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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
A CONURBAÇÃO DA GRANDE FLORIANÓPOLIS
E A ATUAÇÃO DO CAPITAL
VICENTE NASPOLINI1
Resumo: Este trabalho apresenta o estágio atual da pesquisa sobre o tema do planejamento urbano
da chamada “área conurbada da Grande Florianópolis”, a qual estrutura-se em três temas: a) o
desenvolvimento da área conurbada e a atuação do Capital; b) a viabilidade do planejamento num
contexto de fragmentação administrativa; c) o cotidiano entrelaçado das cidades conurbadas. O
caráter disperso das cidades atuais acarreta na fusão dos tecidos urbanos e no entrelaçamento de
seus cotidianos sem submeter-se a um planejamento e gestão integrados do território. Há perda da
totalidade e do vínculo entre as ações e a realidade a que se destinam. Esta é a primeira
fragmentação do espaço urbano: a institucional. Sob esta, opera uma segunda fragmentação, a
operada pelo Capital. O crescimento urbano da região liga-se às formas que o Capital assume para
se reproduzir, entendendo-se as dinâmicas impostas ao território numa contínua união e disputa entre
essas formas.
Palavras-chave: Planejamento Urbano; Conurbação; Capital
Abstract: This paper presents the current state of the research on the topic of urban planning of the
called "conurbation of Greater Florianópolis", which is divided into three themes: a) the development of
the conurbation and the performance of the Capital; b) the feasibility of planning in the context of
administrative fragmentation; c) the interlaced daily lives of conurbation cities. The dispersed nature of
the current cities entails the merging of the urban fabric and the intertwining of their daily lives without
undergoing the integrated planning and land management. There is loss of wholeness and the link
between the actions and the reality to which they refer. This is the first fragmentation of urban space:
institutional. Under this, it operates a second fragmentation, operated by the Capital. Urban growth in
the region is bound to forms that Capital takes to breed, understanding the dynamics imposed to the
territory on a continuous union and struggle between these forms.
Key words: Urban Planning; Conurbation; Capital
1 – Introdução
Oriundo de pesquisa destinada a futura formulação de tese de doutorado,
este artigo pretende apresentar seu atual estágio de desenvolvimento, ainda na fase
da fundamentação teórica. Trata-se de um estudo de caso da “conurbação da
Grande Florianópolis”, constituída pelos municípios de São José, Palhoça e Biguaçu,
além da própria capital catarinense que lhe dá o nome e em torno da qual se
desenvolveu a aglomeração. O amplo tema no qual se insere o trabalho
corresponde ao planejamento urbano de “cidades conurbadas”, por vezes
designadas como “regiões metropolitanas”: viabilidade, necessidade e abrangência.
1
- Acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa
Catarina (PPGG-UFSC). E-mail de contato: [email protected]
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Pressupõe-se que o caráter disperso das cidades atuais, brasileiras ou
não, acarreta na fusão dos tecidos urbanos de municípios vizinhos e no
entrelaçamento de suas dinâmicas locais cotidianas. Entretanto, tal entrelaçamento
não vem acompanhado de novas institucionalizações do planejamento e gestão do
território. Apesar de ser um assunto já debatido há décadas, ainda se administram
cidades conurbadas como um fato isolado, como um sistema fechado de lógicas
internas próprias e cuja interligação com sistemas vizinhos se daria por lógicas
externas de outra ordem. A região objeto aqui não foge a este paradigma. Busca-se
aqui, então, contribuir à superação desse contexto.
As quatro cidades da Grande Florianópolis, após anos de rápido
crescimento populacional, dispersão territorial e amalgamento dos seus processos,
formaram uma só cidade na prática cotidiana, mas não na sua gestão e, por isso, se
veem impelidas a equacionar os variados problemas urbanos surgidos da
fragmentação das políticas urbanas, intensificados sobremaneira a cada verão
devido ao grande afluxo de visitantes. Numa época em que os municípios se veem
obrigados a revisar seus Planos Diretores, torna-se imperativo haver uma avaliação
e resolução conjunta, “supramunicipal”, dos problemas e fenômenos urbanos que
implicam processos e usos do território que desconsideram os limites administrativos
oficialmente constituídos. Essa conjunção de esforços possibilita a apreensão das
dinâmicas a partir da perspectiva da totalidade pois ao não se fragmentar a gestão
do território não se fragmenta a base de efetivação dessas dinâmicas. Hoje, ao
contrário, devido ao processo de planejamento e gestão territoriais ficarem
confinados nos limites municipais, há a perda da totalidade e, portanto, do vínculo
entre as ações e a realidade a que se destinam.
