A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO O RURAL NO NORTE FLUMINENSE ERIKA VANESSA MOREIRA SANTOS1 MARIA DO SOCORRO BEZERRA DE LIMA2 Resumo: Compreender as mudanças no rural do norte fluminense remete a uma sistematização de dados e informações ao longo do contexto histórico. A região marcada tradicionalmente pela lavoura canavieira, atualmente, tem uma economia regional baseada na exploração do petróleo e do gás. Os conflitos agrários configuram outro cenário deste “rural”, como resposta a concentração fundiária, ao domínio de elite agrária e a expulsão dos trabalhadores rurais. A implantação de assentamentos rurais no norte fluminense refletiu diretamente na configuração do espaço rural, seja no aumento da população rural seja nos novos canais de comercialização de produtos agropecuários. Palavras-chave: Norte Fluminense; concentração fundiária; conflitos agrários Abstract: Understanding the changes of rural space in north Rio de Janeiro State requires data and information systematization along the historical context. The region - traditionally marked by sugar plantations - currently has a regional economy based on the development and exploitation of oil and gas fields. The agrarian conflicts have been another feature of this "rural" due to land concentration, to the landed gentry and to the expulsion of the poor from rural spaces. The implementation of rural settlements in north Rio de Janeiro State directly reflected in the rural setting, by increasing the rural population and the new marketing channels for agricultural products. Keywords: North Rio de Janeiro State; land concentration; agrarian conflicts. 1 – Introdução O norte fluminense compreende uma área territorial de 9.730.443 Km 2 e abrange as microrregiões geográficas de Campos dos Goytacazes (Campos dos Goytacazes, São Fidélis, São João da Barra, São Francisco de Itabapoana e Cardoso Moreira) e de Macaé (Macaé, Quissamã, Carapebus e Conceição de Macabu)3.Tal regionalização foi oficializada em 1987 pela Secretaria de Estado de Planejamento e Controle (BIAZZO, 2012). O nosso objetivo é compreender o „rural e o agrícola‟ nessa região, desde 1970 até o século XXI. Os resultados apresentados advêm de 1 - Docente do Departamento de Geografia de Campos e do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal Fluminense/ Campos dos Goytacazes. Pesquisadora do NERU/UFF (Núcleo de Estudos Rurais e Urbanos), do Grupo de Pesquisa Território, Escala e Poder/UFF e do GEDRA/UNESP (Grupo de Estudos Dinâmica Regional e Agropecuária). E-mail de contato: [email protected] 2 Docente do Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense/ Campos dos Goytacazes. Coordenadora do NERU /UFF Núcleo de Estudos Rurais e Urbanos) e PET Ciranda Rural. E-mail de contato: [email protected] 3 Ver mapa 01. 2828 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO pesquisas em desenvolvimento4 realizadas no âmbito do NERU (Núcleo de estudos rurais e urbanos) e do Grupo de Pesquisa Território, Escala e Poder. Mapa 1 – Localização dos municípios da região Norte Fluminense. Campos dos Goytacazes é o município com maior extensão territorial (4.026 Km2) e maior número de distritos (15), cuja origem está justamente no processo de formação sócio-espacial. Entre o final da década de 1980 e meados de 1990, quatro distritos se emanciparam: Quissamã (distrito de Macaé), São Francisco de Itabapoana (distrito de São João da Barra), Cardoso Moreira (distrito de Campos) e Carapebus (distrito de Macaé). Neste texto, propomos a sistematização de dados secundários, por meio de tabelas e cartogramas, a fim de caracterizar o norte fluminense a partir do espaço rural. Para atingir tal objetivo, utilizamos estes procedimentos: levantamento bibliográfico; levantamento documental das Cooperativas e das Associações existentes; compilação e sistematização de dados secundários – SIDRA/IBGE (Banco de dados agregados), CPT (Comissão Pastoral da Terra) e CEEP/CEPERJ (Centro de Estatística, Estudos e Pesquisas) e realização de pesquisa de campo. 