entre a segregação e o desenvolvimento: o parque dos

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Entre a segregação e o desenvolvimento: o Parque dos Buritis no contexto do programa
“Minha Casa, Minha Vida” em Castanhal, Pará
DOI: 10.17552/2358-7040/bag.v2n3p58-79
Willame de Oliveira RIBEIRO; Gleyce Thamirys Chagas LISBOA; Valdirene Martins FONSECA
ENTRE A SEGREGAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO: O PARQUE DOS BURITIS NO
CONTEXTO DO PROGRAMA “MINHA CASA, MINHA VIDA” EM CASTANHAL,
PARÁ
Willame de Oliveira RIBEIRO1 58
Gleyce Thamirys Chagas LISBOA2
Valdirene Martins FONSECA3
Resumo
Castanhal, no nordeste do Pará, passa por um considerável processo de expansão urbana, com destaque,
nos últimos anos, para os empreendimentos imobiliários relativos ao Programa “Minha Casa, Minha
Vida”, especialmente àqueles voltados à faixa de renda entre 0 e 3 salários mínimos, normalmente
localizados nas bordas da cidade. Este é o caso do Conjunto Habitacional Parque dos Buritis, lócus da
pesquisa, cuja problemática está orientada pelas seguintes questões: O conjunto Habitacional Parque dos
Buritis se constitui enquanto um espaço segregado? Qual o seu significado em termos de desenvolvimento
sócio-espacial? Por meio de levantamentos teóricos, documentais e de campo, com aplicação de
entrevistas, pôde-se constar que o empreendimento contribui decisivamente ao processo de segregação
socioespacial e que, apesar dos avanços referentes à garantia da casa própria a grupos desfavorecidos,
existe uma série de contradições no empreendimento à luz da concepção de desenvolvimento sócioespacial.
Palavras-chave: Programa “Minha Casa, Minha Vida”, segregação socioespacial, desenvolvimento
sócio-espacial.
BETWEEN THE SEPARATION AND DEVELOPMENT: THE PARK OF BURITIS WITHIN
THE PROGRAM "MY HOUSE, MY LIFE" IN CASTANHAL, PARA
Abstract
Castanhal, in northeastern Pará, goes through a considerable urban expansion process, highlighting, in
recent years, the real estate "My House, My Life" projects, especially those geared to income range
between 0 and 3 minimum salaries, usually located on the city's edges. This is the case with Housing
Complex Buritis Park, locus of research, whose problematic is guided by the following questions: is
Housing Buritis Park set constituted as a segregated space? What does it mean in terms of social and
spatial development? Through theoretical, documentary and field surveys, with application of interviews,
it can be noted that the project contributes significantly to the socio-spatial segregation process and that,
despite advances regarding the guarantee of home ownership for disadvantaged groups, there are a number
of contradictions in the project according to the socio-spatial development concept.
Keywords: "My House, My Life" Program, socio-spatial segregation, social and spatial development.
1
Geógrafo, Professor Assistente II da Universidade do Estado do Pará – UEPA e Doutorando em Geografia pela
Universidade Estadual Paulista – UNESP/Presidente Prudente. E-mail: [email protected]
2
Licenciada em Geografia e Mestranda em Educação de Ciências Matemáticas pelo IEMCE/UFPA. E-mail:
[email protected]
3
Licenciada
em
Geografia
e
Especialista
em
Gestão
Escolar
pela
UEPA.
E-mail:
[email protected]
Boletim Amazônico de Geografia (ISSN: 2358-7040 - on line), Belém, v. 02, n. 03, p. 58-79.
jan./jun. 2015.
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FONSECA
INTRODUÇÃO
A cidade de Castanhal, o mais importante centro urbano do nordeste do Pará e que
desde 2011 está oficialmente incluso na Região Metropolitana de Belém, apresenta razoável
crescimento populacional e de seu espaço urbano. E acompanhando esse dinamismo da
cidade, tem se destacado nos últimos anos as ações do Programa “Minha Casa, Minha Vida”
– PMCMV do Governo Federal, que possui uma série de empreendimentos em Castanhal.
Com implicações bastante complexas, os empreendimentos do programa suscitam muitas
discussões e apesar da inquestionável importância social tem recebido um considerável
número de críticas. Essa complexidade e essas contradições foram investigadas no Conjunto
Habitacional Parque dos Buritis.
A problemática da pesquisa foi assim estabelecida: O conjunto Habitacional Parque
dos Buritis se constitui enquanto um espaço segregado? Qual o seu significado em termos de
desenvolvimento sócio-espacial?
Para conhecer a realidade desse conjunto foi necessário, além da indispensável
construção de uma fundamentação teórica adequada, uma pesquisa documental sobre o
empreendimento, trabalhos exploratórios de campo e trabalhos de campo para aplicação de
entrevistas semiestruturadas, que serviram a uma posterior análise qualitativa da realidade
estudada. As entrevistas foram aplicadas preferencialmente a responsáveis pela família, em
ruas distintas, para tentar com a amostragem ter diferentes concepções acerca do conjunto.
O trabalho está dividido em quatro partes. Primeiramente é feita uma discussão sobre a
cidade de Castanhal e o processo de expansão urbana que marca este centro urbano na
atualidade. Em seguida se apresentam os empreendimentos do Programa “Minha Casa, Minha
Vida” e a sua inserção nesse contexto de expansão urbana. Feito isso, o trabalho se concentra
na análise da realidade do Conjunto Habitacional Parque dos Buritis, primeiramente,
discutindo o empreendimento em suas vinculações com o processo de segregação
socioespacial e, por fim, considerando o significado do mesmo em termos de
desenvolvimento sócio-espacial.