A premissa fundamental e justificadora do trabalho é a consideração da
conurbação em tela como um todo maior do que a soma das suas partes
constituintes e encontra ressonância nas palavras de Peluso Jr. que, já em 1981,
afirmou que “Florianópolis, mercê do aumento de sua população, deixou de ser
cidade individual, podendo, presentemente, ser compreendida, apenas, pela
conurbação de que faz parte com São José, Palhoça e Biguaçu” (PELUSO JR,
1981, p. 29, grifo nosso).
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A hipótese a ser defendida é a de que, com um “Plano Diretor Integrado”,
de escala urbana e territorial, entre os quatro municípios, as políticas e os projetos
públicos estariam mais próximos da realidade que buscam modificar, mas, para
efetivá-lo,
é
necessária
a
configuração
de
uma
instância
administrativa
“supramunicipal” responsável pelos planejamentos territoriais.
2 – Procedimentos metodológicos
Reconhecendo a pesquisa como uma “aproximação sucessiva da
realidade que nunca se esgota, fazendo uma combinação particular entre teoria e
dados” (SILVA; MENEZES, 2001, p. 20), propõe-se realizar, no trabalho em
desenvolvimento, uma busca pela compreensão da complexidade do objeto em
estudo através de suas frações constituintes.
Antes de tudo, deve-se construir o objeto de forma a produzir um
conhecimento que o transcenda, como sustenta Corrêa (2003). Segundo ele, as
frações ou segmentos da realidade, se tornam objetos ao serem construídos a partir
das suas identificações e problematizações consistentemente articuladas entre si.
Cada objeto carregará consigo características singulares e universais que o
vinculam ao todo do qual foi destacado intelectualmente.
A identificação do objeto surge dos “recortes” temático (o tema
nitidamente delineado), espacial (os limites do espaço e localização do tema) e
temporal (o momento e o contexto do tema espacialmente definido). Mesmo assim,
a identificação temático-espaciotemporal do objeto não é suficiente pois não há a
identificação do problema a ser investigado. A problematização do objeto é
apreendida quando se responde à questão “por quê?”.
Assim sendo, podemos identificar e problematizar o objeto construído por
este trabalho respondendo clara e suscintamente às quatro perguntas acima:
a) Recorte temático: Planejamento urbano de cidades conurbadas;
b) Recorte espacial: Área conurbada da Grande Florianópolis (quatro municípios:
Florianópolis, São José, Palhoça e Biguaçu);
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c) Recorte temporal: para contextualizar o tema definido espacialmente, o ideal é
entender a região desde o começo da ocupação do território, mas aprofundando
do século XX em diante, até os dias atuais.
d) Problematização: A constatação de que a fusão do cotidiano das quatro cidades
não recebe um planejamento urbano que dê conta da complexidade inerente. A
realidade do fenômeno urbano atual exige um planejamento não fragmentado,
territorial, que compartilhe diretrizes comuns e projetos independentes das
divisões administrativas.
A fim de fundamentar a problematização do objeto, questionamentos
precisam ser feitos. Por se tratar de um trabalho na área da Geografia, deve-se
compatibilizar a questão central com o objeto. Como afirma Gomes (2009, p. 27): “o
tipo de questão construído pela ciência geográfica é aquele que se interroga sobre a
ordem espacial [dos fenômenos]” Pode-se utilizar, como sugestão, as características
de um contexto geográfico dadas por Gomes: a) como se dá o arranjo físico das
coisas, pessoas e fenômenos?; b) quais planos, coerências, lógicas ou razões que
orientaram e orientam a dispersão desses elementos sobre o espaço?; c) como
estrutura-se a trama locacional dos elementos que compõem o objeto de estudo
geográfico?
