LÍVIA RIBEIRO DE PAULA CONSIDERAÇÕES SOBRE A INGESTÃO DE CÁLCIO EM DIETAS VEGETARIANAS ESTRITAS LAVRAS – MG 2013 LÍVIA RIBEIRO DE PAULA CONSIDERAÇÕES SOBRE A INGESTÃO DE CÁLCIO EM DIETAS VEGETARIANAS ESTRITAS Monografia apresentada à Universidade Federal de Lavras, como parte das exigências do curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Nutrição Humana e Saúde, para obtenção do título de Especialista em Nutrição Humana e Saúde. Orientador Prof. Eduardo Valério de Barros Vilas Boas LAVRAS – MG 2013 LÍVIA RIBEIRO DE PAULA CONSIDERAÇÕES SOBRE A INGESTÃO DE CÁLCIO EM DIETAS VEGETARIANAS ESTRITAS Monografia apresentada à Universidade Federal de Lavras, como parte das exigências do curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Nutrição Humana e Saúde, para obtenção do título de Especialista em Nutrição Humana e Saúde. APROVADA em __ de março de 2013. __________________________________ __________________________________ ___________________________________ Orientador Prof. Eduardo Valério de Barros Vilas Boas LAVRAS – MG 2013 A Surya,minha filha, que está crescendo sem laticínios, sem sacarose, mas com muito amor e saúde, sorrindo e respeitando todas as formas de Vida. Às crianças veganas, ao seu desenvolvimento sadio, às suas famílias e aos seus princípios DEDICO RESUMO A dieta vegetariana estrita é caracterizada por uma alimentação livre de produtos de origem animal, portanto isenta de laticínios. Embora diversos estudos comprovem que essa escolha alimentar, quando bem planejada, é nutricionalmente adequada para todos os estágios do desenvolvimento humano, a manutenção de estoques saudáveis de cálcio nesse tipo de dieta ainda abre espaço para dúvidas e questionamentos. O cálcio é um nutriente essencial necessário em diversas funções biológicas, especialmente a construção e manutenção óssea. As fontes alimentares de cálcio mais amplamente divulgadas para a população são o leite e seus derivados. No entanto, podemos ingerir cálcio adequadamente através de fontes alternativas aos laticínios. Esta monografia de revisão bibliográfica concentra informações necessárias para um melhor entendimento sobre a importância do cálcio dietético, os fatores que interferem a sua biodisponibilidade e as fontes alimentares que possibilitam a ingestão adequada de cálcio em dietas vegetarianas estritas. Palavras-chave: Dieta vegetariana estrita. Cálcio dietético. Veganos. Fontes alimentares de cálcio. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO..........................................................................6 2. REFERENCIAL TEÓRICO.....................................................8 2.1 A IMPORTÂNCIA DO CÁLCIO DIETÉTICO......................9 2.2 ABSORÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DO CÁLCIO DIETÉTICO...............................................................................10 2.2.1 Fatores Dietéticos Interferentes.................................................11 2.3 FONTES DE CÁLCIO DE ORIGEM VEGETAL..................15 2.4 CÁLCIO EM DIETAS VEGETARIANAS ESTRITAS.........17 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................20 4 CONCLUSÃO............................................................................21 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................23 1. INTRODUÇÃO A relação entre o tipo de alimentação de um indivíduo e a sua qualidade de vida é atualmente incontestável e amplamente difundida por diversos profissionais da área da saúde. A cultura alimentar de uma população gera impactos diretos na saúde individual, bem como afeta também a saúde ambiental, econômica, política e social como um todo. Conforme a famosa visão de mundo holística de CAPRA (1997, p. 16), “o mundo é percebido como um todo integrado”, e não como uma coleção de partes dissociadas. O físico austríaco propõe que a Ecologia pode ter um sentido muito mais amplo e mais profundo que o usual: “A percepção ecológica profunda reconhece a interdependência fundamental de todos os fenômenos, e o