Unidade 1 Shutterstock/Latinstock O que é aprender? O ser humano tem maneiras peculiares de aprender a aprender. Dotado de qualidades inatas e também adquiridas, ele vai ao longo dos anos compondo seu perfil tanto profissional quanto pessoal. Esta unidade discorrerá sobre a aprendizagem e suas especifi‑ cidades, a forma consciente e não consciente da aprendizagem, as diferentes maneiras encontradas pelas pessoas para aprender e como ocorre o processo de aprendizagem no cérebro humano, ou seja, qual parte do cérebro é estimulada quando as pessoas desenvolvem deter‑ minada atividade, bem como a função do professor nesse processo. 9 A aprendizagem e suas dimensões A aprendizagem, em uma dimensão universal, “é idêntica em cada aluno que aprende” (PERRAUDEAU, 2009, p. 11) e, em uma dimensão individual, “se traduz pela heterogeneidade das condutas de aprendizagem observadas em sala” (PERRAUDEAU, 2009, p. 28). Na metade do século XX, com os progressos em relação ao conheci‑ mento do desenvolvimento da criança e o surgimento da psicologia cognitiva, as concepções de aprendizagem foram mudando, ou seja, “as tarefas de aprendizagem, destinadas a fazer memorizar, consolidar, dotar de saberes ou dos saberes‑fazer, passaram para as tarefas de compreensão, destinadas a fazer refletir, levantar problemas, incitar a criar novos procedimentos” (PERRAUDEAU, 2009, p. 13). Como afirmou o Prêmio Nobel Herbert Simon (apud BRANSFORD; BROWN; COCKING, 2007, p. 21), (...) o significado de “saber” mudou: em vez de ser capaz de lembrar e repetir informações, a pessoa deve ser capaz de encontrá‑las e usá‑las. Mais do que nunca, a magnitude do conheci‑ mento humano impede que ele seja totalmente coberto pela educação; ajudar os estudantes a desenvolver as ferramentas intelectuais e as estratégias de aprendizagem necessárias para a aquisição do conhecimento, permitindo que possam pensar produtivamente sobre a história, a ciência e a tecnologia, os fenômenos sociais, a matemática e as artes, é uma concepção melhor dos objetivos da educação. Assim, a consciência de trabalhar as questões mencionadas auxilia o aprendiz a ser mais autônomo e independente na realização das tarefas. Juan Ignácio Pozo, professor na Universidade Autônoma de Madri, tem pesquisas relacionadas ao processo de aprendizagem, ao conheci‑ mento e às estratégias de aprendizagem, com enfoque cognitivista. Ele faz uma distinção entre a aprendizagem implícita e a aprendizagem explícita. A aprendizagem implícita é correlacionada aos automatismos, tendendo a validar uma ideia de aprendizagem que dispensa a compre‑ ensão. É a aprendizagem decorrente de processos não conscientes, isto é, uma aprendizagem que acontece, mas a pessoa não sabe o que sabe ou não sabe explicar aquilo que sabe ou o que aprendeu. A aprendizagem explícita é aquela em que o aprendiz, de forma consciente, sabe explicar o que aprendeu, ou seja, tem clareza em rela‑ ção ao seu processo de aprendizagem. A partir do que foi visto sobre aprendizagem implícita e explícita, como você percebe sua aprendizagem na maioria das vezes? Por que a percebe dessa forma? 10 Os componentes da aprendizagem A aprendizagem, tanto a explícita quanto a implícita, pode ser anali‑ sada a partir de três componentes básicos (POZO, 2002, p. 27‑68), descritos a seguir. 1. Os resultados da aprendizagem – Também chamados de conteú­ dos, consistem no que se aprende, ou seja, o que muda como con‑ sequência da aprendizagem a partir das características anteriores (por exemplo, as propriedades que definem um triângulo isósceles ou as emoções associadas ao cheiro da grama recém‑aparada). 2. Os processos de aprendizagem – Como se produzem essas mudan‑ ças, mediante que mecanismos cognitivos; referem-se à atividade mental da pessoa que está aprendendo, que torna possíveis essas mudanças (a atenção às características relevantes dos triângulos e a diferenciação conceitual, ou meramente perceptiva, entre eles, ou a associação entre esse cheiro e certas experiências vividas em sua presença). 