Metabolismo da galactose, frutose, ácido glicurónico e aminoaçúcares

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Metabolismo da galactose, frutose, ácido glicurónico e aminoaçúcares; Rui Fontes
Metabolismo da galactose, frutose, ácido glicurónico e aminoaçúcares
1.
No contexto do metabolismo dos glicídeos as vias de clivagem e oxidação da glicose, de formação de
glicose (gliconeogénese) e de armazenamento (glicogénese) e degradação (glicogenólise) de glicogénio têm
maior relevância quantitativa. No entanto, outras vias de menor relevância quantitativa também são
importantes. Para perceber isto é importante saber que as glicoproteínas e os glicolipídeos (que são
componentes estruturais) contêm derivados aminados e acetilados de glicose e de galactose. No espaço
extracelular de diversos órgãos e tecidos também existem glicosaminoglicanos que, para além destes
derivados, também contêm resíduos de ácido glicurónico. O ácido glicurónico também aparece ligado a
produtos de excreção que aparecem na bile e na urina. A galactose e a frutose (ou os seus precursores, a
lactose e a sacarose) são açucares que fazem parte da dieta e os seus metabolismos têm características que
os diferenciam do metabolismo da glicose.
2.
O UDP-glicurónico (uridino difosfato de ácido glicurónico) é o dador de ácido glicurónico na síntese de
glicosaminoglicanos e na formação de bilirrubina conjugada e de glicurono-conjugados de
xenobióticos. As enzimas envolvidas nestes processos são transférases em que um dos produtos é o UDP e
o outro o substrato aceitador adicionado de um resíduo de ácido glicurónico:
Equação 1
UDP-glicurónico + X → UDP + glicurónico-X
Os glicosaminoglicanos são sintetizados intracelularmente mas existem predominantemente no espaço
extracelular de variados tecidos e órgãos para onde são segregados pelas células componentes desses
mesmos tecidos. São longos polímeros lineares em que a unidade que se repete é um dissacarídeo que
difere nos diferentes tipos de glicosaminoglicanos. Com uma exceção (sulfato de queratano) todos os
glicosaminoglicanos podem conter resíduos de ácido glicurónico que se ligam a resíduos de um
aminoaçucar. Alguns glicosaminoglicanos também contêm outro ácido urónico, o L-idurónico, que resulta
da epimerização do ácido glicurónico.1
A glicurono-conjugação da bilirrubina e dos xenobióticos é um passo que precede a sua excreção (biliar ou
renal).
3.
O UDP-glicurónico é sintetizado a partir da glicose. No primeiro passo a glicose é fosforilada formando-se
glicose-6-fosfato (cínase da glicose; Equação 2); depois a glicose-6-fosfato sofre isomerização originando
glicose-1-fosfato (fosfoglicomútase; Equação 3) que, por ação da pirofosforílase do UDP-glicose, se
converte em UDP-glicose (Equação 4). A conversão da UDP-glicose em UDP-glicurónico envolve uma
desidrogénase dependente do NAD+ e a transferência de quatro eletrões (Equação 5). O UTP (uridinotrifosfato), substrato na reação expressa pela Equação 4, pode formar-se por fosforilação do UDP (uridinodifosfato) por ação da cínase dos nucleosídeos difosfatos (Equação 6).
Equação 2
Equação 3
Equação 4
Equação 5
Equação 6
Glicose + ATP → Glicose-6-fosfato + ADP
Glicose-6-fosfato ↔ Glicose-1-fosfato
Glicose-1-fosfato + UTP → UDP-glicose + PPi
UDP-glicose + 2 NAD+ → UDP-glicurónico + 2 NADH
UDP + ATP → ADP + UTP
O somatório das Equações 2-5 é a Equação 7.
