DOENÇAS OCASIONAIS EM EMERGÊNCIA E INTERAÇÕES

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2 o Simpósio Técnico sobre Matrizes de Frangos de Corte
13 a 15 de outubro de 1999 — Chapecó, SC, Brasil
DOENÇAS OCASIONAIS EM EMERGÊNCIA E
INTERAÇÕES: BRONQUITE INFECCIOSA DAS
GALINHAS E DOENÇA DE MAREK
Nair Massako Katayama Ito
Médica Veterinária, Doutora em Patologia Aviária
SPAVE Consultoria em Produção e Saúde Animal Ltda
Rua Alvarenga Peixoto, 466 Vila Anastácio
Fone/Fax: (011) 831-2984/ 261-6398
E-mail: [email protected]
1
Introdução
Talvez a terminologia “doença ocasionais em emergência” não seja a mais correta
porque na realidade o que ocorreu foi:
A bronquite infecciosa das galinhas desde que foi reconhecida no Brasil e liberado
o uso da vacina H120 em 1979, nunca esteve totalmente controlada, tanto que
sucessivamente foram introduzidas no pais, cepas mais virulentas do tipo H52 (ou
H70 ?), H90 e Ma5 nos últimos anos. O que aconteceu (?): limitação ou erros
de diagnóstico, intercorrência com outras doenças, aparecimento de mutantes ou
variantes antigênicas, ou reciclagem de vírus vacinal (?).
Surtos da doença de Marek ocorrem porque realmente apareceram cepas
mais virulentas ou elas já existiam e não sabíamos diagnosticar (?) ou existem
erros de vacinação, doenças imunossupressoras quebrando a vacinação, falha na
biossegurança (?). Pode ser que não se tenha tido notificação nos últimos anos,
de casos de Marek com linfomas viscerais, em particular em frangos de corte
e reprodutoras pesadas. No entanto, à luz dos novos conhecimentos, pudemos
enxergar que existem no país e no mundo, cepas oncogências com diferenças
de patogenicidade ou virulência ameaçando a indústria avícola, podendo se tornar
endêmicos, em particular, em criações de poedeiras comerciais e frangos de corte
que não adotam normas mínimas de biossegurança.
2
Doença de Marek
Histórico:
• Marek (1970): Primeira descrição da doença.
• Churchill & Biggs (1967): Herpesvírus associado a células é o agente etiológico.
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Histórico no Brasil: o histórico de ocorrência ou aumento de casos da doença de
Marek no Brasil, na sua forma neoplásica, é semelhante àquela descrita no mundo.
Como se sabe, o aumento de casos da neurolinfomatose causada pelo vírus da
doença de Marek está relacionado com aumento da disseminação, contaminação ou
contágio com vírus do tipo muito virulento (vv MDV) que superam a imunidade induzida
pela cepa HVT (vírus não patogênico e oncogênico isolado de perus) do sorotipo 3, e
cepa SB1 (vírus não patogênico isolado de galinhas do sorotipo 2). Este fenômeno,
denominado de “quebra da vacinação” ocorreu no início da década de 1990 no Brasil,
e foi responsável por muitos casos erroneamente denominados de “Marek tardia”, em
poedeiras comerciais e reprodutoras pesadas. Aproximadamente em 1992/1993 foi
introduzida no Brasil, a vacina do sorotipo 1, amostra CVI 988 (Rispens) e notada uma
redução dos casos de neurolinfomatose. Ao final desta década podemos considerar
que a doença está sob controle, porém emergente em algumas regiões ou segmentos
da avicultura, mesmo utilizando-se a vacina Rispens.
2.1
Casos clínicos no Brasil
Através de análise retrospectiva de casos clínicos que acompanhamos podemos
dar o seguinte histórico:
• Final 1970–início de 1980: doença endêmica em poedeiras comerciais,
reprodutoras pesadas e frangos de corte – fase de introdução da vacina HVT em
poedeiras comerciais e reprodutoras pesadas com redução dos casos clínicos
em todo o país. Em frangos de corte a vacinação era efetuada somente
em granjas com rescidiva de casos e houve “ confusão” com ocorrência de
reticuloendoteliose em um determinado ano.