4 Coletando preços e trilhando caminhos, pesquisa de extensão, Proex/UFF, 2015. Cesta sabores da terra, pesquisa de extensão, Proex/UFF, 2014. A ruralidade no norte fluminense, Edital Jovem Pesquisador, Proppi/UFF, 2014-2015. 2829 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 2 – Contexto histórico: o agrícola e o agrário na região norte fluminense O processo de ocupação da região ocorreu com o domínio da atividade canavieira. As denominações foram e são múltiplas dessa região, desde a chamada região açucareira de Campos (Censos Agropecuários de 1975, 1980 e 1985), Baixada Campista (por causa da forma de relevo), planície Goytacaz (em função da presença dos índios Goytacaz). Cada nomenclatura tem um contexto e um elo comum que é a tríade cana-elite agrária-território. Nosso recorte temporal abrange os anos pós--1970, marcados pelo inicio do processo de reestruturação produtiva e pela exploração de petróleo e gás da bacia de Campos (CRUZ, 2005, PIQUET, 2004). Outro marco importante foi o Programa PROALCCOL, que, segundo Alentejano (2005, p.12), propiciou melhorias na base técnica e alteração nas relações de trabalho: A partir de incentivos governamentais propiciados pelo Programa de Apoio à Agroindústria Açucareira e pelo Programa Nacional do Álcool (PRÓ-ÁLCOOL) a produção de cana na região sofre profundas alterações, seja com a concentração crescente do capital, seja com a radical alteração das relações de trabalho. No caso das relações de trabalho, a marca fundamental é a expulsão dos trabalhadores do interior dos latifúndios, transformando-os em bóia-frias, moradores das periferias das cidades da região, principalmente Campos. A introdução de melhorias técnicas parciais na produção, concentradas no preparo da terra e nos tratos culturais, e excluindo, em geral, a colheita, acentua a diferença sazonal de requerimento de mão-de-obra, gerando uma massa de assalariados temporários. Alentejano (2005), com base em Rua (1998), destaca que as mudanças com o Pro-álcool podem ser resumidas em dois viés: de um lado, a eliminação de antigos engenhos e a implantação de usinas modernas e, de outro, a concentração fundiária, “ que resulta da redução do número de fornecedores, uma vez que as usinas impõem padrões de produção que muitos pequenos fornecedores não conseguem cumprir o que acaba por alijá-los do setor” (ALENTEJANO, 2005 p.13). Neves (1997) chama a atenção para os conflitos agrários que emergem justamente como resposta aos processos de concentração fundiária e da expulsão de muitos trabalhadores dos postos de trabalho que, impedidos de continuar na agricultura, migram para os centros urbanos. A economia agrícola regional, baseada principalmente na cana-de-açúcar, passa a contar com outras atividades nos anos de 1990, como pecuária de corte (tradicional e moderna) e leiteira, mineração e fruticultura. Na tabela 01, notamos a queda da lavoura canavieira, pois a área reduziu 91.500 hectares entre 1990 e 2013. 2830 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Tabela 01: Área colhida de cana-de-açúcar (hectares), Mesorregião Norte Fluminense e municípios, entre 1990 e 2013. 1990 184.880 116.100 3.680 8.600 12.400 6.100 38.000 Norte Fluminense Campos dos Goytacazes Carapebus Cardoso Moreira Conceição de Macabu Macaé Quissamã São Fidélis São Francisco de Itabapoana São João da Barra 2013 93.380 54.000 200 2.650 12 18 13.000 300 23.000 200 Fonte: Produção agrícola municipal (PAM) de 1990 e 2013 no SIDRA/IBGE Org: Erika Moreira (2015) Uma forma de reverter o declínio da atividade canavieira ocorreu por meio de políticas públicas (LIMA; FILHO; NEY, 2013, p. 12), quais sejam: a) Programa Rio Cana Estadual, que começou a funcionar em 2002; b) Programa de Revigoramento da Lavoura de Cana de Açúcar (Lei Municipal nº 7.829/2006) - linha especial de financiamento do Fundo de Desenvolvimento de Campos (FUNDECAM); c) Projeto de Lei oriundo da Medida Provisória (MP) 554/11; d) investimentos da Caixa Econômica