INTRODUÇÃO Organismos procariontes, tais como as bactérias, possuem a características de sofrer com pequenas variações do meio ambiente. Sendo assim, esses organismos necessitam de um maior poder de regulação de seu metabolismo, em prol de uma melhor adaptação às variações do meio. Muito dessa regulação é feita a nível da transcrição de genes por proteinas, aproveitando-se do fato de que algumas proteínas importantes podem ser controladas por alterações alostéricas e ligações covalentes reversíveis. Uma etapa importante no controle de processos celulares é a expressão gênica. Como algumas proteínas podem variar sua quantidade na célula se houver variação no meio onde o organismo se encontra? Com um certo conhecimento é correto pensar que o primeiro passo é bloquear a transcrição desta proteína, num processo chamado regulação da transcrição gênica. Em bactérias, muitos genes estão em complexos chamados OPERONS, e nestes complexos normalmente existe uma proteína repressora e uma ativadora da transcrição de vários genes que, atuando em "parceria", determinam certas características. Esta aula virtual apresentará três operons de uma bactéria muito conhecida chamada E coli: Operon lactose), Operon triptofano) Operon arabinose). lac (controlador da síntese das enzimas metabolizadoras de trp (controle da síntese das enzimas sintetizadoras de e ara (controlador da síntese das enzimas metabolizadoras da O fago lambda também será discutido por suas características únicas de regulação gênica e controle de seu ciclo vital. Essa aula também vai discutir a estrutura de proteínas controladoras que se ligam ao DNA, dando ênfase ao domínio hélice-volta-hélice. Controle da expressão gênica em procariontes OPERON LAC No metabolismo da lactose por E. coli são necessárias duas enzimas que fazem parte de um operon chamado lac. A primeira enzima é a BETA-GALACTOSIDASE. Ela é capaz de clivar a lactose em glicose e galactose que assim servirão como fonte de carbono para a célula (ver figura abaixo). A beta-galactosidase é dita uma enzima indutível, ou seja, sua expressão varia com as necessidades celulares: Caso a bactéria esteja crescendo em meio rico em lactose, sua expressão será alta; Caso a fonte de carbono seja outro carboidrato, sua expressão será reduzida. A outra enzima do operon é a PERMEASE, que, como seu próprio nome indica, é a enzima responsável pelo transporte de lactose do meio extracelular para o meio intracelular através da membrana bacteriana (a lactose, como a maioria dos carboidratos, não é capaz de atravessar a bicamada lipidica sem uma proteína carreadora). Existe ainda no operon lac uma outra enzima: Tiogalactosídeo Transacetilase. Seu papel in vivo ainda é incerto, mas in vitro é capaz de transferir uma acetila do acetil CoA para a hidroxila do carbono 6 de um tiogalactosídeo. Um importante indício de que a indução ocorreria no metabolismo da lactose foi o aumento observado de b-galactosidase quando se tinha um aumento de permease e tranacetilase. Isto foi facilmente compreendido com modelos mutantes que mostravam que as 3 enzimas são codificadas por 3 genes contíguos (ver figura abaixo), onde: z - beta-galactosidase; y - permease; a transacetilase O RNAm do operon lac é dito policistrônico ou poligênico pois possui informação para codificar as 3 proteínas: beta-galactosidase, permease e transacetilase (rever figura acima). Depois da descoberta destes 3 genes, descobriu-se um mutante que possuia os genes para expressar as 3 proteínas, mas não o fazia. Jacob e Monod deduziram que "a taxa de síntese destas proteínas é normalmente governada por um elemento comum diferente dos genes que especificam sua estrutura". A este gene deu-se o nome de regulador (gene i), sendo que os mutantes constitutivos possuem genótipo i-z+y+a+ e os selvagens i+z+y+a+. O gene i é capaz de codificar um repressor que está faltando ou está inativado nos organismos com o gene i-. Através de estudos usando bactérias parcialmente diplóides, através do fator sexual (F'), observou-se que uma bactéria que possui o genoma i+z- e o fator F'iz+ não é capaz de metabolizar a lactose, ou seja, o repressor (produto do gene i) é difundível. Existe no opreron lac uma região promotora (p), que é o local onde a RNA polimerase se liga para começar a transcrição. Juntamente com o operador (o) formam os locais de controle do operon. Na presença do produto do gene i o operon é incapaz de ser codificado pois o repressor está ligado ao operador. O isopropil-b-D-galactosídeo (IPTG) é um