Considerando essas questões, o problema a ser analisado é a
compartimentalização do planejamento em territórios de municípios limítrofes que,
apesar de independentes politicamente entre si, formam uma aglomeração urbana
integrada espacial, social e economicamente em seu cotidiano. Ou seja, enquanto a
realidade concreta dos fenômenos urbanos apresenta mais que uma simples
aglomeração e sim uma única grande cidade, a divisão administrativa do controle e
planejamento espaciais geram uma “policefalia” que impede a visão da totalidade e,
por conseguinte, fragmenta as ações públicas e seus efeitos sobre o território.
Outro cuidado que um trabalho geográfico deve ter, segundo Gomes, é
não se confundir com um trabalho de engenharia, pois este não envolve questões
epistemológicas. O objetivo deve ser o estudo científico do fenômeno de modo a lhe
conhecer por dentro, “discutir o complexo sistema de posições e de localização,
tentar desvendar o papel e a importância desse sistema na estrutura dos fenômenos
e demonstrar o valor dessa análise para a compreensão deles” (GOMES, 2009, p.
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30). Não objetiva aplicar algum conhecimento prévio a fim de solucionar problemas
práticos. Considerando que o autor tem formação em Arquitetura e Urbanismo, a
tendência a ir além de compreender os problemas estudados na pesquisa e buscar
resolvê-los tecnicamente é grande e, portanto, essa ressalva é fundamental.
O maior desafio de uma pesquisa é não distorcer a essência de um objeto
de estudo na busca de simplificá-lo. Seguindo o princípio “hologramático” de Edgar
Morin, “não só a parte está no todo, mas também que o todo está na parte” (MORIN,
2005, p. 181), portanto a complexidade inerente à realidade deve transparecer no
objeto independentemente do tipo e da extensão dos recortes da sua construção.
Isso obriga o pesquisador a levar em conta os “desafios” de lidar com um objeto
complexo como o do acaso e da desordem, da transgressão da abstração
universalista, das inúmeras interações e retroações, da unidade e da multiplicidade
concomitantes, da crise de conceitos fechados e claros e, talvez o mais instigante, a
volta do observador na sua observação.
Esses desafios são inerentes ao processo analítico obrigatório na
construção do objeto e na condução da pesquisa. Como ensina Milton Santos, tal
processo analítico deve ser dialético e contínuo, partindo da prática humana para as
teorias e destas para a práxis. Essa relação entre a teoria e o concreto também foi
abordada por Althusser (1978) quando afirma ser o “fim último” do discurso teórico o
conhecimento dos objetos concretos e singulares, “quer a sua individualidade (a
estrutura de uma formação social), quer os modos de uma individualidade (as
conjunturas sucessivas nas quais existe esta formação social) ” (ALTHUSSER,
1978, p.16). No entanto, tal conhecimento não é um dado imediato:
O conhecimento destes objetos reais, concretos, singulares, é o resultado
de todo um processo de produção de conhecimento, cujo resultado é aquilo
a que Marx chama “a síntese de uma multiplicidade de determinações”,
sendo esta síntese o “conhecimento concreto” de um objeto concreto.
(ALTHUSSER, 1978, p.17)
Neste processo, cumpre papel essencial a síntese operada pela categoria
de “formação econômica e social” por priorizar justamente a formação sobre a
forma, numa determinada época e espaço. As relações de interdependência
funcionais e estruturais entre os diversos elementos desse tempo-espaço devem ser
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tomadas para além da abordagem causal, organizando-as num todo estruturado
que, só a partir dele, pode-se extrair seus significados.
A operacionalização da pesquisa (o como?) depende da construção do
objeto, ou seja, da sua identificação problematizada. Como alerta Corrêa, as
informações qualitativas ou quantitativas, as técnicas e os modelos utilizados devem
ser compatíveis com os questionamentos formulados. As pesquisas a serem feitas a
respeito dos variados elementos, sejam eles a população, as firmas ou as
infraestruturas, devem ser historicizadas e especializadas, ou seja, precisamente
inseridas na história do lugar a fim de mensurar corretamente os seus valores.
Pretende-se,
então,
abordar
e
problematizar
subtemas
que
se
interpenetram mutuamente e configuram o objeto na sua complexidade. São esses
subtemas: a) a história do desenvolvimento urbano da região conurbada e as formas
assumidas pelo Capital nessa evolução; b) a viabilidade do planejamento urbano em
situações de conurbação ou metropolização e a possibilidade de efetivação de
organização territorial num contexto de fragmentação administrativa; c) o cotidiano
entrelaçado como efeito da contínua fusão urbana. Neste artigo, nos deteremos no
primeiro subtema.