3. As condições de aprendizagem – O tipo de prática que ocorre para pôr em marcha esses processos de aprendizagem (por exem‑ plo, o ensino deliberado das propriedades dos triângulos mediante uma exposição teórica seguida da realização de exercícios ou pro‑ blemas, ou a ocorrência repetida de uma resposta, como a leitura arrebatada de O terceiro livro das ondas de Neruda, na presença de um determinado estímulo, como o cheiro da grama recém‑aparada). Sendo explícita ou implícita, a aprendizagem implica em resultados, análises e condições, como mostra o esquema seguinte. ANÁLISE O QUE Aprendemos ou queremos que alguém aprenda. COMO Aprende‑se esse ou esses resultados desejados. QUANDO QUANTO ONDE COM QUEM etc. Deve‑se organizar a prática para ativar esses processos, que requisitos devem reunir essa prática. RESULTADOS OU CONTEÚDOS INTERVENÇÃO PROCESSOS CONDIÇÕES FONTE: POZO, 2002, p. 68. Figura 1 – Aprendizagem 11 As bases da boa aprendizagem são lançadas bem cedo na vida. Os alunos que apresentavam DAs na escola poderiam ter melhor apro‑ veitamento escolar se os professores tivessem maior conhecimento das dificuldades específicas de cada aluno (BRANSFORD; BROWN; COCKING, 2007). A figura seguinte mostra diversas atividades que devem ser seguidas pelo professor a partir do conhecimento que tem de cada aluno. Exercícios e práticas isoladas Narrativas e vídeos Escrita Com base em aula expositiva Prática contextualizada Com base em habilidades Oral Modelação Simulações Ferramentas eletrônicas Casos Conhecimento de como as pessoas aprendem Reforçado pela tecnologia Com base em inquirição Problemas Oportunidades de avaliação Ambientes de comunicação Aprendizagem por projetos Indivíduo versus grupo Estudo pessoal Aprendizagem quebra-cabeça Aprendizagem cooperativa FONTE: BRANSFORD; BROWN; COCKING, 2007, p. 42. Figura 2 – Processos para uma aprendizagem significativa 12 Diante do esquema apresentado na figura, como você percebe a interação desses processos na sua vida acadêmica? De quais processos você consegue se apropriar melhor para a sua aprendizagem? Shutterstock/Latinstock Com esses poucos recursos, o domínio da aprendizagem expande‑se rapidamente e o aluno consegue perceber o quanto isso é importante no seu processo de aprendizagem. Quando o processo de aprendizagem se torna maçante para o aluno e ele não consegue res‑ ponder ao mínimo exigido pelo professor, por não ser compreendido em suas especificidades, o aluno sente‑se ameaçado diante da desaprovação dos outros ou do próprio fracasso, o que é motivo de vergonha e prejudica não somente a sua aprendizagem, mas também a sua relação interpessoal. Suportes para a aprendizagem Mesmo quando pequenas, algumas crianças estão tão apegadas à visão de que “os erros significam que eu sou burra” que consideram difícil admitir a dificuldade ou temem cometer qualquer erro. Durante os anos da escola básica, as crianças que aprendem a ter medo do jul‑ gamento negativo dos outros tendem a internalizar a voz crítica. Por esse motivo, o estabelecimento de uma atitude positiva em relação à aprendizagem é fundamental tanto nos primeiros anos quanto nos subsequentes. 13 Vejamos a seguir alguns processos auxiliares da aprendizagem, segundo Pozo (2002, p. 88‑89). 1. A motivação – A maior parte das aprendizagens, em especial as explícitas, requer uma prática contínua, que por sua vez demanda um esforço, e o aluno deve ter algum motivo para se esforçar, por exemplo, para aprender inglês, compreender as cau‑ sas da Revolução Francesa ou diferenciar um ácido de uma base. Do contrário, se não há motivos para aprender, a aprendizagem será bastante improvável. A falta de motivação costuma ser um dos motivos da deterioração da aprendizagem, principalmente em situações de educação formal. É preciso selecionar e desta‑ car bem a informação que o aluno deve considerar, mas tam‑ bém deve haver gestão ou controle eficaz dos recursos cognitivos disponíveis, conseguindo‑se assim que certas tarefas deixem de consumir atenção somente por processos de automatização. 