indutor artificial do operon lac. Foi através de estudos com esta substância que se descobriu o repressor lac, que na ausência do indutor liga-se ao operador e bloqueia a transcrição (veja as figuras abaixo). O repressor é uma proteína tetrâmera com subunidades idênticas (de 37Kd), cada uma com um ponto de ligação ao indutor. Através de cristalografia (ver fguras abaixo) descobriu-se que esta proteína possui eixos bilaterais, como seria esperado de uma proteína que se liga ao DNA. "O repressor encontra o operador se difundindo ao longo da molécula de DNA (uma procura unidimensional) e não o encontrando a partir do meio aquoso (uma procura tridimensional". Já é sabido que se a glicose estiver no meio de cultura da E coli, ela será preferencialmente usada como fonte de energia, isto é, enzimas utilizadas no metabolismo dos outros carboidratos serão pouco ou nada expressas. Este efeito é chamado repressão por catabólito. Mas como se dá essa repressão? Um fato importante é que a glicose abaixa a concentração do AMP cíclico em E coli. Através de estudos com AMPc exogeno, concluiu-se que "AMPc estimula o início da transcrição de muitos operons indutíveis" sendo, portanto, um sinalizador tanto em bactérias quanto em mamíferos. Mas como se dá essa modulação da transcrição via AMPc? Em bactérias, o AMPc liga-se ao CAP (catabolite gene activator protein - proteína ativadora de genes por catabólitos), uma proteína dimérica com 2 subunidades idênticas de 22Kd. Cada subunidade possui um domínio de ligação ao DNA e ao AMPc (ver figura abaixo). Somente o complexo CAP-AMPc é capaz de estimular a transcrição e se ligar a determinados promotores. No operon lac, CAP se liga próximo a a região que se liga a RNA polimerase. CAP exibe simetria bilateral que se ajusta à seu ponto de ligação do DNA. O repressor se liga em um região "a frente" da RNA polimerase, portanto não bloqueia a sua ligação mas impede sua progressão. CAP também estimula a transcrição do operon lac por possuir uma região de ligação a RNA polimerase quando está ligado ao DNA. Ele também é capaz de girar o DNA em 94 graus. Especificamente, 2 temas hélice-alça-hélice do dímero se inserem em sulcos maiores sucessivos da dupla hélice de DNA. Dois giros de 43 graus correspodem pela maior parte do giro para a direita do eixo do DNA. As ligações do CAP e da RNA polimerase se reforçam mutualmente porque inclinam o DNA no mesmo sentido (uma visão geral pode ser vista no modelo cristalográfico abaixo). Os operons catabólitos indutíveis foram colocados sobre controle duplo, pois possuem promotores de ligação acima da região do operon (provavelmente enfraquecido durante a evolução) para tornar operons dependentes de uma proteína auxiliar que inicia eficientemente a transcrição. O indutor específico atua em um só operon enquanto que o complexo CAP-AMPc é capaz de afetar muitos. Operons controlados em conjunto pelo AMPc são membros de um circuito regulador global, dentre eles: genes heat-shock (que são ativados por uma subunidade sigma diferente da RNA polimerase quando há altas temperaturas) e genes SOS (que codificam enzimas de reparo após dano no DNA). OPERON ARA O operon da arabinose é formado por 3 genes: ara A (que codifica a isomerase), ara B (que codifica ribulocinase) e ara D (que codifica ribulose 5-fosfato epimerase). Também possui um gene regulador ara C, que codifica proteína C, e uma região controladora com 2 operadores (ara O1 e ara O2), um sítio de ligação para CAP e outro regulador (ara I). Assim como a lactose, a arabinose não é utilizada diretamente como fonte de carbono, ou seja, ela precisará ser modificada a xilose 5 fosfato para ser utilizada no metabolismo. O operon ara também está sobre controle duplo: é preciso a presença do complexo CAP-AMPc e a ligação da arabinose à proteína C para que a transcrição seja eficiente. A proteína C é um regulador negativo para o seu próprio gene (ara C). A transcrição de ara C é em sentido oposto a ara B, ara A e ara D, e é controlada por ara O1. Bem, e daí? Bom, a proteína C só é transcrita quando há baixa concentração de CAP-AMPc e dela própria. Mas quando há alta concentração de proteína C e baixa concentração de CAP-AMPc a transcrição pára, pois a proteína C liga-se a ara O1, exercendo uma auto-regulação. Se a proteína C se ligar ao araO2 ocorre um bloqueio na tanscrição de ara B, ara A e ara D, pois ela é capaz de formar uma alça no DNA e se ligar a ara I, impedindo a passagem da RNA polimerase. Isto não ocorre quando há CAP-AMPc ou