A EXPANSÃO URBANA DE CASTANHAL
Cortada pela BR-316, Castanhal tem sua dinâmica econômica diretamente atrelada à
rodovia e atualmente tem se caracterizado pelo aprofundamento das inter-relações com
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Belém, o que também se expressa no eixo rodoviário, com a duplicação da BR-316 no trecho
entre as duas cidades, e é formalmente reconhecido por meio da inclusão de Castanhal na
Região Metropolitana de Belém - RMB em 2011, por força da Lei Complementar n. 076, de
28 de dezembro de 2011, que altera a Lei 027, de 19 de outubro de 1995 (DIÁRIO OFICIAL
DO ESTADO DO PARÁ, 28 DE DEZEMBRO DE 2011, CADERNO 2, p. 8).
Um dado que chama bastante atenção em Castanhal nas décadas recentes é o aumento
de sua população. Como pode ser observado no gráfico 01, baseado nos censos do IBGE, em
1980 Castanhal contava com uma população de 65.246 habitantes; em 1990 a população
alcança o número de 98.452 habitantes e em 2000 já era da ordem de 134.496 habitantes. Em
2010 essa população chega a 173.149 habitantes, com uma densidade demográfica de 168,29
hab/km2 (IBGE, 2014). Dessa forma, a população quase triplicou em três décadas, o que pode
ser considerado um crescimento populacional bastante expressivo e que, inevitavelmente,
possui reflexo sobre a malha urbana, que também se expande fortemente nas últimas décadas
(ver figura 01).
Gráfico 01: Evolução populacional do Município de Castanhal (1980 – 2010)
Fonte: IBGE, 2014.
O mapa mostra que de 1984 a 1994 Castanhal expandiu sua área urbana em 18%, de
1994 a 2008 em 26% e de 2008 a 2013 em 13%. A expansão dessa malha urbana ocorre a
partir da ampliação dos espaços periféricos da cidade, cuja origem está na atuação de uma
diversidade de agentes: o Estado, por meio da construção de Conjuntos Habitacionais na
periferia; os promotores imobiliários, através da conversão de área rural em urbana a partir de
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loteamentos, em geral, com infraestrutura precária, e os grupos sociais excluídos (CORRÊA,
1995), que por meio da ocupação de terras e do mecanismo da autoconstrução dão origem a
assentamentos precários.
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Figura 01: Expansão da malha urbana de Castanhal (1984 – 2013)
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Castanhal possui uma estrutura urbana relativamente simplificada, com apenas uma
área central bem definida e que serve de referência, com uma boa concentração de comércio e
serviços, não apenas a toda a sua área urbana e rural, mas também às pequenas cidades do
entorno, como São Francisco do Pará, Terra Alta, Inhangapi e Igarapé-Açu. A área central se
estabelece nas intermediações de eixos rodoviários importantes, como a Avenida Barão do
Rio Branco, principal via da cidade, a Rodovia BR-316, a PA-136 e a PA-320.
Para Whitacker (2007, p. 04) o centro e os subcentros são “[...] uma concentração
localizável e localizada na cidade, distinguindo-se entre si pela complexidade, abrangência e
com a possibilidade de alguma hierarquia”. Já a centralidade não seria definida pela
localização, “mas pelas articulações entre localizações”, desse modo, a centralidade possui
uma natureza dinâmica e mutável.
No caso de Castanhal, não existem subcentros de comércio e serviços, contando a
cidade apenas com centros de vizinhança, a exemplo do Jaderlândia e do Distrito do Apeú. Os
fluxos de toda a cidade convergem para o centro, o que pode ser observado no transporte
coletivo, cujos itinerários, sem exceção, percorrem o centro da cidade. Assim, apesar do
rápido crescimento da cidade e do dinamismo econômico alcançado com a crescente
integração ao restante da Região Metropolitana de Belém, não ocorreu em Castanhal
movimento no sentido da configuração de outras centralidades intra-urbanas, ao contrário, a
dinâmica atual tem contribuído ao reforço do centro preexistente.
Essa característica mononuclear da cidade acaba reforçando o perfil periférico de suas
bordas. Chaveiro e Anjos (2007) explicam que a definição de periferia não se reduz à noção
geométrica da distância em relação ao centro da cidade, segundo eles, “[...] a periferia possui
um cotidiano específico, bem como uma modalidade de tempo social que define a vida dos
sujeitos. Poder-se-ia dizer que é um lugar específico de dramas sociais, de problemas e
vicissitudes humanas” (p. 183).
Na realidade brasileira atual, não são raros os casos em que a definição da periferia
pela distância do centro se torna problemática, já que diversos processos atuam na valorização
de áreas da cidade, criando atrativos em locais distantes do centro, deslocando população de
média e alta renda para essas áreas e, portanto, as desvirtuando enquanto periféricas.
Entretanto, não é isso que se observa em Castanhal, onde, por enquanto, a distância para o
centro ainda é um bom critério na definição da periferia.