fato de que, enquanto indivíduos e sociedades, estamos todos encaixados nos processos cíclicos da natureza (e, em última análise, somos dependentes desses processos)” (CAPRA, 1997, p. 16). Sob esta perspectiva, as dietas vegetarianas têm se tornado uma possibilidade de mudança de estilo de vida, pois além dos benefícios comprovados para a saúde, a escolha alimentar também pode ser uma questão ética e ecológica (SVB, 2012). O consumo de alimentos orgânicos e biorregionais, sem organismos geneticamente modificados e sem sofrimento animal, a observação da remuneração justa dos trabalhadores e os tipos de processamentos e embalagens dos produtos são questões relevantes para os vegetarianos. Grande parte dos consumidores não tem acesso às informações sobre as conseqüências das suas escolhas alimentares, apenas são manipulados e bombardeados por propagandas que reproduzem os interesses econômicos das grandes indústrias alimentícias (SINGER & MASON, 2007). Vegetarianos são pessoas com escolhas alimentares que excluem carne de todos os tipos (gado, frango, peixe e outros animais marinhos) e produtos que os contenham. Consomem uma ampla variedade de grãos, hortaliças, frutas, legumes, oleaginosas e seus produtos; a esses alimentos, ovolactovegetarianos incluem ovos e produtos lácteos; lactovegetarianos incluem apenas produtos lácteos; vegetarianos estritos (veganos) não consomem nada de origem animal, nem na alimentação, nem em vestimentas ou outros produtos de uso diário (ADA, 2003). Pesquisas apontam que o número de vegetarianos, seja por razões de saúde, filosóficas, ecológicas ou religiosas, é crescente em várias partes do mundo. Estimativas recentes revelam que 3 a 5% da população ocidental é vegetariana. Na Ásia, este número é ainda maior, apesar de não se ter dados oficialmente divulgados (HO-PHAM et al., 2012). No Brasil, segundo dados do IBOPE (Instituto de Opinião Pública e Estatística), que avaliou indivíduos com mais de 18 anos de idade, 10% dos homens e 9% das mulheres brasileiras declararam-se vegetarianos (SVB, 2012). A posição da American Dietetic Association e Dietitians of Canada sobre dietas veganas e outros tipos de dietas vegetarianas informa que estas escolhas alimentares, devidamente planejadas, são apropriadas para todos os estágios do ciclo de vida, incluindo gestação, lactação, infância e adolescência. Informa ainda que a dieta vegetariana é saudável, nutricionalmente adequada e promove benefícios à saúde, prevenindo e tratando certas doenças (ADA, 2003). Entretanto, a dieta vegetariana não está isenta de riscos, principalmente quando não é bem planejada e balanceada de acordo com as necessidades individuais. Muitos trabalhos têm sido publicados acerca da ingestão e do estado bioquímico de nutrientes minerais em indivíduos vegetarianos. Em dietas veganas, a necessidade de adequação da ingestão do cálcio merece destaque, uma vez que o leite e seus derivados são a fonte usual desse nutriente. Pesquisas mostram que veganos têm a densidade mineral óssea (DMO) reduzida devido à menor ingestão de cálcio. O cálcio (Ca) dietético desempenha diversas funções biológicas, especialmente a construção e manutenção dos ossos. A manutenção de estoques saudáveis de cálcio exige que tanto o teor, como a biodisponibilidade desse nutriente nos alimentos devem ser considerados. Estudos têm demonstrado a associação entre a deficiência de cálcio e doenças crônicas, entre elas osteoporose, câncer de colón, hipertensão arterial e obesidade. Embora as evidências científicas mostrem que o cálcio dietético é encontrado em diversos alimentos de origem vegetal, as fontes de cálcio mais conhecidas são o leite e seus derivados. Entretanto, grande parte da população mundial, mesmo consumindo laticínios, apresenta índices de ingestão de cálcio abaixo do recomendado. Considerando as mudanças de estilo de vida e necessidades dietéticas das populações atuais, bem como o avanço da medicina em diagnosticar e tratar pacientes com intolerância à lactose, um melhor entendimento