JEAN MAUGÜÉ E CRUZ COSTA: SENTIDO E POTENCIAL

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JEAN MAUGÜÉ E CRUZ COSTA: SENTIDO E POTENCIAL FORMATIVO NA
PRIMERA FASE DA FACULDADE DE FILOSOFIA (FFCL/USP)
Eixo Temático 3: Pesquisa, Formação de Professores e Trabalho Docente
Pôster
Vinícius Tadeu de Almeida1
Resumo
Este trabalho de cunho histórico analítico tem como proposta de pesquisa, a
reconstituição do sentido e o potencial formativo para Formação Docente, através do
legado deixado pelos professores Jean Maugüé (1935 - 1943) e João da Cruz Costa
(1936-1948), os primeiros catedráticos oficiais da Faculdade de Filosofia da
Universidade de São Paulo (FFCL/USP). O trabalho constitui-se em três partes: 1) A
gênese do curso de Filosofia da USP; 2) O sentido de Formação para o professor
Jean Maugüé; e 3) A Filosofia na Formação para Cruz Costa.
Neste sentido,
Mauguë aponta-nos quão o processo formativo em Filosofia está diretamente
atribuído ao docente e ao aluno, que a ela se dedica (CORDEIRO, 2008). Pela obra
Ensino de Filosofia e Diretrizes, ele apresenta-nos também a concepção de
docência: o docente-intelectual, comprometido com a (re) construção dos
significados epistemológicos, legitimados por uma prática pedagógica entre o já
conhecido e ao conhecer, ou seja, entre o ensinado e ao ensinar. Nesse sentido, é
notável que os argumentos do docente e do filósofo se imbricam, ao ponto de serem
confundidos e potencializados durante a formação (CORDEIRO, 2008). Assim, Cruz
Costa, também trabalha, quando assume a cátedra, porém ressalta que o processo
formativo adquire sentido pela História das Ideias como construção do pensamento
filosófico e, portanto o ensino se faz e se prova na história (VAZ, 1961), quando se
toma consciência da concentricidade histórica (VITA, 1950).
Palavras-chave: Jean Maugüé; Cruz Costa; Formação Docente.
1
Professor de Filosofia. Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação: Formação
de Educadores da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), sob a orientação da
Profa. Dra. Marília Claret Geraes Duran. Bolsista CAPES/PROSUP. Pesquisador dos Grupos
de Estudos e Pesquisa: FORM‘AÇÃO (UMESP) e Religião e Modernidade (PUCMINAS).
GÊNESE DA PESQUISA
A CRIAÇÃO DA FACULDADE DE FILOSOFIA (FFCL/USP)
A Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo (FFCL/USP) inspirada
no modelo educacional universitário2 e na tradicional cultura filosófica francesa
adotou desde os seus contíguos metodológicos aos procedimentos intelectivos,
favorecendo o desenvolvimento da interdisciplinaridade de formação cultural.
Uma confluência marcada por intensos envolvimentos ideológicos da
intelligentsia brasileira
3
e com os objetivos da criação da própria Universidade de
São Paulo, em 1934.
[...] essa faculdade seria a unidade central da universidade:
desenvolveria pesquisa e ensino de alto nível nas ciências
humanidades, prepararia professores para o ensino secundário e
infundiria competência científica nas velhas faculdades profissionais
que haviam sido incorporadas à universidade quando essa foi
estabelecida.
(SCHWARTZMAN,
2006,
p.163)
Além do dever intelectual na formação de professores em Filosofia, a variante
franco-uspiana, constituiu o ponto de referência e a crítica da importância para
vívidas reflexões no plano ideológico, tendendo a acentuar a exigência pedagógica
possível pelas conquistas da Escola Nova·, pelo Estatuto das Universidades
brasileiras· e da Constituição de 1934·, que não entrarei em detalhes, pois, possui
uma gama de particularidades que ultrapassa os objetivos deste trabalho.
Sendo assim, a partir do Artigo 7º Decreto n. 6.283, 25 de janeiro de 1934, a
Faculdade de Filosofia estruturou o currículo do Curso de Filosofia, inicialmente
dividido em quatro grandes áreas especificas ou cadeiras: 1) Filosofia; 2) História da
Filosofia; 3) Filosofia da Ciência e 4) Psicologia. O que exigiu uma duração em três
anos. No primeiro ano o aluno cursava duas disciplinas das cadeiras de Filosofia e,
2
Os atributos essenciais da estrutura universitária são: a primazia da agregação, como
procedimento básico de seleção; o burocracialismo; seu caráter de sistema mais voltado para
os exames do que para o ensino (...) além da incapacidade para integrar os sistemas
universitários de ensino e pesquisa (PROTA, 1987, p.65). Em tempos atuais (1970) os
objetivos da formação geral e profissional integrados, formação cultural; pesquisa cientifica e
técnica associada ao ensino (PROTA, 1987, p.129).