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Em Castanhal, a expansão da malha urbana ocorre por meio da expansão das
periferias, acompanhando os eixos de circulação, neste caso, três ganham destaque: o eixo da
BR-316, a leste da cidade; o eixo da PA-320, em direção a São Francisco do Pará, a nordeste
da malha urbana; e o eixo da Rodovia Transcastanhal, a noroeste. Como se observa na figura
01, os dois primeiros eixos tem muita importância na expansão urbana de 1984 a 1994, e
estão relacionados tanto à constituição de conjuntos habitacionais quanto à expansão pela
ocupação de grupos sociais excluídos e o desenvolvimento da autoconstrução. Nesse caso,
vale frisar o Bairro do Jaderlândia, eixo leste, originado de uma ocupação em 1985, um dos
bairros mais populosos de Castanhal e que apresenta características típicas de uma periferia
urbana, concentrando pobreza, violência, precários serviços públicos etc.
No período de 1994 a 2008 se verifica a importância dos três eixos de expansão
anteriormente citados, mas com uma participação mais expressiva dos loteamentos privados e
de conjuntos habitacionais estatais. Já na atualidade, nota-se uma redução expressiva das
ocupações por grupos sociais excluídos e um fortalecimento da expansão da cidade a partir da
promoção imobiliária de loteamentos e também por meio das políticas públicas de habitação,
agora, num novo momento, com a criação em 2009 do Programa Minha Casa Minha Vida. Os
empreendimentos do programa tem forte impacto na expansão da malha urbana de Castanhal
e seguem os mesmos eixos de expansão já implementados por outros agentes.
O PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA EM CASTANHAL
O Programa Minha Casa Minha Vida foi lançado pelo Governo Federal em 2009
visando, de um lado, reduzir os efeitos nacionais da crise econômica internacional de 2008,
que atingia o sistema financeiro e o mercado imobiliário; e, de outro lado, possibilitar o
atendimento das famílias com renda de até 10 salários mínimos pelo mercado de habitações.
O PMCMV, de acordo com Cardoso e Aragão (2013), “[...] foi aprovado pela Medida
Provisória nº 459, publicada em 25 de março de 2009, posteriormente convertida na Lei n.
11.977, de 7 de julho 2009, e pelo Decreto no 6962, de 17 de setembro de 2009”.
Ainda segundo os autores, esse programa, que envolve aumento do volume de créditos
para compra de habitações e redução de juros, pretendia construir um milhão de moradias em
um curto período e tinha para isso a alocação de R$ 34 bilhões. Possuindo metas estabelecidas
a partir das várias faixas até 10 salários mínimos de renda, o programa previa para a faixa de 0
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a 3 salários, a construção de 400 mil casas, utilizando-se do Fundo de Arrendamento
Residencial, do PMCMV Entidades, do Programa Nacional de Habitação Rural e do PMCMV
para municípios com população de até 50 mil habitantes.
Os empreendimentos do PMCMV que compõem a presente análise estão inseridos na
modalidade de 0 a 3 salários mínimos, executada por meio do Fundo de Arrendamento
Residencial. O processo é conduzido por pelo menos três agentes fundamentais: a construtora,
responsável pelo projeto; a Caixa Econômica Federal, que administra os recursos financeiros;
e a Prefeitura Municipal, que seleciona os beneficiários e informa a Caixa e, em alguns casos,
também é responsável pela oferta do terreno.
Segundo a Secretaria Municipal de Habitação4 de Castanhal a seleção das famílias a
serem beneficiadas obedece a critérios preestabelecidos pelo PMCMV, como o limite de
renda até três salários mínimos e a existência de dependentes (ou se tratar de idoso ou
deficiente). O acesso ao Programa ocorre por meio do seguinte trâmite: realização de cadastro
no site da Prefeitura Municipal de Castanhal; contato por telefone da Secretaria de Habitação
com o potencial beneficiário; realização de entrevista para identificar a situação de
vulnerabilidade social; levantamento da documentação exigida pela Caixa. Ao final desse
processo é composta uma lista de beneficiários que é enviada à Caixa e atendida à medida que
os empreendimentos são materializados.
Quadro 01: Empreendimentos do Programa Minha Casa Minha Vida em Castanhal
EMPREENDIMENTO
Nº DE UNIDADES
LOCALIZAÇÃO
SITUAÇÃO
HABITACIONAIS
499
Novo Estrela
Parque dos Castanhais
500
Parque dos Buritis
496
Jardim dos Tangarás
Entregues
332
Jardim dos Ipês
Fonte Boa
Amarelo
344
Jardim dos Ipês Rosa
360
Jardim dos Ipês Roxo
376
Jardim dos Ipês Branco
1000
Jardim Imperador
Residencial Japiim I e II
Em construção
500
Bom Jesus
Jardim das Flores
688
Heliolândia
Residencial Girassol II
Fonte: Secretaria Municipal de Habitação de Castanhal.5
4
Informação verbal obtida em entrevista realizada em 21 de maio de 2014 com representante da Secretaria.
Informação verbal obtida em entrevista realizada em 21 de maio de 2014 com representante da Secretaria.
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Desde o seu lançamento em 2009, foram entregues 7 empreendimentos do
PMCMV/faixa 0 a 3 salários mínimos em Castanhal e existem mais três que estão sendo
construídos, como demonstra o quadro 01.
A quase totalidade dos empreendimentos é formada por casas de dimensões reduzidas,
contendo os cômodos mais fundamentais. A exceção fica por conta dos Ipês Amarelo, Rosa,
Roxo e Branco, que são constituídos tanto por casas quanto por apartamentos. Considerados
em conjunto, o Jardim dos Ipês é o maior dos empreendimentos com 1412 Unidades
Habitacionais (UH), sendo 332 casas e 1080 apartamentos.