Federal e da AgeRio (agência de fomento estadual); e) redução de ICMS em 2012. Atualmente, os antigos agentes atuantes no setor canavieiro estão sendo absorvidos por grandes empresas, como Coagro (Cooperativa Agroindustrial do Estado do Rio de Janeiro).Esse declínio no setor canavieiro está vinculado ao cenário da população, rural e urbana, com a participação majoritária dos residentes urbanos e o decréscimo da população rural (tabela 02). Tabela 02 - Dinâmica da população rural e urbana no Norte Fluminense, entre 1970 e 2010. Municípios da Região Açucareira de Campos Campos dos Goytacazes Carapebus Cardoso Moreira 1970 pop pop rural urbana 1980 pop pop rural urbana 1991 pop pop rural urbana 2000 pop pop rural urbana 2010 pop pop rural urbana 142.724 176.082 145.184 203.358 64.442 324.667 42.812 364.177 45.006 418.725 0 0 0 0 0 0 1.791 6.875 2.817 10.542 0 0 0 Conceição de Macabu Macaé 4.227 25.516 7.333 39.082 3.966 20.639 9.658 2.981 13.982 55.224 11.559 89.336 0 0 0 4.550 8.029 Quissamã São Fidélis 0 23.355 0 11.788 0 19.710 0 6.057 4.410 5.975 7.699 15.263 12.421 22.160 10.276 26.513 7.246 7.864 São Francisco de Itabapoana São João da Barra 0 45.894 0 9.725 0 33.522 0 0 0 21.737 19.738 21.066 29.770 29.791 8.051 19.631 20.262 21.092 7.054 25.693 2.240 16.542 6.454 126.007 3.843 8.757 2.874 18.337 3.869 202.859 12.996 29.679 Fonte: Censos Demográficos 1970, 1980, 1991, 2000 e 2010. Org: Erika Moreira (2014) Enquanto Macaé, São Fidélis, São João da Barra, São Francisco de Itabapoana exibiram, entre 2000 e 2010, redução da população rural, os municípios 2831 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO de Campos, Carapebus, Conceição de Macabu e Quissamã exibiram, ainda que timidamente, um incremento da população rural. A região Norte Fluminense passou no período 1980-1991 por um êxodo rural mais intenso que o estado do Rio de Janeiro, provavelmente devido à estagnação da atividade açucareira (CRUZ, 2005). Mapa 02: Grau de urbanização e População total no ano de 2010. Segundo Cruz (2005), o município de Macaé apresentou o maior crescimento populacional (46%) nos anos 1980, pois foi o receptor direto dos recursos para a exploração petrolífera. Contudo, o referido autor pontua que, nas décadas subsequentes, o crescimento foi menor, pois os investimentos pesados do setor petrolífero “já haviam se realizados em décadas anteriores” (CRUZ, 2005, p. 82). No mapa 02 é possível observar que o município de Macaé apresentou a maior taxa de urbanização (98,1%) em 2010; em contrapartida, São Francisco de Itabapoana, a taxa foi a menor, 51%, cuja economia local depende, além do setor de serviços, também da fruticultura e das olerícolas. As mudanças no perfil demográfico regional podem ser analisadas a partir de três aspectos. Primeiro, a crise do setor açucareiro (1970) e sua reconversão com as políticas agrícolas (PRO-ALCOOL), no final dos anos 1970. Segundo, o início da exploração na Bacia de Campos, no final dos anos 1970, e a consolidação nas décadas seguintes. Terceiro, a emancipação dos municípios de Carapebus, São Francisco de Itabapoana e Quissamã (CRUZ, 2005). 2832 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Com a implantação do polo de extração do petróleo e gás em Macaé, na Bacia de Campos, no final dos anos de 1970, a região torna-se “produtora de petróleo, sendo responsável por mais de 80% da produção brasileira” (CRUZ, 2005, p. 56). No bojo desse processo, a atividade petrolífera suplanta a açucareira na dinâmica econômica regional. Nos anos 1990, com as mudanças na legislação, houve aumento dos royalties às regiões produtoras, o que levou ao incremento dos recursos destinados aos municípios da Bacia de Campos. Tabela 03 – Valor adicionado bruto total e participação da agropecuária, segundo os municípios da região Norte Fluminense, 2011. Município Cardoso Moreira Carapebus Campos dos Goytacazes Conceição de Macabu Macaé Quissamã São Fidelis São Francisco de Itabapoana São João da Barra Norte Fluminense Valor adicionado