Concepção e Papel do Movimento Estudantil

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Concepção e Papel do Movimento Estudantil: uma reflexão
necessária1
Samuel Britto das Chagas*
ME: representante de uma categoria ou Movimento Social?
Para iniciar-se um debate sobre Movimento Estudantil torna-se necessário
colocar-se a concepção que se tem deste importante agrupamento social, e existem
diferentes concepções de ME atualmente. O que tem pautado importantes discussões
dentro das entidades estudantis; as principais concepções a este respeito são as de que o
ME seja um movimento social ou representante de uma categoria. Com isso devem-se
analisar as características de ambas as concepções para aprofundar-se o debate dentro
das entidades estudantis.
O ME apresenta características, que faz com que possa ser considerado como
Movimento Social, segundo Touraine citado por Scherer-Warren, 1984, os movimentos
sociais “referem-se a um grupo mais ou menos organizado, sob uma liderança
determinada ou não; possuindo um programa, objetivo ou plano comum;
baseando-se numa doutrina, princípio valorativo ou ideologia; visando um fim
específico ou mudança social. Porém, segundo as teorias marxistas do século passado
os movimentos sociais surgem da necessidade de organização e da comunidade de
interesse de classe; a exigência de uma vanguarda para o movimento; o
desenvolvimento de uma consciência de classe e de uma ideologia autônoma; uma
proposta ou um programa de transformação social”.
Por outro lado, alguns estudantes consideram o ME como representante de uma
categoria, a categoria estudantil, e para isso utiliza-se as seguintes características:
possuir pauta reivindicatória própria; se organizar em função de um lócus de ação
(escola-universidade), podendo se tornar corporativista em algumas situações em
função de pautas específicas; com tendência a movimento de massas; estas
características estão vinculadas ao movimento sindical, que é representante de uma
categoria, a exemplo o sindicato dos docentes do ensino superior (ANDES-SN).
O ME ainda apresenta duas características que são inerentes a sua organização e
que são fatores fundamentais para sua análise, que são: o policlassismo, que está
vinculado ao fato do ME ser formado por várias classes sociais, o que é fruto das
diferentes camadas sociais que estão presentes na sociedade, e consequentemente nas
escolas e nas universidades, isto não deve ser considerado como maléfico, porém causa
uma dificuldade na unificação de pautas, dificulta a unidade de ação, dificulta a
construção de uma identidade de classe, o que tem feito com que alguns estudantes da
classe média façam uma opção de classe, se identificando com a classe trabalhadora, o
que chamamos de “suicídio de classe”. Outra característica do ME é a transitoriedade,
que esta relacionada ao período de atuação do estudante na escola ou universidade, que
geralmente está entorno de 3 a 5 anos (com algumas exceções), diferente dos outros
Movimentos Sociais ou Partidos Políticos em que o militante possui uma história na
organização social, que pode durar a vida toda. Esta característica tem sido um fator
limitante para o ME, pois dificulta o repasse acumulado coletivamente por um militante,
que estando em plenas condições políticas de atuação, se forma, e passa a atuar em
outra organização social criando uma lacuna entre os grupos estudantis; pois muitas
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1. Texto escrito com objetivo de refletir sobre a concepção e o papel do Movimento Estudantil visando fomentar o debate
entre as entidades estudantis.
* Estudante de Agronomia UFLA, membro da Coordenação Nacional da FEAB, Gestão 05-06 Lavras - MG “Eles temem o
impossível, sejamos o impossível”.
vezes o militante que esta no final do curso tem dificuldades de se relacionar com os
iniciantes, o que gera o refluxo em alguns grupos.
Somado a isso, outra característica do ME, que também é uma característica do
movimento social, é a forte influência dos Partidos Políticos, que no caso do ME tem
uma relação histórica, o que causa grande debate entre os estudantes, pois muitos
militantes do ME também são militantes do partido, e contribuem com a organização de
ambas as organizações, o que pode ser avaliado como uma relação positiva. Portanto
para outros, esta relação é vista de forma negativa, e faz com que alguns estudantes se
afastem das entidades ou tomem uma postura apartidária. Esta polêmica tem sido tema
de grandes discussões no ME brasileiro, o que deve ser aprofundado sempre que
possível pelas entidades estudantis (CA´s, DCE´s, Executivas e Federações de Curso,
UEE´s e UNE) e também pelos Partidos Políticos que atuam junto ao ME, primando
sempre pela autonomia das entidades. Vale dizer, que ao longo da história, a relação
com os partidos sempre contribuiu para a organização dos Movimentos Sociais.
Importante ressaltar aqui que o ME, assim como outros grupos sociais sofre a
influência das condições objetivas que regem a sociedade, ou seja, estão diretamente
ligados as relações sociais e ao modelo de sociedade vigente, o capitalista, em sua forma
mais recente: o neoliberalismo. Com isso, suas ações são conjunturais e dependem das
condições pré-estabelecidas para serem potencializadas. Portanto, muitas das vezes, as
pautas do ME são pautas conjunturais (flutuantes) que sofrem forte influência das
condições materiais e ideológicas.