A despeito da inquestionável importância da oferta de habitações à parcela da
sociedade que não consegue adquirir a moradia por meio do mercado imobiliário, existem
problemas que precisam ser discutidos, como pressuposto à melhoria do próprio programa.
Este é o caso da localização dos empreendimentos.
Na cidade de Castanhal as áreas periféricas, ou seja, as áreas precarizadas em termos
infraestruturais, são exatamente as mais afastadas em relação ao centro da cidade. Isso ocorre
porque a cidade está estruturada em torno de um único centro, não existindo, assim,
subcentros. O que se verifica são apenas centros de vizinhança. Desse modo, a localização dos
empreendimentos do PMCMV nas extremidades da malha urbana fornece um caráter
extremamente periférico a esses, ocasionando reforço ou promoção do processo de
segregação socioespacial, já que a inserção dessas áreas no contexto urbano se apresenta
bastante problemática por conta de sua localização, especialmente quando se consideram as
condições de acesso a bens e serviços, normalmente, centralizados.
A segregação materializa no espaço as desigualdades pertinentes às relações sociais e,
a partir daí, se torna um fator de interferência nessas desigualdades, especialmente de reforço
a elas. De acordo com Lefebvre (2008), a segregação faz parte da reprodução das relações
sociais de produção e é, ao mesmo tempo, uma negação da cidade, porque se opõe a sua
condição enquanto espaço de reunião, e sua revelação, já que expõe, no plano espacial, sua
natureza desigual e contraditória.
O reforço a dinâmicas de segregação já largamente presentes na sociedade
contemporânea se apresenta enquanto uma contradição importante de uma política, como o
PMCMV, voltada à promoção do acesso a uma necessidade fundamental, a moradia, pois este
acesso deveria diminuir as distâncias entre os grupos sociais formadores da cidade, mas, com
a segregação, essa desigualdade acaba sendo potencializada. Para Corrêa (1995) a segregação
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é marcada pela existência de forte homogeneidade social internamente a um determinado
espaço e de grande diferenciação em relação aos espaços externos.
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Figura 02: Os empreendimentos do Programa Minha Casa Minha Vida em Castanhal
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Essa homogeneidade interna e a diferenciação com relação ao entorno fica evidente
nos empreendimentos em questão, isso porque existe um limite de renda de até 3 salários
mínimos para a inclusão nessa modalidade do programa, garantindo assim uma grande
homogeneidade interna, já a diferenciação em relação ao entorno pode ser compreendida em
dois níveis: num primeiro, o padrão construtivo promove a diferenciação em relação ao
entorno imediato, as diferenças de renda aqui são pequenas uma vez que se tratam de grandes
espaços periféricos; num segundo nível, comparando as áreas dos empreendimentos com a
cidade em sua totalidade, se percebe uma diferenciação mais forte, marcada pela polarização
do centro e seu entorno em relação aos empreendimentos e seu amplo entorno periférico.
Claramente, esses empreendimentos do PMCMV em Castanhal se configuram como
um processo de segregação imposta (CORRÊA, 1995), já que o controle do processo não
pertence aos grupos sociais residentes, mas, principalmente ao Estado, por meio da Caixa
Econômica Federal, da Prefeitura Municipal e, em alguns casos, do Governo do Estado; e aos
grupos privados, representados pela construtora. Nessa associação entre o Estado e o capital
privado está a decisão sobre o formato da política, a dimensão, as características, a localização
dos empreendimentos e, também, quem serão os beneficiários.
Como pode ser observado na figura 02, os empreendimentos do PMCMV, na
modalidade até 3 salários mínimos, estão, em Castanhal, sem exceção, localizados em áreas
de expansão periférica da cidade. Alguns empreendimentos, como os Jardins dos Ipês, o
Jardim dos Tangarás e o Residencial Girassol II, possuindo contiguidade com essas áreas
periféricas; os demais, Parque dos Castanhais, Parque dos Buritis, Residencial Japiim I, II e
Jardim das Flores, apresentando distanciamento em relação à malha urbana, mesmo a
periférica.
A partir daqui será destacado o Parque dos Buritis, no Bairro Novo Estrela, cuja
origem está em loteamentos privados recentes, compondo uma área de expansão ao norte da
cidade, acompanhando o eixo da Rodovia PA-136.
O CONJUNTO HABITACIONAL PARQUE DOS BURITIS E A SEGREGAÇÃO
SOCIOESPACIAL
O Parque dos Buritis, com 500 residências, é um dos empreendimentos do PMCMV
em Castanhal com maior apelo social, já que se volta ao estrato social de até 3 salários
mínimos de renda. Em média vivem nas residências aproximadamente 04 pessoas, entre
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crianças e adultos, e a casa disponibilizada para cada família é de 37,7 m2, contendo dois
quartos, uma sala, uma cozinha e um banheiro. De início, constata-se que as casas possuem
cômodos de dimensões muito reduzidas, especialmente a cozinha, porém o que chama mais
atenção é a má qualidade dos materiais utilizados na construção, pois, na grande maioria das
casas, as portas da frente e da lateral já estão oxidadas em decorrência da exposição ao sol e à
precipitação.
