Trabalho 298 O PAPEL DO ENFERMEIRO FRENTE AOS DISTÚRBIOS ALIMENTARES. Andrew Ferreira Ramos¹; Sônia Regina Jurado²; Natascha Alves Duarte³; Juliana de Souza Fonseca4; Jomara Brandini Gomes(5) Introdução: A anorexia e a bulimia nervosas são distúrbios da conduta alimentar que se caracterizam, respectivamente, pela abstenção voluntária dos alimentos e pela ingestão compulsiva seguida de vômitos, caracterizando-se como uma síndrome na qual ocorre uma série de distúrbios psicológicos e comportamentais associados a alterações somáticas características de desnutrição do tipo marasmática, principalmente nos casos de anorexia nervosa(1). Esses quadros têm sido descritos predominantemente em adolescentes do sexo feminino, de classe sócio-econômica média e alta, quase sempre em países desenvolvidos, sendo que a síndrome ocorre como consequência da obsessão dessas jovens pela busca de um “corpo perfeito”(2). Descrita como síndrome psicossomática, a anorexia nervosa compreende alterações somáticas importantes caracterizadas pela desnutrição proteica calórica e amenorreia, além de distúrbios psicológicos como depressão, fobia, compulsões, preocupação obsessiva com os alimentos, distorção de imagem corporal, entre outros, acreditando-se que a sua origem seja psicogênica, embora de natureza obscura(¹). À medida que a doença progride, muitas vezes iniciada com dietas para emagrecer aliadas a programas exaustivos de exercícios físicos, o emagrecimento tende a se acentuar levando ao quadro de desnutrição, ocasião na qual os familiares buscam tratamento médico, apesar da frequente resistência encontrada na paciente. No diagnóstico da anorexia nervosa é fundamental afastar doenças de caráter tumoral, hormonal, gastrointestinal, além de certos quadros psiquiátricos, como a depressão e a esquizofrenia. A partir da década de 80 do século XX, devido à surpreendente mudança que a anorexia nervosa vinha sofrendo nas suas formas de depressão/ou apresentação clínica em provável resposta às modificações ocorridas no contexto sócio cultural, descreve-se o novo quadro denominado bulimia nervosa, caracterizado por surtos de ingestão maciça dos alimentos, seguidos por comportamentos compensatórios de eliminação, por vômitos, uso abusivo de laxantes, diuréticos e atividade física excessiva(1). A etiopatogenia da bulimia nervosa inclui com grande frequência, conflitos familiares, história de abuso sexual na infância e questões sobre o desenvolvimento da feminilidade, ocasionando dificuldade no controle de impulsos, depressão crônica, exagerado sentimento de culpa e intolerância à ______________________________________ 1. Acadêmico do Curso de Enfermagem da UFMS. Campus de Três Lagoas. PET – Programa de Educação Tutorial –Enfermagem. E-mail: [email protected] 2. Profª. Adjunta e Chefe do Departamento de Enfermagem da UFMS. Tutora do PET – Programa de Educação Tutorial Campus de Três Lagoas. 3. Acadêmica do Curso de Enfermagem da UFMS. Campus de Três Lagoas. PET – Programa de Educação Tutorial –Enfermagem 4. Acadêmica do Curso de Enfermagem da UFMS. Campus de Três Lagoas. PET – Programa de Educação Tutorial –Enfermagem 5. Profª. Adjunta e Coordenadora do Curso de Enfermagem da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul / Campus de Três Lagoas. Doutora em Enfermagem Fundamental pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto / USP 1300 Trabalho 298 frustração e à ansiedade(3). As manifestações físicas apresentadas por pacientes com bulimia não são tão comprometedoras quanto ao estado nutricional, ao contrário do que é visto na anorexia nervosa. Vários distúrbios gastrointestinais, alguns deles sérios e potencialmente fatais, são descritos como dilatação gástrica aguda, inclusive com possibilidade de ruptura, hipertrofia de parótidas, desgaste do esmalte dentário, esofagite, esvaziamento gástrico, anormal e síndrome do cólon irritável. Faz-se necessário distinguir a bulimia da anorexia nervosa já que ela pode também acontecer como sintoma coadjuvante da mesma, ou de forma isolada, em subtipos de doença afetiva, esquizofrenia e obesidade, quando ocorrem episódios noturnos de voracidade em usuários de psicofármacos e deficientes mentais (1). O tratamento dos transtornos alimentares é desafiador e complexo, visto que se depara com um quadro de confusão, perplexidade e de franco desespero do paciente e de seus familiares. Assim, várias modalidades terapêuticas específicas são necessárias e desenvolvidas por equipe multiprofissional, tanto a nível ambulatorial quanto em