Tuberculose - Revista Panamericana de Infectología

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Rev Panam Infectol 2015;17(2):83-89
ARTIGO ORIGINAL /ARTÍCULO ORIGINAL
Tuberculose: formas clínicas e características
epidemiológicas da população internada nos sanatórios
de Campos do Jordão
Tuberculosis: clinical forms and epidemiological characteristics of the population admitted in
sanatoria of Campos do Jordão
Aline Cortat Coca1
Marisa Marins1
Raquel Franchin Ferraz2
Fernando Augusto Alves da Costa3
Rev Panam Infectol. 2015;17(2):83-89
ISSN 1679-7140
ISSN 1807-3352 on line
http: www.revistaapi.com
Recebido em 15/10/2015
Aprovado em 2/12/2015
Os autores declaram não haver conflito
de interesses.
Acadêmicos do 12º semestre do Curso de Medicina da Universidade
Anhembi Morumbi- São Paulo, SP, Brasil.
2
Mestre em Ciências da Saúde pela UNIFESP-EPM, São Paulo, SP,
Brasil.
3
Médico cardiologista, Diretor da Clínica Paulista de Doenças
Cardiovasculares, doutor em Ciências da Saúde pela Universidade
de São Paulo, USP, São Paulo, SP, Brasil.
1
RESUMO
A tuberculose é uma doença infecciosa de evolução crônica, que
compromete principalmente os pulmões. A Organização Mundial
da Saúde estima que até o ano de 2020, um bilhão de pessoas sejam
infectadas, 200 milhões adoeçam e 35 milhões possam morrer,
com mais de oito milhões de casos novos a três milhões de mortes
decorrentes da doença por ano. Objetivo: o objetivo deste estudo
foi identificar a taxa de falência do esquema I de tratamento da
tuberculose e os fatores contribuintes. Método: foram analisados
os prontuários de 50 pacientes do sexo masculino hospitalizados
por recidiva de tuberculose, que representou uma parcela de
19,45% das 257 internações no período de dois anos anteriores
à coleta de dados. A maioria eram moradores de rua e as queixas
mais frequentes foram tosse produtiva , dispneia, perda de peso
e febre, com associação de ao menos entre duas delas. Todos
realizaram ao menos um tratamento e somente oito completaram
ao menos um tratamento. Resultados: foram coletados prontuários
de 50 pacientes do sexo masculino hospitalizados por recidiva de
tuberculose com idade média de 42,36 (+ 12) anos. Esse valor
representa uma parcela de 19,45% das 257 internações ocorridas
no período de janeiro de 2013 a janeiro de 2015. Os pacientes
com tuberculose multirresistente (10 casos) representaram 3,9%
das internações do período. Conclusão: a tuberculose continua
sendo uma doença presente e frequente em nosso meio, estando
relacionada à falta de aderência ao esquema terapêutico,
atingindo principalmente aqueles com baixa renda, ainda traz
exposição de pessoas saudáveis pela facilidade na transmissão. O
modo de vida em comunidades tipo albergues, alojamentos com
compartilhamento de sanitários, bebedouros e camas, constitui
fator de risco para disseminação da doença.
Palavras Chave: Tuberculose; Recidiva; Tuberculose
multirresistente a múltiplos medicamentos
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Coca AC et al. • Tuberculose: formas clínicas e características epidemiológicas da população internada nos sanatórios de Campos do Jordão
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ABSTRACT
Tuberculosis is an infectious disease of chronic
disease, which mainly affects the lungs. The World
Health Organization estimates that by the year
2020, one billion people are infected, 200 million
and 35 million get sick you may die, with more
than eight million new cases and three million
deaths from the disease annually. Objective:
the study aimed to identify the I scheme failure
rate of tuberculosis treatment and contributing
factors. Method: the medical records of 50 male
patients hospitalized for relapse of tuberculosis
were analyzed, representing a share of 19.45%
of the 257 admissions within 2 years prior to
data collection, most were homeless, the most
frequent complaints They were productive cough,
dyspnea, weight loss and fever, with association
of at least two of them. All patients underwent at
least one treatment and only 8 completed at least
one treatment. Conclusion: thus, it is concluded
that tuberculosis remains a present and frequent
disease in our country, related to lack of adherence
to the treatment regimen, affecting mainly those
with low income, also brings exposure of healthy
people for ease of transmission. The way of life
in communities like hostels, toilets Sharing
accommodation, drinking fountains and beds, is a
risk factor for spread of the disease.
