PARECER COREN-DF Nº 001/2013 SOLICITANTE: Sindate – DF Sindicato dos auxiliares e técnicos de enfermagem do Distrito Federal. ASSUNTO: Competência do profissional técnico de enfermagem nos procedimentos de iodoterapia. I – ANÁLISE: Há muitos anos verificou-se que as radiações ionizantes produziam danos biológicos nos seres vivos. Os primeiros casos de dano ao homem (dermatites, perda de cabelo, anemia) foram relatados na literatura logo após a descoberta dos raios X. Ao longo dos anos foram relatados casos de dano em consequência da exposição à radiação, entre os quais se incluem os danos que afetaram os primeiros pesquisadores no campo da energia nuclear, como Marie Curie. Foi somente após a segunda Guerra Mundial, em virtude das explosões nucleares nas cidades japonesas de Hiroshima e Nagazaki e do uso cada vez maior de radionuclídeos nos mais variados setores de atividades, que se estudou com mais detalhes os efeitos produzidos por doses repetidas de radiação a longo prazo (Noções de Proteção Radiológica – IPEN/202). Para (BELLINTANI et al, 2002), organismo humano é uma estrutura complexa cuja menor unidade com funções próprias é a célula. As células são constituídas de moléculas e estas por sua vez de átomos. As células são compostas por vários tipos de moléculas como: aminoácidos, proteínas, água e eletrólitos como o potássio, cloro, sódio, cálcio, magnésio, fosfatos. Podemos dividir as células do organismo humano em dois grandes grupos, as células somáticas e as células germinativas. As células somáticas compõem a maior parte do organismo, sendo elas responsáveis pela formação da estrutura corpórea (ossos, músculos). As células germinativas estão presentes nas gônadas (ovários e testículos) e se dividem produzindo os gametas (óvulos e espermatozóides) necessários na reprodução. Essas células são muito importantes, pois são as responsáveis pela transmissão das características hereditárias do indivíduo. Segundo (BELLINTANI et al, 2002) os efeitos biológicos produzidos pela ação das radiações ionizantes no organismo humano são resultantes da interação dessas radiações com os átomos e as moléculas do corpo. Nessa interação, o primeiro fenômeno que ocorre é físico e consiste na ionização e na excitação dos átomos, resultante da troca de energia entre a radiação e a matéria. Seguindo-se a este, ocorre o fenômeno químico que consiste de rupturas de ligações químicas nas moléculas. A seguir aparecem os fenômenos bioquímicos e fisiológicos. Após um intervalo de tempo variável aparecem as lesões observáveis, que podem ser no nível celular ou no nível do organismo como um todo. Na maioria das vezes, devido à recuperação do organismo, os efeitos não chegam a tornar-se visíveis ou detectáveis. Um dos processos mais importantes de interação da radiação no organismo humano é com as moléculas de água. Esta importância é consequência da quantidade de água presente no organismo humano (aproximadamente 70 % do corpo humano). Quando a radiação interage com as moléculas de água do organismo humano, essas moléculas se quebram formando uma série de produtos danosos ao organismo, como os radicais livres e a água oxigenada. Esse processo é chamado de radiólise da água. De acordo com Rissato et al, (2009) em seu estudo “ A Importância do Gerenciamento de Rejeitos Radioativos na Iodoterapia), a iodoterapia é uma das terapêuticas da medicina nuclear que emprega como radionuclídio o iodo radioativo. Esse tratamento, realizado em unidades de internação, exige procedimentos de radioproteção para prevenir contaminação de pacientes, equipe de saúde e meio ambiente. Rissato et al, 2009 apud Oliveira et al, 2007, relata que a iodoterapia é a terapêutica que utiliza os isótopos radioativos 123I e 131I para tratamento em cintilografia da tireóide, rastreamento de metástases e origem tireoidiana, terapêutica de hipertireoidismo, doses ablativas e terapêuticas para tratamento do câncer diferenciado da tireoide. Desde 1950, o radioisótopo 131I é um dos radionuclídios mais utilizados na medicina nuclear, considerado “traçador universal”, e o primeiro radionuclídeo aprovado para uso nos Estado Unidos pelo Conselho Nacional de Monitoramento e Proteção Radioativa (Nacional Council on Radiation Projtection and Measurementes – NCPR 1982), na forma de iodeto de sódio. O valor do tratamento combinado para CDT – Câncer Diferenciado da Tireoide, cirurgia seguida de tratamento com iodo 131I e hormônios tiroidianos, é reconhecida desde 1980, pela observação da intensa diminuição do índice de recidivas, após a utilização desta terapêutica que envolve a iodoterapia (RISSATO et al, 2009 apud CALEGARO et al, 2007). De acordo com Calegaro et al, (2007), devido ao sucesso da ablação do tecido remanescente com iodo 131I e emprego da terapia hormonal supressiva, houve um aumento razoável na terapia complementar com iodo 131I, Assim, alguns procedimentos rotineiros são realizados pelos auxiliares de enfermagem a um ou dois pacientes durante a