2. A recuperação e a transferência das representações – É preciso planejar as situações de aprendizagem tendo em mente como, onde e quando o aluno deve recuperar o que aprendeu. Quanto mais compreendermos o que fazemos, quanto mais consciência tivermos dos nossos conhecimentos, mais provável é que recor‑ ramos a eles em novas situações, relacionando‑os com outras. 3. A consciência – É quando o próprio aluno, de maneira pro‑ gressiva, acaba exercendo o controle de seus processos, utili‑ zando‑os de forma estratégica, mediante uma tomada de cons‑ ciência dos resultados que espera da sua aprendizagem, dos processos mediantes os quais pode alcançá‑los e das condições mais adequadas para pôr em marcha esses processos. A prioridade dos professores é encorajar ao máximo a aprendiza‑ gem e a independência dos alunos, afinal o corpo docente é a alma de qualquer instituição de ensino. “Por mais que se invista em equi‑ pamentos, em laboratórios e outras estruturas físicas – sem negar a importância de todo esse instrumental –, tudo isso não configura mais do que aspectos materiais se comparados ao papel e à importância do professor” (CHALITA, 2001, p. 161). Para tanto, vejamos alguns itens importantes no gerenciamento da aprendizagem, conforme Pozo (2002, p. 142‑147). • Aumentando o autogerenciamento emocional – Prestando atenção aos sentimentos, os alunos são conduzidos a adotar meios mais hábeis de responder às suas reações emocionais, tanto pessoal quanto socialmente. Assim como as crianças em casa aprendem com os exemplos e as conversas que as cercam, o mesmo acontece na escola. 14 • Construindo a resiliência com problemas reais – Enfrentar um problema que não era capaz de resolver, trabalhar nele e resolvê‑lo. Muitas vezes, quando temos um problema que não conseguimos resolver, informamos ao professor e ele nos ajuda. • Desenvolvendo a imaginação – As pessoas aprendem por meio da imaginação e, à medida que fazem isso, cultivam-na como uma ferramenta de aprendizagem. • Os professores como aprendizes – Uma comunidade de aprendizes em que prevalece o espírito de investigação, refle‑ xão e disposição para arriscar‑se, experimentando coisas novas e aprendendo com seus colegas. • Comunidade de investigações (projetos) – Aprender a apren‑ der por meio de projetos que estimulem as crianças a cooperar e a se comunicar em suas equipes de pesquisa. Estão apren‑ dendo, decidindo a respeito de que informações necessitam, como obtê‑las, captá‑las e comunicá‑las. Resiliência – Tolerância emocional que um indivíduo tem em relação a determinada situação que acontece em sua vida, sem se deixar abalar de maneira desesperadora, ou seja, enfrenta a situação, procura resolvê‑la e superá‑la de maneira harmônica e natural. A terminologia vem da física e é aplicada a determinados componentes que se alteram depois de uma temperatura, mas que em seguida voltam ao seu estado normal. Podemos exemplificar a capacidade de resiliência com um elástico, quando este atinge o máximo de sua elasticidade sem arrebentar e depois, quando solto, volta ao seu estado anterior. A pesquisa deve ser muito explorada pelos professores, pois é por meio dela que os alunos conseguem pensar sobre a própria apren‑ dizagem. Muitos alunos têm uma certa incapacidade para lidar eficientemente com as exigências da vida cotidiana e, especificamente, para administrar sua carga de trabalho (PERRAUDEAU, 2009). A resiliência, sobretudo entre os mais brilhantes, é preocupantemente baixa. A falta de resiliência, e até mesmo de genuína coragem e curio‑ sidade, dos alunos universitários parece ser de âmbito mundial. O nível de álcool, estresse, ansiedade, depressão e distúrbios alimenta‑ res são elevados nos universitários. Um diploma torna‑se um rito de passagem sem muito valor no mundo real em virtude da necessidade cega de transmitir grande quantidade de conteúdos e métodos. Com um pouco de imaginação e mais entusiasmo pela aprendizagem, as universidades podem tornar‑se locais onde pessoas de todas as idades desenvolvam ferramentas e atitudes de aprendizagem que são de real valor no mundo exterior (PERRAUDEAU, 2009). 