3
[...] Dentre os interesses internos, foram mais repisados aqueles centrados na ―campanha
educacional‖ de Júlio de Mesquita Filho, à frente do jornal O Estado de S. Paulo. O propósito
era reagir a politica do governo federal. Como fator local, é possível identificar o clima de
renovação cultural proveniente da década de 20 e expresso pelo crescente movimento
modernista como responsável pela germinação que resultaria, dentre outras importantes
mudanças, na campanha pela criação da Universidade de São Paulo (CORDEIRO, 2008, p.
29)
uma, de Geografia e História. No segundo ano, o currículo contemplava mais três
disciplinas de Filosofia outras três disciplinas de Filosofia e uma das Ciências Sociais
e Políticas. E, finalmente, no último ano, eram oferecidas três disciplinas, das quais
pertencia a subsecção das Ciências Sociais e Politicas, entre elas: História da
Civilização, História da Civilização Brasileira e Direito Político. No quadro
esquemático, pode ser resumido assim4:
Quadro 01
DISCIPLINAS DO CURSO DE FILOSOFIA DÉCADA 30
ANO
DISCIPLINAS
I ANO
FILOSOFIA
II ANO
FILOSOFIA
III ANO
FILOSOFIA
PSICOLOGIA HISTÓRIA
DA
CIVILIZAÇÃO
HISTÓRIA
FILOSOFIA
SOCIOLOGIA
DA
DAS
FILOSOFIA
CIÊNCIAS
HISTÓRIA
SOCIOLOGIA
DA
FILOSOFIA
Ao passar por estas disciplinas, o aluno concluinte era considerado apto a
lecionar Filosofia, e obtinha a sua licença, conforme o artigo 11,
Art.11 – Terminado o curso (...) ao candidato será dada licença
cultural respectiva, considerando licenciado em filosofia (...).
Paragrafo Único – Fica facultada ao candidato a inscrição em
qualquer das secções, ou subsecções, para fazer o curso seriado
completo, de três anos, ou o curso de uma ou mais disciplinas de
escolha livre, segundo o critério de especialização.
Porém, quando a primeira turma estava para forma-se, o docente da Cadeira
de Filosofia, Jean Maugüé, percebeu a necessidade de fazer uma complementação:
―curso especial” de História da Filosofia:
1. O espinosismo 2. A vida e a obra de Espinoza 3.Origens do
espinosismo 4. O problema do Bem Supremo 5. O Tratado
4
Este do quadro foi articulado pelo próprio pesquisador, baseado na tese de CORDEIRO,
Denílson Soares. A formação do discernimento: Jean Maugüé e a gênese de uma
experiência filosófica no Brasil. 2008.
Teológico-Político; 6. A religião; 7. A política. 8. O método; 9.
Deus; 10. Os atributos da substância; 11. A alma e o corpo; 12.
Os três graus do conhecimento; 13. Aspecto geral do
espinosismo. 14. Os sentimentos e as paixões; 15. A razão; 16.
Beatitude. (CORDEIRO, 2008, p.110).
Na apresentação do currículo acima, dos anos iniciais do curso de Filosofia,
ressalto, a divisão do trabalho intelectual foi direcionado a construção da cultura
filosófica, exigindo dos futuros professores ao ensino secundário, a tarefa de moldar
a consciência nacional (ARANTES, 1996). No entanto, havia outra etapa para pensar
e organizar a filosofia profissional, ou melhor, professores filósofos. Segundo
Arantes, a Filosofia institucionalizada ou universitária no Brasil encontrava-se na
condição ausente de formação, apenas uma espécie de enxerto sem solidez,
condenado a retaguarda dos estudos uspianos, contudo, na virada nos anos 30 aos
40, a Filosofia profissional destravou em momento de ascensão na leitura do ensaio
crítico brasileiro, encontrada na figura do professor francês Jean Maugüé, que
veremos a seguir.
