 128, tradução nossa), onde as três dimensões – redistribuição, reconhecimento e representação9 – abrangeriam o princípio normativo da paridade de representação. O problema da “moldura” (framing), segunda a autora refere-se ao fato da teoria da justiça em um mundo globalizado dever se apresentar, finalmente, como tridimensional: incorporando a dimensão política da representação, ao lado da dimensão econômica da distribuição e da dimensão cultural do reconhecimento. Essa dimensão política10 da justiça precisa referir-se, então, à constituição da jurisdição do Estado e das regras de decisão pelas quais ele estrutura a contestação, sendo este o palco no qual as lutas por distribuição e reconhecimento seriam realizadas. Segundo Fraser (2005): 9 Segundo Kevin Olson, essa “concepção tridimensional, atualiza efetivamente a tríade de Weber de classe, status e partido” (Olson, 2008, p. 7, tradução nossa). 10 É interessante notar que Fraser (2005) admite que Young (2002) e Sen (1999) foram os únicos teóricos que conseguiram relacionar democracia e justiça a partir desta dimensão política. 21 Estabelecendo critérios de pertencimento social e determinando quem conta como membro, a dimensão política da justiça especifica o alcance das demais dimensões: diz quem está incluído e quem está excluído do conjunto daqueles intitulados a uma justa distribuição e reconhecimento recíproco. Estabelecendo as regras de decisão, a dimensão política estabelece os procedimentos para colocar e resolver as disputas em ambas as dimensões econômica e cultural: diz não somente quem pode fazer demandas por redistribuição e reconhecimento, mas também como tais demandas devem ser colocadas e adjudicadas. (Fraser, 2005, p.44, tradução nossa). Acreditamos que um dos desafios que este deslocamento (do paradigma bidimensional para uma visão escalar tri-dimensional da justiça social) nos coloca seria o de caber à teoria política contemporânea, sob as conjunturas atuais, “explicitar dimensões que estão na sombra, subentendidas, não explicitadas e não tratadas justamente por força de uma organização epistemológica reducionista que não as visibiliza ou valoriza” (Matos & Cypriano, 2008, p. 24). As condições inerentes à democracia, na atual condição global, fazem-nos questionar as bases que se fundaram conceitos como o de contrato social, liberdade, igualdade, autonomia, responsividade, só para citar alguns exemplos. Como Pateman (1993) propõe, precisamos de uma outra teoria do contrato social (como uma teoria do contrato sexual) e também “necessita-se urgentemente de uma nova história da liberdade” (Pateman, 1993, p. 340). Como notamos o caminho percorrido pela teoria política contemporânea, gradualmente, foi o de incorporar perspectivas inovadoras que têm tido o papel de questionar as bases do cartesianismo e do viés racionalista, incorporando discursos não-modernos para resolver os problemas modernos: (a) utilizando-se da afirmação política do pluralismo, da diversidade e (b) de uma forma de pensamento relacional e em fluxo do pós-modernismo, assumindo posições antagônicas às grandes narrativas e aos discursos universalistas (Kumar, 1997); (c) valendo-se de idéias e métodos desconstrucionistas, aderindo em parte à ênfase na fragmentação, sobretudo quando se pretende tratar das questões relacionais que reivindicam o descentramento do sujeito; e, (d) dando expressiva ênfase aos avanços teórico-analíticos do feminismo, destacando assim a importância da função “desestabilizadora” do debates ante as suposições fundacionais da teoria moderna, visto que a neutralidade referente a gênero é profundamente questionada a fim de se desmascarar as perspectivas masculinas que marcam estas teorias (Barrett & Phillips, 1992). 22 As colocações crítico-emancipatórias para teoria política e para as discussões a respeito da normatividade proposta não contribuem para desvirtuar algo como o “valor científico”. Pelo contrário, as propostas feitas e os desmascaramentos da realidade fornecem instrumentos para uma visão mais ampliada das instituições, do Estado, do poder e da política. O futuro da teoria política e das teorias da justiça, como de outras diversas vertentes teóricas, deve mirar a busca por novas ferramentas que contribuirão para as pesquisas que surgem na Ciência Política sobre os grupos “marginalizados/subalternizados”, como são as mulheres, os negros, a população LGBT, as minorias étnicas e religiosas etc. A crítica ao mainstream ou à corrente hegemônica da análise política é justamente a direção do ataque que se dirige ao caráter monístico e ao predomínio de uma “razão indolente”, como nos diz Boaventura de Souza Santos (2007): uma razão cega às multiplicidades e aos aspectos contingentes e históricos da vida social e política. A cartografia do “estudo da política” e da prática política, revela-nos questões que ainda merecem maior atenção. Notadamente se destaca que as fronteiras, tanto do pensamento quanto dos territórios das nações, ainda são bastante excludentes. Percebe-se que as fronteiras são desenhadas para excluir alguns e algumas da possibilidade chance de participar integralmente em disputas autorizadas acerca da justiça, por isso, esta é a injustiça definidora de uma era globalizada. A expressão dos ativistas pichadas nos muros de Paris, em maio de 1968, antecipou o nosso dilema contemporâneo: que se danem as fronteiras (les frontières on s'en fout). As fronteiras, quer queiram, quer não, existem, mas o desafio da teoria política contemporânea normativa e da prática política é torna-las mais abertas, mais permeáveis e mais inclusivas. Concentrar-se nas discussões sobre a representação política como a terceira escala/dimensão da justiça, hoje, é uma aposta que amplia o horizonte da lutas por justiça social através de uma noção redimensionada de que não há redistribuição ou reconhecimento sem representação (Fraser, 2005). 23 Referências bibliográficas ASSIS, Mariana; CYPRIANO, Breno; REZENDE, Daniela. (2008), “A presença das mulheres brasileiras na política: uma discussão sobre as cotas legislativas sob o enfoque da política da diferença”, in L. Lüchmann et al. (orgs.), Movimentos sociais, participação e reconhecimento. Florianópolis: Fundação Boiteux. ARENDT, Hannah. (2007), A condição humana. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária. AVRITZER, Leonardo. (2007), “Sociedade civil, instituições participativas e representação: da autorização à legitimidade da ação”. Dados. vol. 50. 3: 443–464. BALL, Terence. (2001), “Aonde vai a teoria política?”. Revista Sociologia e Política. n. 23. p. 9-22. 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