A renda familiar dos moradores do Conjunto Habitacional Buritis varia de R$ 200,00 a
R$ 1.810,00 (dados das entrevistas realizadas em maio de 2014), ficando dentro do limite de
renda definida pelo PMCMV, na faixa de 0 a 3 salários mínimos. Essa homogeneidade da
renda familiar é um importante fator a contribuir para a caracterização do processo de
segregação socioespacial. O mesmo se nota com relação ao nível de escolarização. As
entrevistas apresentaram 50% dos moradores com o ensino fundamental incompleto, 20%
com o ensino médio incompleto e 30% com o nível médio completo, demostrando que a
maioria dos habitantes do conjunto possui um grau de instrução baixo e apontando para uma
homogeneidade interna e, portanto, para a ocorrência do processo de segregação
socioespacial.
Entretanto, existem outros importantes fatores a serem considerados na caracterização
do processo de segregação, como, por exemplo, o próprio sentimento por parte da sociedade
que sofre com o mesmo, no caso da segregação imposta. Neste sentido, levando em
consideração que o Conjunto Habitacional Parque dos Buritis se encontra localizado a uma
distância de aproximadamente de 7 km do centro da cidade de Castanhal, como podemos
observar na figura 02, o que para a realidade local é uma distância bastante considerável; nos
depoimentos coletados se constatou uma insatisfação da população com o serviço prestado
pelo transporte público.
Fazendo referência ao transporte público, o morador 09 diz: “é precário porque
geralmente é de meia em meia hora, principalmente domingos e feriados” 6 alertando que aos
domingos e feriados a situação fica pior, já que o ônibus demora ainda mais. Como o conjunto
é distante do centro, estes moradores utilizam o ônibus, a motocicleta ou até mesmo a
bicicleta para realizarem este deslocamento e falam que a possibilidade de caminharem ao
centro é nula.
6
As informações verbais foram obtidas em entrevistas realizadas em maio de 2014.
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Figura 03: Precária pavimentação asfáltica do Parque dos Buritis
Foto: Lisboa, maio 2014.
Segundo o morador 03: “o ônibus é de hora em hora, uma hora mais ou menos de
tempo porque a buraqueira tá demais, não tem quase onde pisar não, é só buraco”,
justificando a demora do transporte em decorrência da pavimentação no conjunto já ser quase
inexistente, mesmo sendo um local habitado há pouco tempo. Na figura 03 é possível
perceber a quase inexistência de pavimentação no local, que possui vários buracos em todas
as ruas do conjunto.
Apesar de alguns moradores do Parque dos Buritis não perceberem a distância do
centro da cidade como um problema fundamental, outros ressaltam os prejuízos advindos
dessa situação, como exposto nas falas.
Acho muito, tudo o que a gente quer é no centro e pra ir no centro, tem que pegar
ônibus e leva tempo e dinheiro eu acho longe sim, assim porque aqui mesmo no
conjunto não tem farmácia, se a gente quer um remédio tem que ir no centro, quer
pagar contas tem que ir no centro, eu acho assim que deveria ter pelo menos uma
farmácia (MORADOR 01).
Bastante, muito, às vezes a gente quer comprar alguma coisa, um remédio, aí a gente
precisa de comprar alguma coisa e é tarde da noite aí a segurança que é ruim
(MORADOR 06).
Um pouco, distante daqui pro centro uns 7 Km, o sistema de ser longe, não prejudica
tem transporte, depende de ter o dinheiro” (MORADOR 10).
Nas falas do morador 01 e 06 existe a percepção de que a distância do conjunto em
relação ao centro da cidade dificulta a vida, principalmente no que se refere à busca de
serviços de saúde, uma vez que no conjunto ou nos arredores não existem farmácias que
possam suprir a demanda da população. Outro fator que merece ser mencionado é a fala que
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ressalta a necessidade de recursos financeiros para ter acesso ao transporte coletivo, o que
limita a mobilidade de muitos moradores.
É preciso observar que a grande distância em relação ao centro não se torna
perceptível na fala de todos os moradores, isso em decorrência da satisfação dos mesmos com
o empreendimento. Agora eles possuem uma residência e, portanto, a alegria do acesso ao
imóvel interfere na percepção dos fatores negativos, como a distância. O sentimento de estar
segregado não aparece tanto nas falas, porque os moradores estão satisfeitos por terem uma
casa, mas isso não quer dizer que o processo de segregação não esteja presente no conjunto.
Neste sentido, 90% dos moradores afirmaram gostar de morar no local em virtude de
ser seu, pois a grande maioria morava de aluguel e diz que o valor pago todo mês não pesa no
orçamento familiar. Este fato se explica também em decorrência destes morarem no conjunto
por mais de 02 anos, o que fez com que muitos se acostumassem com a moradia. A fala do
morador 07 explica muito bem o impacto inicial ao receber a notícia da conquista da casa
própria e a mudança de sentimento após anos morando no local.
Quando minha mulher falou que tinha conseguido uma casa pra cá, disse pra ela que
não tinha matado ninguém pra mim esconder, não quiria vim pra cá, mas morava de
aluguel e tava desempregado aí acabei vindo e gostei, acho que me acostumei aqui, e
é barato né a gente paga e nem sente.
O impacto inicial do processo de segregação faz com que muitos rejeitem a ideia de se
distanciarem da cidade e se deslocarem para áreas distantes. A fala do morador 07 ressalta a
ideia de se esconder, o que demonstra os estigmas e preconceitos que se formam sobre as
áreas distantes, pois este distanciamento centro-periferia pode ser uma forma do processo de
segregação socioespacial.