acerca da biodisponibilidade de cálcio se faz necessário. Estes estudos possibilitam alternativas para a manutenção de estoques saudáveis de cálcio, especialmente em dietas isentas de laticínios. A presente monografia de revisão bibliográfica trata sobre o cálcio, sua importância, biodisponibilidade e alternativas para obtê-lo em dietas vegetarianas estritas. Para esta revisão foram avaliadas as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), juntamente com o parecer da American Dietetic Association, Dietitians of Canada e da Sociedade Vegetariana Brasileira sobre dietas vegetarianas, bem como diversos artigos científicos sobre o assunto. 2. REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 A IMPORTÂNCIA DO CALCIO DIETÉTICO O cálcio é um macromineral essencial à nutrição humana, desempenhando um papel fundamental para o funcionamento do organismo animal. Ele é o principal elemento estrutural do esqueleto, responsável pela construção e manutenção dos ossos. Cerca de 99% do cálcio presente em nosso corpo faz parte integrante dos ossos e dentes. O 1% remanescente é encontrado nos tecidos moles e fluidos corporais (VILAS BOAS, 2010). Embora num percentual de menor expressão, o cálcio que está nos líquidos e células do organismo tem funções biológicas importantíssimas, sendo indispensável para a coagulação sanguínea, contração muscular e transmissão dos impulsos nervosos. Muitos estudos têm demonstrado que o consumo de cálcio previne doenças como a osteoporose, hipertensão arterial, obesidade e câncer de cólon (HEANEY, 2006). As principais organizações de saúde recomendam valores de ingestão de cálcio conforme grupos etários, pois há especificidades em cada grupo que devem ser levadas em consideração. A Tabela 1 apresenta as recomendações de diferentes organizações para a ingestão de cálcio. Tabela 1 Recomendação organizações. Organização Bebês FAO/OMS Food Nutrition Board IOM 300 400 210 270 para ingestão de Cálcio em mg/dia, em diversos Crianças Adolescentes Adultos Idosos 600 700 500 800 1.300 1.000 1.300 1.300 1.000 1.200 200 700 1.300 1.000 1.000 260 1.000 FAO/OMS= Food and Agriculture Organization of the United Nations/ Organização Mundial da Saúde; IOM=The Institute of Medicine. Fonte: Adaptada de Pereira et al., 2009; Ross et al., 2011. A necessidade de cálcio varia conforme a faixa etária, sendo maior em períodos de rápido crescimento como a adolescência. Nesses períodos, ocorre crescimento ósseo e aumento do depósito mineral, até que o pico de massa óssea seja alcançado por volta da terceira década de vida. Na idade adulta, a necessidade diária de cálcio é em torno de 1.000 mg. Nos períodos em que a absorção intestinal de nutriente encontra-se diminuída ou a taxa de reabsorção óssea aumentada, como na pós-menopausa, a necessidade de cálcio novamente se eleva (PEREIRA et al., 2009). 2.2 ABSORÇÃO E BIODISPONIBILIDADE DO CÁLCIO DIETÉTICO Considerando-se o papel fundamental que o cálcio desempenha na manutenção da saúde geral dos indivíduos, esse nutriente tem recebido destaque especial no que diz respeito às questões de políticas de saúde pública. Mesmo em populações de países desenvolvidos, como os Estados Unidos, observa-se o consumo dietético de cálcio abaixo do recomendado (HEANEY, 2006). No Brasil, os dados de consumo alimentar obtidos pela Pesquisa BRAZOS (Brazilian Osteoporosis Study) de 2007, revelaram que 90% dos entrevistados ingerem 1/3 (400 mg) do valor preconizado de cálcio pela DRI (PEREIRA et al., 2009). A partir desses dados observa-se que a carência de cálcio pode ocorrer mesmo em dietas que incluem leite e seus derivados. Muitos estudos revelam que somente a ingestão de alimentos ricos em cálcio, por si só, não é o suficiente. É necessário que o cálcio dietético esteja biodisponível (BUZINARO et al., 2006). Segundo PEREIRA (2010, p.8), “o termo biodisponiblidade aplicado para nutrientes e substâncias bioativas pode ser considerado como a proporção da quantidade ingerida, absorvida e realmente utilizada pelo organismo”. A