arabinose ( que liga-se à proteína mudando sua conformação), que são reguladores positivos (nesse caso, o RNAm para proteína C não é formado porque ela está ligada a araO1). Note que o operon ara é bastante rico em regulação: Uma proteína pode regular sua própria síntese, reprimindo a transcrição de seu gene. A ligação de uma molécula sinalizadora a uma proteína pode transformá-la de inibitória para ativatória já que se liga a pontos diferentes no DNA. Os pontos reguladores no DNA para ligação de proteínas não precisam ser contíguos aos genes contolados por eles. O DNA é facilmente dobrado pela ligação de proteínas ou complexos. Estas alças são bastante comuns na regulação gênica em eucariontes. AS alterações provocadas pelas moléculas sinalizadoras são facilmente retidas, respondendo a variações nos níveis metabólicos Controle da expressão gênica em procariontes OPERON TRP O operon trp possui 5 enzimas capazes de transformar corismato em triptofano. Como bactérias são seres procariontes (sem a membrana nuclear), a tradução começa antes do término da transcrição. O RNAm do trp é rapidamente sintetizado e seu tempo de vida é curto após ter sido totalmente transcrito, respondendo à variações do meio quanto a concentração de trp quase que imediatamente. Isto é possivel porque o repressor trp, um dímero com 107 aminoácidos, é codificado pelo gene trp que está longe do operon trp. Somente quando o repressor está ligado ao triptofano torna-se capaz de se ligar fortemente ao operador, que possui simetria bilateral. O operador se superpõe ao promotor para o início de transcrição, ou seja, o repressor está ligado ao operador impede alostericamente que a RNA polimerase se ligue eficientemente ao promotor trp impedindo a transcrição. O repressor possui uma estrutura dimérica onde cada dímero possui 3 domínios: Um central amino terminal e duas cabeças flexíveis para leitura de DNA (carboxiterminal). O tema hélice-alça-hélice volta a estar presente em cada subunidade. É interessante que o repressor sem o trp é incapaz de se ligar ao DNA pois sua região de ligação está separada de 26A, mas quando o trp se liga, ele é capaz de aumentar em 8A a abertura possibilitando a ligação do complexo a 2 sulcos maiores adjacentes no DNA, além de ajudar na estabilização da estrutura. Controle da expressão gênica em procariontes ATENUAÇÃO Você já ouviu falar em Atenuação? Pois é, um pesquisador chamado Charles Yanofsky e seus colaboradores chamou de atenuação um novo mecanismo de controle da expressão gênica que ele descobriu enquanto estudava o operon do triptofano Charles observou que alguns mutantes que continham deleções entre o operador e o gene para a primeira enzima do operon (trpE) apresentaram aumento da produção do mRNA de trp. Além disso, o mRNA de trp revelou uma sequência líder de 162 nucleotídeos antes do códon iniciador de trpE e as deleções anteriormente observadas foram mapeadas dentro dessa sequência líder cerca de 30 a 60 nucleotídeos antes do códon iniciador de trpE. A importante observação sequinte, foi que não mutantes produziam um transcrito que consistia apenas dos 130 nucleotídeos da sequência líder quando a quantidade de triptofano era alta, mas produziam um mRNA de 7 Kb quando a quantidade de triptofano era baixa na célula. Dessa forma, Yanofsky concluiu que a transcrição do operon trp deve ser regulada por um ponto regulador de término (atenuador), situado entre o operador e a primeira enzima. Esse atenuador contém uma sequência rica em GC sequida de uma rica em AT e cada uma dessas regiõesexibe um eixo de simetria bilateral. Além disso, o transcrito líder termina com uma série de "U"s. Agora provavelmente você deve estar se fazendo aquela velha pergunta: E DAÍ? Pois bem, vamos ao sentido de tudo isso. Como vocês sabem, estamos estudando procariontes. Uma característica importante desses seres é a ausência de compartimentalização nas células, ou seja, não existe separação das estruturas celulares por membranas. Sendo assim, o DNA procariótico está solto no citoplasma permitindo que os processos de transcrição e tradução ocorram simultaneamente. A atenuação faz uso desse rígido acoplamento entre esses dois processos para controlar a expressão gênica. Como? Bem, um importante indício para responder essa pergunta foi a descoberta de que parte do mRNA líder é traduzido. Esse peptídeo líder de 14 aminoácidos possui códons para triptofano nas posições 10 e 11 que exercem um papel muito significativo na regulação. Quando o triptofano é abundante, esse