Pode-se perceber nessa fala o que Negri (2008, p.132) chama de segregação
involuntária, pois por forças externas ele foi obrigado a habitar e se deslocar para um novo
espaço que não era de sua preferência. E Carlos (2004, p. 62) complementa afirmando que
para uma imensa parcela da sociedade, a vida urbana constitui-se pela precariedade absoluta,
envolvida num processo de trabalho dividido e sem conteúdo, numa cidade que não lhe
pertence e com a qual não se identifica, pois quando este morador foi “obrigado” a se dirigir
para o Conjunto Habitacional Parque dos Buritis ele não se reconhecia como pertencente e
tampouco se identificava com o local onde foi morar.
Já na fala do morador 01: “gosto, porque antes eu não tinha uma casa, aí eu ganhei
essa casa e tenho que gostar, gosto de ter a minha casinha” e do morador 10: “gosto, uma
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morada dessa aqui é um paraíso”7; nota-se o quanto o Programa Minha Casa Minha Vida
enquanto programa de cunho social é importante na vida destas famílias, que anteriormente
viviam pagando aluguel ou em casas cedidas e a partir do momento que recebem suas casas
conseguem vislumbrar uma perspectiva de vida melhor, contudo acompanhada de novos
problemas.
O Parque dos Buritis não possui um muro separando o conjunto dos demais, porém
esta divisão foi feita pela ação do agente social chamado de proprietário de terra, que espera a
ação de outro agente social, o Estado, para só assim realizar o efetivo loteamento dos terrenos
ociosos, os quais estão no entorno do conjunto, como bem descreve Corrêa (1995, p. 19).
Aos proprietários dos terrenos mal localizados, em periferias sem amenidades, resta
apenas outra estratégia. Em uma cidade onde existe uma segregação sócio espacial,
com um setor periférico, não apenas distante do centro mas sem amenidades, não
atraindo, portanto, grupos sociais de elevado status, não resta aos proprietários
fundiários senão o loteamento de suas terras como meio de extrair a renda da terra.
Lembrando que as terras compradas pela construtora pertenciam ao espaço agrário e
depois de sua aquisição foram incorporadas ao tecido urbano, por isso a distância do centro
para o conjunto. Fica evidente a complacência do Estado para com os grupos hegemônicos,
como as construtoras, contribuindo decisivamente à segregação socioespacial dos grupos
desfavorecidos, pois, no caso estudado, o empreendimento decorre de um programa estatal e
mesmo assim o que se nota é o promotor imobiliário definindo a localização.
Figura 04: Perspectiva do Conjunto habitacional Parque dos Buritis à noite
Foto: Lisboa, maio 2014.
7
Informação verbal obtida em entrevista realizada em maio de 2014.
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Figura 05: Perspectiva do Conjunto habitacional Parque dos Buritis durante o dia
Foto: Lisboa, maio 2014.
Nas figuras 04 e 05 fica notório o afastamento do Conjunto em relação ao bairro
vizinho, o que no período da noite se torna um tormento em virtude do perigo que estes
moradores enfrentam para chegar às suas casas. Durante o dia não é muito diferente, visto que
a área não habitada se torna local propício à realização de roubos e demais ações criminosas.
Tudo isso se dá pela estratégia de valorização da terra por parte do proprietário da terra,
visando adquirir lucros após o beneficiamento do Estado nas áreas próximas ao Conjunto.
O processo de segregação socioespacial do Conjunto Habitacional Parque dos Buritis
pode ser bem visualizado na paisagem, como demonstram as figuras 04 e 05. Elas ressaltam o
isolamento físico, pois o Conjunto foi construído de maneira tal que foi distanciado dos
bairros vizinhos e com isso a segregação ficou nítida não só por ter colocado esta população
distante do centro e desconectada dos demais bairros, mas por ter elegido um grupo com
renda similar e com um grau de escolaridade muito parecido, constituindo, assim, uma
homogeneidade interna.
Com isso, se constitui uma realidade urbana marcada pelo processo de segregação
socioespacial, onde, de um lado, está a classe média e alta em um bairro e, do outro, se
encontra a classe de baixa renda vivendo em um Conjunto Habitacional feito única e
exclusivamente para esta classe. Portanto, a política do Programa Minha Casa Minha Vida PMCMV, no empreendimento analisado, apesar de todos os avanços que envolve o acesso à
moradia, contribuiu à separação entre os grupos sociais e não à convivência entre eles.
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O SIGNIFICADO DO CONJUNTO HABITACIONAL PARQUE DOS BURITIS EM
TERMOS DE DESENVOLVIMENTO SÓCIO-ESPACIAL
Ao observar o Conjunto Habitacional Parque dos Buritis com mais atenção, percebe-se
que, mesmo sendo uma obra do Programa Minha Casa Minha Vida, o qual visa minimizar o
déficit habitacional no Brasil, o objetivo alcançado foi o de movimentar a economia
privilegiando o setor privado capitalista, com objetivos relacionados ao lucro. Por conta disso,
as construções foram realizadas sem a mínima preocupação, além de fornecer a casa aos
futuros moradores. A justiça social, a qualidade de vida e o direito à autonomia, conceitos
essenciais ao desenvolvimento sócio-espacial, são pouco observáveis no processo de
constituição do conjunto habitacional.