CONTRIBUIÇÃO DE JEAN MAUGÜÉ
A contribuição de Jean Mauguë para a estruturação do curso de Filosofia na
USP foi de extrema relevância, pois, assinalou principio de enxergar a formação dos
filósofos no Brasil, que encontramos no manuscrito de suas aulas: O Ensino de
Filosofia e suas diretrizes (1935) 5, uma expressão de estudos que:
[...] desde o princípio, o compromisso de universitários brasileiros
com vistas a dar sua resposta a um desafio crescente: cisão entre,
por um lado, a dimensão especializada que, hegemônica, condena
o estudante a se tornar técnico a serviço da raquítica dieta
profissional nos dias de hoje e, por outro lado, a dimensão
multidisciplinar que, cada vez menos concreta, deveria a um
formando tratar de assuntos suscetíveis de interessar a todo mundo,
ou seja, pronunciar-se de modo inteligível acerca de tudo aquilo que
assumisse significado para uma vida nova justa. (CORDEIRO,
2008, p.21)
Mauguë alicerceia o seu curso na celebre fórmula kantiana: “Não se ensina
filosofia, ensina-se a filosofar”, numa tentativa de responder ou conceituar: “O que é
a Filosofia?”. Um conceito referente à realidade a partir do pressuposto ontológico,
ou seja, da pressuposição de que algo existe, possuindo uma essência, identidade
ou natureza própria. Assim, perguntando sobre qual seria a realidade ou a natureza
5
―[...] foi considerado a ‗certidão de nascimento‘ do Departamento de Filosofia da USP‖
(CORDEIRO, 2008, p.155).
das coisas, qual o seu significado, Mauguë organiza o curso de Filosofia. Para
CORDEIRO,
[...] há, segundo Mauguë, um caráter dialético envolvido na
arquitetura do problema. Pensamento, ensino e formação são
constituídos mutuamente, estão em relação de interdependência, as
vias que os interligam são de mão dupla. Tanto a filosofia é o
filosofo quanto o filosofo passa a ser a filosofia apresentada. Aqui
temos, por conseguinte, um dos primeiros predicados envolvidos à
pergunta original. (CORDEIRO, 2008, p.86).
Mauguë traça as seguintes diretrizes para a formação de docentes:
1) O ensino de Filosofia deve ser pessoal, tanto da parte do
professor como parte dos estudantes. Pede-se ao professor
reflexões que empenha a responsabilidade intelectual. Seria de
desejar que se pedisse aos estudantes um pouco mais de
personalidade. 2) A personalidade do estudante forma-se na
atenção dada às lições, sobretudo na reflexão, e mais ainda, pela
leitura, lenta, continua e mediata. 3) A leitura deve ser uma regra de
vida para o estudante. Ele não deve ler senão os bons autores. É
mais seguro ler aquele que o tempo já consagrou. A filosofia
começa com o conhecimento dos clássicos. 4) A História da
Filosofia, deve ter, no Brasil, um lugar primordial. Ela pode ser
ensinada, seguindo métodos rigorosos e perfeitamente modernos.
Não há vida presente sem o conhecimento da vida passada. 5)
Enfim, o futuro da Filosofia no Brasil depende da cultura que o
estudante tiver adquirido anteriormente. A Filosofia, segundo uma
das concepções da República, de Platão, nada mais é que o
coroamento dialético de um ensino harmônico e completo.
(MAUGÜÉ, 1996, p.56, grifos meu).
Por estas diretrizes, Mauguë traduz uma concepção de docência: o docenteintelectual comprometido com a (re) construção dos significados epistemológicos
legitimados na prática pedagógica dialética entre o conhecido e ao conhecer, ou
ainda, entre o ensinado e ao ensinar. Maugüé deixa bem claro, que o ensino de
Filosofia só passa a ter sentido quando, no processo do filosofar, o docente instiga o
seu interlocutor (aluno) a pensar e questionar os fenômenos reais do Mundo.
