JOURNAL OF APPLIED PHYSICS BRAZIL VOLUME 88, NUMBER 14 &DUJDH'HVFDUJDGH&DSDFLWRUHVQXP&LUFXLWR5&HP6pULH 22 NOVEMBER 2002 5RGULJR+MRUW 'HSDUWDPHQWRGH)tVLFD8QLYHUVLGDGH)HGHUDOGR3DUDQi &XULWLED35%UDVLO Determinamos a constante de tempo capacitiva de um circuito RC em série monitorando as tensões em seus elementos durante os processos de carga e descarga do capacitor. Com isso descobrimos a capacitância do capacitor. Dependendo da ordem de grandeza da constante de tempo, utilizamos métodos distintos: cronômetro e fonte de corrente contínua ou osciloscópio e gerador de ondas quadradas. As associações de capacitores em série e em paralelo exibem capacitâncias equivalentes que concordam com as equações previstas. ,,1752'8d­2 %&$5*$'(80&$3$&,725 O primeiro capacitor operativo, conhecido como garrafa de Leyden, foi construído por experimentadores no século XVIII, na Holanda1. Desde então, com o avanço da tecnologia, muitas aplicações foram atribuídas ao capacitor. Entre elas destacam-se o funcionamento de máquinas fotográficas e o ajuste fino nos circuitos de sintonia de aparelhos de rádio, televisão e telefones celulares. Neste experimento verificamos a relação entre os fenômenos de carga e descarga de capacitores num circuito RC, assim como o comportamento da carga e corrente em função do tempo. Através de ajustamentos gráficos encontramos a constante de tempo característica do circuito RC, e com esta a capacitância do capacitor. Associando vários capacitores analisamos a capacitância equivalente quando em série e em paralelo. Ao final são feitas comparações entre teoria e experimento. A Fig. 2 ilustra o circuito de carga. A chave 6 inicialmente está aberta e o capacitor descarregado. A chave é então fechada e a carga começa a passar pelo resistor e se acumular na placa positiva do capacitor. ,,)81'$0(17$d­27(Ï5,&$ , =+ $&$3$&,725(&$3$&,7Æ1&,$ O capacitor, um dispositivo utilizado para armazenar carga, e também energia, é constituído por dois condutores muito próximos um do outro, com um isolante entre eles (Fig. 1). A razão entre a carga 4 e o potencial 9 de um condutor isolado é a capacitância &. Esta é a medida da capacidade de o Fig. 1. Capacitor eletrolítico condutor armazenar carga para uma dada diferença de potencial. No capacitor, a capacitância depende do tamanho, da forma e da disposição geométrica dos condutores e também do material isolante entre estes. a) Endereço eletrônico do autor para contato: [email protected] Fig. 2. Diagrama do circuito para carregar o capacitor. Pela regra das malhas de Kirchhoff1: e - ,5 - 4 =0 & (2.1) Pela definição de corrente elétrica: G4 GW (2.2) e, substituindo em (2.1), temos1,2: e =5 G4 4 + GW & (2.3) Esta é uma equação diferencial ordinária de primeira ordem, cuja solução é dada por2-4: 4(W ) = &e (1 - H / ) = 4 (1 - H / ) (2.4) onde 4 é a carga final atingida e t 5& é a constante de tempo capacitiva do circuito. Utilizando (2.2), derivando esta equação, temos a corrente no tempo: , (W ) = e H 5 / = , 0H / (2.5) onde , é a corrente no início do processo e t a constante de tempo do circuito. 