Key words: Tuberculosis, Recurrence; Tuberculosis
multidrug-resistant
INTRODUÇÃO
A tuberculose é uma doença infecciosa de evolução
crônica, que compromete principalmente os
pulmões, sendo o agente etiológico o Mycobacterium
tuberculosis. A Organização Mundial da Saúde estima
que até o ano de 2020, um bilhão de pessoas sejam
infectadas, 200 milhões adoeçam e 35 milhões
venham a óbitor, com mais de oito milhões de casos
novos a três milhões de mortes decorrentes da doença
por ano.
Diferentemente do que se imaginou nas décadas
de 1960 e 1970, de que com a conquista de uma
potente quimioterapia a doença tenderia a um efetivo
controle, a tuberculose recrudesceu em todo o mundo.
Este recrudescimento foi facilitado por suas relações
com a pandemia do HIV, pela ampliação da miséria
das populações desfavorecidas em contraste com
o aumento da longevidade nas mais desenvolvidas
– todos rebaixadores da imunidade; contribuem
também para isso os movimentos migratórios, a
progressiva diminuição dos investimentos no setor
84
de saúde e a deterioração dos serviços de assistência
pública.
Nos dias atuais, a tuberculose permanece
como a maior causa de morbidade e mortalidade
entre as doenças infectocontagiosas no mundo. A
identificação da gravidade da situação no cenário
internacional levou a Organização Mundial de Saúde
(OMS), em março de 1993, declarar a tuberculose
como emergência global. A diferença entre as diversas
regiões do mundo são aberrantes. Enquanto 21% dos
infectados (382.000.000) são contabilizados nos
países avançados, 79% (1.328.000.000) o são nos
em desenvolvimento e pobres(1).
Segundo dados divulgados pela Organização
Mundial da Saúde (OMS), em 2010 foram
diagnosticados e notificados 6,2 milhões de casos de
tuberculose no mundo, sendo 5,4 milhões de casos
novos, equivalentes a 65% dos casos estimados para
o mesmo ano. A Índia e a China representam 40% dos
casos notificados e o Brasil está entre os 22 países que
concentram 82% dos casos de tuberculose no mundo.
A tuberculose tem relação direta com a miséria e
com a exclusão social. No Brasil, ela é uma doença
que afeta, principalmente, as periferias urbanas
ou aglomerados urbanos denominados de favelas
e, geralmente, está associada às más condições de
moradia e de alimentação, à falta de saneamento
básico, ao abuso de álcool, tabaco e de outras drogas.
A incidência da doença é maior entre os presos do
que entre a população em geral devido a facilidade
da transmissão, que ocorre por meio de partículas
de secreção pulmonar desidratada constituída
por bacilos. Em 2010, a população privada de
liberdade representou 0,2% da população do país,
porém contribuiu com 6,0% dos casos novos de
tuberculose notificados no SINAN naquele ano. As
penitenciárias facilitam a ocorrência e transmissão
da tuberculose(1-2).
O diagnóstico de tuberculose, além da avaliação
clínica, deverá estar fundamentado nos métodos:
bacteriológico, cultura, exame radiológico, prova
tuberculínica, histopatológico.
A baciloscopia direta do escarro é o método
fundamental porque permite descobrir as fontes
mais importantes de infecção (os casos bacilíferos).
Recomenda-se para o diagnóstico da tuberculose a
coleta de duas amostras de escarro: uma, por ocasião
da primeira consulta, e outra independentemente do
resultado da primeira, na manhã do dia seguinte, ao
despertar. Se for necessária uma terceira amostra,
aproveita-se para coletá-la no momento da entrega
da segunda.
A cultura para microbiologia é indicada para os
suspeitos da tuberculose pulmonar persistentemente
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negativos ao exame direto e para o diagnóstico de
formas extrapulmonares como meningoencefálica,
renal, pleural, óssea ou ganglionar, também está
indicada nos casos de suspeita de resistência
bacteriana às drogas, seguida do teste de
sensibilidade.
O exame radiológico é auxiliar no diagnóstico da
tuberculose, justificando-se sua utilização nos casos
suspeitos. Nesses pacientes, o exame radiológico
permite a seleção de portadores de imagens
sugestivas de tuberculose ou de outra patologia, sendo
indispensável submete-los a exame bacteriológico
para se fazer um diagnóstico correto, já que não é
aceitável, exceto em crianças, o diagnóstico de
tuberculose pulmonar sem investigação causal pela
baciloscopia de escarro.