• Final da década de 1980 e início de 1990: casos clínicos esporádicos, “quebra
da vacinação do HVT” e confusão com leucose linfóide/ mielóide, resultando na
introdução e aumento de uso da vacina Rispens em meados da década de 1990
para poedeiras comerciais, e menos significante para reprodutoras comerciais.
Vacinação crescente de frangos de corte com amostra HVT, concomitante com
aumento da produção avícola no Brasil.
• Fim da década de 1990: apesar da consolidação do uso da vacina Rispens,
principalmente em poedeiras comerciais e HVT para frangos de corte, tem
ocorrido casos de linfomas nos três segmentos da avicultura.
2.2 Situação atual para casos de linfomas no Brasil (meados a fim
da década de 1990)
• Poedeiras comerciais: em algumas regiões com prevalência elevada de perda de
pernas e em outras, apenas aumento de casos de encefalite e perda de pernas
e, em outros casos restritos a lotes de uma ou outra forma clínica. Linfomatose
visceral em alguns lotes.
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• Reprodutoras comerciais: situação conturbada e confusa devido ocorrência de
leucose linfóide ou mielóide agravada por pouco acompanhamento e/ou real
redução de casos de linfomas devido doença de Marek. Paralisia de pernas
e encefalites podem estar subdiagnosticadas e contribuindo com aumento de
casos de imunossupressão e neoplasias do complexo sarcoma leucose linfóide.
• Frangos de corte: casos esporádicos de condenação de carcaça de frangos de
corte e confusão disgnóstica com “síndrome do fígado e baço grande” (Big liver
spleen – BLS) e/ou fase virêmica do vírus do complexo sarcoma leucose linfóide.
Avaliação de bolsa de Fabrícius sugere que existe infecção com vírus da doença
de Marek e, aparentemente, existem casos subdiagnosticados de encefalite e
perda de pernas.
2.3
Etiologia
Herpesvírus (DNA vírus) associado a célula e classificada em 3 sorotipos:
• Sorotipo 1: amostras virulentas e oncogênicas.
• Sorotipo 2: amostra não oncogênica de galinhas (SB1) utilizada como vacina.
• Sorotipo 3: HVT (Herpesvírus de perus) – vacina.
Definição: Doença neoplásica caracterizada pela ocorrência de tumores nas
vísceras, pele e nervo periféricos, caracterizadas por uma proliferação anormal de
linfócitos T, e indução de linfomas.
2.4 Biggs
Em (1921) deu a denominação de doença de Marek para uma enfermidade que
causa lesões inflamatórias caracterizadas por infiltração de células mononucleares
em:
• Nervos periféricos: Polineurites, Neurite, Paralisia difusa.
• Íris: Cegueira, olhos cinza, iritis, uveite, “conjuntivite/hemorragia”;
e ainda, linfomas nas visceras, músculos e pele:
• Linfoma visceral ou leocose visceral.
• Linfoma cutâneo.
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2.5
Virulência ou oncogenicidade
Presente somente nos vírus do sorotipo 1.
• Atenuado (35 a 70 passagens): Rispens.
• m.MDV: Cu2
• v.MDV: JM, GA, HPRS-16.
• vv.MDV: Md5, RB1B.
• vv.+MDV: 584 A.
2.6 Evidências para ocorrência de mutação (Witter, 1998)
• MDV pode ser atenuado.
• Mutante espontâneo que contém integrado o LTR (long terminal repeat) do REV
• Alguns vírus atenuados tendem a reestabelecer virulência quando reinoculados
seguidamente em aves.
• O retrovírus insere LTRs no genoma do vírus da Marek dos sorotipos 1 e 3.