Já como procedimentos específicos pretende-se utilizar:
•
Revisão bibliográfica sobre os diversos temas que dizem respeito ao objeto da
tese: planejamento urbano, geografia urbana, administração pública e outros;
•
Pesquisa histórica acerca da evolução socioespacial da região em questão;
•
Contextualização da situação local e regional nas realidades nacional e mundial;
•
Pesquisa acerca das leis e normas institucionais que intervieram no processo;
•
Levantamento de dados e pesquisa de campo que possam detalhar os diversos
elementos relevantes em sua evolução;
•
Produção de mapas e ilustrações que explicitem os conteúdos qualitativos e
quantitativos presentes no texto.
3 – Resultados e Discussão
O rápido crescimento urbano da região em vista está muito ligado às
formas que o Capital assume para se reproduzir. Este atua num determinado
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território tornando-o locus daquele modo de produção que lhe auferir o maior
rendimento possível. Conhecendo-se a realidade brasileira como um exemplo de
desenvolvimento desigual e combinado, “esdrúxula combinação de atraso, tradição,
modernidade, subdesenvolvimento, relações pré-capitalistas e capitalismo” (CANO,
2010, p. 4), pode-se entender as dinâmicas impostas ao território pelo Capital em
suas mais diversas formas, as quais às vezes se aliam, em outras disputam entre si.
A Grande Florianópolis pode ser analisada também sob essa perspectiva:
a da ação territorial dos diversos segmentos do Capital. Até meados do século XX,
vigorava por aqui uma economia de base agropesqueira pouco expressiva
associada a pequenas unidades manufatureiras e ao funcionalismo público das
esferas municipal, estadual e federal. Devido à sua estruturação baseada em
pequenas propriedades e terras comunais, além de uma população diminuta, a
região não consolidou um Capital Mercantil (comercial) de origem agrária capaz de
dominar os rumos do desenvolvimento. Também não foi capaz de resistir às
investidas do Capital Industrial quando este ganha impulso no Brasil a partir dos
anos 50.
É nessa época que Florianópolis recebe o seu primeiro Plano Diretor
buscando transformá-la a partir da industrialização e da urbanização. Segundo Reis,
“o plano revela a influência das políticas preconizadas pela CEPAL, com ênfase
colocada no desenvolvimento econômico da cidade, através do incentivo a
atividades industriais dinâmicas e modernas” (REIS, 2012, p. 171). Durante o regime
militar, essa ótica chega ao seu ápice ao expandir os planos industrializantes para a
região circundante pois, “de caráter nitidamente desenvolvimentista, tinha como
objetivo básico a transformação de Florianópolis num grande e moderno centro
urbano, num polo de desenvolvimento integrado por rodovias ao estado” (REIS,
2012, p. 173). O Estado se apresentava, então, como o promotor e organizador do
estabelecimento do Capital Industrial. O Capital Mercantil, em segundo plano mas já
crescendo em importância, se metamorfoseia, deixa de ser agrário e assume
“funções especializadas” (CANO, 2010). Passa a ser, então, fundiário, ou melhor,
imobiliário e mira no turismo que começava a despontar na região, principalmente na
Ilha de Santa Catarina, como pedra de toque da expansão urbana.
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Essa metamorfose do Capital Mercantil, plasmando uma “indústria”
imobiliária, ocorrida na região objeto não é fenômeno isolado, mas generalizado,
pelo menos nas cidades médias brasileiras, onde o fortalecimento dos mercados
fundiários e imobiliários significam “um peso relativo cada vez mais acentuado […]
no conjunto das atividades econômicas, maiores graus de complexidade dos
processos de estruturação intraurbana e, em vários casos, nas dinâmicas de
reestruturação” (MELAZZO, 2013, p. 30).
