Homilia de N. Sra. da Conceição, 08 de dezembro de 2006. Meus irmãos e minhas irmãs, a Igreja toda hoje se alegra nesta solenidade da Imaculada Conceição. Muitas comunidades aqui na nossa Arquidiocese têm como “madroeira” a Virgem Imaculada, concebida sem pecado original. Para nós é uma alegria porque nós podemos trazer nesse dia a oração e a memória da Virgem Maria e trazer também a memória da fundação da nossa congregação dos missionários do Sagrado Coração. Hoje de manhã eu já dizia na missa que para nós é um motivo de um orgulho santo muito grande, nós, missionários do Sagrado Coração, num espaço de tempo da nossa fundação de 152 anos de existência, fundados pelo Pe. Julio Chevalier, nós tenhamos realizado na igreja a promoção e o nascimento de 21 comunidades, ou seja, de 21 igrejas particulares, dioceses, mais ou menos num espaço de 7 a 8 anos nos 56 países onde nós somos missionários, aí nós fundamos 21 novas dioceses para a vida da igreja. Isso, pensando e olhando o conjunto das congregações religiosas, isso é uma graça de Deus muito grande na nossa vida de missionários do Sagrado Coração. De que nesse tempo de um século e meio, 152 anos, 21 novas igrejas tenham brotado do serviço missionário dos missionários do Sagrado Coração. Isso é uma alegria que partilho com vocês. A celebração de hoje, da Imaculada Conceição, como todos os dogmas de Nossa Senhora, dizem respeito de modo muito particular à identidade da pessoa humana. Todos os dogmas marianos, o dogma da virgindade de Nossa Senhora, o dogma da maternidade, o dogma da assunção de Nossa Senhora, este de modo particular da Imaculada Conceição, Maria, a mãe de Jesus, foi concebida sem pecado original. Foi preservada para que no seu corpo, na sua vida, se realizasse plenamente a graça de Deus. Todos esses dogmas, e de modo particular este, dizem respeito à identidade da pessoa humana. São dogmas antropológicos que nos ajudam a compreender não somente a vocação de Nossa Senhora, esse dado que se realiza na vida de Maria, mas nos ajuda a compreender que todos nós, homens e mulheres somos criados pela graça de Deus, para que na nossa vida pessoal, na nossa identidade diante da comunidade humana, diante do próprio Deus e diante de nós mesmos, Deus possa realizar em cada um o seu plano de salvação. O seu plano de amor. Maria, a Imaculada Conceição, nos ajuda assim a compreender que toda pessoa humana é criada unicamente para responder ao projeto do nosso Deus. Por isso muito mais do que o pecado, muito mais do que a originalidade do pecado, para nós é hoje e sempre a originalidade da graça de Deus. Nenhum de nós, nenhuma pessoa humana foi criada no pecado e para o pecado, pelo contrário, todos nós somos criados na originalidade da graça de Deus, no amor do nosso Deus, que quer fazer de mim, de você, de cada um de nós, homens e mulheres, que possam registrar na sua vida aquilo que tem acontecido na vida de Nossa Senhora, ou seja, ela é preservada do pecado original, o que significa dizer, ela é preservada de toda a possibilidade de vir a pecar. Isso não é apenas um privilégio de Maria, isso é graça de Deus para todos nós. Para que todos nós possamos como ela, a exemplo dela, também lutar contra toda a realidade do pecado, porque o pecado não é uma realidade humana. Nenhum de nós foi criado no pecado ou para o pecado. O pecado é uma realidade circunstancial, está presente no mundo e nós somos chamados pela graça do batismo a dizer não a esta realidade que é uma circunstância, que é uma situação que está instalada no mundo por conta das nossas opções e por conta das nossas decisões. Celebrar o dogma da Imaculada Conceição na verdade para todos nós é reconhecer aquilo que São Paulo nos diz na carta dele aos romanos: a graça de Deus, muito maior do que qualquer realidade de pecado, é a graça pela qual nós fomos criados, pela qual