2.7 Morbidade e Mortalidade
A expressão da virulência ou oncogenicidade dos vírus da doença de Marek
(MDV) do sorotipo 1 na galinha, depende de uma série de fatores que nem sempre
consideramos quando analisamos um surto de campo, por exemplo:
• HVT é estimado experimentalmente como capaz de dar 80% a 90% de proteção
contra desafio com v.MDVs. Melhor taxa de proteção a nível de campo pode ter
relação com redução da taxa de contaminação ou desafio de campo ou a outros
fatores que discutiremos a seguir.
• MDVs virulentos que produzem neurolinfomatose, produzem infecção persistente
na presença de HVT e podem induzir formação de tumores porque o HVT não
produz anticorpos anti-tumor (linfoma tardio).
• Quebra de vacinação é um termo que é utilizado para denominar casos em que
um vírus virulento acomete aves vacinadas:
– Com HVT ou SB1: v.MDVs ou vv.MDVs.
– Com HVT + Rispens: vv.+MDVs.
São fatores quer podem modificar a ocorrência de mortalidade por neurolinfomatose ou linfomas:
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Características do vírus:
• Virulência Susceptibilidade genética.
• Dose Tempo de desafio após vacinação [imunidade].
• Tipo de imunidade: HVT, SB1, Rispens.
Característica da ave:
• Sexo: (machos mais susceptíveis [linha genética?].
• Susceptibilidade genética.
• Imunidade passiva.
• Idade versus imunocompetencia.
Ambiente:
• Stress/corticosteróides.
• Taxa de desafio (biossegurança).
• Infecção concurrente: Anemia, criptosporidiose, Gumboro, Retrovírus (REV,
ALVs).
2.8
Epidemiologia
• Altamente contagioso e se dessemina por contato indireto ou ave a ave.
• Aves infectadas são portadoras, talvez para o resto da vida.
• Eliminação do vírus ocorre através das penas – células queratinizadas descamadas e permanece infectivo por meses ou anos e ainda fezes, secreção nasal.
• Larva e adultos do Alphitobius diaperinus e mosquitos.
• Cama reutilizada, piso de chão batido.
Pintos alojados em galpões comerciais geralmente se infectam tão precocemente
quanto 9 dias de idade, após o que, o vírus dissemina progressivamente, infectando
aproximadamente todas as aves num período de 8 semanas. Anticorpos adquiridos
pela infecção natural são detectados ao teste do AGP, de 6–7 semanas após infecção
e o número de aves positivas também aumenta: o tempo médio de ocorrência de
50% de infecção viral e 50% de resposta de anticorpos foi de 14 a 17 dias. Lesões
microscópicas sucedem a infecção viral.
Witter et al, 1970
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2.9
Multiplicação do vírus no hospedeiro
O vírus da doença de Marek, de acordo com o seu grau de patogenicidade ou
virulência, efetua infecções do tipo produtivo, abortivo, latente e não produtivo. Todo o
ciclo de infecção celular ocorre num período de 4 semanas pós infecção quanto mais
virulento for o vírus:
• Início da infecção: Inalação, e vírus infectam macrófagos e células linfóides
(B e T) efetuando infecção produtiva, abortiva, latente e não produtiva e
causando perda funcional das células T, B e de macrófagos.
• Células com vírus associado migram em um período de 2 semana para:
1. Folículo da pena – infecção produtiva eliminando vírus completos e
infectantes.
2. Invadem nervos periféricos e tecidos não linfóides produzindo inflamação.
3. Outros órgãos linfóides: Baço, Timo e Bolsa de Fabrícius produzindo
linfocitólise e/ou apoptose.
• Em 3 a 4 semanas pode ocorrer a linfomatose ou linfoma nas visceras e
músculos.