Ao fim e ao cabo, o plano desenvolvimentista sofreu resistências das
elites locais e teve implementado uma pequena parte de seus dispositivos,
mostrando assim uma gradual guinada nos interesses hegemônicos. Como conclui
Sugai, em sua análise dos investimentos públicos e dinâmica socioespacial na área
conurbada de Florianópolis,
[…] a classe dominante dirigiu o processo de distribuição espacial das
classes sociais na área conurbada de Florianópolis por meio da apropriação
dos territórios nos quais pretendia concentrar e expandir as suas áreas
residenciais e de lazer. Houve ocasiões em que ocorreram disputas entre as
frações do capital como, por exemplo, na decisão de priorizar a construção
da Via de Contorno Norte-Ilha em detrimento da Via Expressa Sul, na
década de 1970, ou ainda, na polêmica sobre a localização do campus
universitário da UFSC, no início dos anos 1960. Entretanto, nessas disputas
também predominaram os interesses do grupo hegemônico. (SUGAI, 2015,
p. 182)
Passadas algumas décadas e planos de uso do território, após
analisarmos a evolução e a conjuntura atual, vemos que a Grande Florianópolis está
atrelada, não a um conflito, mas a uma cooperação entre os Capitais Mercantil e
Industrial. Este expande sua área de atuação tanto no continente como na Ilha, com
indústrias convencionais ou de alta tecnologia vinculadas às universidades. Aquele
acompanha a expansão industrial e abre novas frentes para a migração com o apelo
turístico aliado ao discurso da “qualidade de vida”, sempre se servindo dos
investimentos públicos em suas áreas de atuação e, conforme expõe Cano,
“ganharão destaques, entre outras, as benesses do poder público amparando o
capital imobiliário regional, na construção civil, nas atividades imobiliárias, na
especulação urbana, na construção da infraestrutura urbana, etc.” (CANO, p. 3).
Fica claro esse aspecto ao se notar os inúmeros empreendimentos imobiliários
(loteamentos e condomínios) implementados na região conurbada (“Bosque das
Mansões”, “Cidade Pedra Branca”) e até em cidades mais distantes como Rancho
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Queimado, município de pouco mais de dois mil habitantes, onde na primeira
década do século XXI foram implantados mais de vinte condomínios horizontais em
suas terras agrícolas (MACARI, 2009).
Isso vai ao encontro da interpretação dos fenômenos sob o “paradigma do
conflito”. O território usado não é um dado natural e inerte, com valor intrínseco, mas
construído e valorizado de acordo com as circunstâncias e correlação de forças da
sociedade que o usa. “Assim, o mercado imobiliário seria dominado pelos interesses
de grupos e classes, em vez dos consumidores individuais; o Estado não teria o
papel de um árbitro neutro e passivo, mas, pelo contrário, seria um ativo agente”
(FARRET, 1985, p. 81). A interferência do Estado gera o valor ao alocar
investimentos e organizar o espaço nos moldes do Capital. “Nesta perspectiva,
portanto, o espaço perde o caráter passivo diante dos processos sociais, de modo
que a sua apropriação fica sujeita·aos conflitos e barreiras que caracterizam a
alocação do produto social” (FARRET, 1985, p. 81). Ou seja, o planejamento
urbano, quando presente na região, tem servido aos interesses do Capital em suas
diferentes formas, abrindo caminho aos investimentos e garantindo a rentabilidade.
4 – Considerações finais
A pesquisa encontra-se em seu estágio inicial. Ainda se faz necessário
um levantamento de dados que quantifique e dimensione a dinâmica do Capital em
suas diversas formas na Grande Florianópolis. Além disso, espacializar tais dados
também é de fundamental importância para a compreensão da produção dos
espaços urbanos na região conurbada.
Esse levantamento deve ser inserido no contexto das últimas décadas de
um Capitalismo financeirizado e desregulamentado, que insere as cidades num
ambiente de competição regional, impõe o estudo das dinâmicas globais do Capital
a fim de situar o significado e o caráter da produção recente do espaço urbano na
Grande Florianópolis.
A partir da Cidade de Florianópolis, também na condição de capital do
Estado de Santa Catarina, pode-se perceber nas últimas décadas (desde o
final do século passado e enveredando pelo século atual) como “nós”
estratégicos e significativos de urbanização ora e curso operam e
representam, nas devidas proporções, estágios de transformações
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socioespaciais associados com tentáculos de “modernidades globalizantes”.