Equação 7
Glicose + ATP + UTP + 2 NAD+ → UDP-glicurónico + ADP + PPi + 2 NADH
1
Em alguns casos (sulfato de dermatano, heparina e sulfato de heparano), já depois da síntese da cadeia, uma percentagem
maior ou menor dos resíduos de ácido glicurónico sofre epimeração no carbono 5 convertendo-se em resíduos de ácido Lidurónico. Esta epimerização não ocorre nos casos do ácido hialurónico e do sulfato de condroitina. O aminoaçucar pode ser
a N-acetil-glicosamina (ácido hialurónico, sulfato de queratano, heparina e sulfato de heparano) ou a N-acetil-galactosamina
(sulfato de condroitina e sulfato de dermatano). Com exceção do ácido hialurónico todos os glicosaminoglicanos contêm
resíduos de sulfato que, na sua maior parte, estão ligados por ligações sulfoéster a grupos hidroxilo do polímero; no caso da
heparina, o sulfato pode substituir alguns dos grupos acetilo da N-acetil-glicosamina havendo, por isso, resíduos de N-sulfilglicosamina.
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O somatório das Equações 1, 6 e 7 (Equação 8) permite compreender que na formação de um conjugado do
ácido glicurónico (e de uma unidade dissacarídica dos glicosaminoglicanos) se gastam 2 “ligações ricas em
energia” do ATP e se formam 2 NADH (eventualmente usados na síntese de ATP na fosforilação
oxidativa).
Equação 8
4.
Glicose + 2 ATP + 2 NAD+ + X → glicurónico-X + 2 ADP + PPi + 2 NADH
A frutose que é absorvida no intestino pode resultar da hidrólise da sacarose da dieta mas também da
ingestão direta de frutose sobretudo em alimentos que foram processados industrialmente2. A absorção da
frutose no intestino e o seu transporte do sangue para as células envolve transportadores de membrana mas
ocorre sempre a favor do gradiente: não há transporte ativo de frutose. No pólo apical dos enterócitos e das
células tubulares renais o transportador para a frutose é o GLUT5; no pólo basal destas mesmas células e
nos hepatócitos é o GLUT2 [1]. Na criação do gradiente que possibilita a sua absorção e a sua entrada para
as células estão envolvidas enzimas que promovem a sua metabolização. Após a ingestão de frutose, a sua
concentração no plasma sobe para valores que podem atingir 0,5 mM (10% do da glicemia), mas desce
rapidamente para valores que são mais de 100 vezes inferiores aos da glicemia [2]. As enzimas envolvidas
na metabolização específica da frutose (cínase da frutose (Equação 9) e aldólase B (Equação 10)) são mais
abundantes no fígado3 sendo neste órgão que a frutose absorvida é maioritariamente captada (GLUT2) e
metabolizada [3, 4]. O primeiro passo no seu metabolismo é catalisado pela cínase da frutose que promove
a sua fosforilação no carbono 1. A frutose-1-fosfato formada sofre a ação da aldólase B que catalisa a sua
cisão formando-se como produtos a dihidroxiacetona-fosfato (um intermediário da glicólise e da
gliconeogénese) e o gliceraldeído (Equação 10). A conversão do gliceraldeído no correspondente
intermediário fosforilado envolve a ação da cínase das trioses (Equação 11). A Equação 12 é o somatório
das reações referidas acima e mostra que a frutose é, no fígado, convertida em dihidroxiacetona-fosfato +
gliceraldeído-3-fosfato.
Equação 9
Equação 10
Equação 11
Equação 12
Frutose + ATP → Frutose-1-fosfato + ADP
Frutose-1-fosfato → dihidroxiacetona-fosfato + gliceraldeído
Gliceraldeído + ATP → gliceraldeído-3-fosfato + ADP
Frutose + 2 ATP → dihidroxiacetona-fosfato + gliceraldeído-3-fosfato + 2 ADP
As trioses fosfato formadas (dihidroxiacetona-fosfato e o gliceraldeído-3-fosfato) são interconvertíveis
(isomérase das trioses-fosfato; ver Equação 13) e são intermediários da glicólise e gliconeogénese podendo
ser convertidas em glicose (via aldólase, fosfátase da frutose-1,6-bisfosfato, isomérase das hexoses-fosfato
e glicose-6-fosfátase)4. Outros destinos possíveis são a formação de glicogénio, lactato e palmitato
(lipogénese), sofrer oxidação completa com produção de CO2 (via glicólise, desidrogénase do piruvato,
ciclo de Krebs e fosforilação oxidativa) ou originar glicerol-3-fosfato (via ação da desidrogénase do
glicerol-3P: ver Equação 14) que é um dos precursores na síntese de triacilgliceróis.