Com isso, a concepção que se apresenta sobre o ME é de que este seja um
Movimento Social, pois: possui um grupo dirigente (Ex: DCE), apresenta um programa
ou pauta própria de reivindicação (Ex. Assistência Estudantil), se organiza a partir de
um princípio valorativo ou ideologia partindo de um lócus de atuação (escolauniversidade), que luta por transformação social (Ex: Luta pela Educação), e tende a ser
um movimento de massas dependendo da conjuntura (Ex: Atos em Brasília). Porém
com algumas características do Movimento Sindical, como o corporativismo (pautas
específicas), e o fato de representar uma categoria (estudantes), além de características
inerentes a sua organização como policlassismo e transitoriedade.
O Papel do ME junto à luta por uma nova sociedade
A transformação da sociedade tem sido o objetivo estratégico de vários
movimentos sociais sendo assim torna-se fundamental definir qual o papel do ME junto
às lutas sociais, que estão mobilizando milhares de pessoas a nível mundial. Bem como
analisar quais são seus objetivos estratégicos e táticos definindo-se as tarefas que serão
executadas pelo conjunto das entidades estudantis e dos estudantes, seus parceiros e
apoiadores.
Com base na concepção de que o ME é um Movimento Social, deve-se colocar
como objetivo estratégico para este movimento a transformação da sociedade, ou seja,
sua principal tarefa deverá ser a construção de um novo projeto de sociedade, que para
parcela significante do ME está pautado na afirmação do socialismo como projeto
estratégico. Portanto, não deve-se cometer o equívoco de que sozinho esta parcela da
sociedade conseguirá fazer as transformações, por isso torna-se necessário as alianças
junto a outros movimentos sociais, partidos políticos e demais entidades, que possuam o
mesmo projeto estratégico.
Outra tarefa importante que se apresenta como papel do ME é a luta pela
Educação, e mais especificamente pela universidade, pois é o lócus de ação deste grupo
social, portanto bandeira histórica dos estudantes. Com isso deve-se traçar uma aliança
com setores importantes que atuam dentro da universidade, como professores e
funcionários pautando as principais contradições necessárias à mudança da
universidade, e unificar o movimento social pela educação entorno de pautas como: A
luta por uma Educação Pública, Gratuita, Laica, de Qualidade e referenciada pela
sociedade.
Contudo a universidade historicamente esteve a serviço da classe dominante, e
com isso cumpre um papel como instrumento ideológico de dominação social. Neste
sentido, a perspectiva de disputa da universidade se dá no plano ideológico fazendo com
que a prioridade deva ser a disputa de consciência acumulando forças entorno de um
outro projeto de sociedade, e consequentemente de universidade. Para tanto torna-se
fundamental pensar os instrumentos de disputa ideológica, que potencializem um
avanço do ME.
Para realizar estas tarefas o movimento estudantil precisa de uma organização
que cumpra o papel de direção do processo de transformação, e neste sentido a
formação de militantes comprometidos com as lutas sociais torna-se tarefa fundamental.
Pois para se propor a transformar a sociedade é preciso formar dirigentes
revolucionários, o que segundo Marighella: “A organização revolucionária não se
converte em vanguarda pelo fato de autodominar-se como tal. Para isso é necessário
passar à ação e acumular uma prática revolucionária convincente, pois somente a ação
faz a vanguarda”.
Este grupo dirigente deve possuir referencia na sua base social, ou seja, nos
estudantes, e para isso deve-se colocar como tarefa do ME o acúmulo de forças, que
deve-se dar através da massificação das lutas estudantis. Contudo, vale ressaltar que a
conjuntura tem sido desfavorável para a massificação das lutas, pois vive-se um
momento de descenso de massas, o que esta relacionado ao fato da luta de classes não
estar pautada na sociedade atual, o que somado ao avanço do neoliberalismo faz com
que o momento se torne bastante desfavorável para as lutas sociais. Neste sentido, o
grupo dirigente deve ter algumas características, que deverão ser trabalhadas, tais como:
a solidariedade; a indignação; a disciplina; o estudo; o compromisso; o desprendimento;
a militância.
O ME deve dar um salto qualitativo nas lutas estudantis, e para isso é
fundamental traçar as estratégias e as táticas para atingi-lo. Portanto seu papel está
definido em 5 eixos fundamentais:
1. Lutar pela transformação da sociedade;
2. Lutar pela Educação e pela transformação da universidade;
3. Construir lutas concretas e fazer a disputa de consciência nas universidades;
4. Formar militantes comprometidos com as lutas do povo e a militância estudantil;
5. Massificar entorno de um novo projeto de sociedade e na construção de uma
nova universidade.
Bibliografias Consultadas:
HARNECKER, M., Estratégia e Tática, São Paulo - SP, Editora Expressão Popular, 1ª
edição, 2003, 160 p.
MOVIMENTO CONSULTA POPULAR, Os Núcleos, Cartilha n° 17, São Paulo – SP,
1ª edição, 37 p.
SCHERER-WARREN, I., Movimentos Sociais: um ensaio de interpretação
sociológica, Florianópolis – SC, Editora da UFSC, 1984, 150 p.
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