8715 J. Appl. Phys. Brazil, Vol. 88, No. 14, 22 November 2002 Os gráficos da Fig. 3 e Fig. 4 ilustram a carga e corrente em função do tempo no circuito. Fig. 3. Gráfico da carga no capacitor contra o tempo. Após um intervalo de tempo t 5&, 4 4 H 4 , isto é, a carga no capacitor está a 63% da carga final, &e. Esta é uma maneira de descobrir o valor da constante t. Se a taxa de carregamento fosse constante, em W t a carga estaria completa. O valor da carga tende assintoticamente a 4 &e. R. Hjort &'(6&$5*$'(80&$3$&,725 Seja um capacitor carregado com carga 4 no circuito da Fig. 5. A chave S está inicialmente aberta e a diferença de potencial no capacitor é 9 4 &, sendo & sua capacitância. Como não existe fonte, este é um sistema não conservativo, onde a energia é transformada em calor no resistor 5 pelo efeito Joule. Como, neste caso, a carga se reduz, a Fig. 5. Diagrama do circuito para a corrente mede uma taxa descarga do capacitor. de diminuição. Assim: , =- G4 GW (2.8) Aplicando a regra das malhas ao circuito e substituindo (2.8), temos1,2: 4 G4 +5 =0 & GW (2.9) Esta é uma equação diferencial de primeira ordem e pode ser resolvida por separação de variáveis2-4. Assim: Fig. 4. Gráfico da corrente contra o tempo no circuito. A corrente tem valor inicial , e5 e diminui exponencialmente com o tempo. Esta corrente inicial é aquela que existiria se no circuito houvesse apenas a resistência. Tomando a tensão somente no resistor: 9 = 5, = eH / (2.6) e efetuando o logaritmo natural da equação, temos: ln 9 = ln e - 1 W 5& (2.7) Assim, podemos representar outro gráfico, onde, através da reta \ D[E, obtemos o coeficiente angular, D 5&, e o linear, E OQe. Esta é outra forma de determinar t de um circuito RC. × ( ) 0 1 1 G4 = GW 4 5& ×0 4(W ) = 40 H = 40 H (2.10) (2.11) onde 4 é a carga inicial no capacitor e t 5& a constante de tempo do circuito. Se aplicarmos (2.8) nesta equação, temos a corrente: 9 " , (W ) = 0 H 5 ! = ,0H " (2.12) onde 4 & 9 (pela definição de capacitância) e 9 5 , (pela lei de Ohm). 8716 J. Appl. Phys. Brazil, Vol. 88, No. 14, 22 November 2002 A Fig. 5 mostra como varia a carga no capacitor em função do tempo. Após um intervalo de tempo W t, a carga é 4 4 H 4 , isto é, está a 37% do valor inicial. R. Hjort corrente contínua de tensão e 9. Em paralelo com os terminais do resistor e do capacitor foram instalados voltímetros para monitorar as tensões (9) e 9* , respectivamente). Tendo o capacitor inicialmente descarregado, fechou-se a chave S. Assim foi gerada a tabela 1 (carga). + ,.- +0/ + 3,00 2,59 2,25 1,96 1,72 1,48 1,32 1,14 1,00 0,88 0,77 0,68 0,60 0,53 0,47 0,41 0,35 0,33 0,29 0,26 0,23 0,21 0,19 0,17 0,15 0,14 0,12 0,11 10- Fig. 5. Gráfico da carga no capacitor contra o tempo. O gráfico da corrente pelo tempo (Fig. 6) é semelhante ao da carga. Após intervalo de tempo t 5&, a corrente cai a H do seu valor inicial. +0/ 0,00 0,49 0,81 1,12 1,37 1,59 1,76 1,94 2,08 2,22 2,31 2,42 2,49 2,57 2,63 2,68 2,73 2,77 2,81 2,84 2,87 2,89 2,92 2,93 2,95 2,98 2,99 3,00 2 / -3 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120 130 140 150 160 170 180 190 200 210 220 230 240 250 260 270 Tabela 1. Carga de um capacitor. Fig. 6. Gráfico da corrente no capacitor contra o tempo. Em seguida, com o capacitor carregado, o circuito é modificado para o da Fig. 5, da seção II.C (descarga), abrindo a chave S e retirando a fonte. A chave é então novamente fechada e os dados do processo da descarga monitorados, gerando a tabela 2. + A tensão no capacitor é dada por: 4 & 9% = 0 H & $ # (2.13) e o respectivo logaritmo neperiano: ln 9 ' = ln 40 1 W & 5& (2.14) Representando o gráfico de OQ9( versus W, temos uma reta da forma \ D[E cujo coeficiente angular é D 5& e linear E OQ4 &. A constante t 5& pode também ser determinada desta forma. ,,,352&(',0(172(;3(5,0(17$/ $&521Ð0(752()217(&& A montagem experimental é feita conforme a Fig. 2 da seção II.B (carga). Foram utilizados: capacitor de & ), resistor de 5 W e fonte de ,.