Equação 13
Equação 14
Dihidroxiacetona-fosfato ↔ gliceraldeído-3-fosfato
Dihidroxiacetona-fosfato + NADH ↔ glicerol-3-fosfato + NAD+
Embora as concentrações intracelulares de glicose possam inibir (inibição competitiva) a atividade de
fosforilação da frutose no carbono 6 pelas diversas hexocínases dos tecidos (incluindo a hexocínase IV, a
hexocínase hepática; ver Equação 15) admite-se que uma parte menor do metabolismo da frutose possa
ocorrer via conversão da frutose em frutose-6-fosfato (intermediário da glicólise e gliconeogénese).
Equação 15
5.
Frutose + ATP → frutose-6-fosfato + ADP
Embora a glicose seja o glicídeo com o papel mais importante no metabolismo energético dos mamíferos, o
nutriente dos espermatozoides é a frutose que é sintetizada a partir da glicose nas vesículas seminais. O
2
A razão do uso crescente da frutose é o facto deste monossacarídeo ser muito doce, cerca de duas vezes mais doce que a
glicose, por exemplo.
3
Também existem nas células tubulares renais onde seriam importantes para metabolizar a frutose criando o gradiente
necessário para a sua reabsorção.
4
Alguns autores, alargando o conceito clássico de gliconeogénese, incluem na gliconeogénese os processos de formação de
glicose a partir de frutose e galactose.
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processo de síntese de frutose envolve a redução, dependente do NADPH, da glicose a sorbitol (redútase
das aldoses; Equação 16) e a oxidação, dependente do NAD+, do sorbitol a frutose (desidrogénase do
sorbitol; ver Equação 17). O sorbitol é o poliálcool que resulta da redução do grupo aldeído da glicose.5 O
facto de os espermatozoides consumirem frutose e de o líquido seminal conter este açúcar dá aos gâmetas
masculinos uma vantagem competitiva sobre outras células (nomeadamente fungos e bactérias) que
povoam a vagina normal contribuindo para a sua sobrevivência (e para a sobrevivência dos genes neles
contidos). A membrana citoplasmática dos espermatozoides contém GLUT5, o transportador da frutose [1]
mas, nestas células, o metabolismo da frutose, ao contrário do que acontece no fígado, envolve a
hexocínase (conversão em frutose-6-fosfato; ver Equação 15) [5].
Equação 16
Equação 17
Glicose + NADPH → sorbitol + NADP+
Sorbitol + NAD+ → frutose + NADH
6.
A intolerância hereditária à frutose é uma doença congénita rara causada por uma alteração no gene da
aldólase B. A aldólase B dos indivíduos com intolerância hereditária à frutose, sendo capaz de catalisar com
eficácia as conversões próprias da glicólise e gliconeogénese (frutose-1,6-bisfosfato ↔ gliceraldeído-3fosfato + dihidroxiacetona-fosfato) não é capaz de cindir a frutose-1-fosfato (ver Equação 10) [4]. Os
doentes têm episódios agudos de vómitos e hipoglicemia quando ingerem frutose (ou sacarose). Na
patogenia das crises estão alterações das concentrações intra-hepatocitárias de metabolitos como a
acumulação de frutose-1-fosfato e a depleção de ATP e Pi. Na maioria dos casos, os doentes (ou os seus
pais) aprendem a evitar os alimentos que contêm frutose e a terapêutica é exatamente essa: restrição na
ingestão de frutose e sacarose.6
7.