absorção intestinal de cálcio é feita principalmente no jejuno e o pH baixo favorece a sua absorção, que é regulada diretamente pela vitamina D e hormônios PTH e GH (paratormônio e hormônio do crescimento, respectivamente). Os requerimentos de Ca variam conforme a faixa etária e as condições fisiológicas dos indivíduos. Sua absorção é maior no crescimento, na gestação/lactação, na atividade física e na carência de Ca ou fósforo (P), e menor no envelhecimento. Em geral, quanto maior a necessidade e menor o fornecimento dietético, mais eficiente será a absorção (BUZINARO et al., 2006; PEREIRA, 2010). Os fatores ambientais, tais como a dieta e os aspectos próprios do estilo de vida de cada indivíduo, somados aos fatores endógenos (idade, condições fisiológicas e regulação hormonal) têm diversas influências na biodisponibilidade de cálcio (PEREIRA et al., 2009). No que tange especificamente à alimentação, quando se objetiva adequar nutricionalmente uma dieta para otimizar o consumo de cálcio, é necessário investigar a interação desse mineral com outros nutrientes (BUZINARO et al., 2006, PEREIRA, 2010). 2.2.1 FATORES DIETÉTICOS INTERFERENTES “O cálcio absorvido da dieta depende do balanço entre a ingestão, a absorção (ingestão menos perda fecal) e excreção” (BUENO & CZEPIELEWSKI, 2008, p.387). Esses mecanismos são influenciados por diversos fatores, dentre os quais destacamos os seguintes: a) Ação da Vitamina D A ação da vitamina D é necessária para que ocorra uma adequada absorção intestinal de Ca. Pode ser adquirida pela ingestão de alimentos fontes desse nutriente ou produzida pela síntese cutânea. A exposição solar é responsável por 80% a 90% dos estoques de vitamina D. Conseqüentemente, o baixo consumo de alimentos fontes de vitamina D e a insuficiente exposição solar podem interferir na absorção do cálcio (PEREIRA et al., 2006). Assim, é possível estabelecer uma importante relação entre a vitamina D e o cálcio, uma vez que os níveis séricos normais de vitamina D promovem a absorção de 30% do cálcio dietético e mais de 60-80% em períodos de crescimento, devido à alta demanda desse mineral. “Por isso, durante a infância, a deficiência de vitamina D pode causar retardo de crescimento, anormalidades ósseas, aumentando o risco de fraturas na vida adulta” (BUENO & CZEPIELEWSKI, 2008, p. 390). Uma das causas relacionadas ao declínio da absorção de cálcio com o passar da idade, pode estar ligada à diminuição endógena na produção de vitamina D. Os grupos etários mais avançados passam menor tempo expostos ao sol e com o processo de envelhecimento, ocorre piora da função renal e diminuição da produção de vitamina D (BUZINARO et al., 2006). b) Componentes Vegetais Alimentos ricos em fibra podem prejudicar a absorção de minerais. Conforme os resultados da pesquisa de ALLEN (1982), o acréscimo de frutas e hortaliças na dieta de pacientes, causou um aumento da ingestão de Ca de 1070 para 1166 mg/dia, mas também provocou uma queda no balanço do elemento, que passou de +72 para -122 mg/dia. O mesmo estudo mostrou que pacientes submetidos à dieta para perda de peso, com elevados teores diários de Ca (em torno de 1302 mg/dia) e de fibras, tiveram uma redução no balanço corpóreo de Ca, que passaria de +32 para -77 mg/dia. Por outro lado, estudos posteriores revelam que a fibra sozinha não interfere na absorção de nutrientes. Os efeitos observados diretamente na absorção do Ca parecem ser devidos a outros fatores alimentares. Alimentos ricos em fibras freqüentemente contêm também ácido fítico ou ácido oxálico, substâncias que interagem com o Ca, formando complexos insolúveis e reduzindo a sua absorção intestinal. HEANEY & WEAVER (1990) estudaram as diferenças de biodisponibilidade de Ca entre a couve e o espinafre e constataram uma maior absorção de Ca a partir da couve. Esse resultado foi atribuído ao alto teor de oxalato contido no espinafre. Assim como a couve, eles concluíram que outros vegetais com reduzido teor de ácido oxálico (brócolis, repolho, mostarda e