total 124,326 754,534 36.363,261 204,133 11.166, 217 3.843,826 428,572 676,984 5.888,212 59.450,071 % da agropecuária no valor adicionado 11,8 0,9 0,3 3,2 0,4 0,7 7,0 14,8 0,4 0,6 Fonte: CEEP/CEPERJ Org: Erika Moreira (2015). Os dados da tabela 03 apontam que o valor adicionado bruto agropecuário tem uma participação ínfima nos municípios dessa região. Apenas Cardoso Moreira e São Francisco de Itabapoana, apresentam um percentual razoável de 11,8% e 14,8%, respectivamente. Vale mencionar que são os municípios que conseguiram emancipação nos anos de 1990. Cardoso Moreira tem uma produção agrícola voltada à cana e à pecuária mista, enquanto São Francisco de Itabapoana tem como carroschefes o abacaxi, a mandioca, o maracujá, a goiaba e a cana-de-açúcar. Na década de 1970, as elites agroindustriais e agropecuárias assumiram “o controle dos recursos passados à região, graças a um bem-sucedido processo de obtenção de reconhecimento e da legitimidade para assumir a posição de representantes dos interesses regionais” (CRUZ, 2005, p. 66). Nos dias atuais, a elite agrária se metamorfoseou em elite imobiliária. Muitas áreas utilizadas pelas antigas usinas de açúcar se transformaram em condomínios residenciais ou vazios urbanos à espera de valorização imobiliária. A elite que outrora concentrava terra e capitais estendeu o seu domínio sobre a terra, os capitais e o 2833 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO poder político. A inserção da indústria petrolífera no cenário regional representou uma nova dinâmica de crescimento econômico, baseada na transição das principais atividades econômicas, sobretudo a agropecuária. 2.1- Estrutura fundiária e produtiva: concentração e estratégias fundiárias O panorama da estrutura fundiária aponta para um processo de concentração fundiária, fruto de uma estrutura marcada por grandes extensões de terras voltadas ao cultivo da cana-de-açúcar. Os dados dos Censos Agropecuários de 1996 e 2006 indicam que o problema fundiário não só continuou, mas também agudizou nos últimos anos. O mapa 03 apresenta as mudanças nas variáveis área e número de estabelecimentos. Dois municípios estão sem os dados de 1996, por conta do processo emancipatório, Carapebus (1997) e São Francisco de Itabapoana (1995). Mapa 03: Variação do número de estabelecimentos agropecuários e da área (%), entre 1996 e 2006, na Mesorregião Geográfica Norte Fluminense. Entre 1996 e 2006, o Norte fluminense teve movimentos distintos em relação à área ocupada e ao número de estabelecimentos agropecuários, que convergiram, indiscutivelmente, na concentração fundiária, como podemos acompanhar no mapa 03. Apenas Cardoso Moreira, emancipado de Campos em 1993, teve ampliação do número e da área dos estabelecimentos. Campos dos Goytacazes e São Fidélis, municípios áreas tradicionais do cultivo da cana, tiveram redução da área total dos 2834 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO estabelecimentos, mas ampliaram, sutilmente, o número de estabelecimentos agropecuários. Todavia, a ampliação se deu justamente nos estabelecimentos agropecuários com até 50 hectares. Em situação diferente estão os municípios de Conceição de Macabu, Macaé, São João da Barra e Quissamã, que apresentaram redução da área e do número de estabelecimentos, primeiro com a emancipação de Carapebus e de São Francisco de Itabapoana e, segundo, pela redução da área colhida com a atividade canavieira. Essas mudanças retratadas na estrutura fundiária estão vinculadas aos modelos produtivos adotados. A cana de açúcar foi durante alguns séculos, o carrochefe da economia regional. A competitividade com novas áreas produtoras, os problemas na transmissão hereditária, o sucateamento dos antigos engenhos e as novas estratégias da elite agrária, são alguns fatores que levaram a crise do setor e agonizou as relações de trabalho no campo. Em âmbito geral, a região norte fluminense ocupado ampliou o número de pessoal nos estabelecimentos agropecuários e o número de proprietários. Apenas