15 Durante a vida toda, em cada aspecto dela, as pessoas são apren‑ dizes. A aprendizagem ao longo da vida abrange a paternidade e a maternidade, a separação e a perda, enfrentar a doença e o infortúnio, tanto de si mesmo quanto dos outros, viver em novas culturas; aprender novas habilidades, praticar hobbies e atividades de lazer; dominar novas tecnologias; desenvolver uma posição com relação às questões atuais. Todavia, a área da vida adulta que a aprendizagem permeia mais persis‑ tentemente do que qualquer outra é o trabalho. A vida profissional está mudando rapidamente. Mesmo para aqueles ainda empregados pelas empresas convencionais, a incerteza e a insegurança são realidades diá‑ rias. As novas competências que são requeridas incluem aprender novas habilidades e conhecimentos, as competências para dominar o que ainda não conseguimos vislumbrar. A força de trabalho precisa sentir que há pessoas com visão e autoconfiança no leme da empresa. Atualmente, “na nova cultura da aprendizagem, já não se trata de adquirir conhecimentos verdadeiros absolutos, mas sim de relativizar e integrar esses saberes divididos“ (POZO, 2002, p. 29) e proporcionar ao aprendiz uma atitude questionadora e não mais passiva durante o processo de aprender. Essa percepção de mundo e pessoas está presente nas teorias cog‑ nitivistas que tratam da mente humana, de como o indivíduo conhece, processa a informação, compreende e dá significados a ela. Ou seja, as diferentes propostas que compõem esse paradigma da aprendizagem é que concebem a con‑ duta e o conhecimento humano a partir das representações provenientes da mente humana e estudam os mecanismos que transformam essas representações. Em outras palavras, essa con‑ cepção de aprendizagem discute a diferença entre aquisição da informação e do conhecimento. (POZO, 2002, p. 40) Assim, a aprendizagem, numa percepção cognitivista, ocorre quando o sujeito organiza as informações recebidas, percebe e direciona essas informações e consegue fazer a transposição dos conhecimentos adquiridos de uma situação para outra (POZO, 2002). Pozo (2002, p. 46) pontua que o enfoque cognitivista concebe a aprendizagem como um processo de armazenamento de informa‑ ções; auxilia na organização do conteúdo e de suas ideias a respeito de um assunto, em uma área particular de conhecimento; busca defi‑ nir e descrever como os indivíduos percebem, direcionam a atenção, coordenam as suas interações com o ambiente; como aprendem, com‑ preendem e reutilizam informações integradas em suas memórias a longo prazo; e como transferem os conhecimentos adquiridos de um contexto para o outro. 16 Assim Pozo, um autor cognitivista, defende que (...) não se trata de mudança apenas quantitativa, mas qualitativa. Não se trata de reproduzir respostas já preparadas, mas também de gerar novas soluções. Não é uma mudança mecânica, e sim que requer um envolvimento ativo, baseado na reflexão e na tomada de consciência, por parte do aprendiz. (POZO, 2002, p. 65) Para tanto, a aprendizagem não pode mais ser concebida como mera reprodução de conhecimentos já existentes, e sim como produ‑ tora de novos saberes. É com esse novo movimento de construção e reflexão dentro das escolas que construímos nossa cultura. “Vivemos numa sociedade com ritmos de mudança muito acelerados, que exige continuamente novas aprendizagens e que, ao dispor de múltiplos saberes, requer dos alunos e professores uma integração e relativi‑ zação de conhecimentos que vai além da mais simples e tradicional reprodução dos mesmos” (POZO, 2002, p. 89). Identificar as condições que mais favorecem a formação de bons aprendizes, em seu sentido fundamental, talvez seja a prioridade das sociedades contemporâneas. Pensar como o aluno aprende é incluí‑lo numa cultura que gera suas formas de aprendizagem. Ao aprender, ele interfere em sua realidade, constrói e reconstrói o conhecimento, pois “nas condições de verdadeira aprendizagem os educandos vão se transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo” (FREIRE, 1996, p. 26). Nessa perspectiva, discentes e docentes são sujeitos da aprendiza‑ gem. Assim, entende‑se que não cabe apenas ao aluno aprender. Ao ensinar, o professor vivencia seus momentos de aprendiz, pois está em constante movimento de construção e reconstrução de seus saberes. Mas como acontece o processo de aprendizagem dentro do nosso cérebro? O cérebro e a aprendizagem Os avanços tecnológicos nos permitem obter mais informações de forma detalhada sobre a estrutura e o funcionamento do cérebro, esta‑ belecendo onde e quando ocorrem os processos cognitivos específicos. Essa informação determina a ordem em que diferentes partes do cérebro encontram‑se ativas quando estão realizando determinadas atividades. A imagem a seguir representa um cérebro humano e suas duas divi‑ sões principais – o hemisfério direito (HD) e o hemisfério esquerdo (HE). 17 FUNÇÕES DO LADO ESQUERDO DO CÉREBRO Percepção artística Pensamento analítico Lógica Criatividade Linguagem Imaginação Raciocínio Intuição Ciência e matemática Percepção de formas tridimensionais Escrita Pensamento holístico Habilidade com números Percepção musical Controle da mão direita Controle da mão esquerda Shutterstock/Latinstock FUNÇÕES DO LADO DIREITO DO CÉREBRO O hemisfério direito é responsável por certas funções, como a percepção espacial e a mu‑ sical. Já o hemisfério esquerdo tem outras funções, como realizar cálculos matemáticos e possibilitar as habilidades de escrita e fala. Lobo parietal Lobo frontal Lobo occipital Lobo temporal Cerebelo Medula espinhal O lobo parietal é responsável pelo sentido tátil‑cinestésico; o lobo frontal, pelo planejamento consciente e pelo controle motor; o lobo occipital, pela visão; e o lobo temporal, pela audição e pela memória. 18 Shutterstock/Latinstock É preciso estimular os dois hemisférios para que ambos possam dar as devidas respostas. Cada hemisfério, também chamado de córtex cerebral, é dividido em quatro principais divisões ou lobos: frontal, parietal, temporal e occipital. Veja a imagem a seguir. O lobo frontal está localizado na parte da frente do crânio e é res‑ ponsável pelo planejamento consciente, pela fala, pelos movimentos voluntários e pelo controle motor. Essa área também é responsável pelo humor, pelos impulsos e pelas situações que envolvem a relação com o outro. “Na criança, é o último lobo a completar a sua matura‑ ção, que ocorre entre 5 e 7 anos de idade” (ROTTA; OHLWEILER; RIESGO, 2006, p. 89). O lobo temporal é responsável por várias funções. Na sua lateral, está a área mais especial, chamada de córtex auditivo, que é relacio‑ nada à audição e também à visão. Já a parte anterior é responsável pelo olfato, pelas emoções, pela memória e pelo comportamento. O lobo parietal é basicamente sensitivo e é responsável pelo sen‑ tido tátil‑cinestésico. Está localizado na parte superior do cérebro e tem como função a orientação no espaço e o movimento. O lobo occipital é localizado na parte de trás do cérebro, na região da nuca, onde se encontra o córtex visual. A função desse lobo é a recepção de informações visuais do ser humano. O cérebro é um órgão complexo e seu estudo deve ser feito sob a perspectiva da evolução (MORA, 2004, p. 18). Ele se constitui em uma grande massa gelatinosa de quase um quilo e meio de peso, de cor acinzentada (por isso é chamado de massa cinzenta), com uma orga‑ nização complexa um pouco mais conhecida atualmente. Tem como função básica manter o indivíduo vivo e em constante contato com o meio no qual está inserido. Apresenta um imenso e complexo bosque de células e conexões intercelulares, composto de aproximadamente 100 bilhões de neurônios de diferentes formas e tamanhos. O córtex cerebral é constituído de vários neurônios, os grandes responsáveis pela realização das sinapses (MORA, 2004). Neurônio é a unidade principal do sistema nervoso central (SNC). É uma célula com finalidade de comunicação eletroquímica: receber, processar e enviar as informações. “Um só neurônio