- +0/ -3,00 -2,50 -2,22 -1,92 -1,69 -1,47 -1,30 -1,13 -1,00 -0,88 -0,77 -0,68 -0,60 -0,53 -0,47 -0,42 -0,37 -0,33 -0,29 -0,25 -0,23 -0,20 -0,18 -0,16 -0,14 -0,13 -0,11 -0,10 + 10- +0/ 3,00 2,58 2,24 1,95 1,70 1,50 1,32 1,16 1,01 0,90 0,79 0,70 0,61 0,54 0,48 0,43 0,38 0,33 0,30 0,26 0,23 0,21 0,19 0,17 0,15 0,13 0,12 0,11 2 -3 / 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120 130 140 150 160 170 180 190 200 210 220 230 240 250 260 270 Tabela 2. Descarga de um capacitor. 8717 J. Appl. Phys. Brazil, Vol. 88, No. 14, 22 November 2002 %26&,/26&Ï3,2(*(5$'25'(6,1$,6 Para circuitos cujo t 5& não seja elevado, o procedimento anterior não permite visualizar o fenômeno, uma vez que estes podem durar apenas alguns milissegundos. Para tal se faz necessária a utilização de um osciloscópio e um gerador de funções. É montado o circuito da Fig. 7, com o osciloscópio monitorando a tensão do resistor 5 e do capacitor &, com o gerador criando ondas quadradas de 131 Hz de freqüência, com tensão de 13,0 V. Fig. 7. Diagrama do circuito, com osciloscópio monitorando tensões no resistor (canal 1) e no capacitor (canal 2). Foram ajustadas as escalas vertical e horizontal do osciloscópio tal que somente a parte correspondente à carga no capacitor aparecesse no monitor. Assim, a partir do gráfico da tensão no capacitor visualizado no osciloscópio (Fig. 8), mediu-se, através dos cursores, o tempo para atingir 63% da carga total do capacitor. Nesta situação específica, o tempo DW corresponde à constante de tempo t 5& do circuito. Fig. 8. Tensão sobre o capacitor durante a carga. Também poderia ser utilizado o gráfico da tensão no resistor (Fig. 9) quando este atinge 37% da tensão máxima. R. Hjort Com estes dados, e considerando &=0,1mF, foi gerada a tabela 3. Os valores de 5 foram obtidos com o ohmímetro. 465 798;: 4=<?> @BADCE FBGH5 IKJL: MN>OP@BQRE QSGH5 IKJL: 1,00 4,90 9,78 100 490 978 108 499 992 Tabela 3. Medida da constante de tempo do circuito. Utilizando esta mesma montagem, foram associados capacitores em série e em paralelo e, através da constante de tempo, determinadas as capacitâncias equivalentes. Considerando dois capacitores com &=0,1mF, e um resistor com 5=1kW, foi gerada a tabela 4. T JUJUGDFE VDWBXDG MN>OP@BQRE QSG 5 IKJL: série paralelo 52,60 211,00 < OP@BQRE QSG [ \: YZ 5R 52,6 211,0 < > @BADCE FBG [ \: YZ 5R 50,0 200,0 Tabela 4. Associações de capacitores. ,95(68/7$'26(;3(5,0(17$,6 Com os dados obtidos na tabela 1, foram feitos os gráficos de 9] [W e 9^ [W (Fig. 10). Nota-se que a regra de Kirchhoff é obedecida, e 9] 9^ em todos os instantes. Fig. 10. Circuito de carga: tensão no resistor (preto) e tensão no capacitor (vermelho) contra o tempo. Utilizando a equação (2.7), foi gerado o gráfico linearizado (Fig. 11). Fig. 9. Tensão sobre o resistor durante a carga. Fig. 11. Gráfico linearizado da carga com reta ajustada. 