A prova tuberculínica auxilia no diagnóstico da
tuberculose e, isoladamente, indica apenas infecção
e não é suficiente para o diagnóstico da doença. A
leitura da prova tuberculínica é realizada 72 a 92
horas após a aplicação, medindo-se, com régua
milimetrada, o maior diâmetro transverso da área de
endurecimento palpável.
Algumas circunstâncias podem interferir no
resultado das provas tuberculínicas, como, por exemplo:
portadores de doenças imunodepressoras, situações
com imunodepressão transitória. Histopatológico
é um método empregado principalmente na
investigação das formas extrapulmonares. A lesão
apresenta-se como um granuloma, geralmente com
necrose de caseificação e infiltrado histiocitário de
células multinucleadas. Como esta apresentação
ocorre em outras doenças, o achado de BAAR (Bacilo
Álcool-Ácido Resistente) na lesão é fundamental para
auxiliar o diagnóstico de tuberculose.
A tuberculose é uma doença grave, porém curável
em praticamente 100% dos casos novos, desde que
obedecidos os princípios da moderna quimioterapia.
A associação medicamentosa adequada, as doses
corretas e o uso por tempo suficiente, com supervisão
da tomada dos medicamentos, são os meios para
evitar a persistência do bacilo e o desenvolvimento
de resistência às drogas, assegurando, assim, a cura
do paciente. Compete aos serviços de saúde prover
os meios necessários para garantir que todo indivíduo
com diagnóstico de tuberculose venha a ser, sem
atraso, adequadamente tratado.
O tratamento será desenvolvido sob regime
ambulatorial, supervisionado, com pelo menos três
observações semanais da tomada dos medicamentos
nos primeiros dois meses e uma observação por semana
até o seu final. A supervisão poderá ser realizada de
forma direta na unidade, no local de trabalho e na
residência do paciente por meio de agente sanitário
ou agente comunitário de saúde. A unidade de saúde
pode identificar líderes comunitários ou responsáveis
familiares que auxiliem na supervisão do tratamento.
Os pacientes que não se curam após o tratamento
com os esquemas padronizados pelo Ministério da
Saúde (MS), correspondem ao grupo de doentes
classificados no Consenso Brasileiro de Tuberculose,
em 1997, como portadores de tuberculose
multirresistentes (TBMR). Estes pacientes e seus
familiares serão atendidos por equipe multiprofissional
especializada, em Centros de Referencias que
cumpram as normas de biossegurança e sejam
credenciados para este fim, pelas coordenadorias
municipais e estaduais de tuberculose. Lá receberão,
gratuitamente, o esquema medicamentoso alternativo
disponibilizado pelo Ministério da Saúde, composto
por uma combinação das seguintes drogas, de acordo
com o resultado do teste de sensibilidade: amicacina,
ofloxacina, terizidona, etambutol e clofazimina(3).
Em 2005, uma avaliação da OMS17 englobando os
22 países que mais concentram casos de tuberculose
no mundo indicava que a taxa de cura da doença no
Brasil (81%) era a nona pior entre todos os países
analisados. A cobertura populacional dos serviços de
saúde que aplicam o tratamento supervisionado (68%)
era a segunda pior, melhor somente que a Nigéria
(65%). Embora este índice venha apresentando
melhoras nos últimos anos, o Brasil, à época, não
havia atingido as metas internacionais previstas para
o controle da tuberculose(3).
Dessa maneira, esse estudo visa apontar os
principais motivos de não adesão ao tratamento bem
como sugerir melhorias na orientação ao paciente
sobre obtenção do medicamento, tomada em períodos
adequados e riscos de contágio para sociedade.
O objetivo deste trabalhol foi identificar a taxa de
falência do esquema I de tratamento de tuberculose
e fatores que contribuem para a falha no Hospital
São Camilo na cidade de Campos do Jordão. Além
disso, avaliou-se a incidência de tuberculose
multirresistente em pacientes tratados como falha do
esquema I, fatores que contribuem para tal incidência
e principais fatores associados ao mau tratamento de
tuberculose para auxiliar em estratégias de orientação
ao paciente sobre importância do tratamento e
prevenção.
MÉTODOS
Neste estudo, aprovado pelo Comitê de Ética
em Pesquisa da Universidade Anhembi Morumbi,
foram utilizados prontuários de pacientes em
acompanhamento no Hospital São Camilo na cidade
de Campos do Jordão, referência em tratamento de
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tuberculose no estado de São Paulo.