internação para terapia com iodo 131I, e dessa forma são expostos às emissões das radiações emitidas pelos pacientes, podendo esta, variar de acordo com o número de pacientes internados, distancia mantida em relação aos pacientes e o tempo de permanência na enfermaria. De acordo com publicação realizada no site “medicinanuclear”, o tratamento das metástases de tireoide com doses altas de iodo 131I administrado via oral, não produz reações colaterais importantes, ou desconforto para os pacientes e, mesmo assim, é realizado com internação e isolamento do doente durante dois a três dias, medida necessária para que o paciente não irradie seus familiares ou pessoas circunstantes enquanto quantidades significativas de iodo radioativo permanecerem em seu corpo. A internação e isolamento se fazem em quartos terapêuticos especiais com paredes blindadas e tratamento especial dos efluentes para não irradiar a vizinhança ou contaminar o meio ambiente. Para Oliveira et al, (2003) a falta de vestimentas de proteção individual nos estabelecimentos e a ausência de controle médico periódico, demonstram o descaso em relação aos trabalhadores que estão expostos a radiação ionizante no Brasil, sendo a jornada de trabalho, formação dos profissionais, treinamento periódico, dosimetria pessoal e exames médicos de rotina os fatores de maior relevância e impacto. Constata-se, atualmente, que a maioria dos estabelecimentos fornece monitores individuais para trabalhadores pacionalmente expostos a radiação ionizante, porém os colaboradores não são instruídos corretamente sobre as suas normas de utilização. Flôr e Gelbgke (2009), relatam que pelo fato de a enfermagem radiológica atuar cada vez mais com tecnologias emissoras de radiação ionizante em seu processo de trabalho, é imperiosa sua qualificação, haja vista que este campo de atuação profissional tende cada vez mais aumentar e a enfermagem precisa preparar-se para atuar com segurança. Entre as suas especialidades a radiologia e o diagnóstico por imagem possuem uma gama de procedimentos que utilizam a radiação ionizante, a ação da enfermagem nesta especialidade ocorre principalmente no preparo dos usuários (pacientes), ou seja, na administração das soluções por via parenteral, oral e retal, na orientação e cuidados pré e pós procedimentos, assim como no preparo do ambiente onde serão inseridos. Quanto ao processo de manejo (cuidado) do paciente submetido ao procedimento com iodo 131I, Rissato et al, (2009) afirma que o requisito básico que justifica a internação é a aplicação do iodo 131I com atividade acima 1,11 Gigabecquerel (Gbq – 30 milicurie), conforme norma estabelecida pela Comissão Nacional de Energia Nuclear – CENEN, sendo assim, as normas de biossegurança/radioproteção do elemento 131I devem ser considerados pelos profissionais da medicina nuclear e unidade de internação que compõem a equipe de enfermagem (Enfermeiros, Técnicos e Auxiliares de Enfermagem), profissionais atuantes diretamente nas unidades de internação. Ressalta ainda, que o conhecimento técnico sobre os procedimentos utilizados para o preparo do quarto de internação, antes, durante e após o tratamento com iodo 131I, e a adequação das instalações intra-hospitalares, principalmente quanto ao decaimento e armazenamento dos rejeitos radioativos, gerados durante o período da internação é de fundamental importância para a proteção de pacientes e profissionais de saúde. II – DO PARECER: CONSIDERANDO o Decreto nº 94.406/87 regulamentador da Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o exercício da enfermagem e dá outras providências, a saber: Art. 8º Ao enfermeiro incumbe: I – Privativamente: b) organização e direção dos serviços de Enfermagem e de suas atividades técnicas e auxiliares nas empresas prestadoras desses serviços; c) planejamento, organização, coordenação, execução e avaliação dos serviços da assistência de Enfermagem; e) consulta de Enfermagem; f) prescrição da assistência de Enfermagem; h) cuidados de Enfermagem de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos científicos adequados e capacidade de tomar decisões imediatas. Art. 10º O Técnico de Enfermagem exerce atividades auxiliares, de nível médio técnico, atribuídas a equipe de enfermagem, cabendo-lhe: I – assistir ao enfermeiro: a) no planejamento, programação, orientação e supervisão das atividades de assistência de enfermagem; b) na prestação de cuidados diretos de enfermagem a pacientes em estado grave; d) na prevenção e controle sistemático da infecção hospitalar; e) na prevenção e controle sistemático de danos físicos que possam ser causados a pacientes durante a assistência a saúde. Art. 11º O auxiliar de enfermagem executa atividades auxiliares, de nível médio atribuído à equipe de enfermagem, cabendo-lhe: I – preparar o paciente para consultas, exames e tratamentos; II – observar, reconhecer e descrever sinais e sintomas, ao nível de sua qualificação; III – executar tratamentos especificamente prescritos, ou