folhas de nabo) possuem uma melhor biodisponibilidade de Ca. Segundo BUZINARO (2006), o ácido fítico também é um componente que, em altas concentrações, afeta o balanço de Ca, uma vez que fibras purificadas não prejudicariam a absorção do elemento. Fontes concentradas de fitatos, tais como farelo de trigo, cereais estruturados ou grãos secos, reduzem substancialmente a absorção de Ca. Contudo, PEREIRA et al. (2009) indicam que os estudos sobre o efeito dos oxalatos e fitatos no metabolismo do Ca em humanos ainda são poucos e os resultados muitas vezes contraditórios. Segundo os autores, esses componentes parecem afetar a absorção do cálcio apenas quando a dieta não é balanceada. O efeito que os alimentos vegetais exercem sobre a biodisponibilidade do Ca parece depender de inúmeros fatores. Pesquisas demonstram os efeitos benéficos de compostos bioativos em diferentes processos biológicos, inclusive no aumento da absorção de cálcio. Os oligossacarídeos não digeríveis, como a inulina e os frutanos são resistentes à hidrólise das enzimas alimentares. “Uma vez que não são hidrolisados e absorvidos no estômago e intestino delgado, esses componentes sofrem fermentação parcial ou total quando chegam ao intestino grosso. A fermentação leva à produção de ácidos graxos de cadeia curta, que resulta na acidificação do intestino e conseqüente estimulação da absorção de cálcio” (PEREIRA et al, 2009, p. 166). Somado a esses benefícios, MACDONALD et al. (2004) acrescentam que o consumo de frutas e hortaliças diminui a acidez da dieta e os nutrientes contidos nesses alimentos ajudam a proteger a saúde dos ossos. Segundo os autores, baixas concentrações de magnésio sérico foram diagnosticadas em mulheres com osteoporose e os ossos da trabécula da crista ilíaca também apresentaram menor quantidade de magnésio, quando comparadas com mulheres saudáveis. Os sais de potássio demonstraram resultados positivos no balanço de cálcio e redução da remodelação óssea. Dessa forma, a ingestão de frutas e hortaliças ricas em nutrientes como o potássio, a vitamina C e a vitamina K podem proteger a saúde óssea e diminuir o risco de fraturas (MACDONALD et al., 2004). c) Excesso de proteína As proteínas com altas concentrações de aminoácidos sulfurados aumentam a perda de cálcio pela urina. A excreção de sulfato torna a urina mais ácida, diminuindo a reabsorção renal do cálcio (WEAVER & PLAWECKI, 1994). Segundo BUZINARO et al.(2006), um dos aspectos mais pesquisados da interação da ingestão protéica com o metabolismo do Ca, refere-se ao aumento da excreção de cálcio na urina. “Estima-se que haja um aumento da calciúria em 60 mg/d para cada 50 g de proteína ingerida. Cada grama de proteína metabolizada aumentaria as concentrações urinárias de Ca em cerca de 1,75 mg. Assim, duplicar a quantidade de proteínas dietéticas purificadas ou aminoácidos na dieta aumentaria o Ca urinário em cerca de 50%” (BUZINARO et al., p. 857). d) Excesso de Sódio A ingestão elevada deste nutriente também acarreta o aumento da excreção renal de cálcio (NIEVES, 2005), influenciando a perda óssea. Acredita-se que a cada 2 gramas de sódio (aproximadamente 6 gramas de sal, NaCl) ingeridos, a excreção de cálcio urinário aumente em média de 30 a 40 miligramas. Entretanto, se a ingestão de sódio for abaixo de 2.400 mg/ dia, não haverá impacto negativo sobre a saúde óssea (PEREIRA et al., 2009). 2.3 FONTES DE CÁLCIO DE ORIGEM VEGETAL O cálcio de muitos alimentos vegetais é bem absorvido e as dietas veganas podem fornecer quantidades adequadas desse nutriente quando incluem regularmente alimentos ricos em cálcio (ADA, 2003). São fontes biodisponível, os vegetais de folhas verdes escuras, batatas, frutas e leguminosas, como a soja e os feijões. As nozes e sementes comestíveis também apresentam boa disponibilidade de cálcio (MESSINA, MELINA & MANGELS, 2003; ADA, 2003; TACO, 2011). O cálcio é absorvido de maneira diferente dependendo do alimento e sua composição (Tabela 2). Estudos apontam que a absorção do cálcio de origem