o município de Campos dos Goytacazes apresentou ampliação nessas duas variáveis. Com exceção de São Francisco de Itabapoana e Carapebus, os restantes (seis) reduziram o quadro de pessoal ocupado e da condição de produtor na qualidade de proprietário. No sentido de apreender as mudanças na estrutura produtiva, escolhemos três lavouras temporárias, o abacaxi perola a mandioca (aipim) e a pecuária leiteira. Para cada produto, levamos em consideração a distribuição dentro da região norte fluminense entre 1990 e 2013. A produção do abacaxi vem desde o limiar do século XXI ampliando áreas e mercados. Um incentivo para tal ocorreu com o Programa Frutificar5. Segundo Pinheiro da Silva (2006, p. 16), o referido programa foi financiado, no ano de 2000, pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES). “Este Programa financiou linhas de crédito para estimular o potencial exportador da fruticultora no estado, com recursos totais que chegaram à cifra de R$ 350 milhões, em 1999 (BNDES, 2005 apud PINHEIRO DA SILVA, 2006, p. 16).”. 5 Programa financia a implantação das seguintes culturas: Abacaxi, Banana, Caju, Citros (Laranja, Limão e Tangerina), Coco Verde, Goiaba, Manga, Maracujá, Pêssego e Uva. Consulta em http://www.rj.gov.br/web/seapec/exibeconteudo?article-id=167019 2835 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO Para ter uma ideia dessa ampliação, em 1990, São João da Barra respondia por 70% da área total destinada ao cultivo do abacaxi. Em 16 anos, a área foi ampliada em mais de dez vezes, alcançando 4.100 hectares, sendo o grande produtor o município de São Francisco de Itabapoana (85%), desmembrando de São João da Barra no ano de 1995 (tabela 04). A produção do abacaxi é consumida na própria região, nos mercados de Campos dos Goytacazes e de Macaé, e nos grandes centros (Rio de Janeiro, Niterói e Vitória). Tabela 04: Área colhida do abacaxi na Mesorregião Norte Fluminense - 1990 e 2013. Norte Fluminense Carapebus Campos dos Goytacazes Cardoso Moreira Conceição de Macabu Macaé Quissamã São Francisco de Itabapoana São Fidélis São João da Barra 1990 434 80 25 30 299 2013 4.100 290 30 3.500 280 Fonte: Produção agrícola municipal (PAM) de 1990 e 2013 no SIDRA/IBGE Org: Erika Moreira (2015) Com a produção da mandioca ocorre um processo semelhante, o maior produtor é o município de São Francisco de Itabapoana, seguido por Campos dos Goytacazes e Quissamã (tabela 05). A produção é escoada para os mercados da região norte, uma parte destinada aos grandes centros, Rio de Janeiro e Niterói. Tabela 05: Área Colhida de mandioca (hectares) na Mesorregião Norte Fluminense - 1990 e 2013. Norte Fluminense Carapebus Campos dos Goytacazes Cardoso Moreira Conceição de Macabu Macaé Quissamã São Francisco de Itabapoana São Fidélis São João da Barra 1990 3.702 0 567 0 50 180 65 0 30 2.810 2013 5.420 55 570 50 95 150 410 4.000 40 50 Fonte: Produção agrícola municipal (PAM) de 1990 e 2013 no SIDRA/IBGE Org: Erika Moreira (2015) A produção de leite também é uma atividade estratégica que foi adotada pelos produtores prejudicados com a crise da atividade canavieira. Entre 1990 e 2013, a 2836 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO produção regional saltou de 47 para 105 mil litros. O produto é escoado para os laticínios localizados na região, na região noroeste fluminense e no sul do Espírito Santo. Os municípios de Campos dos Goytacazes, São Fidélis e São Francisco de Itabapoana são os principais produtores de leite da região. Essa breve caracterização das estruturas produtiva e fundiária permite afirmar que o norte fluminense tem passado por alguns processos no campo. Primeiro, a elite agrária vem criando estratégias e alianças com outros setores (imobiliários, serviços), assim, a terra não é só um meio para produzir, mas também para especular. Segundo, o setor sucroalcooleiro passa por uma reconversão industrial, com a participação de grandes grupos do ramo. Terceiro, os conflitos agrários e a implantação de assentamentos rurais são ações políticas de resistência no campo. 