Após avaliação dos critérios de inclusão e exclusão,
os dados foram anotados em tabela específica
para o estudo e armazenados para posterior análise
estatística.
Amostra: foi contabilizado o número total de internações
por tuberculose no Hospital São Camilo desde janeiro
de 2013 a janeiro de 2015 e o número de internações
por recidiva de tuberculose. Das internações por
recidiva, foram selecionados aleatoriamente os
prontuários de 50 pacientes hospitalizados de janeiro
de 2013 a janeiro de 2015, representando 19,45%
das 257 internações ocorridas.
A amostra foi composta por pacientes com idade
superior a 18 anos, portadores de tuberculose ativa
com tratamento prévio superior a 30 dias em período
inferior a cinco anos após o primeiro esquema
terapêutico com ao menos duas hospitalizações
para tratamento dos sintomas da doença. Não
foram considerados aqueles prontuários sem
informações completas sobre a regularidade no uso
de medicamentos antituberculínicos.
As informações coletadas foram: idade, raça,
duração dos sintomas, extensão da doença (locais
de acometimento), coabitação com um doente de
tuberculose, contatos com pessoas diagnosticadas
com tuberculose, cavitação à radiografia de tórax,
uso irregular dos medicamentos, negativação tardia
do escarro, presença de diabetes, alcoolismo, doses
dos fármacos e sorologia anti-HIV. Como desfecho
observou-se cura ou falência do tratamento por
reincidência através de cultura positiva de escarro para
tuberculose, presença de tuberculose multirresistente
ao final do tratamento ou manutenção de resultado
fortemente positivo até o 4º mês de tratamento.
Estudo estatístico: A analise do estudo foi feita
utilizando programa estatístico SPSS versão 20. As
variáveis foram expressas em média e desvio padrão
para variáveis contínuas e contabilizadas como
percentagem (variáveis categóricas). Todos os testes
foram bi-caudados. Testes de normalidade foram
usados baseados no método de Kolmogorov-Smirnov.
Variáveis categóricas foram analisadas pelo método
de chi² e se necessário foi utilizada a correção de
Fisher. Variáveis contínuas foram avaliadas pelo teste
T de Student.
O nível de significância adotado foi p<0.05.
RESULTADOS
Foram coletados prontuários de 50 pacientes
do sexo masculino hospitalizados por recidiva de
tuberculose com idade média de 42,36 (+ 12) anos.
86
Esse valor representa uma parcela de 19,45% das
257 internações ocorridas no período de janeiro de
2013 a janeiro de 2015.
Os pacientes com tuberculose multirresistente
(10 casos) representaram 3,9% das internações do
período.
Caracterização da amostra
A amostra foi avaliada quanto às suas características
sociais (Tabela 1).
Tabela 1: Caracterização da amostra quanto ao perfil
social
N (%)
Estado civil
Solteiro
38 (76)
Casado
6 (12)
Divorciado
4 (8)
Não informado
2 (4)
Residência
Casa própria
14 (28)
Casa de familiares
2 (4)
Pensão
1 (2)
Albergue público
1 (1)
Morador de rua
22 (44)
Escolaridade
Analfabetos
Ensino fundamental
Ensino médio
2 (4)
16 (32)
0 (0)
Ensino superior
1 (2)
Não informado
33 (66)
Sem renda
32 (64)
Renda variável
13 (26)
Aposentadoria
4 (8)
Pensão do governo
1 (2)
Renda
Ocupação
Desempregado
32 (64)
Emprego informal
13 (26)
Aposentado / Pensionista
4 (8)
Pensionista
1 (2)
Percebe-se que a população estudada era composta
por pacientes solteiros, de baixo grau de escolaridade
(1º grau incompleto) ou até mesmo sem lembrar o
quanto estudaram, sem renda ou com renda variável
pela ausência de vínculo empregatício (aqueles com
renda possuem benefícios estatais somente, como
bolsas e aposentadoria) sendo que a maioria não possui
emprego ou realiza trabalhos esporádicos informais.
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(2%) e casa de familiares (4%). Trata-se de parcela
da população abaixo da linha de pobreza, com acesso
limitado a informações e recursos de saúde, bem
como à moradia e adequadas condições de higiene
(Figura 1).
A maioria dos pacientes estudados não possuía
moradia (44%) ou, quando possuíam, tratava-se de
participantes de programas habitacionais do governo,
moradias irregulares e precárias (favelas) (28%), os
demais casos foram compostos de pacientes com
cadastro em albergues da prefeitura (1%), pensões
Figura 1: Perfil de renda e moradia dos pacientes estudados
Hábitos e Doenças Associadas: os pacientes foram
divididos de acordo com seus hábitos e doenças
concomitantes que favorecem a contaminação e
desenvolvimento da tuberculose (Tabela 2).