A galactose é ingerida ligada à glicose na lactose que, por ação da lactase intestinal, sofre hidrólise. A
absorção da galactose nos enterócitos (e, a reabsorção nas células tubulares renais) envolve a ação da
SGLT1 (transporte ativo secundário dependente do Na+). A galactose absorvida é rapidamente convertida
em glicose (ou glicogénio) e estes processos ocorrem maioritariamente no fígado; as concentrações
plasmáticas de galactose após ingestão de grandes quantidades de galactose ou em jejum são semelhantes
às apontadas acima para o caso da frutose [6, 7]. Tal como no caso da frutose o primeiro passo é o seu
transporte via GLUT2 seguido da sua fosforilação no carbono 1; a enzima envolvida denomina-se cínase
da galactose (ou galactocínase; Equação 18). A transférase de uridilato da galactose-1-fosfato (ou uridiltransférase da galactose-1-fosfato; Equação 19) catalisa a transferência de um resíduo de uridilato (UMP)
entre a UDP-glicose e a galactose-1-fosfato; um dos produtos formados é a UDP-galactose e o outro a
glicose-1-fosfato. A reação de isomerização da UDP-galactose em UDP-glicose é catalisada pela UDPgalactose-4-epimérase (Equação 20).
Equação 18
Equação 19
Equação 20
Galactose + ATP → Galactose-1-fosfato + ADP
Galactose-1-fosfato + UDP-glicose ↔ UDP-galactose + Glicose-1-fosfato
UDP-galactose ↔ UDP-glicose
O somatório das Equações 18-20 é a Equação 21. Esta Equação mostra que a galactose se converte em
glicose-1-fosfato e que não é errado dizer-se que o par UDP-galactose/UDP-glicose (interconvertíveis por
ação da epimérase) tem um papel “catalítico” (ou pseudo catalítico) neste processo de conversão.
Equação 21
Galactose + ATP → Glicose-1-fosfato + ADP
A ação sequenciada da fosfoglicomútase operando sobre a glicose-1-fosfato formada (Equação 3) e da
glicose-6-fosfátase sobre a glicose-6-fosfato (Equação 22) permite compreender que se pode formar glicose
a partir da galactose ingerida e que a glicemia aumente quando se ingere galactose.
Equação 22
Glicose-6-fosfato + H2O → Glicose + Pi
5
A redútase das aldoses também existe no cristalino do olho e pensa-se que a acumulação de sorbitol neste tecido é, pelo
menos, uma das causas das cataratas dos doentes diabéticos.
6
O défice de cínase da frutose é outra deficiência que pode ocorrer no metabolismo da frutose, mas não é uma verdadeira
doença. Os afetados não têm qualquer sintoma e as únicas anomalias são, aquando da ingestão de frutose, a excessiva
excreção renal de frutose (daí a designação clássica de “frutosúria essencial”), subidas mais marcadas na frutosemia e uma
metabolização lenta (via hexocínase) da fração da frutose ingerida que não se perde na urina.
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A glicose-1-fosfato também pode ser substrato para a síntese de UDP-glicose (Equação 4) que é o dador de
unidades de glicose na síntese de glicogénio, de glicoproteínas e de glicolipídeos.
É comum pensar-se que a galactose pode ser convertida em galactose-6-fosfato por ação das hexocínases
dos tecidos. Contudo, esta ideia é errada: a atividade das hexocínases na galactose é, mesmo in vitro,
praticamente nula [8].
8.
Para além da lactose, muitos componentes estruturais dos tecidos (como glicoproteínas, glicolipídeos e
proteoglicanos) contêm resíduos de galactose. A UDP-galactose é o dador de galactose aquando da ação de
galactosil-transférases (Equação 23) que participam na síntese desses componentes estruturais e, no caso
do tecido mamário em fase de lactação, na de lactose. Nestas ações catalíticas, o carbono anomérico da
galactose que estava ligado ao fosfato β da UDP passa a estar ligado a uma proteína, a outro resíduo
glicídico ou a um lipídeo.