situação de hospitalização dessas pacientes, seja em hospitais gerais ou psiquiátricos. Dentre as ações profissionais voltadas ao tratamento da anorexia e bulimia nervosas, destacam-se a terapia nutricional baseada na orientação e reeducação alimentar, a psicofarmacoterapia, a psicoterapia individual e a de grupo familiar (3). Frente à problemática descrita, denota-se que o enfermeiro e a equipe de enfermagem prestam assistência a essa clientela desempenhando ações preventivas, diagnósticas e terapêuticas, embora nem sempre tenham preparo adequado para lidar com pessoas acometidas pela síndrome dos distúrbios alimentares. Objetivo: identificar na literatura científica como ocorre a assistência de enfermagem voltada às pessoas acometidas pela síndrome dos distúrbios alimentares. Metodologia: Trata-se de uma pesquisa exploratória descritiva com base em fontes bibliográficas que garantem a fidedignidade das informações, nas quais se realizou uma revisão da literatura. A compilação dos dados foi realizada por meio das leituras exploratória, seletiva, analítica e interpretativa. Resultados: Na busca realizada na literatura sobre o tema deste estudo, verifica-se que as condições básicas para a assistência de enfermagem aos pacientes com transtornos alimentares são: conhecer a patologia, conhecer as reações adversas dos medicamentos, ter empatia e sensibilidade, estar preparado e apto para lidar com situações de risco como tentativa de suicídio e aplicar a SAE Sistematização da Assistência de Enfermagem, que deve ser individualizada e levar sempre em conta os fatores biológicos, sociais e psíquicos(4). Em nível de atenção voltada à prevenção dos distúrbios alimentares, o enfermeiro pode atuar exercendo seu papel de educador em saúde realizando ações educativas junto aos adolescentes e seus familiares, sendo que pelas características de sua formação profissional e por sua inserção em diferentes contextos de atuação tais como ambientes hospitalares, postos de saúde e escolas, ao ter contato direto com comunidades tem facilidade em atuar como intermediário entre o conhecimento científico e o senso comum, ampliando as dimensões do cuidar 1301 Trabalho 298 voltadas a prevenir os adolescentes quanto ao risco de desenvolverem a síndrome dos distúrbios alimentares(5). O momento ideal para o início das ações educativas voltadas à prevenção desses distúrbios é a partir de 10 anos de idade em ambos os sexos, já que é normalmente nesta faixa etária que as crianças começam a notar as mudanças corporais em função da aproximação do início da puberdade, ocasião propícia para que se possa responder às dúvidas que possuem sobre essa fase pela qual estão passando. Nas ações educativas desenvolvidas pelo enfermeiro é de fundamental importância que as informações a respeito dos transtornos alimentares sejam apresentadas com uma linguagem simples, acessível a todos e que sejam abordados dois tópicos principais: o primeiro trataria de esclarecer sobre as características diagnósticas, epidemiológicas, comportamentais, fatores desencadeadores e de risco para o seu desenvolvimento. O segundo trataria de discutir as exigências da mídia sobre o padrão de beleza atual, destacando atitudes preventivas e práticas saudáveis de alimentação e esportes, e alertando para o perigo da utilização de medicamentos e dietas sem acompanhamento médico, informando onde e quando procurar atendimento especializado, destacando que o preconceito e a demora em procurar ajuda, aumentam os prejuízos à saúde das pessoas acometidas por estas doenças (6). A assistência de enfermagem também é prestada às pessoas que desenvolveram a síndrome de anorexia nervosa ou bulimia e apresentaram comprometimentos físicos e/ou emocionais muito severos e que necessitam de atendimento hospitalar, seja em hospitais gerais e em hospitais psiquiátricos. Nesse tipo de atendimento, o enfermeiro sistematiza a assistência utilizando-se do Processo de Enfermagem para prescrever e implementar os cuidados adequados a essas pessoas, buscando assim uma forma holística de intervenção. Para que esta intervenção seja efetiva, implica considerar o sujeito, o seu sofrimento psiquíco e todos os outros fatores envolvidos, quer sejam eles de ordem biológica, cultural ou psicossocial no plano de cuidados da enfermagem, que deve buscar o alívio do sofrimento dessas pessoas e permitir-lhes o crescimento e a liberdade de fazer escolhas maduras. Para tanto, o planejamento da assistência deve ser individualizado, elaborado em conjunto com a pessoa