nós vivemos e com a qual nós experimentaremos definitivamente do amor deste mesmo Deus. Por isso a celebração de hoje é importante para a vida da Igreja. Porque na verdade é a forma que a Igreja tem, olhando para Nossa Senhora, identificando-a como a mulher que na graça de Deus, nos méritos de Cristo, foi capaz de fazer acontecer na sua vida o projeto do Evangelho, dizendo unicamente “sim” a esse projeto. Mesmo que tudo pudesse provocar o contrário, ela se mantém na graça, ela se mantém na proposta, ela se mantém no discernimento de ser fiel ao Evangelho de seu filho Jesus, de ser fiel à proposta de seu Deus e pai, e a esta realidade que está presente na vida de Maria é o que Deus quer que aconteça na minha vida e na vida de cada um de nós. Não por uma questão de privilégio, mas por uma questão de vocação. A nossa vocação é a santidade, não é o pecado, o final de um destino da vida de cada um de nós. A nossa vocação é única, já diz São Paulo na segunda leitura de hoje. Ele louva e bendiz a Deus porque nós fomos escolhidos, antes de toda a fundação do mundo, para que fôssemos santos, irrepreensíveis no amor. Essa é a vocação de toda pessoa humana. A liturgia de hoje é de tamanha importância porque ela nos ajuda a compreender que toda pessoa humana é boa. Ninguém foi criado para a maldade. E interessante a gente perceber que na primeira leitura, a única proposta de inimizade que Deus mantém e provoca em nós é a inimizade com a realidade do mal. Do mal ninguém pode ser amigo. “Por isso entre ti, serpente, e a mulher, porei uma inimizade por todas as gerações.” Nenhuma maldade pode ser uma realidade presente na vida da pessoa humana por vocação, porque por vocação, por graça de Deus, por dom de Deus, todos nós somos bons. Queremos então nessa bondade experimentar do amor de Deus integralmente, como essa mulher experimentou e que por causa disso a Igreja a chama de Imaculada Conceição. Porque na vida dela se realizou aquilo que desde a concepção de todos nós Deus quer que se realize para toda a humanidade. O quê? A graça de Cristo que se experimenta e que se vive pela bondade, pelos valores do Evangelho, por aqueles valores humanos que dignificam toda pessoa humana e que a faz identificar-se com o próprio Deus. Meus irmãos e minhas irmãs, vamos pedir nesta celebração de hoje, então, primeiro, que a gente redescubra o valor de toda pessoa humana. Toda maldade é uma circunstância das opções dos homens e mulheres, das sociedades na história humana, e isso nós podemos mudar, porque por vocação ninguém é criado para ser mal. Ninguém é criado para o pecado, ninguém é criado para uma realidade que nos afasta e que nos impede de viver plenamente a realidade de Deus. Todos fomos criados para a bondade. Esta consciência tem que nos ajudar a descobrir isso e a descobrir também uma maneira nova de nos enxergarmos, de enxergarmos o mundo, de enxergarmos os nossos relacionamentos, que são no princípio da confiança e da bondade. Segundo, que na nossa vida se realize o que se realizou na vida dessa mulher. O privilégio de Maria é uma vocação de todos nós. Todos somos chamados à santidade, e o referencial dessa nossa santidade é Jesus Cristo, o único Senhor. Ele que é a referência pela sua morte, pela sua ressurreição, referência da única vocação pela qual Deus criou todos nós: o amor. E quando é que a gente pode celebrar e viver isso? Quando a gente for capaz de nas nossas opções, nas nossas decisões, poder dizer como Maria: “Eis aqui o servo, a serva do Senhor.” Vamos ficar alguns instantes em silêncio e vamos reconhecer isso na nossa vida, dizendo para nós mesmos: Eu fui criado para a bondade. Se eu faço muitas vezes opções pela maldade, essa é uma circunstância na minha vida, porque a graça de Deus me orienta para a plenitude do amor. Leituras: Gn 3, 9-15. 20 Sl 97 (98) Ef 1, 3-6. 11-12 Lc 1, 26-38