Tabela 2: Hábitos e doenças associadas
Sim (%)
Não (%)
Não informado (%)
Tabagismo
31
18
1
0,27
Etilismo
38
11
1
0,045
Uso de drogas ilícitas
31
18
1
0,94
Outras doenças associadas
15
35
0
0,002
Contaminação por HIV
19
21
4
0,48
Observa-se que a população estudada consumia,
em sua maioria, bebidas alcoólicas, cigarros e
drogas ilícitas. Além disso, 19 eram soropositivos
e 15 possuíam outras doenças que comprometem
as defesas imunológicas, fatores que propiciam a
contaminação pelo bacilo causador da tuberculose.
Ainda que diversos fatores se encontrem presentes,
somente o etilismo e a ocorrência de outras doenças
com comprometimento imunológico foram apontados
P
como fatores de correlação com maior número de
tratamentos prévios e, consequentemente, com
recidiva da doença.
Manifestação e tratamento de tuberculose: os pacientes
procuraram atendimento com queixas mais frequentes
de tosse produtiva (43), dispneia (23), perda de peso
(32) e febre (10), sendo que essas queixas não eram
isoladas e havia ao menos associação entre duas delas.
Tabela 3: Sintomas de tuberculose com maior prevalência
Ausente
Presente
P
Tosse produtiva
7 (14%)
43(86%)
<0.001
Dispneia
27(54%)
23(46%)
0.57
Perda de peso
18(36%)
32(64%)
0.048
Febre
34(68%)
16(32%)
0.001
87
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Os sintomas e sinais mais prevalentes neste grupo
que levaram os pacientes a procurarem serviço
médico foram: tosse produtiva, febre e perda de peso,
respectivamente.
Todos esses pacientes foram submetidos
a exames diagnósticos consistidos em cultura
de escarro, baciloscopia e raio-X de tórax para
comprovação do diagnóstico de tuberculose e o grau
de comprometimento pulmonar. Foram observados
45 casos de contaminação com infecção de caverna
pulmonar. Além disso, 46 pacientes apresentavam a
forma pulmonar, um apresentou a forma miliar, um
caso diagnosticado de neurotuberculose, uma forma
disseminada e um ganglionar.
Correlacionou-se a existência de cultura com
comprovação da contaminação pelo Bacilo e o
término do tratamento e observou-se que 82,9%
desses pacientes não completaram o tratamento
indicado, apontando a falha na aderência como fator
de multirresistência (Tabela 4).
Tabela 4: correlação entre cultura com comprovação da contaminação pelo Bacilo e o término do tratamento
Não
sim
Cultura
Tratamento completo
Não
Sim
N (%)
N (%)
0 (0)
42 (82,9)
1 (100)
7 (17,1)
Quando questionados sobre o tratamento anterior,
somente 8 completaram o esquema terapêutico
prescrito, 16 não completaram dois meses de
tratamento, 17 pacientes completaram entre dois e
3,5 meses de tratamento e um paciente completou
Total
P
1 (100)
49 (100)
0.037
até seis meses de tratamento (Tabela 5).
Esses pacientes realizaram ao menos um tratamento
incompleto, fato que pode contribuir para recidiva
da doença e para o surgimento de cepas de bacilos
resistentes ao tratamento disponível atualmente.
Tabela 5: História de tratamento e local de manifestação de acordo com tratamentos prévios de tuberculose
Tratamentos prévios (N)
1 (11)
2 (22)
3 (12)
4 (3)
5 (2)
Presença de caverna pulmonar (N)
10
21
10
2
2
Tuberculose extrapulmonar (N)
3
1
1
1
0
Tratamento prévio completo (N)
4
1
1
1
1
Tempo de tratamento na última infecção
(média em meses)
2
3
2,5
1,8
2
DISCUSSÃO
Foram analisados prontuários de 50 pacientes,
representando 19,45% das 257 internações
ocorridas no período de janeiro de 2013 a janeiro
de 2015, sendo que os pacientes com tuberculose
multirresistente (10 casos) representaram 3,9% das
internações do período. Quanto às características
sociais, observou-se que os homens eram solteiros,
sem escolaridade ou com estudos precários, não
possuíam renda ou possuíam empregos informais com
renda variável, contudo havia aqueles com benefícios
estatais como bolsas e aposentadoria. Assim, trata-se
de parcela da população abaixo da linha de pobreza,
com acesso limitado a informações e recursos de
saúde, bem como à moradia e adequadas condições
de higiene.
