ID: 34011834 11-02-2011 Tiragem: 18200 Pág: 39 País: Portugal Cores: Preto e Branco Period.: Semanal Área: 26,79 x 13,23 cm² Âmbito: Economia, Negócios e. Corte: 1 de 1 PEDRO AZEVEDO Administrador da Golden Assets O Inverno do nosso contentamento A recente queda do indicador do desemprego, nos EUA, foi simultaneamente surpreendente e encorajadora. Com a média dos analistas a vaticinar um número de 9,5%, o valor efectivamente observado (9%) permitiu que diversos analistas clamassem vitória na batalha face à crise. Os números do desemprego, a confirmarem-se nos próximos meses, são a melhor notícia proveniente dos mercados financeiros desde que a cobiça e avidez humanas criaram essa arma de destruição maciça, a qual se imortalizará na história, como se de uma complexa fórmula química se tratasse, com o sugestivo nome de CLO (dívida colateralizada-subprime). Menos desemprego implicará mais consumo das famílias, logo melhores resultados para as empresas. O comportamento dos mercados financeiros nos últimos 2/3 meses ilustra o optimismo que neste Inverno tomou conta dos investidores: outrora descrentes e pessimis- tas, eles são agora os portadores da mensagem de boa-esperança. De facto, os índices accionistas americanos subiram bastante durante o último trimestre, acompanhando idêntico sentimento vivido no mercado de “commodities”. Até tempos recentes glorificadas, as obrigações do Tesouro americanas – consideradas o activo de último refúgio – parecem ter perdido atractividade, ultimamente. A subida do mercado accionista e das mercadorias e a melhoria observada na criação de emprego estão a criar condições para que os analistas possam rever o crescimento em alta. No entanto, alguma inquietação subsiste: será esse crescimento inflacionista? Teme-se que o programa de recompra de activos (600 mil milhões de dólares) por parte do FED – essencialmente constituído por compra de treasuries (dívida pública americana) – crie um excesso de liquidez no sistema que, desvalorizando o valor da moeda, produza inflação. Estes temerosos analistas vêm na tendência de va- lorização do ouro, prata e cobre, mas também do petróleo, bem como na subida, ao longo da curva, dos yields das obrigações americanas, argumentos para sustentar as suas teorias. Aqui chegados, devo dizer que partilho estas preocupações. Não haja mal-entendidos, os Estados Unidos são (e serão) o propulsor da economia mundial e, como tal, quaisquer bons indicadores aí produzidos terão sempre impacto positivo noutras economias, como a nossa, permitindo, nomeadamente, recentrar a discussão na previsível recuperação económica, enquanto meio de salvaguardar o pagamento da dívida pública. No entanto, mais recentemente, diversos membros do FED parecem antagonizar posições com a linha condutora de Ben Bernanke. Nunca como hoje foram tão visíveis diferenças de opinião entre os Conselheiros da Reserva Federal. Os mais alarmistas, como Lacker ou Fisher, tentam antecipar o fim do programa de recompra de activos, pesarosos de que tal a não acontecer criará uma aceleração dos preços, posteriormente bastante difícil de combater. Estas novas expectativas inflacionistas poderão servir de suporte ao dólar, na medida em que a subida dos yields americanos crie nos investidores a oportunidade de regresso aos “carry-trades”, negócio em que se compra uma moeda com taxa de juro mais alta, vendendo-se a taxa de juro mais baixa. Assim, e na expectativa de subida de taxas de juro nos EUA, os operadores poderiam retirar o dólar da incómoda companhia do iene (como moedas com taxas de juro insignificantes), cabendo posteriormente ao mercado resgatar a moeda americana como activo de referência. Enfim, a Primavera que se avizinha trará provavelmente resposta a muitas dúvidas aqui expressas. Terão estes últimos meses sido ilusórios? O desemprego regressará em força? Conseguiremos sustentar crescimento sem inflação? Muitas perguntas de difícil resposta, hoje. Resta-nos saborear o momento (favorável), que faz deste tempo o Inverno do nosso contentamento!