O desenvolvimento sócio-espacial ressalta a necessidade de estabelecer uma crítica ao
economicismo das abordagens e estratégias de desenvolvimento, de se considerar outras
dimensões da realidade social, e de se valorizar a participação ativa dos interessados na
implementação do processo de desenvolvimento. Pode, assim, ser compreendido, segundo
Souza (1997, p. 19), como um processo de superação de problemas e “[...] conquistas de
condições propiciadoras de uma maior felicidade individual e coletiva, o desenvolvimento
exige a consideração simultânea das diversas dimensões constituintes das relações sociais
(cultura, economia, política) e, também, do espaço natural e social”.
Na visão de Souza (2002), o desencadeamento e a promoção do processo de
desenvolvimento, por ele denominado de desenvolvimento sócio-espacial, exige uma
participação ativa dos interessados nele, ou seja, a sua concretização somente é possível se for
conduzida pela população que necessita constituí-lo. Este princípio, o da autonomia,
parâmetro principal do conceito, pode ser expresso como a “capacidade de cada indivíduo e
de cada coletividade de estabelecer metas para si próprio com lucidez, persegui-las com a
máxima liberdade possível e refletir criticamente sobre a sua situação e sobre as informações
de que dispõe” (op. cit., p. 64).
Dessa forma, a não observância da autonomia inviabiliza o processo de
desenvolvimento, que se estabelece a partir de parâmetros subordinados a autonomia, a
melhoria da qualidade de vida, que consiste na “crescente satisfação das necessidades - tanto
básicas quanto não básicas, tanto materiais quanto imateriais - de uma parcela cada vez maior
da população”; e o aumento da justiça social que, por sua vez, se constata a partir de uma
“crescente garantia de possibilidades iguais de ação para os indivíduos” (SOUZA, 2002, p.
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62-63). Esses parâmetros subordinados adquirem uma natureza mais concreta por meio de
seus respectivos parâmetros subordinados particulares, como o grau de desigualdade sócioeconômica e a satisfação individual com relação à saúde, à educação e à moradia.
A partir da ideia de justiça social, a primeira observação que se pode fazer ao
PMCMV é com relação à divisão por classes sociais e pela renda das famílias, o que denota
que para famílias de baixa renda as casas são de materiais inferiores, com uma área de 37,70
m2 e em locais distantes, porém para os grupos com maior renda, de 06 a 10 salários mínimos,
as áreas são maiores, em locais bem mais valorizados e com segurança, pois a maioria destes
empreendimentos é vendida como condomínios fechados. Só nesta pequena reflexão nota-se o
quanto há disparidade entre os empreendimentos em virtude das classes para as quais se
destinam.
Já com relação à qualidade de vida, o outro parâmetro subordinado do
desenvolvimento sócio-espacial, é necessário entender que os moradores do Conjunto
Habitacional Parque dos Buritis moravam, predominantemente, em casas alugadas, cerca de
80% das famílias entrevistadas. Considerando a mudança do aluguel à casa própria, pode-se
dizer que ocorreu uma melhoria na qualidade de vida, sobre a óptica da moradia, uma vez que
antes moravam de aluguel ou em casas cedidas e agora estas pessoas possuem uma casa
própria, o que justifica, por exemplo, o fato de muitos gostarem do conjunto.
Porém, na fala dos moradores, com relação à política de construção do conjunto, é
notória a insatisfação em relação à estrutura física das casas e do conjunto em geral, pois os
moradores relataram que o contrato descrevia uma casa com revestimento cerâmico, janelas
de vidro, forro, portas, um lavador, porém ao receber suas respectivas casas perceberam logo
que as mesmas não possuíam o revestimento, o piso era de cimento queimado, as janelas de
um material muito inferior ao vidro.
As reclamações não param por aí, o conjunto foi feito em um terreno inclinado, o que
favoreceu os moradores que, segundo eles, “ficaram em cima e prejudicou aos que ficaram na
baixada”. Os da baixada sofrem com o alagamento de suas residências, com o mau cheiro dos
esgotos que são lançados em um córrego no final do conjunto e falam que a META,
construtora responsável pela obra, foi obrigada a fazer algumas muretas em residências que
alagavam e agora vai ter que colocar o revestimento cerâmico em todas as casas.
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O morador 07 assim relatou: “entrei no ministério público pedindo minha lajota,
porque tava no papel né, então tenho que reclamar” e destaca que diante do ganho de causa,
“agora eles (META) vão ter que lajotar a de todo mundo, porque muita gente reclamou”.
Nestas falas, fica nítido o interesse do capital preponderando sobre o social, pois o projeto
entregue na Caixa Econômica Federal continha um tipo de casa, com materiais bem melhores
e ao término da construção a realidade era outra.
Fica explícito no Parque dos Buritis, o que muitos estudos sobre o PMCMV vêm
constatando: uso de materiais de má qualidade, a deficiência do saneamento básico, precária
pavimentação das ruas e o descaso dos órgãos públicos com relação aos conjuntos, para o
caso em questão, alegando só poder intervir após 05 anos, pois enquanto isso o conjunto
habitacional seria de responsabilidade da construtora.
Isso causa indignação por parte dos moradores, que dizem “estamos abandonados
aqui”, fala do morador 08, que continua seu discurso: “eu acho que deixou muito a desejar, o
banheiro não presta, todo infiltrando água, já veio um engenheiro da CAIXA e disse que saiu
o rejunte de tanto varrer, nunca vi só de tu varrer o rejunte soltar e vaso tá solto, as ruas nem
se fala, completo abandono”. Esse relato é confirmado pela figura 06, que demostra muito
bem alguns materiais de qualidade inferior utilizados na construção das casas.