A amostra foi composta majoritariamente por
moradores de rua (44%), que consumiam em sua
maioria bebidas alcoólicas, cigarros e drogas ilícitas,
contudo somente o etilismo foi apontado como fator
88
de correlação com maior número de tratamentos
prévios e, consequentemente, com recidiva da
doença, juntamente com a ocorrência de doenças
que comprometem as defesas imunológicas.
O sintoma mais prevalente foi tosse produtiva,
82,9% desses pacientes não completaram o
tratamento indicado e todos os estudados realizaram
ao menos um tratamento incompleto. Dessa forma
conclui-se que a falta de aderência é o principal fator
de recidiva da tuberculose.
Este trabalho, ao destacar os principais fatores
de risco dos indivíduos que contraíram a doença,
nos reflete a situação social em que eles estão
inseridos. Em grande maioria são indivíduos que
não constituíram família ou não conseguiram manter
uma vida conjugal saudável, assim perdendo a base
familiar. São na grande maioria moradores de rua, e
uma grande parcela convive nos mesmos albergues,
dividindo assim o mesmo ambiente e formando
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aglomerados habitacionais o que propicia também
disseminações de doenças infecto contagiosas.
Os banheiros e os bebedouros são comunitários,
as camas não são individuas e sim aleatórias e
consequentemente temos situações favoráveis para
esta disseminação. Por outro lado, pessoas saudáveis
que convivem diariamente com pacientes portadores
da tuberculose também ficam expostas à doença,
convivendo em locais públicos, portanto tornam-se
comunicantes potenciais.
Cumpre salientar que o nível de escolaridade foi
relevante para este grupo que possui baixa formação,
fato presente em 100% dos participantes e, portanto,
desconhecem programas de prevenção, ou seja, o
individuo doente desconhece a transmissão da sua
doença. Ações para esclarecimento da doença para
o portador seriam muito bem-vindas. A escolaridade
é um fator importantíssimo e ações para incluir mais
crianças nas escolas é fundamental, bem como
incluir de forma lúdica o conhecimento da doença e
seus cuidados.
Ressaltamos o problema social causado pelas
drogas, fator determinante para a proliferação das
doenças sexualmente transmissíveis e doenças
oportunistas, no caso a tuberculose estudada, onde
50% dos participantes eram usuários de drogas
ilícitas. Estamos, portanto, diante de um grave
problema social onde necessitamos entender a
condição de dependência química, a condição de
exclusão social, da pobreza e muitas vezes por ações
que não combatem de forma efetiva estas condições,
favorecendo o enfraquecimento ao combate da
tuberculose.
REFERÊNCIAS
1. Veronesi-Focaccia. Tratado de infectologia; 2010;
4 ed; cap. 68: 1263-1267.
2. Secretaria de vigilância em saúde – Ministério
de Saúde. Boletim epidemiológico. Especial
tuberculose; v. 43; Março de 2012.
3. Tuberculose. Guia de vigilância epidemiológica.
II Consenso brasileiro de Tuberculose. Diretrizes
Brasileiras para Tuberculose 2004. Jornal brasileiro de pneumologia 30(Supl 1) – Junho de
2004. S59 – S69.
4. Barreira D; Grangeiro A; Avaliaçao das estratégias
de controle da tuberculose no Brasil; Rev de saúde pública 2007; 41 (Supl.1): 4-8.
CONCLUSÃO
A tuberculose continua sendo uma doença presente e
frequente em nosso meio atingindo, principalmente,
aqueles com baixa renda, baixa escolaridade e
consumidores de drogas ilícitas. Ainda traz exposição
de pessoas saudáveis agente causador pela facilidade
na transmissão. O modo de vida em comunidades
tipo albergues, alojamentos com compartilhamento
de sanitários, bebedouros e camas, constitui fator de
risco para disseminação da doença.
AGRADECIMENTOS
Aos colegas do Hospital São Camilo na cidade de
Campos do Jordão, pela ajuda na coleta das informações, sem a qual o estudo não seria possível. Ao
orientador pelos ensinamentos e paciência para a
conclusão do estudo.
Correspondência:
Aline Cortat Coca
Praça Amadeu Amaral 47 conjunto 12A, Bela Vista,
São Paulo/SP Brasil
CEP01327-010
E-mail: [email protected]
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