vegetal é eficiente devido ao pH mais ácido no intestino conferido pela digestão desse tipo de alimento (BUZINARO et al., 2006). Tabela 2 Comparação da biodisponibilidade de cálcio em diversas fontes nutricionais. Alimento Biodisponibilidade (%) Brócolis Repolho 61,3 53,8 Couve 49,3 Mostarda 40,2 Leite 32,1 Iogurte 32,1 Queijo Cheddar 31,2 Tofú com Cálcio 31,0 Feijão Azuki 24,4 Batata Doce 22,2 Feijão Branco 21,8 Fonte: Adaptada de Buzinaro et al., (2006); SVB (2012). Pesquisas comparando as diferenças entre a biodisponibilidade de cálcio da couve e do leite indicam que a couve pode ser considerada tão boa quanto o leite em termos da capacidade de absorção de cálcio. Os resultados de HEANEY & WEAVER (1990) mostram que a capacidade de absorção do cálcio da couve foi excelente em todos os casos estudados, sem resultados menores que 30%. E em nove dos onze casos, a capacidade de absorção de cálcio da couve foi ainda maior que a do leite. Os cientistas interpretaram essas descobertas como uma evidência da boa biodisponibilidade do cálcio da couve e provavelmente de toda a classe de vegetais com baixo teor de oxalato. Nozes e sementes comestíveis contêm alta densidade de nutrientes e de substâncias bioativas que potencializam seus efeitos benéficos à saúde. Destaca-se, dentre os minerais, a composição em ferro, cálcio, zinco e selênio, pela importância dos dois primeiros na prevenção de carências nutricionais de relevância em saúde coletiva (FREITAS E NAVES, 2010). Segundo MELINA & MANGELS (2003), autores do “Novo guia norte-americano para vegetarianos”, adultos deveriam inserir, no mínimo, 8 porções de alimentos ricos em cálcio por dia (Tabela 3). Eles também enfatizam que as necessidades de cálcio são alcançadas com a variedade nas escolhas e a adição de frutas e hortaliças ricas em isoflavonas, potássio e vitamina K, que podem favorecer a saúde óssea. Tabela 3 Teor de cálcio nos alimentos de origem vegetal. Alimento Gergelim Teor de cálcio em mg (em 100g do alimento) 825 Coentro 784 Feijão branco 240 Amêndoa 237 Manjericão 211 Semente de linhaça 211 Farinha de soja 206 Salsa 179 Couve refogada 177 Rúcula 160 Castanha do Brazil 146 Couve 145 Taioba 141 Agrião 133 Feijão Carioca 123 Grão de Bico 114 Feijão Preto 111 Nozes 105 Melado 102 Brócolis 86 Tofu 81 Cebolinha 80 Almeirão 63 Fonte: TACO (2011). 2.4 CÁLCIO E SAÚDE ÓSSEA EM DIETAS VEGANAS Um crescente número de evidências científicas tem indicado que a dieta vegetariana estrita é capaz de fornecer todos os nutrientes necessários ao organismo humano, com a exceção da vitamina B12 (SVB, 2012). O cálcio de muitos alimentos vegetais tem boa biodisponibilidade e as dietas veganas, quando bem planejadas, podem fornecer esse nutriente em quantidades adequadas. Além disso, muitos novos alimentos vegetarianos são enriquecidos com cálcio. Só se aconselha a suplementação para veganos caso não atendam à necessidade de cálcio com a alimentação (ADA, 2003). Segundo o GUIA ALIMENTAR DE DIETAS VEGETARIANAS PARA ADULTOS da Sociedade Vegetariana Brasileira, material base para o parecer oficial sobre vegetarianismo do Conselho Regional de Nutricionistas SP/MS - CRN-3, lançado em janeiro do ano passado, é possível manter estoques saudáveis de cálcio com uma dieta isenta de laticínios, incluindo uma gama de alimentos vegetais com melhor biodisponibildade de cálcio e através das bebidas vegetais fortificadas. O mesmo material acrescenta ainda que: “Não há diferença entre a prescrição nutricional de cálcio para lactovegetarianos e para onívoros. No entanto, na dieta vegetariana estrita a escolha das demais fontes de cálcio tem maior importância, já que o leite e seus derivados são a fonte usual para a maioria. Essa prescrição também não é difícil para o nutricionista, por ser semelhante à do indivíduo intolerante à lactose” (SVB, 2012). Pesquisas sobre a resistência óssea de vegetarianos indicam que os veganos costumam apresentar densidade mineral óssea (DMO) menor do que os lactovegetarianos e onívoros, mas a associação