Aplicações Industriais das Radiações Ionizantes Datação

Propaganda
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
ESCOLA DE ENGENHARIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA NUCLEAR
Curso de Extensão em Radiologia Industrial, Gamagrafia e
Medidores Nucleares para Técnicos
Aplicações Industriais das Radiações
Ionizantes
Datação, Esterilização e Detecção de
Fugas
Prof. Sergio V. Möller, Dr.-Ing.
LMF – Laboratório de Mecânica dos Fluidos
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
Rua Sarmento Leite, 425
90050-170 Porto Alegre, RS
F: 51- 3316 3228, Fax:3316 3255
[email protected]
http://www.mecanica.ufrgs.br/lmf
DATAÇÃO POR 14C
Desde 1950, quando o método de datação por 14C foi colocado em prática, tornou-se a
principal ferramenta para a determinação cronológica de episódios originados a
aproximadamente 40000-50000 anos passados, nas áreas de arqueologia, geologia,
paleobotânica, paleoclimatologia, etc. A invenção do método é creditada a W.F. Libby (19081980) em 1949, pelo qual recebeu em 1960 o Prêmio Nobel em Química. O método tem por
base a contínua produção do carbono radioativo (14C) na alta atmosfera, pela interação de
nêutrons cósmicos com átomos de nitrogênio (14N) através da reação [14N (n, p) 14C], ou seja:
14
N7 + 1n0 → 14C6 + 1H1
(1)
O 14C é então oxidado a 14CO2 e entra no ciclo global do carbono (Figura 1).
14
C + O2 → 14CO2
(2)
Plantas assimilam 14C durante a fotossíntese e animais comem plantas. Assim, todos
os seres terrestres vivos mantêm sua entrada de 14C durante a vida. O 14CO2, como o CO2,
dissolve-se nos oceanos e está disponível ao plâncton, corais, moluscos e peixes, de modo que
todos os seres durante sua vida reabastecem-se continuamente do 14C. Na morte das plantas
ou animais a entrada do 14C cessa. O tempo da morte pode ser estabelecido pela determinação
do 14C residual. O 14C decai com uma meia-vida de 5730 anos a 14N.
Estudos teóricos e experimentação mostram que existe equilíbrio entre o 14C
assimilado por um ser vivo e a respectiva taxa de decaimento. O valor de equilíbrio em um ser
vivo é de 15,3 desintegrações por minuto por grama de carbono. Este valor dá origem ao
método para a determinação do tempo transcorrido desde a morte de um determinado material
orgânico. A equação que descreve a atividade específica do 14C em um material orgânico é
Figura 1 - Diagrama indicando a formação natural do 14C na alta atmosfera, sua incorporação
nos seres vivos (vegetais e animais) e o decaimento radioativo após a morte dos mesmos.
ASp = 15,3 e −0 , 693T / 5568
(3)
onde:
ASp é a atividade específica
T o tempo em anos transcorrido desde a morte.
Por convenção internacional utiliza-se até hoje o valor da meia-vida de 5568 anos
determinado na década de 50, que sabidamente apresenta um erro da ordem de 3%. A idade
14
C convencional é calculada com base em 95% da atividade normalizada a -25‰ (por mil)
para o fracionamento isotópico do padrão, Ácido Oxálico distribuído pela NIST (National
Institute of Standards and Technology), e reportada em anos AP (Antes do Presente), sendo
Presente o ano de 1950:
(4)
onde,
Aon = atividade normalizada do padrão ácido oxálico (cpm)
Aox = atividade líquida do padrão ácido oxálico (cpm)
δ13COx = δ13C do CO2 obtido na síntese do ácido oxálico
A atividade normalizada da amostra é calculada através da equação:
(5)
onde,
An = atividade normalizada da amostra (cpm)
Aa = atividade líquida da amostra (cpm)
δ13Ca = fracionamento isotópico da amostra em relação ao padrão PDB
O tempo decorrido em anos AP é dado pela relação:
(6)
A atividade de 14C de uma amostra é determinada empregando-se contadores
proporcionais gasosos, espectrômetros de cintilação líquida de baixo nível de radiação de
fundo e/ou a técnica de AMS (Accelerator Mass Spectrometry), que é utilizada para amostras
com concentração inferior a 0,1g de carbono.
A idade 14C é baseada primariamente assumindo a constância da concentração do 14C
(relacionado ao 12C) no passado. Entretanto, observaram-se variações na razão 14C/12C do
dióxido de carbono na atmosfera devido a variações no campo magnético terrestre, e na
atividade solar.
Estas variações foram estudadas e estabelecidas, datando-se amostras de anéis de
crescimento de árvores por dendrocronologia.
Outro aspecto importante a ser considerado na determinação da idade 14C
convencional, é a correção por fracionamento isotópico. Ao absorverem o CO2 atmosférico
para realizar o processo de fotossíntese, as plantas o fazem de forma discriminatória em
relação aos isótopos 12C e 13C, que introduz erros no cálculo da idade 14C. O cálculo deste
fracionamento é feito empregando-se a equação a seguir, sendo o resultado expresso na
unidade δ13C:
(7)
onde R = 13C/12C.