e estabelecido um contrato de aceitação e responsabilidade mútua (7). Alguns dos cuidados voltados ao aspecto biológico das pessoas hospitalizadas para tratamento das complicações dos distúrbios alimentares são: rigorosa observação clínica (sinais vitais, eliminações fisiológicas, ingestão hídrica, queixas álgicas), sondagem gástrica prescrita pelo médico caso haja recusa em alimentar-se, administração de medicamentos prescritos e observação de possíveis efeitos colaterais dos mesmos, dentre outros(4). Todas as ações de enfermagem devem ser norteadas pelas três medidas consideradas essenciais no relacionamento com qualquer paciente: apoio, estabelecimento de limites e ajuda na expressão de pensamentos e sentimentos(7). Quanto a essas medidas terapêuticas que devem ocorrer no relacionamento interpessoal entre equipe de enfermagem e pacientes, o oferecimento de apoio pode ser realizado com a permanência ao lado do paciente aceitando-o sem preconceitos, mostrando suas 1302 Trabalho 298 características sadias, estimulando sua participação em grupos de atividades como jogos e técnica de relaxamento, estando disponível e incentivando-o no tratamento. O estabelecimento de limites pode ser obtido pela conduta firme do profissional e pela não omissão da informação sobre o que está sendo realizado no tratamento(4), levando a pessoa a modificar comportamentos prejudiciais a si e aos outros, bem como estabelecer padrões de comportamento mais maduros do ponto de vista psicológico, devendo ser usado principalmente quando são identificados comportamentos como o boicote às intervenções da equipe, nas situações de autopunição e quando ocorre desrespeito ao contrato firmado (7). A ajuda na expressão de pensamentos e sentimentos deve ser desenvolvida por meio do uso de técnicas de comunicação terapêutica como “saber dizer não”, “repetir comentários”, “deixar frases em aberto”, “ouvir em silêncio”, entre outras, principalmente nas situações em que se identificam falta de autocontrole, falta de diferenciação entre emoção e fome e nos momentos em que o sentimento de culpa pela ingestão de algum alimento tortura o paciente(7). Conclusão: A magnitude da problemática que envolve os distúrbios alimentares na atualidade aponta para a necessidade de novas dimensões do cuidar, exigindo dos enfermeiros compreensão mais profunda de suas ações enquanto educadores, para que novos caminhos possam ser trilhados na busca de uma assistência que privilegie o ser humano em sofrimento psíquico. Contribuições/implicações para enfermagem: Possibilitar a reflexão dos enfermeiros acerca de seu papel profissional voltado à assistência de enfermagem necessária às pessoas vitimadas pelos distúrbios alimentares. Descritores: Papel do Enfermeiro, Anorexia Nervosa, Bulimia Nervosa. Referências: 1. Ribeiro RPP ; Santos PCM ; Santos JE. Distúrbios da conduta alimentar: anorexia e bulimia nervosas. Medicina, Ribeirão Preto 1998; 31: 45-53. [online]. [Acessado em: 13 de março. 2011]; Disponível em: www.fmrp.usp.br/revista/1988 2. GRANDO, LH. Família e transtornos da alimentares: uma forma singular de estar no mundo. 2005. 162 p. Tese (Doutorado). Escola de Enfermagem. Universidade de São Paulo. [online]. [Acessado em: 24 de março. 2011]; Disponível em: www.teses.usp.br/teses/disponiveis/ 3. Morgan CM ; Vecchiatti IR ; Negrão AB. Etiologia dos transtornos alimentares: aspectos biológicos, psicológicos e socioculturais. Rev Bras Psiquiatria, São Paulo, 2002; 24 (suppl.3). [online]. [Acessado em: 13 de março. 2011]; Disponível em: www.scielo.br/scielo.php 4. Castillo ARGL. Anorexia, bulimia e obesidade. Barueri, São Paulo: Manole; 2004. 5. Ribeiro, B. Anorexia nervosa: o enfermeiro na orientação e prevenção. 2007. 1303 Trabalho 298 6. Oliveira AS ; Antonio PS. Sentimentos do adolescente relacionados ao fenômeno Bullying: possibilidades para a assistência de enfermagem nesse contexto. Revista Eletrônica de Enfermagem. 2006; 8(1): 30-41. [online]. [Acessado em: 5 de março. 2011]; Disponível em: www.fen.ufg.br/revista/revista8_1/original_04.htm 7. Grando LH. Representações sociais e transtornos alimentares: as faces do cuidar em enfermagem. 122p. Dissertação (Mestrado). Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. 2000. [online]. [Acessado em: 7 de março. 2011]; Disponível em: www.teses.usp.br/teses/disponiveis/ Informações: Área temática: Processo de cuidar em Saúde e Enfermagem Eixo temático do evento: "Ciência de Enfermagem em tempos de interdisciplinaridade" Forma de Apresentação: Pôster 1304