clínica desse achado é insignificante. Estudo avaliando o balanço de cálcio no organismo e os marcadores de metabolismo ósseo em dietas veganas e lactovegetarianas, concluiu que o balanço de cálcio foi positivo nas duas dietas. Apesar da diferença quantitativa de cálcio nas duas dietas, não houve diferenças significativas sobre os índices avaliados, quando o cálcio provém apenas de fontes vegetais ou quando inclui produtos lácteos (KOHLENBERGMUELLER & RASCHKA, 2003). Um recente estudo sobre a associação entre veganismo e perda óssea acompanhou 210 mulheres (105 veganas e 105 onívoras) em período pós-menopausa durante 2 anos. A incidência de fraturas foi de 5,7% nas veganas e 5,4% entre as onívoras. Esses resultados indicam pouca diferença e apesar da menor densidade mineral óssea (DMO) a dieta vegana não tem efeitos adversos na dissolução óssea e no risco de fraturas (HO PHAM et al., 2012). A dieta vegetariana estrita bem planejada deve conter uma diversidade de frutas e hortaliças. Além disso, incluir uma grande quantidade de folhas verdes, o que contribui para o aporte de vitamina K. (SVB, 2012). MACDONALD (2004) discute em seu artigo sobre a influência da ingestão de frutas e hortaliças sobre a saúde óssea. Seus resultados mostram que o potássio, a vitaminas C e a vitamina K ajudam a proteger a saúde óssea, diminuindo o risco de fraturas em mulheres no período da menopausa. Em estudos sobre a relação entre a osteoporose e a ingestão de micronutrientes, NIEVES (2005) conclui que além dos cuidados com a ingestão de cálcio e vitamina D, os demais micronutrientes necessários para otimizar a saúde dos ossos são encontrados facilmente em uma dieta saudável, rica em frutas e hortaliças que asseguram a ingestão adequada de magnésio, potássio, vitamina C, vitamina K e outros potenciais nutrientes (NIEVES 2005). Essas conclusões são reforçadas pelas pesquisas de NEW (2004) que indicam que a quantidade de vitamina K, o efeito das proteínas vegetais e do potássio na alcalinidade sangüínea, juntamente com os efeitos dos fitoestrógenos e teor de absorção de cálcio vegetal são as possíveis causas para a manutenção da saúde óssea em vegetarianos. Por outro lado, a quantidade de fibras, frutas e hortaliças assim como a presença constante de sementes, grãos e cereais integrais na dieta vegetariana podem afetar a biodisponibilidade do cálcio dietético. O fornecimento adequado de cálcio requer cuidados com o monitoramento dos teores de ácido fítico e ácido oxálico (BUZINARO et al., 2006, PEREIRA et al., 2009). Para isso, veganos devem evitar alimentos ricos em ácido oxálico (espinafre, acelga, folhas de beterraba e cacau), juntamente com alimentos ricos em cálcio, pois não há métodos culinários para reduzir o ácido oxálico (SVB, 2012). Já os teores de ácido fítico podem ser reduzidos com o emprego de certas técnicas durante o preparo. Práticas como maceração, germinação e fermentação podem reduzir substâncias antinutricionais (BARCELOS, 2007; SVB, 2012), conforme o indicado: “Em dietas com reduzido teor de minerais, o processamento dos alimentos, sobretudo com fermentação, capaz de reduzir o teor de fitato, deve ser empregado no preparo dos alimentos, visando a aumentar a biodisponibilidade dos minerais” (SIQUEIRA et al, 2007). Contudo, a ingestão de cálcio em dietas isentas de laticínios é geralmente mais baixa (SALOMÃO et al., 2012). Entretanto, quando a dieta de uma pessoa é pobre tanto em proteína quanto em sódio e há prática de atividades físicas regulares, as necessidades de cálcio podem ser menores que a de uma pessoa sedentária que se alimente com uma dieta ocidental padrão. Esses fatores e a influência genética podem ajudar a explicar variações da saúde óssea que são independentes da ingestão de cálcio (ADA, 2003). 