Equação 23
UDP-galactose + X → UDP + galactose-X
Embora a UDP-galactose possa ter origem na galactose da dieta (galactose → galactose-1-fosfato →
glicose-1-fosfato → UDP-glicose ↔ UDP-galactose; ver Equações 18, 19, 4 e 20), a esmagadora maioria
das moléculas de UDP-galactose consumidas nos processos de biossíntese é sintetizada a partir da glicose.
Nesta síntese participam hexocínases (no caso do fígado, a hexocínase IV) que catalisam a formação de
glicose-6-fosfato (ver Equação 24), a fosfoglicomútase (Equação 3) e a pirofosforílase da UDP-glicose
(Equação 4). A UDP-glicose (formada por ação sequenciada destas 3 enzimas: glicose → glicose-6-fosfato
→ glicose-1-fosfato → UDP-glicose) pode, por ação da mesma isomérase que, no fígado, participa na
conversão da galactose da dieta em glicose (epimérase da UDP-galactose; Equação 20), levar à formação de
UDP-galactose. Assim se compreende que a galactose (e a lactose) não seja um nutriente essencial (é
dispensável na dieta).
Equação 24
9.
Glicose + ATP → glicose-6-fosfato + ADP
Na glândula mamária inativa existe uma galactosil-transférase que está normalmente envolvida na síntese
de glicoproteínas (Equação 23). Imediatamente após o parto começa a sintetizar-se na glândula mamária
uma outra proteína (lactalbumina) que se liga à galactosil-transférase. O complexo galactosil-transféraselactalbumina tem atividade catalítica e designa-se como síntase da lactose porque catalisa a formação de
lactose (Equação 25): a lactalbumina modifica a atividade da galactosil-transférase no que diz respeito ao
substrato aceitador que passa a ser a glicose.
Equação 25
UDP-galactose + glicose → lactose + UDP
10. Estão descritas patologias congénitas raras causadas por alterações nos genes codificadores da
galactocínase, da uridil-transférase da galactose-1-fosfato e da 4-epimérase da UDP-galactose que causam
défice de cada uma destas enzimas [9]. Todas estas alterações causam aumento da galactose no plasma
sanguíneo quando se ingere galactose (ou lactose) e por isso são conhecidas pela designação de
galactosemias. No entanto, porque se conhece há mais tempo (desde 1935) e porque tem consequências
mais graves, quando se diz simplesmente “galactosemia” o mais provável é estar a falar-se do défice de
uridil-transférase da galactose-1-fosfato. No défice de uridil-transférase da galactose-1-fosfato ocorre
bloqueio da conversão galactose-1-fosfato → glicose-1-fosfato o que leva à acumulação de galactose-1fosfato e galactose nas células. Não se sabe a patogenia da maior parte das alterações que podem
manifestar-se nestes doentes (atraso de crescimento, insuficiência hepática, anomalias no sistema nervoso
central, alterações renais, disfunção ovárica, etc.) mas sabe-se porque é que desenvolvem cataratas. Quando
se acumula galactose nas células do cristalino a redútase das aldoses presente nestes tecidos converte a
galactose em galactitol, o polialcool correspondente à galactose (ver Equação 26). O galactitol acumula-se
nas células do cristalino e, porque tem poder osmótico, provoca a acumulação secundária de água que está
na origem da opacificação do cristalino. No caso do défice de galactocínase acumula-se galactose mas não
galactose-1-fosfato e a única alteração é o desenvolvimento de cataratas que tem a mesma etiologia. O
tratamento é, em ambos os casos, uma dieta restritiva onde a galactose (e lactose) está totalmente proibida.