2.10
Patogenia
No campo, de modo geral, não se dá muita importância à patogenia da doença
de Marek, quando na verdade este é o ponto mais importante da doença e define
“perdas subclínicas´´ de grande significado prático. Na atualidade, com o advento do
uso de vacinas para o controle da enfermidade, e aumento de exigências no controle
sanitário, é importante considerar que, no curso da infecção pelo vírus virulento da
doença de Marek, ocorrem os seguintes fenômenos:
• Imunossupressão: no início (1 semana após contágio) o vírus diminui funções
das células mononucleares e macrófagos e destrói linfócitos B da bolsa de
Fabrícius.
• Encefalite: [“Paralisia transitória”] na ausência de imunidade humoral sólida,
o vírus após replicação na bolsa de Fabrícius, em particular os vírus do tipo
muito virulento, suplanta a barreira hematoencefálica e localiza-se no sistema
nervoso central causando edema vasogênico, afluxo perivascular de células
mononucleares e/ou linfóides, trombose e hemorragia.
• Paralisia dos nervos periféricos: ocorre replicação do vírus nas fibras nervosas
com desmielinização e afluxo de células mononucleares e/ou linfóides causando,
inicialmente, inflamação e/ou proliferação anormal de células linfóides (perda de
pernas, torcicolo, asa caída, etc) caracterizando o quadro de neurite periférica.
• Linfomas ou tumores: somente após ocorrer multiplicação viral no hospedeiro
e indução de resposta imune celular (afluxo de células T) é que ocorre a
proliferação neoplásica dos linfócitos T diferenciados. Nesta fase notamos
linfomas viscerais, cutâneos e ainda nos nervos periféricos.
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• Excreção viral: durante todo o curso da infecção pode ocorrer multiplicação viral
(citolítica) em vários tecidos, incluso folículo da pena, e eliminação de vírus
infectante. A principal forma de eliminação do vírus parece ocorrer através da
descamação da pele e penas.
2.11
Apresentação clínica
Quando uma ave é infectada por um vírus do tipo muito virulento da doença de
Marek (vv.MDV) temos um curso clínico em um plantel de aves que se caracteriza por:
• Paralisia transitória: ocorre 2 a 3 semanas após infecção e geralmente as
aves morrem devido à competição, dificuldade de acesso aos comedouros,
bebedouros e fome. As aves apresentam tremores de cabeça devido à
ocorrência de encefalite.
• Problema de pernas: ocorre 5 a 6 semanas após infecção e nota-se
comprometimento dos nervos periféricos (neurolinfomatose periférica).
• Caquexia, leucopenia progressiva e tumores cutâneos e/ou viscerais aparecem
após 7 a 10 semanas.
2.12 Limitação diagnóstica, diagnósticos diferenciais e exames
complementares
Os exames virológicos e sorológicos são muito limitados no que diz respeito à
aplicação prática, e em particular para o vírus da doença de Marek extremamente
limitado. De modo geral, provas diagnósticas são realizadas através de exame
histopatológico de órgãos com formações neoplásicas, baseada em uma chave
diagnóstica que compreende exame de bolsa de Fabrícius, nervos periféricos e
formações tumorais e encontro de transformação neoplásica de células linfóides. No
entanto, no que diz respeito ao diagnóstico da doença de Marek e diferenciação com
outras enfermidades, e ainda avaliação epidemiológica da dispersão do vírus, notamos
que existem muitas falhas e um certo nível de despreocupação. Podemos enumerar
os seguintes pontos críticos:
Diagnóstico:
• Amostragem e remessa de material adequado.
• Não existe prova sorológica: AGP pode ser útil mas não define tipo de vírus.
• PCR mais direcionado para análise de massas tumorais quando poderia ser
realizado com tecidos alvo.
• Histológico: fase de linfomatose confunde-se com reticuloendoteliose e leucose
mielóide.
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Epidemiologia:
• Não existe rotina de monitoria em particular da fase virêmica, que poderia ser
indicativo de coexistência de vírus patogênicos.
2.13
Avaliação da “temperatura” para Marek
Baseado em estudos experimentais realizados no períodos de 1990–1992 e
1998–1999 temos realizado e recomendado:
• Avaliação histológica da condição da bolsas de Fabrícius.