8718 J. Appl. Phys. Brazil, Vol. 88, No. 14, 22 November 2002 R. Hjort A reta ajustada tem coeficiente angular D=-0,0122 e linear E=1,0035. Logo, o valor da capacitância, por este método, era de &=1,0928F. Com a tabela 2 foram feitos os gráficos de 9] [W e 9^ [W (Fig. 12). Observa-se que, apesar de 9] ser negativo, 9] 9^ em todas as linhas, o que também comprova a regra das malhas. linearizados da carga e descarga, respectivamente, foram 1,0928F e 1,0875F. O valor nominal do capacitor era de 1,0F. Alguns fatores que contribuíram para possíveis erros experimentais foram a precisão dos instrumentos de medida (cronômetro e multímetros) e o fato de os valores terem sido coletados manualmente. Foi utilizado somente um fundo de escala nos voltímetros (20V), caso contrário, a resistência interna destes seria alterada e com esta as medidas das tensões. No segundo procedimento experimental, para cada configuração de R e C, era preciso ajustar os valores da amplitude e freqüência no gerador de funções para a devida visualização do gráfico no osciloscópio. Circuitos com capacitâncias muito pequenas (da ordem de 10-9 F) acentuavam os erros experimentais. Isso porque estas sofriam interferência de outros elementos do circuito, como os fios, que também possuem pequena capacitância. Observa-se, pela tabela 3, que é pequena a diferença entre os valores teóricos e experimentais para o valor de t. A capacitância equivalente na associação de capacitores em série e em paralelo, exibida na tabela 4, segue o modelo teórico: Fig. 12. Circuito de descarga: tensão no resistor (preto) e tensão no capacitor (vermelho) contra o tempo. Utilizando a equação (2.14), foi gerado o gráfico linearizado (Fig. 13). Através do ajuste da reta, os coeficientes angular e linear encontrados foram, respectivamente, D=-0,0123 e E=1,0175. Logo, o valor da capacitância, pelo gráfico, era de &=1,0875F. & _ = &1 + & 2 1 1 1 = + &` &1 & 2 No osciloscópio, recurso de armazenamento gráfico de 9^ [W (Fig. 14) capacitor no circuito, equivalentes distintas. (paralelo) (série) foi comparado, com o de sinais (DXWRVWRUH), o da carga e descarga do utilizando capacitâncias Fig. 13. Gráfico linearizado da descarga com reta ajustada. 9680È5,2 Os fenômenos de carga e descarga de capacitores seguem equações exponenciais, de acordo com o modelo previsto. Este tipo de comportamento é encontrado também em inúmeras outras áreas de estudo3,4, tendo como algumas aplicações: resfriamento de um corpo, crescimento populacional, decaimento radioativo e espalhamento de uma epidemia. A regra das malhas de Kirchhoff é comprovada em todas as montagens experimentais, isto é, a soma dos potenciais nos elementos de um circuito é sempre nula. O valor da constante de tempo t de um circuito RC pode ser encontrado experimentalmente utilizando-se métodos distintos, dependendo da ordem de grandeza desta. No primeiro método, os valores para a capacitância, adquiridos a partir dos gráficos Fig. 14. Comparação do gráfico variando-se a capacitância. Pelo gráfico, nota-se que a amplitude e a freqüência mantém-se constantes, somente a acentuação da concavidade é alterada. Isso é devido à variação das constantes de tempo. 9,5()(5Ç1&,$6 P. Tipler, )tVLFD (LTC, 4ª edição). E. Kreyszig, 0DWHPiWLFD6XSHULRU (LTC, 1983). 3 C. C. Ross, 'LIIHUHQWLDO(TXDWLRQV (Springer-Verlag, 1995). 4 W. Boyce e R. DiPrima, (TXDo}HV'LIHUHQFLDLV (OHPHQWDUHVH3UREOHPDVGH9DORUHV&RQWRUQR (LTC, 5ª ed). 1 2