2.2 - Questão agrária: novos atores em velhos dilemas No caso de Campos dos Goytacazes, o aumento da população rural está vinculado à implantação de assentamentos rurais por meio do Movimento dos Sem Terra (MST), conforme os dados da CPT. Entre 2004 e 2010, foram implantados 5 assentamentos rurais no município e, atualmente, existem 9 assentamentos. Data de Tipo o N . de famílias Organização criação Campos dos Gotacazes 24/5 50 FETAERJ Acampamento 2005 São João da Barra 23/7 100 MST Acampamento Campos dos Gotacazes s/i 170 s/i Área de conflito 2006 Cardoso Moreira s/i 80 s/i Área de conflito São Francisco de Itabapoana s/i 85 s/i Área de conflito Campos dos Gotacazes s/i 100 s/i Área de conflito 2007 Cardoso Moreira s/i 150 s/i Área de conflito São Francisco de Itabapoana s/i 53 s/i Área de conflito Campos dos Gotacazes 14/7 525 FETAG Acampamento 2011 Campos dos Gotacazes 30/7 52 MST Acampamento Campos dos Gotacazes s/i 552 s/i Área de conflito 2011 São Francisco de Itabapoana s/i 12 s/i Área de conflito São João da Barra s/i 450 s/i Área de conflito Campos dos Gotacazes s/i 200 s/i Área de conflito Campos dos Gotacazes s/i 1 s/i Área de conflito 2012 Campos dos Gotacazes s/i 50 s/i Área de conflito São João da Barra s/i 450 s/i Área de conflito Quadro 01: Acampamentos e áreas de conflito no norte fluminense, entre 2005 e 2014. Fonte: CPT s/i: sem informação Org: Erika Moreira (2015) Ano Município 2837 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO O quadro 01 mostra que o norte fluminense é marcado pelos conflitos agrários, fruto de uma estrutura fundiária concentrada. “ Os assentamentos rurais da região, em sua maioria, são oriundos de ocupações realizadas em fazendas pertencentes a antigas usinas de cana-de-açúcar, que vivenciaram um processo falimentar a partir da década de 1980 (AQUINO, 2008, p.18)”. A partir dessas informações, observamos, em linhas gerais, que há um impasse entre o Estado (via políticas públicas) e a elite agrária (fundiária e imobiliária, no contexto atual). Mesmo com uma economia regional marcada, principalmente, pelos royalties do petróleo e gás, os indicadores sociais ainda mostram os graves problemas atinentes a essa questão. “Em um cenário „caótico de falência e fechamento de usinas, desemprego, que o MST retoma, a partir dos anos 1990, suas ações no Estado do Rio de Janeiro e volta sua atenção para a região Norte Fluminense. Havia ali uma vasta extensão de terras improdutivas em função das sucessivas falências ocorridas (MACEDO, 2006 apud AQUINO, 2008, p.18)”. 3- Considerações finais No contexto da região norte fluminense, buscamos evidenciar que o movimento migratório campo – cidade foi intenso entre os anos de 1970 e 2000, decorrente da crise no setor usineiro e a decadência da cana de açúcar; também se configura importante o movimento cidade – campo, a partir do limiar do século XXI, com as estratégias utilizadas pelos movimentos sociais e instituições publicas. Essas mudanças na estrutura produtiva, com o decréscimo na produção da cana-de-açúcar e o cultivo de raízes e frutas, não levaram a alteração de um problema estrutural, a concentração de terras e, consequentemente, o poderio da elite agrária. Na região norte fluminense, com ressalva de Campos dos Goytacazes, demais municípios apresentaram redução no pessoal ocupado e no número de proprietários entre 1996 e 2006. Alem disso, em decorrência da queda da renda agrícola, muitos agricultores buscaram entradas monetárias não-agrícolas em atividades vinculadas as plataformas da Petrobras. Em suma, o rural na região norte fluminense vem passando por mudanças, seja na redução da área cultivada com lavouras, seja na redução do quadro de pessoas ocupadas, enfim, alterações que não afetaram estruturalmente a concentração fundiária. 2838 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO 3 – Referências AQUINO, Silvia Lima; MENGEL, Alex Alexandre. 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