ARTIGOS DE OPINIÃO Listar Todos Cogumelos: um recurso natural que urge preservar António Ferreira Borges Os cogumelos não são mais do que uma estrutura de reprodução de um fungo que, por norma, não se vê, por estar enterrado no solo, e que pode atingir, nalguns casos, várias dezenas de metros. Essa parte subterrânea do fungo é um emaranhado conjunto de filamentos microscópicos denominado micélio. Os cogumelos, também designados por carpóforos, esporóforos ou corpos frutíferos, por serem estruturas de reprodução, formam-se quando as condições ambientais (temperatura e humidade) são favoráveis. Normalmente estão associados a temperaturas amenas e a elevados teores de humidade; daí o seu aparecimento no Outono e na Primavera. Os fungos que originam os cogumelos formam associações micorrízicas com quase todas as espécies arbóreas, embora esta associação seja mais visível apenas em algumas delas, como por exemplo as espécies do género Pinus sp., Castanea sativa, Quercus sp., etc. Daí o aparecimento dos cogumelos maioritariamente junto destas árvores. Este tipo de fungos (existem outros tipos de fungos: saprófitas e parasitas) estabelece uma relação simbiótica com as plantas através das raízes, permitindo-lhes aumentar a superfície de absorção dos nutrientes e o volume de solo explorado pelo sistema radicular, podendo inclusive contribuir para a protecção das plantas contra certas doenças. A maior parte dos fungos produz esporos de dois modos diferentes: sexuada e assexuadamente. Enquanto os esporos produzidos sexuadamente são o resultado da fusão de dois núcleos de células parentais, gerando um núcleo haplóide, os esporos assexuados são formados por simples diferenciação do micélio. Nas nossas florestas aparecem todos os anos, durante os períodos do Outono e da Primavera, mas principalmente no Outono, quase sempre nos mesmos sítios, dezenas de tipos diferentes de cogumelos, variáveis em função das espécies arbóreas que servem de suporte ao fungo e das condições ambientais de cada época. Perante esta dádiva da natureza, tem-se assistido nos últimos anos a uma procura desenfreada deste precioso “ouro” da floresta, graças ao seu enorme valor comercial. É lamentável que esta exploração ocorra sem regras, desrespeitando completamente os ecossistemas em que emergem os cogumelos, e dos quais estes fazem parte integrante. A manta-morta é revolteada, em cada época, vezes sem conta, utilizando-se instrumentos inadequados, em muitos casos preparados especificamente para este fim. O revoltear constante da manta-morta condiciona a sua actividade microbiana: através da instabilidade mecânica dos materiais que a constituem, de alterações da temperatura, humidade, acidez, entre outras. Os cogumelos são recolhidos, na quase totalidade dos casos, para sacos de plástico, e sem se ter em atenção o seu grau de maturação (os mais novos são os mais valorizados); os cogumelos jovens ainda não garantiram a sua função de reprodução, através da dispersão dos esporos. Perante esta situação, e com o intuito de salvaguardar um bem que, e ao contrário da caça (que é res nullius), não é directamente de todos nós, mas sim dos donos das terras nas quais aparecem, embora constitua um importante património que não deixa de ser nosso, é 26/9/2007 urgente o seguinte: regulamentar a actividade de recolha dos cogumelos, definindo, entre outras coisas, um código de conduta do colector; obrigar todos os colectores a frequentarem uma acção de formação, na qual seja demonstrada a importância dos cogumelos enquanto seres vivos de um ecossistema complexo, a identificação dos principais tipos de cogumelos e o modo de efectuar correctamente a sua apanha. A frequência deste curso teria por objectivo a obtenção de uma licença, de carácter obrigatório, de âmbito concelhio, regional ou nacional, que habilitaria os colectores para a recolha de cogumelos; proceder, numa fase posterior, à inventariação de todos os tipos de cogumelos existentes nas nossas florestas e à identificação de zonagens por tipos, importância económica, interesse na conservação, etc. Pensamos que, com estas medidas, relativamente fáceis de implementar, podemos passar a assistir à recolha de cogumelos de um modo legal, responsável, e acima de tudo garantindo a preservação e a sustentabilidade deste precioso recurso natural que, gratuitamente, ainda vai aparecendo nas nossas florestas, apesar da redução que ano após ano vai sendo notória nalguns locais. © 2005 CAP / CENTRO DE FORMAÇÃO AGRÍCOLA DA GUARDA - QUINTA DAS RELVAS