• Quantificação e análise histológica de casos de perda de pernas e/ou encefalites
precoces na recria.
• Análise de mortalidade em aves semi-adultas e adultas e colheita de material
para exame histopatológico.
• Incidência de irite e/ou cegueira branca em aves adultas e estudo histológico.
2.14
Conclusões preliminares sobre o aumento da incidência de
Marek ao final desta década
Antes de considerar que pode estar ocorrendo “seleção” de cepas do tipo muito
virulentas pelo uso de vacinas atenuadas do sorotipo 1, seria muito importante
ponderar alguns fatores tais como:
Cepas vacinais:
• Não vacinado com HVT: caso que pode ocorrer com frango de corte e poderia
estar associado com aumento do desafio natural.
• Poedeiras e reprodutoras não vacinadas com cepa do sorotipo 1: pode se
aventar “quebra de vacinação” propiciado pelo alojamento de idade/linhagem
múltipla e aumento de criações locais, tráfego de aves, etc.
Lotes vacinados:
• HVT em frangos de corte: vários fatores podem estar contribuindo com aumento,
a médio/longo prazo, da contaminação pelo vírus virulento da doença da Marek:
– Subdosagem excessiva da vacina/ imunidade adquirida marginal.
– Exposição prematura antes da implantação da imunidade devido reutilização de cama, idade múltipla, higiene e desinfecção, desinsetização, aves
caipiras ou outro tipo de ave, etc.
– Erro da vacinação.
– Resposta imune comprometida devido à preexistência de fator imunossupressivo (leucose linfóide, micotoxinas, Gumboro, etc).
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– Associação com anemia infecciosa.
– Reticuloendoteliose (?).
– Vacina forte de Gumboro x vacinação.
Poedeiras e reprodutoras com HVT + Rispens: Idem anterior, sendo importante
considerar, para o futuro, o papel de resistência para Marek obtida através da seleção
genética das aves.
Vacinas do futuro:?? Nada poderá conter o vírus virulento da doença de Marek se
não houver uma conscientização sobre boas práticas de biossegurança.
2.15
Impacto da doença de Marek sobre a incidência de leucose
linfóide
• MDV – sorotipo 2 aumenta Leucose linfóide em algumas linhagens de aves
[desrepressão de oncogene??]
• Imunossupressão MDVs virulentos.
3
Bronquite infecciosa das galinhas
3.1 Introdução
3.2 Etiologia
A bronquite infecciosa das galinhas é induzida por um Coronavírus, que possue
90–200 nm de diâmetro e projeções de 20 nm em sua superfície. O vírus é composto
de RNA e contém três proteínas virais específicas.
“S” ou E2 : presente nas projeções e com 2 frações, S1 e S2. A fração
S1 é responsável pela indução de anticorpos inibidores da hemaglutinação e
soroneutralização.
M ou E1 : glicoproteínas da matriz.
N: nucleoproteínas internas.
Definição: a bronquite infecciosa das galinhas é uma doença respiratória aguda,
altamente contagiosa que pode induzir quadros clínicos dos mais variados em aves
não vacinadas, conforme a idade das aves e o tipo de vírus.
3.3 Idade das aves
• Pintos: comprometimento respiratório severo com exsudato caseoso na traquéia,
brônquios e bronquíolos, mais severo em machos. Podem eliminar fezes mais
fluídas e apresentar retardo do crescimento.
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• 3–4 sem: assintomático com possibilidade de ocorrência de distúrbio renal, mais
evidentes de 35 a 70 dias de idade, e principalmente machos de corte. Pode ser
causa de nefropatia crônica em galinhas de reposição.
• Produção: queda de produção e, comprometimento não reversível e mais
grave do oviduto em galinhas em início de produção do que em aves mais
velhas. Perda da qualidade da casca, nefropatia crônica e falsas poedeiras como
consequência da infecção em fase de maturidade sexual.