peptídeo completo é sintetizado permitindo a formação de uma alça que pára a transcrição. Entretanto, quando hà pouco triptofano, o ribossomo pára nos códons UGG repetidos devido à escasses de triptofanil-tRNA. O ribossomo parado altera a estrutura do mRNA de modo que RNA polimerase que o transcreve continua além do ponto atenuador. É importante relembrar que esse efeito só é possível porque a transcrição e a tradução estão bem acopladas. O ribossomo que traduz o mRNA líder de trp está logo atrás da molécula de Rna polimerase que está transcrevendo o molde de DNA. Vários outros operons para a biossíntese de aminoácidos em E. coli são hoje conhecidos como tendo atenuadores. O peptídeo líder de cada um deles contém uma abundância de aminoácidos do tipo controlado pelo operon. Por exemplo, o operon de treonina codifica enzimas que sintetizam tanto treonina quanto isoleusina. O peptídeo líder contém 8 treoninas e 4 isoleucinas em uma sequências de 16 aminoácidos. Sete fenilalaninas estão presentes no líder de 15 aminoácidos do operon da fenilalanina. Ainda mais marcantesão as sete histidinas em fila encontradas no peptídeo líder do operon de histidina. FAGO LAMBDA O fago lambda é capaz de desenvolver ciclos no interior da célula: a via líticae a via lisogênica. Quando o fago lambda entra na via lisogênica, seu DNA fica covalentemente inserido no DNA da célula hospedeira em um ponto específico. Assim, o prófago (estágio em que os DNAs ficam ligados) se replica como parte do cromossomo hospedeiro em uma bactéria lisogênica, e suas funções líticas ficam dormentes mas não perdidas, ou seja, o fago lambda pode voltar a desenvolver a via lítica, por exemplo através de agentes que danificam DNA do hospedeiro. Existem três estágios de expressão gênica na via lítica: inicialimediato, inicial-retardado e tardio. O estágio inicial imediato possui dois operadores: Ol e Or (l-left e rright). O transcrito da esquerda forma a proteína N. Na ausência desta proteína os transcritos iniciais-imediatos param, portanto ela permite uma maior expressão dos genes lambda ativando o estágio inicial-retardado. No estágio inicial-retardado é que são feitas as proteínas para a replicação do DNA lambda e para a recombinação. Neste estágio também é transcrito um gen que forma a proteína Q, que é outro regulador da expressão gênica em fago lambda. Esta proteína impede o témino da transcrição. A via lisogênica também possui três estágios: estabelecimento, manutenção e liberação. O primeiro necessita da integração dos DNAAs (viral e hospedeiro) e a inativação da via lítica. Kaiser demostrou que só o gen cI é expresso no prófago que é capaz de codificar o repressor lambda que se liga aos operadores Ol e Or. O repressor em Ol impede a transcrição para a esquerda dos genes iniciais-imediatos, ou seja, a proteína N não é sintetizada e a via lítica é bloqueada. Ao se ligar em OR impede a tanscrição dos genes cro e Q. De fato só o gen cI é transcrito. O gen cI que codifica o repressor está entre Ol e Or, e cada um destes operadores possui 3 regiões com diferentes afinidades para se ligar ao repressor. O ponto de ligação mais forte para o repressor em Ol quanto em Or é o mais próximo do início do primeiro gen estrutural do operon, Ol1e Or1, respectivamente. O promotor para o gen N fica dentro de Ol1, e o promotor para o gen cro fica dentro de Or1. Como no operon da arabinose, a ligação do repressor a estes operadores bloqueia a ligação da RNA polimerase ao promotor correspondente, e portanto a transcrição do gene N (transcrito à esquerda) e a do gene cro (transcrito à direita) não são iniciadas. Por outro lado, a transcrição do próprio gen cI não é bloqueada pela ligação do repressor a estes pontos de alta afinidade. O que controla o nível do repressor??? SUA PRÓPRIA SÍNTESE!!! As diferentes afinidades de Or1, Or2 e Or3 pelo repressor constituem o papel central de sua alto regulção. Em baixos níveis de repressor, o Or1 está preenchido o que bloqueia a transcrição do gen cro e outros que ficam à dirreita. Uma molécula de repressor ligada a Or1 favorece a ligação de outra a Or2, o que aumenta a transcrição do gen cI e leva à produção de mais repressores. ã medida que a concentração de repressorres aumenta, Or3 fica ocupado. O fago lambda tira proveito de uma proteólise ativada para mudar sue ciclo de lisoênico para lítico, de modo que possa escapar de um meio que já não é mais tão seguro. Este comportamento deve-se a uma fina integração entre algumas proteínas e operadores.