(MACHADO, 2008, p. 229)
Essa articulação no espaço local de lógicas externas e completamente
estranhas à comunidade que o utiliza cotidianamente nos leva a levantar alguns
questionamentos acerca do processo de planejamento e qualidade dos ambientes
urbanos gerados por ele. O espaço da cidade sempre foi, sob o Capitalismo, mais
considerado por seu valor de troca do que pelo valor de uso. No entanto, nos últimos
tempos, tal abordagem tem ficado mais agressiva e se intensificado ao ponto de se
criar toda uma nova terminologia que lhe dê conta. As cidades, agora, implementam
um “planejamento estratégico” que, sendo “market oriented and friendly planning”,
buscam dotá-la de um “city-marketing” capaz de promovê-la na “guerra das cidades”
(VAINER, 2007).
As intervenções urbanas têm vindo então a viabilizar os grandes eventos
ou intensificar a carga imagética e publicitária, negligenciando os espaços cotidianos
utilizados pela massa da população. Estes são deixados à iniciativa privada parcelar
e empreender, fragmentando espacialmente uma realidade já fragmentada
institucionalmente.
5 – Referências Bibliográficas
 Livros
ALTHUSSER, Louis. Sobre o trabalho teórico. 2ª ed. Lisboa: Presença, 1978.
MORIN, Edgar. Ciência com consciência. 8ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2005.
REIS, Almir Francisco. Ilha de Santa Catarina: permanências e transformações.
Florianópolis: Ed. da UFSC, 2012, 281p.
SILVA, Edna Lúcia da; MENEZES, Estera Muszkat. Metodologia da pesquisa e
elaboração de dissertação. 3. ed. Florianópolis: Laboratório de Ensino a Distância
da UFSC, 2001.
SUGAI, Maria Inês. Segregação silenciosa: investimentos públicos e dinâmica
socioespacial na área conurbada de Florianópolis (1970-2000). Florianópolis: Editora
da UFSC, 2015.
 Capítulos de livros
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FARRET, Ricardo Libanez. “Paradigmas da Estruturação do Espaço Residencial
Intraurbano”. In: FARRET, Ricardo Libanez et al. O espaço da cidade: contribuição
à análise urbana. São Paulo: Projeto, 1985.
MACHADO, Ewerton Vieira. “(Re)Arranjos sócio-espaciais na produção da „Região
Metropolitana‟ de Florianópolis: Trajetórias e tendências”. In: SOUZA, Maria Adélia
(Org.). A Metrópole e o Futuro: Refletindo sobre Campinas. Campinas: Edições
Territorial, 2008, pp. 229-243.
 Monografias, dissertações e teses
MACARI, Anelise Christine. Condomínios fechados em áreas rurais: o caso de
Rancho Queimado na Região Metropolitana de Florianópolis. Dissertação
(Mestrado) - UFSC, CTC, PGAU-Cidade. Florianópolis: 2009.
 Revistas científicas
CANO, Wilson. “Reflexões sobre o papel do capital mercantil na questão regional e
urbana do Brasil”. Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, v. 27, p.
29-57, 2010.
CORRÊA, Roberto Lobato. “Análise crítica de textos geográficos: Breves Notas”.
Geo UERJ. Revista do Departamento de Geografia, Rio de Janeiro, nº. 14. pp. 0718, jul. 2003.
GOMES, Paulo Cesar da Costa. “Um lugar para a Geografia: contra o simples, o
banal e o doutrinário”. In: MENDONÇA, Francisco et al. (Orgs.) Espaço e tempo:
complexidades e desafios do pensar e do fazer geográfico. Curitiba: ADEMADAN,
2009, pp. 13-30.
MELAZZO, Everaldo Santos. Estratégias fundiárias e dinâmicas imobiliárias do
Capital financeirizado no Brasil. Revista Mercator. Fortaleza, vol. 12, nº 2, p. 29-40,
set. 2013.
PELUSO JR, Victor Antônio. "O crescimento populacional de Florianópolis e suas
repercussões no plano e na estrutura da cidade". Revista do Instituto Histórico e
Geográfico de Santa Catarina. 3ª fase, n. 03, 1981.
VAINER, Carlos B. Planejamento Territorial e Projeto Nacional: Os desafios da
fragmentação. ANPUR, Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, v. 9,
n. 1, mai. 2007.
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