3.4
Classificação do vírus
São inúmeros os tipos de vírus da bronquite infecciosa das galinhas (VBIG)
e inúmeras tentativas têm sido efetuadas no sentido de agrupar as amostras em
sorotipos (provas de soroneutralização e inibição da hemaglutinação) ou em grupos
antigênicos, (RNA–polimerase, fingerprint, etc); no entanto, não tem sido possível
estabelecer uma diferenciação ou classificação exata das inúmeras isolados de
campo. A classificação baseada em diferenças de virulência e tropismo dos vírus
da bronquite infecciosa das galinhas, seria o mais adequado para fins de análise
epidemiológica dos surtos naturais, no entanto, este critério não tem sido devidamente
explorado para classificar os diferentes vírus de campo. Segundo a literatura, pode-se
estabelecer diferenças de patogenicidade e virulência entre protótipos conhecidos de
vírus para os diferentes sistemas de cultivo IN VITRO, como de invasibilidade IN
VIVO para sistema respiratório, digestivo, reprodutor e urinário. Cabe lembrar, que
a despeito da variação do tropismo ou disseminação para outros órgãos ou tecidos,
todas as amostras do VBIG se multiplicam na traquéia.
Tipos de Vírus
Amostra
Beaudette
66579
Sinonímia
M42ATC
VR22ATC
Massachussetts M–41
82828
IBV–41
VR21ATC
Connecticut
A5968
IBV–46
VR817ATC
Amostras
nefrotrópicas
Holland
Holte e Gray
Amostra T
Característica
Rápida mortalidade embrionária (<48 horas).
Apatogênico para aves.
Reação homóloga do anticorpo só com vírus
do tipo Massachussetts.
Patogenicidade reversível.
Altamente patogênico para sistema respiratório e sistema reprodutor e raramente produz nefrite.
Pouco patogênico para o sistema respiratório.
Patogenicidade desconhecida para sistema
reprodutor e urinário.
H52 é patogênica para trato respiratório, reprodutor, urinário e afeta a bolsa de Fabrícius,
enquanto H120 é mais atenuado não lesando
rim.
Mais patogênica que Holland.
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Arkansas
A-99
Variante antigênica com patogenicidade para
trato respiratório e reprodutor, mas não causando nefrite.
Legenda: ATC – American Type Culture.
Nos últimos anos tem se descrito isolamento de cepas com tropismo ou
patogenicidade diferenciada.
• Amostra 793/98: Miopatia peitoral.
• Amostra G – enterotrópica: com persistência no esôfago, proventrículo, duodeno
e bolsa de Fabrícius.
• Atualidades: Com o uso de vacinas vivas do tipo H120 contra a bronquite
infecciosa das galinhas, a partir de sua legalização no fim da década de 1970;
da introdução da vacina oleosa em meados da década de 1980, e finalmente
com a introdução de cepas vacinais do tipo H52 e MA5 nos últimos anos, tem se
notado uma modificação da manifestação clínica e sorológica. Esta modificação
pode ser atribuída a inúmeros fatores quais sejam:
• Taxa de proteção conferida pela imunidade adquirida através da vacinação, e
persistência da imunidade.
• Modificação da persistência e/ou reciclagem de vírus vacinais mais virulentos.
• Aparecimento de novas amostras.
• Programa de vacinação.
• Fatores intercorrentes e/ou coincidência com outros patógenos.
Desta forma, hoje podemos concluir que a infecção, a resposta imune, a
intensidade dos sinais clínicos e consequências da infecção do VBIG podem variar
conforme a idade, virulência da amostra e condição imunitária da ave. Por outro lado,
é importante lembrar que as infecções intercorrentes ou coincidentes podem modificar
totalmente a expressão do quadro anátomo clínico, como sorológico da infecção.