Outro ponto a ser discutido diz respeito aos equipamentos urbanos, fundamentais para
a qualidade de vida dos moradores. Cabe aqui destacar dois deles: a escola e o posto de saúde.
Com relação à escola, no local onde foi construído o empreendimento não há nenhuma que
possa suprir a demanda do residencial e em decorrência disso a Prefeitura Municipal de
Castanhal disponibiliza um ônibus escolar para levar e trazer os estudantes. Uma medida
paliativa, já que o Estado não construiu uma escola nas proximidades.
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Figura 06: Materiais com defeito nas residências
Fonte: Lisboa, maio 2014.
Já com relação à saúde há muitas reclamações por parte dos moradores, pois o
Conjunto foi construído em uma área afastada e, por conta disso, o Posto de Saúde ficou
muito distante. 90% dos moradores afirmam ter uma saúde de péssima qualidade, 10% dizem
ser ruim e nenhum entrevistado apresentou avaliação positiva. O morador 05, se referindo aos
serviços de saúde, diz: “é péssimo, é ruim porque é longe, o posto, consulta daqui é lá no
Novo Estrela, bastante longe”.
Em uma visita ao posto de saúde foi relatado que a demanda aumentou muito, não
sendo suportada, e, por esse motivo, as consultas precisam ser agendadas e as datas são
sempre há longo prazo. Uma funcionária do local afirma:
precisamos da colaboração dos moradores porque não estamos dando conta, o posto
está atendendo a demanda de 4 bairros: o Novo Estrela, a invasão, o Buritis e o
Castanhais o que dificulta o nosso atendimento, é muita gente para poucos
funcionários e para os serviços ofertados.
Outras questões como a precariedade no abastecimento de água e os problemas
relativos à criminalidade e à falta de segurança pública também ganham destaque nas falas
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dos moradores e são importantes elementos na depreciação da qualidade de vida. O gráfico 02
apresenta os principais problemas do Conjunto na visão dos moradores entrevistados.
Gráfico 02: Problemas do Parque dos Buritis segundo os moradores entrevistados
5
4
3
2
1
0
Água
Saneamento
Básico
Pavimentação
das Ruas
Lixo
Segurança
Pública
Fonte: Trabalho de Campo, maio 2014.
A despeito da importância do acesso à casa própria, o Conjunto Habitacional dos
Buritis não promoveu aos seus moradores a amplitude dos parâmetros subordinados gerais do
desenvolvimento sócio-espacial, justiça social e qualidade de vida, haja vista a falta dos
equipamentos urbanos, como escola e posto de saúde, equipamentos estes essenciais à vida
cotidiana dos moradores, já a justiça social não é alcançada devido os problemas na
construção do conjunto, colocando os moradores numa situação de inferioridade diante da
cidade.
Além disso, a justiça social, que nada mais é que o direito de igualdade e
possibilidades iguais de ação, é o oposto da segregação socioespacial, visto que o ser humano
é obrigado a se dirigir para um local. Nem ao menos a casa é escolhida. Isso tudo distancia da
justiça social e, ao mesmo tempo, se aproxima do fenômeno contrário, a segregação.
O parâmetro subordinador do desenvolvimento sócio-espacial, a autonomia, não é
levado em consideração, pois em nenhum momento do planejamento do conjunto, da
construção do mesmo, a sociedade civil organizada ou moradores individualmente foram
ouvidos para decidir a localização do conjunto, o tamanho das casas, os cômodos necessários
para as famílias, as necessidades coletivas e individuais da população. A falta de autonomia
dos moradores se expressa na questão do revestimento das casas, na qual a construtora META
colocou o revestimento cerâmico recentemente nas casas e não foi dado ao morador a
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oportunidade de escolha deste material e nem ao menos a decisão sobre o dia melhor de
colocá-lo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo de caso do empreendimento Parque dos Buritis em Castanhal demonstra
resultados próximos aos encontrados por estudos de outras experiências do Programa “Minha
Casa, Minha Vida” em todo o Brasil. De início, é inquestionável o avanço representado por
uma política habitacional que atinge os grupos sociais mais necessitados, ofertando um bem
indispensável, a casa própria.
Entretanto, esse acesso à moradia vem acompanhado de uma série de problemas com
relação à vivência da cidade, pois o processo de segregação socioespacial, que claramente
acompanha o programa, limita o acesso dos moradores a serviços essenciais, como saúde e
educação.
Assim, o PMCMV tem seu aspecto positivo, pois consegue fazer com que pessoas que
não tinham seus imóveis adquiram sua casa para morar. Entretanto, os empreendimentos não
visam uma melhoria na qualidade de vida sobre diversos aspectos, como saúde, educação,
segurança, água, etc. E muito menos promove a justiça social.
O processo de segregação socioespacial constituído pelo empreendimento Parque dos
Buritis, atendendo aos interesses da construtora e promovendo a separação dos moradores do
restante da cidade dificultando, assim, a sua mobilidade urbana, o acesso à saúde, ao
comércio, à escola e até mesmo aos seus trabalhos; representa um problema do ponto de vista
da justiça social, pois potencializa uma situação de desigualdade social marcante na sociedade
contemporânea, mas principalmente representa a não consideração da autonomia dos
interessados na política pública habitacional, a quem não é resguardado o direito de
interferência, muito menos de condução do processo de produção do empreendimento.
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