O valor de δ13C é expresso por mil (‰) e representa a proporção da razão 13C/12C de
uma amostra em relação a do padrão PDB (Belemnitella Americana). Amostras orgânicas ou
inorgânicas que se encontram incorporadas ao ciclo global do carbono, devem ser corrigidas
para -25‰.
Os testes nucleares realizados nos anos 50 e 60, ocasionaram uma produção excessiva de
vários radionuclídeos entre eles o 14C na atmosfera devido a reações dos nêutrons liberados
com o nitrogênio, conforme a reação [14N (n,p) 14C]. Esta ação antropogênica recebeu o nome
de efeito “fallout” ou poeira radioativa. Determinações da atividade do 14C na atmosfera
indicaram que aos 2 x 1030 átomos de 14C existentes antes dos testes nucleares foram
adicionados 6 x 1028 novos átomos.
Em conseqüência das alterações da atividade do 14C após os testes nucleares, o método de
datação por 14C apresenta como limite mínimo para a determinação da idade o ano de 1950.
No entanto, o acréscimo na atividade do 14C atmosférico tem contribuído para os estudos
ambientais e climatológicos recentes.
Como se pode ver, há uma grande quantidade de incertezas cercando o método do 14C, por
isso, este método é usualmente utilizado juntamente com algum ouro método de datação ou
utilizando-se alguma referência (amostra) adicional.
EXEMPLO:
Um pedaço de madeira carbonizada encontrada em uma escavação em ruínas na região
central dos Estados Unidos apresentou uma atividade de 0,510×10-3 microcuries. A amostra
de carbono pesava 525 gramas após separação e processamento. Qual é aproximadamente a
idade da civilização existente na época em que foi cortada a árvore que deu origem à amostra?
Solução:
Primeiramente deve-se determinar a atividade específica da amostra:
dpm
0,5 ×10 −9 (curies) ⋅ 3,7 × 1010 (dps ) ⋅ 60( s )
= 2,16
ASp =
g
525( g )
Da equação (3)
ASp = 15,3 e −0, 693T / 5568
2,16 = 15,3 e −0 , 693T / 5568
(3)
ou seja,
0,7701 = 2,7279 −
0,693 T
5568
Resolvendo para o tempo T obtém-se
T = 15633 anos
Ou seja, a civilização existiu a cerca de 16000 anos.
Determinação de Fugas (vazamentos) em Tubulações
Fugas em tubulações enterradas ou submersas podem ser detectadas introduzindo-se
traçadores radioativos no sistema. Detetores portáteis podem, então, localizar áreas
radioativas que indicam o ponto de fuga. Este procedimento evita que uma grande escavação
deva ser realizada para localizar o ponto onde uma tubulação está rompida.
São utilizados radioisótopos beta-emissores como o Irídio-192 ou Tecnécio-99, que
também são utilizados em sistemas de esgotos para determinar a dispersão de dejetos em
emissários oceânicos, usualmente a distâncias de 3 km da costa.
A radiação proveniente do radioisótopo não deve ser detectada dentro do duto, e sim
quando há uma fuga para o solo que circunda o local da fuga. Uma vez determinado o local
do vazamento e o mesmo reparado, o solo deve ser descontaminado. Para facilitar esta tarefa,
um radioisótopo com meia-vida curta como o sódio-24, que tem uma meia-vida de 15 horas,
pode ser utilizado
Esterilização
Materiais cirúrgicos como agulhas, fios e compressas podem ser esterilizados por meio
de irradiação gama. A radiação ionizante mata todos os microorganismos atrvés da ruptura de
seu DNA.
Um sistema típico de esterilização possui fonte de cobalto-60 com capacidade da
ordem de 3 milhões de curies. Os produtos a serem esterilizados já embalados são levados em
esteiras para a sala do irradiador. A fonte de radiação, antes estocada em uma piscina, é
erguida ao nível do material a ser irradiado. Os produtos são submetidos a uma dose
absorvida mínima de 25 kGy e o processo é automático. O processo de esterilização leva
cerca de 6 horas e não há necessidade de quarentena, apenas dosimetria para a confirmação da
dose de radiação recebida. Não há resíduo de radiação no produto. Durante todo o processo os
produtos permanecem em sua embalagem, não sendo manuseados até a sua utilização final.
Produtos que não podem ser esterilizados por meio de radiação gama, como teflon,
polipropileno e suturas absorvíveis (poliglactina), são esterilizados com produtos químicos
(óxido de etileno) e necessitam quarentena posterior.
Irradiação de Alimentos e Sementes
Alimentos que são facilmente deterioráveis, como vegetais, frutas, aves e peixes,
podem ser irradiados para prolongar sua durabilidade. A radiação gama, produzida por fontes
de cobalto-60 e césio-137, mata bactérias, fungos e esporos, retarda ou impede a germinação,
proporcionando o aumento da vida útil do produto.
A irradiação de alimentos é um processo físico comparável à pasteurização, por isso,
muitas vezes chamado “pasteurização a frio”. Além de radiação gama podem ser utilizados
raios-X e feixes de elétrons, em ambientes adequados semelhantes ao utilizados em
esterilização.