4
Sintomas, sinais e lesões
Existem evidências de que o tropismo tissular do vírus pode ser dependente de
características do vírus, vias de infecção e fatores concorrentes:
• Quadro respiratório: espirros, roncado, dificuldade respiratória e descarga nasal
e eventualmente conjuntivite são vistos com maior frequência em frangos de
corte. Infecções puras com VBIG em galinha de postura e reprodutoras pesadas
geralmente não induzem sintomas respiratórios em aves em fase de recria e
produção, no entanto, fatores intercorrentes ou associação com outros agentes
podem tornar aparentes os sinais respiratórios supracitados. Estes mesmos
fatores podem agravar o quadro em frangos de corte.
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• Fatores intercorrentes que induzem quebra de resistência local: frio, stress
calórico, uso de subproduto de origem animal, pneumopatias neo ou post-natais,
ambiência, etc.
• Associação com outros agentes infecçiosos: Mycoplasma gallisepticum, Mycoplasma synoviae, , Haemophyllus sp, anemia das aves, doença de Gumboro,
Pneumovírus, etc.
As lesões macroscópicas se restringem a ocorrência de aumento de secreção
mucóide a nível de seios nasais, conjuntiva e traquéia, e, invariavelmente congestão
e/ou hiperemia, quando o quadro não está complicado. Ao exame microscópico,
nota-se a nível de traquéia e brônquios, necrose epitelial associada a intenso afluxo
de células inflamatórias com predomínio de células mononucleares e, particularmente
nos bronquíolos terminais; acúmulo de exsudato inflamatório no lúmen.
4.1
Nefropatia
VBIG nefropáticos geralmente induzem depressão, penas arrepiadas, fezes
aquosas e aumento do consumo de água após o término da fase respiratória. Empastamento de cloaca e/ou diurese são observados em alguns casos e comumente aves
assintomáticas apresentam somente lesões microscópicas no rim, caracterizadas por
necrobiose tubular e hiperplasia linfóide. Cepas mais patogênicas podem induzir
nefrite nefrose. Como no caso de comprometimento do trato respiratório temos fatores
que agravam o quadro e/ou modificam a manifestação clínica.
• Micotoxinas principalmente ocratoxina.
• Doença de Gumboro.
• Chicken Anemia.
• Nefropatias pré-existentes.
• Cálcio
• Intoxicações ou sobrecargas por sulfa/ olaquindox.
• Desequilíbrio ácido/ básico, etc.
Sistema reprodutor: queda de produção, perda de qualidade da albumina,
alteração da qualidade e cor da casca podem coincidir com encontro de lesão
na traquéia ou de rim, como pode ocorrer na sua ausência, na dependência do
tipo de vírus e status imunitário da ave. De modo geral, não são notados lesões
macroscópicas no oviduto, exceto discreto encurtamento do oviduto. No entanto, cabe
lembrar que a severidade das lesões macroscópicas e microscópicas podem variar na
dependência de:
• Patogenicidade da amostra.
• Idade de infecção e tempo pós infecção.
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• Associação, principalmente E.coli.
Hipotrofia permanente do oviduto, induzindo redução da qualidade do ovo ou
produtividade da ave pode ser induzido por infecções muito precoces (e.g. primeira
semana de vida) ou na fase de pré-postura. É importante lembrar que nefropatias
crônicas ou mesmo problemas digestivos induzido pelo VBIG de tropismo diferenciado,
podem comprometer a qualidade da casca devido comprometimento do metabolismo
do Ca/P e minerais essenciais.
Sistema digestivo: amostras de VBIG com enterotropismo acentuado podem estar
associadas com gastroenteropatias, diarréias, diurese e injúria epitelial na bolsa de
Fabrícius. Infecções com 1 dia de idade ou muito precoces podem induzir também
depressão do consumo e ganho de peso. McFerran (1971) descreveu a ocorrência
de comprometimento da cicatrização do umbigo, distensão abdominal e edema
subcutâneo em pintos de um dia de idade infectados com VBIG.