Por conseguinte, Mauguë nos assinala que o processo formativo (o Ensino de
Filosofia), é diretamente atribuído ao docente e o aluno em Filosofia, que a ela se
dedica, ―em relação dinâmica e mutuamente dependente, cuja qualidade interfere
decisivamente no resultado‖ (CORDEIRO, 2008, p. 90). Tal perspectiva foi assumida
mais tarde, pelo brasileiro, João da Cruz Costa, recém-formado professor. Desta
forma, evidencia-se uma subdivisão do curso da Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras - USP. O professor Cruz Costa, passou a lecionar Filosofia Geral. Cruz Costa
seguindo os passos do mestre, tinha o seguinte proposito com o seu curso:
O meu propósito, era trazer a reflexão filosófica ou crítica — e não
as filosofias — para desenrolá-lo da vida brasileira da qual eu
acreditava — e ainda às vezes acredito — há de emergir uma
cultura que nos seja própria, que caracterize o que somos no todo
da cultura humana. (CRUZ COSTA, p. 112, 2011).
Nesta concepção, a formação de professores em Filosofia no FFCL da USP,
estava relacionada com a consciência reflexiva e o valor do significado
epistemológico da Filosofia:
[...] traçar a sua orientação, tornar a achar a inteligência, o espírito
nos domínios do seu exercício e mesmo nos resultados de seus
esforços. (...) A filosofia é uma tentativa superior, de segundo grau.
Ela pretende reaver, na sua unidade abstrata esse poder [o poder
dos homens materializados nas ciências e nas artes], ou se se
prefere o sentimento desse poder. A filosofia é reflexiva. É o espírito
ou a inteligência que se apreende a si mesma. (MAUGÜÉ, 1996)
Deste modo, a primeira turma de professores filósofos, foi marcada por uma
visão holística das questões humanas, com leituras profundas de grandes clássicos,
pois, acreditava-se que o professor de Filosofia tem o dever de combater a ausência
de tato histórico e discernimento ao traduzir o sentido da obra em termos atuais:
O professor de filosofia também tem seus deveres neste combate:
traduzir o sentido da obra em termos atuais, para isso, ensina
Maugüé, ―ser-lhe-á suficiente revelar o que nele próprio se passa
enquanto estuda um velho autor‖; mostrar que a leitura de um
filósofo clássico sugere ideias e imagens que normalmente são
muito atuais; combater o desfile das ―marcas filosóficas‖
reposicionando-as, sem desprezá-las, nos seus níveis de
maturidade intelectual no conjunto de perspectiva filosófica; nunca
tomar ideias particulares por gerais; abandonar o falso prazer de
querer parecer ultramoderno; ―o que é necessário suscitar, avivar no
estudante o senso de reflexão e das ideias gerais: em suma, criar o
discernimento‖. (CORDEIRO, 2008, p. 93)
Assim, o percurso da formação docente em Filosofia na USP, em sua primeira
fase, foi constituído por uma prática de formação de ser ativo protagonista do fazerse humano, pela atividade da investigação. Tratando-se de um esforço para
desentranhar as próprias potencialidades do docente e dar forma a si mesmo na
abertura de seu espírito em direção à vida social, ao continuo processo de (re)
significar a própria educação do pensamento, fazendo com que cada um seja o
sujeito da sua própria história.
CRUZ COSTA
O professor João da Cruz Costa defendeu o ensino filosófico como se faz e se
prova na história (VAZ, 1961, p. 10), ou seja, uma ocorrência cultural referente à
criação de ideias como seu uso e sua operacionalização no processo histórico
brasileiro. Esta marcante forma de pensar provia diretamente das fortes influências
das leituras feitas principalmente de Sergio Buarque de Holanda6, Gilberto Freyre7 e
Caio Prado Junior8.
Sendo assim, Cruz Costa considera que o filosofar adquire sentido na história
das ideias que lhe concede significado conjugado às técnicas de erudição, o que fez
advertir aos seus alunos para ―as vicissitudes pelas quais passaram em nossa terra,
as correntes filosóficas estrangeiras, e, sobretudo, para a curiosa significação que
elas têm apresentado no evolver de nossa história‖ (VITA, 1950, p.22). O
conhecimento histórico é o caminho norteador a ser percorrido, necessário ao devir
humano, isto é, a conciliação entre o conhecimento teórico e as condições históricas.
Porém, não é restauração ou iluminação do passado como libertação.