Vantagens da irradiação:
1. Redução ou eliminação de microorganismos que podem causar doenças.
2. O valor nutricional dos alimentos irradiados é essencialmente inalterado: macronutrientes, tais como proteínas, carbohidratos e gorduras são relativamente estáveis a
doses até 10 kiloGrays. Micronutrientes, especialmente vitaminas podem ser sensíveis a
qualquer método de processamento de alimentos. Sob condições ótimas, até 1 kGy a
alteração das vitaminas é insignificante. Outras condições podem vir a afetar o teor de
vitaminas como a temperatura durante a irradiação.
3. Não são produzidas alterações químicas perigosas nos alimentos: E geral, pequenas
alterações químicas nos alimentos podem ser produzidas, porém não daninhas ou
perigosas à saúde. A principal alteração é a formação e produtos chamados “radiolíticos”,
alguns bastante familiares como a glucose, ácido fórmico e dióxido de carbono que estão,
todavia, presentes naturalmente nos alimentos. A quantidade média formada quando um
alimento é irradiado a uma dose até 1 kGy é, no entanto, da ordem de 3 mg por kg de
alimento.
4. Não há alteração significativa da aparência dos alimentos.
5. O alimento não fica radioativo: quando os alimentos são expostos a altas doses de
radiação, a radiação induzida é da ordem de um milésimo de becquerel, isto é, cerca de
200 mil vezes inferior à radiação natural do mesmo.
Limitações da irradiação de alimentos:
1. Pode ser aplicada a um número limitado de alimentos: tecnicamente, qualquer alimento
pode ser irradiado, a limitação ou restrição depende da aprovação de instituições.
2. Ainda é uma tecnologia cara, porém os custos estão, hoje em dia, estão se tornando
compatíveis com outras tecnologias (embalagem a vácuo, supercongelamento, etc.) com
crescentes vantagens.
O quadro a seguir, extraído da Revista Brasil Nuclear, descreve um irradiador de
alimentos.
Na tabela da página seguinte, estão listados vários tipos de alimentos, as doses
necessárias e os resultados a serem alcançados com a irradiação.
Vista de um iradiador de alimentos (Fonte: Brasil Nuclear)
Tabela 1: Tipos de alimentos, doses necessárias e os resultados a serem alcançados com a
irradiação.
Tipos de alimentos
Dose ( kGy)
Carne, aves, peixes,
20 - 71
crustáceos, alguns vegetais,
pães e alimentos preparados
1.0 máximo
Resultados esperados
Esterilização. Os produtos tratados
podem ser armazenados à temperatura
ambiente sem deterioração. Os
produtos tratados podem ser utilizados
para a alimentação hospitalar em
pacientes que necessitam dietas
microbiologicamente estéreis.
Reduz o número de microorganismos e
insetos. Substitui produtos químicos
usados para esse propoósito
Retarda a deterioração ao reduzir o
número de microorganismos em
produtos frescos ou refrigerados. Mata
alguns tipos de bactérias venenosas
(salmonela) e parasitas.
Prolonga a vida útil da fruta impedindo
o crescimento de fungos
Mata insetos ou previne sua
reprodução. Pode eventualmente
substituir a fumigação feita após a
colheita com essa finalidade.
Retarda o apodrecimento
0.05 - 0.15
Inibe a formação de brotos
variável
Alterações físicas tais como a redução
de tempo de reidratação.
Temperos e especiarias
Até um máximo de
30
Carne, aves, peixes
0.1 - 10
Morangos e outras frutas
1-5
Grãos, farinhas, frutas,
vegetais e outros alimentos
sujeitos à infestação por
insetos
Bananas, abacaxis, mangas,
mamãos, goiabas e outras
frutas não-cítricas.
Batatas, cebolas, alho,
gengibre
Grãos, vegetais e frutas
desidratadas
0.1 - 2
Referências
Borges, V., Esterilização, Notas de Aula DENUC/UFRGS
Dantas, V., 1998, Proteção por Radiação, Brasil Nuclear, 17, pp. 22-23.
Foster, A. R. & Wright, Jr., R. L., 1977, Basic Nuclear Engineering, Boston, Ma: Allyn &
Bacon.
http://www.cths.nsw.edu.au/learning/science/nuclear/use_industry_irradiation.htm
http://www.cths.nsw.edu.au/learning/science/nuclear/use_industry_leakdetect.htm
http://www.extension.iastate.edu/foodsafety/
http://www.phys.canterbury.ac.nz/Courses2002/100Level/phys106coursework/phys106sectio
ns33to38.pdf
Lisi, C.S., Pessenda, L.C.R., 2003, Determinações das atividades do 14C de "fallout" nos
hemisférios norte e sul, in Laboratório de 14C. Técnicas e Aplicações em Estudos
Paleoambientais. http://www.cena.usp.br/labs/ApostilaPe.PDF.
Pessenda, L.C.R.; Lisi, C.S.; Gouveia, S.E.M., 2003, Datação por 14C, in Laboratório de 14C.
Técnicas e Aplicações em Estudos Paleoambientais. http://www.cena.usp.br/labs/
ApostilaPe.PDF.
Download