5
Vacinação modificando expressão clínica da bronquite infecciosa das galinhas
A manifestação clínica e gravidade da bronquite infecciosa das galinhas, a
presença de lotes doentes dentro de uma mesma granja e o número de aves doentes
dentro de um lote, podem estar sendo modificados pelo uso de vacina e eficácia
dos programas de vacinação. Fatores que podem estar ocorrendo a nível de campo
relativo à vacinação:
• Cobertura para cepas virulentas ou variantes (identidade sorológica).
• Imunogenicidade da vacina (valência).
• Duração da proteção.
• Uso de cepas vacinais mais invasivas/ reciclagem.
• Desuniformidade da resposta imune (cepas vivas e vacinas oleosas).
• Perda de imunidade humoral para a progênie ou ovo.
De uma outra forma, além da vacinação, devemos considerar alguns aspectos
importantes relativos a resposta imune do hospedeiro e relação com o vírus
desafiante, tais como:
• Efeito protetor da imunidade humoral e secretória na porta de entrada com a
imunidade celular sendo mais eficiente no controle da disseminação do vírus
para outros tecidos.
• Taxa de proteção depende do equilíbrio entre a imunidade humoral e celular e
pode ser modificado por fatores imunodepressores, como pela taxa de perda de
anticorpos via ovo.
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2 o Simpósio Técnico sobre Matrizes de Frangos de Corte
13 a 15 de outubro de 1999 — Chapecó, SC, Brasil
• Persistência do vírus pode ocorrer na presença de imunidade humoral, e.g.
imunidade passiva não interfere com resposta imune induzida pela vacinação
com 1 dia de idade. Uma ave infectada com VBIG, mesmo com imunidade
humoral pode apresentar vírus no seu organismo, e continuar eliminando vírus
no meio ambiente e portanto favorecendo disseminação ambiental. Sabe-se
que uma ave com infecção natural pode apresentar e eliminar vírus por tempo
bastante prolongado.
– Tecido respiratório: no máximo 49 dias.
– Oviduto e ovos – até 51 dias.
– Fezes: até 20 semanas.
5.1 Diagnóstico
Com base nos inúmeros fatores discutidos, o diagnóstico laboratorial da bronquite
infecciosa das galinhas tornou-se mais complexo, sendo necessário, para fins
conclusivos analisar criteriosamente:
• Efeitos clínicos, com ênfase análise de lesões microscópicas para avaliação da
taxa de proteção e invasão para outros tecidos.
• Isolamento do vírus, sendo necessário diferenciar cepas vacinais.
• Fatores ou doenças intercorrentes, principalmente Mycoplasma sp.
• Resposta sorológica e variações dentro da granja conforme idade e programa de
vacinação.
• Tipo de exame sorológico e interpretação.
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Conclusão
Ainda não temos um consenso para indicação de um método profilático ou
preventivo eficiente para conter a bronquite infecciosa das galinhas. A vacinação
tem sido um método eficaz para reduzir perdas causadas pela doença, mas não
tem sido totalmente eficiente para erradicar o problema. Não existe biossegurança
ou quarentenário que possa conter a disseminação horizontal do vírus da bronquite
infecciosa das galinhas. A desinfecção pode ser um método auxiliar na redução da
contaminação ambiental e transmissão horizontal.
Finalmente, o que pode trazer algum benefício é conhecer melhor a etiopatogenia
da doença e o papel da imunoprofilaxia ou imunoprevenção; que por sinal são muito
pouco estudados. Devemos reavaliar os programas de vacinação, dar ênfase à
imunidade celular e secretória (IgA) para impedir a disseminação e persistência do
vírus no organismo da ave. É preciso entender que o Coronavírus ou o vírus da
bronquite infecciosa é um vírus que estabelece uma “relação inteligente” hospedeiro
parasita e que está na natureza para sobreviver, portanto, não mata o hospedeiro,
convive com ele na medida do possível harmoniozamente. Se o hospedeiro não tem
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resistência própria ou se não damos condição adequada a ele (nutrição, instalação,
manejo, doenças intercorrentes) o vírus estupidamente mata o hospedeiro (nefrite
nefrose) ou então favorece a ocorrência de distúrbios metabólicos.
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