Cruz Costa preocupado com os problemas da formação no Brasil, buscou em
suas aulas dar maior destaque aos estudos que possibilitaria a dialética de um
sistema filosófico: o positivismo no Brasil. por considerar que este ajudou a
transformar o momento histórico de nosso país (COSTA, 1956, p.138). Deste modo,
traz a superfície uma antiga questão: A Filosofia no Brasil, como um ensaio de
remontar uma criação de uma filosofia nacionalista:
[...] Reflitamos na nossa experiência colonial. [...] Untemos as
velhíssimas e enferrujadíssimas tradições que herdaram os
americanos para que assim mais maleáveis, elas nos possam
esclarecer sobre o verdadeiro sentido da História que é,
precisamente, o de libertar o homem do passado e dirigi-lo para as
transformações que a vida impõe. (COSTA, 1945, p. 69-70)
6
O cerne de seu pensamento encontra-se na célebre obra “Raízes do Brasil” (1936), que
consiste em uma macrointerpretação do processo de formação da cultura brasileira (...) a
importância do legado cultural da colonização portuguesa do Brasil e a dinâmica dos arranjos
e adaptações que marcaram as transferências culturais de Portugal para a sua colônia
americana (DIAS, 1994).
7
Manteve, porém, uma grande ligação com Pernambuco, em especial Olinda e Recife. Com o
livro "Casa-Grande & Senzala" (1933). O autor também tenta desmistificar a noção de
determinação racial na formação de um povo no que dá maior importância àqueles
cultural e ambiental.
8
―Após 1930, Caio Prado vai se tornar o mais influente historiador brasileiro, ―pegou o bastão‖
das mãos de Capistrano e prosseguiu, revigorando e acelerando a prova olímpica, histórica e
política, do ―redescobrimento do Brasil‖ (REIS, 1999)‖.
Neste sentido, suas aulas no curso de Filosofia faziam referência e crítica às
modas filosóficas:
Com o advento dos cursos regulares de Filosofia, a situação
modificou-se em parte. Começamos então a nos vestir mais
simplesmente, mais moderadamente, tendo em conta, por certo, a
9
moda, mas sem os atavios e falsos luxos filoneístas . Fugir a moda
não é fácil, mas vestir-se com exagero é ridículo. (COSTA, 2011,
p.111)
Apesar de defender a ideia de uma identidade nacional em Filosofia,
nunca admitiu que tivesse um projeto teórico de orientação, e por isso,
assumindo por conta própria o título de filosofante. E que, acima de tudo, é
necessária humildade intelectual: ―um professor simples, interessado, que
pode enganar os ingênuos e os pacóvios, mas não engana os que são bem
dotados‖ (CRUZ COSTA, 1960, p.114).
A pesquisa, ainda em caráter preliminar das características teóricas, apresenta
provocações e lacunas. Contudo, como sinaliza CRUZ COSTA: ―Mas, neste mundo
não pode responder a tudo (1960, p. 122), por isso a Filosofia é reflexão; é
inquietação‖. Não é esquematismo, não é dogmatismo. Alain já dizia, em um dos
seus Propos, que ―pensar é dizer não‖, que ―refletir é negar aquilo que se crê‖. (João
da Cruz Costa, 1960, p. 120). Assim, ―acredito que um professor simples,
interessado no seu trabalho, nunca escorrega no erro do brilhareco‖, (COSTA, 1960,
p. 114).
RESULTADOS PARCIAIS
Como resultados parciais nesta pesquisa, menciono alguns aspectos: 1) O
surgimento de uma nova forma de olhar para práticas pedagógicas dos professores
de Filosofia, fez de suas práticas uma forma de transmitir conhecimento filosófico ou
cultura, mas, a partir delas construir a identidade nacional; 2) Há, sobretudo, um
enriquecimento através da Faculdade de Filosofia, de determinar seu impacto no
âmbito social e educacional; 3) A constituição do filosofar Uspiano representou um
9
Uma crítica aos intelectuais brasileiros que aderiam a toda e qualquer novidade provinda de
outros continentes: (...) A Filosofia no Brasil sempre foi um produto de importação. (...) Na
Colônia, a escolástica importada de Coimbra; no Império, o ecletismo; a seguir o positivismo e
o evolucionismo, que chegaram até a República. Depois, o neokantismo, um pouco de
bergsonismo, muito ralo; o marxismo, o existencialismo e até Husserl, Hartmann e Heidegger!
(...) Mais recentemente, o estruturalismo. Até a fundação da Faculdade de Filosofia, o
filoneísmo dominou nossa cultura. Era importante haver lido a obra mais recentemente
publicada e, de preferência, no original. Mas não se indagava muito se o leitor assimilava o
que lera (COSTA, 2011, p.111).
esforço de desentranhar as próprias potencialidades institucionais, influenciando toda
uma forma de pensar e formar docentes para lecionar Filosofia.
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