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Muitos estudos apontam que as principais fontes de cálcio provêm do leite e seus derivados. Entretanto, é possível manter estoques adequados desse mineral, através de uma variedade de fontes de cálcio de origem vegetal presentes em uma dieta vegana biodiversa e balanceada. Esse conhecimento ainda é pouco expressivo, uma vez que grande parte da população ainda apresenta dificuldades em aceitar a idéia de que é possível ter ossos saudáveis sem o consumo de laticínios. De acordo com essa revisão bibliográfica, a prática vegetariana estrita, pode atender às necessidades diárias de cálcio, apesar da ingestão de cálcio em veganos, em geral, ser menor do que em onívoros. Algumas conclusões puderam ser levantadas acerca dos fatores que possibilitam a saúde óssea dos veganos, como a baixa ingestão de proteína e de sódio e a grande variedade de frutas e hortaliças presentes na dieta. Apesar disso, ainda há muitas questões a serem elucidadas, devido às limitações das informações a respeito das reais necessidades de cálcio em dietas vegetarianas estritas, especialmente em períodos de rápido crescimento, na gestação, na lactação e mulheres no período da menopausa. 4. CONCLUSÕES Suprir as necessidades diárias de cálcio dietético, visando à manutenção da saúde óssea e dos diversos processos biológicos aos quais o cálcio se relaciona, é de vital importância. Diante dos diversos mecanismos de absorção e biodisponibilidade do cálcio, a ingestão desse mineral deve ser cuidadosamente avaliada e planejada, especialmente para os indivíduos que não consomem laticínios. A dieta vegetariana estrita, quando bem balanceada, pode suprir as necessidades recomendadas de cálcio. Para isso, veganos devem incluir diariamente as fontes de cálcio mais ricas e de melhor biodisponibilidade em seus cardápios. A suplementação é recomendada apenas quando as necessidades diárias de cálcio não são supridas através da alimentação. Investigações acerca do que ocorre durante os processos digestivos e do metabolismo do cálcio revelam a importância não só da seleção do alimento, mas também da adequada combinação e equilíbrio entre os diversos nutrientes que compõem a dieta. Sob esta perspectiva, além da ingestão de alimentos ricos em cálcio, considera-se importante o consumo adequado de vitamina D, aliado à exposição solar segura, bem como atenção aos teores de proteína e sódio da dieta. Estudos mostram que elevadas quantidades de proteína e de sódio contribuem negativamente para o balanço de cálcio, pois promovem perda urinária desse mineral. A biodisponibilidade de cálcio varia de acordo com os diversos componentes dos alimentos e, mesmo no reino vegetal, pode ser elevada, principalmente quando o alimento for pobre em ácido oxálico. A redução do teor de ácido fítico dos alimentos a partir do emprego de técnicas culinárias, como maceração, germinação e fermentação, também ajuda a melhorar a absorção de cálcio. As fontes de cálcio para veganos incluem vegetais folhosos como couve, brócolis, agrião, repolho e temperos como o coentro e salsinha. As leguminosas, amêndoas e sementes oleaginosas também apresentam boa biodisponibilidade de cálcio. O tofu enriquecido com cálcio, as bebidas e os leites vegetais fortificados são alternativas práticas para atingir as necessidades diárias recomendadas desse mineral. As frutas e as hortaliças em geral, também são ricas fontes de potássio, magnésio e vitamina K, nutrientes que juntamente com o cálcio colaboram para a saúde óssea. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADA. Position of the American Dietetic Association and Dietitians of Canada: Vegetarian diets. Journal of the American Dietetic Association. 2003; 103:745-65. ALLEN, LH. Calcium bioavailability and absorption: a review. Am J Clin Nutr. 1982;35:783-808. BARCELOS, M. F. P.; Substâncias Tóxicas Naturais em Alimentos – Lavras: UFLA FAEPE, 2007. BUENO, Aline L.; CZEPIELEWSKI, Mauro A.. A importância do consumo dietético de cálcio e vitamina D no crescimento. J. Pediatr. (Rio J.), Porto Alegre, v. 84, n. 5, Oct. 2008 . BUZINARO, Elizabeth F. et al. Biodisponibilidade do Cálcio Dietético. Arq Bras Endocrinol Metab. 2006;50/5:852-861. 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