A dieta pode curar e previne o desenvolvimento das cataratas. Esta dieta também previne o
desenvolvimento da insuficiência hepática e a morte precoce nos casos de défice de uridil-transférase da
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galactose-1-fosfato mas outras anomalias não são prevenidas. De notar que a galactose é nutricionalmente
dispensável já que a UDP-galactose pode ser formada a partir da glicose via ação da 4-epimérase da UDPgalactose7
Equação 26
Galactose + NADPH → galactitol + NADP+
11. As oses aminadas são importantes constituintes de glicoproteínas, glicolipídeos e glicosaminoglicanos. Tal
como no caso da glicose, da galactose e do ácido glicurónico o substrato dador das oses aminadas para a
síntese destes compostos são derivados contendo o resíduo UDP. As transférases envolvidas catalisam
reações análogas às descritas pelas Equações 1 e 23. As oses aminadas formam-se a partir da frutose-6fosfato que, por ação de uma transférase, aceita a porção azotada do grupo amida da glutamina gerando a
glicosamina-6-fosfato (Equação 27). A transformação da glicosamina-6-fosfato em UDP-glicosamina
ocorre através de transformações semelhantes às que sofre a glicose-6-fosfato quando se converte em UDPglicose: isomerização a glicosamina-1-fosfato e aceitação do resíduo uridilato do UTP (Equação 28 e
Equação 29). É frequente que o grupo amina esteja acetilado (ligação amida); a acetilação do grupo amina
ocorre através da transferência do grupo acetilo da acetil-coenzima A para a glicosamina-6-fosfato
(Equação 30). A formação da UDP-N-acetil-galactosamina (ou da UDP-galactosamina) ocorre por
isomerização da UDP-N-acetil-glicosamina (ou da UDP-glicosamina), numa reação análoga à descrita pela
Equação 20.
Equação 27
Equação 28
Equação 29
Equação 30
Frutose-6-fosfato + glutamina → glicosamina-6-fosfato + glutamato
Glicosamina-6-fosfato (ou N-acetil-glicosamina-6-fosfato) →
Glicosamina-1-fosfato (ou N-acetil-glicosamina-1-fosfato)
Glicosamina-1-fosfato (ou N-acetil-glicosamina-1-fosfato) +UTP →
UDP-glicosamina (ou UDP-N-acetil-glicosamina) + PPi
Glicosamina-6-fosfato + acetil-CoA → N-acetil-glicosamina-6-fosfato + CoA
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(Scriver, C., Beaudet, A., Sly, W. & Valle, D., eds) pp. 967-1000, McGraw-Hill, New York.
7
Os doentes com défice de 4-epimérase da UDP-galactose são muitíssimo raros e a doença é mal compreendida. Nos casos de deficiência
mais grave a restrição absoluta de galactose não é possível porque, para estes doentes, a galactose é nutricionalmente indispensável.
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Galactose
Lançadeiras do
malato ou do
glicerol-3-fosfato
→
Fosforilação
oxidativa
Glicogénio
UDP
ATP
2 NAD+
ADP
2 NADH
UDP-Glicurónico
UDP-Glicose
Galactose-1-fosfato
H2O
X
2 Pi
PPi
UDP
Pi
UTP
Glicurónico-X
UDP-Galactose
UDP-N-acetil-glicosamina
Glicose-1-fosfato
PPi
ATP ADP
Glicose
UTP
UDP-N-acetilgalactosamina
Glicose-6-fosfato
Pi
H2O
glutamina glutamato
ADP
ATP
N-acetil-glicosamina-1fosfato
ATP
Pi
ADP
CoA
N-acetilglicosamina- 6fosfato
Glicosamina-6fosfato
Frutose-6-fosfato
Frutose
Acetil-CoA
ATP
ADP
H2O
Frutose-1,6-bisfosfato
Frutose-1-fosfato
Dihidroxiacetonafosfato
Gliceraldeído-3fosfato
Gliceraldeído
Pi + ADP +
NAD+
ADP
ATP
QH2
NADH
ATP + NADH
Fosfoenolpiruvato
ADP
Q
ATP
NAD+
Piruvato
Glicerol-3-fosfato
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