de rotina, além de outras atividades de enfermagem, tais como: a) ministrar medicamentos por via oral e parenteral; b) realizar controle hídrico; a) prestar cuidados de Enfermagem pré e pós-operatórios; IV – prestar cuidados de higiene e conforto ao paciente e zelar pela sua segurança, inclusive: a) alimentá-lo ou auxiliá-lo a alimentar-se; b) zelar pela limpeza e ordem do material, de equipamentos e de dependências de unidades de saúde. V – integrar a equipe de saúde. CONSIDERANDO o Código de Ética dos Profissionais da Enfermagem expresso na Resolução 311/2007, em que assegura o direito e responsabilidades do profissional de enfermagem: Art. 2. Aprimorar seus conhecimentos técnicos, científicos e culturais que dão sustentação a sua prática profissional; Art. 10. Recusar-se a executar atividades que não sejam de sua competência técnica, científica, ética e legal ou que não ofereçam segurança ao profissional, à pessoa, família e coletividade. Art. 12. Assegurar à pessoa, família e coletividade assistência de Enfermagem livre de danos decorrentes de imperícia, negligência ou imprudência. Art. 13. Avaliar criteriosamente sua competência técnica, científica, ética e legal e somente aceitar encargos ou atribuições, quando capaz de desempenho seguro para si a para outrem; Art. 21. Proteger a pessoa, família e coletividade contra danos decorrentes da imperícia, negligência ou imprudência por parte de qualquer membro da equipe de saúde. Art. 30. Administrar medicamento sem conhecer a ação da droga e sem certificar-se da possibilidade dos riscos. CONSIDERANDO a resolução COFEN – 211/1998 que aprova normas técnicas de radioproteção nos procedimentos a serem realizados pelos profissionais de enfermagem e que trabalham com radiação ionizante em Radioterapia, Medicina Nuclear e Serviços de Imagem. CONSIDERANDO NR 32 - Segurança e Saúde no Trabalho em Serviços de Saúde em seu Item 32.4 – Das Radiações Ionizantes que estabelece o processo de desenvolvimento do Plano de Proteção Radiológica nos estabelecimentos de saúde, assim como processo de radioproteção e uso dos dosímetros. CONSIDERANDO a Resolução Comissão Nacional de Energia Nuclear - CNEN 114/2011 (alteração do item 5.4.2.1) Publicado no D.O.U em 01/09/2011 que estabelece as Diretrizes Básicas de Proteção Radiológica. CONSIDERANDO o processo colaborativo dos profissionais de enfermagem (enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem) no cuidado do paciente submetido a procedimento radiológico registrado na literatura supracitada. III – CONCLUSÃO: Considerando o exposto, sou de parecer que: Os procedimentos de enfermagem radiológica requerem diretrizes seguras quanto ao manejo do paciente antes durante e após os procedimentos realizados pela equipe de enfermagem, adoção de um Plano de Treinamento Continuado e elaboração de processos seguros com adoção sistemática de medidas adequadas para radioproteção além da imprescindível necessidade de implantação da efetiva Sistematização da Assistência de Enfermagem em conformidade com disposto na Resolução COFEN de nº 211/98 respeitando cada nível de competência conforme Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o exercício da enfermagem. Este é o parecer Brasília, 19 de maio de 2013. Enf. Edivaldo Bazilio dos Santos Coren-DF 166212 Membro da CTA do COREN-DF REFERÊNCIAS: Diretrizes Básicas de radioproteção – Resolução CNEN 114/2011. Publicado no D.O.U em 01 de setembro de 2011. RESOLUÇÃO COFEN – 211/1998. Disponível em http://novo.portalcofen.gov.br/resoluo-cofen2111998_4258.html. BRASIL. Lei 7.49813. Lei 7.498, de 25 de junho de 1986. Dispõe sobre Lei 7.498 a regulamentação do exercício da enfermagem e dá outras providências. BRASIL. Decreto 94.406, de 8 de junho de 1987. Regulamenta Lei n. 7498/86 que dispõe sobre o exercício da enfermagem e dá outras providências. CONSELHO FEDERAL DE ENFERMAGEM. Resolução 311/2007. Aprova o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem. RISSATO et al, (2009). Importância do Gerenciamento de Rejeitos Radioativos na Iodoterapia – Revista UNIARA, nº 21/22, 2008/2009. FLÔR, Rita; GELBCKE, Francine – Tecnologias Emissoras de radiação Ionizante e a Necessidade de Educação Permanente para uma Práxis Segura da enfermagem Radiológiica. Rev. bras. enferm. Vol.62 nº5, 09/2009. OLIVEIRA et al, (2009). Elaboração de um Programa de Monitorização Ocupacional em Radiologia para o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho – Radiol Bras vol. 36 º.1; São Paulo, 02/2003 Fundamentos da Terapêutica Clínica com Radioisótopos – Disponível em: http://www.medicinanuclear-santamaria.com.br/fundamenter1.html. CALEGARO, José; TEIXEIRA, Sandra. Avaliação da Exposição Ocupacional de Auxiliares de Enfermagem na Iodoterapia Durante 11 Anos – Radiol Bras vol.40 nº. 4 São Paulo, 08/2007. SMELTZER, S.C; BARE, BG. Brunner e Suddart. Tratado de Enfermagem Médico Cirurgica. 9ª Ed. Rio de Janeiro. Guanabara Koogan, 2002. Parecer Técnico Aprovado na ROP 447ª dia 31.07.2013