do córtex cerebral pode ter entre 30.000 e 40.000 pontos de contato. Efetivamente, os neurônios, depois de receber a informação de outros neurônios por meio de suas ramificações, criam uma mensagem que é transcrita, por sua vez, para outros neurônios de um circuito.” (MORA, 2004, p. 19) 19 Shutterstock/Latinstock As sinapses são responsáveis pelo transporte das informações pelo sistema nervoso. ­Dependendo do processo de transmissão dos sinais, podem ser elétricas – quando as corren‑ tes iônicas passam diretamente pelas junções comunicantes, que são estruturas que permi‑ tem a comunicação entre células – ou químicas – quando a transmissão ocorre por meio de neurotransmissores. É nas sinapses (termo que vem do grego e significa contato, ligação) que a transmissão de informações acontece. Essa transmissão sináp‑ tica é realizada de forma eletroquímica, pois a comunicação entre os neurônios depende de impulsos elétricos e da liberação de substâncias químicas chamadas de neurotransmissores. Cada neurotransmissor tem seu receptor próprio e cada neurônio secreta somente um tipo de neurotransmissor. • Sinapse elétrica – Esse processo acontece de forma direta, ou seja, de uma membrana a outra, porque existe um canal entre as células que aproxima uma membrana da outra, permitindo que a sinapse aconteça diretamente. Exemplos de sinapses elé‑ tricas são as dos músculos e as do coração. • Sinapse química – Esse processo acontece por meio dos neuro‑ transmissores, ou seja, a informação sai de um local chamado célula pré‑sináptica, vai até a célula sináptica e chega até a célula pós‑sináptica. Todo esse percurso acontece para que a informação chegue a determinado neurônio. 20 Assim, pode‑se concluir que a sinapse elétrica acontece por um canal direto e a sinapse química, por um caminho mais alongado. O córtex cerebral é um emaranhado tão confuso quanto desconhecido. Certamente são bem‑sucedidas as grandes conexões entre as diferentes áreas do córtex cerebral ou entre essas áreas corticais e outras áreas do cérebro (as grandes estradas), mas nosso conhecimento atual sobre as íntimas conexões dos neurônios no próprio córtex cerebral (os cami‑ nhos vicinais) é muito escasso. Na verdade, as regras que controlam e dirigem as conexões corticais locais são praticamente desconhecidas. Hoje em dia, a neurociência trata de desbravar o terreno e ver até onde conduzem os caminhos vicinais do cérebro que se originam das grandes autoestradas. A informação que corre pelas autoestradas e pelos cami‑ nhos vicinais. Na sinapse química, a informação é transferida de um neurônio para o outro, graças a um ou muitos mensageiros químicos que navegam no espaço aberto, para levá‑los do terminal neuronal em que foram liberados ao terminal de outro neurônio. Essas substâncias químicas são os neurotransmissores, isto é, as “moléculas” que transmi‑ tem a informação “neuronal”. Em um único desses contatos (de quase um trilhão que o cérebro apresenta), o trânsito molecular pelo qual se transfere a informação de uma célula para a outra é imenso. Cada uma de tais conexões microscópicas (sinapses) é um cimento granuloso ou uma substância condutora particular que serve para unir muito inti‑ mamente as superfícies neuronais em contato. MORA, F. Continuum: como funciona o cérebro? Trad. Maria Regina Borges. Porto Alegre: Artmed, 2004. Acesse o link <http://www.youtube.com/watch?v=ctSoXbjMgTI> para observar como se dá a percepção de estímulos externos pelo cérebro e como acontecem as sinapses nervosas. Com tudo isso, conseguiu‑se um órgão, o cérebro, com uma caracterís‑ tica notável, a de trabalhar constantemente e jamais descansar. Sua função é permanente, desde o primeiro momento em que começa a organizar‑se, poucos dias depois do nascimento, até a morte. Não descansa sequer no sono ou na doença, nem em qualquer outra circunstância. O cérebro é, portanto, um processo em constante e permanente mudança e funcionamento. Essa é a maravilha criada pela natureza. (MORA, 1996, apud MORA, 2004, p. 9) Podemos observar que o cérebro é um órgão de grande valia, pois é ele que comanda tudo em nossa vida, como nossas emoções, ações e aprendizagens. 21 Memória e aprendizagem Até que ponto a memória é importante? Imagine se você não tivesse memória: não reconheceria ninguém e nada que fosse familiar. Seria incapaz de ler, escrever, falar, porque não se lembraria de nada que estivesse relacionado com a linguagem. Não lembraria nada que tivesse realizado alguns minutos antes. Graças à memória, podemos realizar diversas tarefas com diferentes propósitos. Ela nos permite ligar para alguém, conversar com outras pessoas, reconhecer as pes‑ soas, entender o que lemos em livros e revistas e compreender o que vemos na televisão, no cinema e no teatro. A memória é a faculdade de armazenar algo, mas também de resgatar toda vez que precisamos fazer uso disso, seja no contexto de uma conversa, de realizar uma atividade e em outras situações em que se faz necessário. Mas por que lembramos algumas coisas e esquecemos outras? Vamos distinguir duas formas de memória. • Memória de longo prazo (MLP) – Utilizamos a memória de longo prazo justamente para lembrarmos quem somos, obter‑ mos informações sobre nós mesmos. Para Perraudeau (2009 p. 58), é o modo e o lugar de estocagem de informações, ou seja, organização fonética, semântica, estrutural. • Memória de curto prazo (MCP) – Usamos a memória de curto prazo em momentos mais pontuais, como, por exemplo, lem‑ brarmos o número de telefone durante alguns minutos, nome de uma rua onde precisamos ir naquele instante, enfim, situa‑ ções que são momentâneas. A MCP apresenta duas caracterís‑ ticas fundamentais. “Uma delas é a capacidade muito limitada (apenas cerca de sete dígitos podem ser lembrados); e a fra‑ gilidade de armazenamento, pois qualquer distração provoca esquecimento” (EYSENCK; KEANE, 2007, p. 191). Acesse o link <http://revistaeducacao.uol.com.br/formacao‑docente/170/artigo234952‑1. asp> e veja várias indicações de livros que resultam de estudos sobre neurociência e educação. No link <http://www.youtube.com/watch?v=KdFSdOrBRiM&feature=pla yer_embedded#!>, você encontra uma animação da sinapse nervosa, a partir da qual é possível visualizar a transmissão dos impulsos elétricos e a parte química da sinapse. Melhorar a compreensão também melhora a memória. Tentar lem‑ brar coisas que não fazem muito sentido é uma tarefa ingrata. Um exemplo muito bom da habilidade da memória em ação é apre‑ sentado pelo ator Anthony Hopkins, que é famoso por sua capacidade 22 de decorar as falas, mas, para isso, utiliza técnicas eficientes: lê cada palavra mais de 300 vezes, anotando no roteiro o número de vezes que leu cada parte. À medida que sua memória melhora, ele faz uma cruz na margem, depois uma estrela. A memória prodigiosa de Hopkins não é um talento inato, mas reflete o domínio consumado das habilidades de um tipo específico de aprendizagem (MORA, 2004, p. 22‑24). Em muitas situações práticas da vida real, o intelecto conta menos do que poderíamos imaginar. Atualmente, há muitas pesquisas mos‑ trando que a inteligência prática das pessoas tem pouco a ver com o seu QI ou com outras medidas da capacidade de raciocínio formal, pois a habilidade que o indivíduo tem para exercer determinada fun‑ ção e resolver algum problema está acima das medições do seu QI. O quociente de inteligência, conhecido como QI, era um instru‑ mento muito utilizado para avaliar o grau de inteligência das pessoas. Quanto maior era seu QI, mais inteligente o sujeito era considerado. Embora ainda hoje algumas empresas usem o teste de QI para veri‑ ficar o nível intelectual dos seus candidatos a colaboradores, ele não se baseia mais na competência das pessoas em um único tipo de inte‑ ligência, mas em várias. Essas inteligências serão apresentadas, com mais detalhes, nas próximas unidades. O ser humano está constantemente em processo de aprendizagem, seja implícito ou explícito. A unidade seguinte discorrerá sobre o que é metacognição e sua contribuição no processo ensino-aprendizagem. 23