"O que aconteceu essencialmente é que a mobilidade do capital

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Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores parlamentares,
Creio que todos os cidadãos preocupados com a crise
econômica mundial acompanharam com atenção a reunião
de Cúpula do G20 realizada na semana passada em
Londres. Para o governo brasileiro, não bastasse a
expectativa por medidas concretas dos países ricos para
a resolução da crise por eles gerada, os acontecimentos
de Londres mereceram alta prioridade política visto o
novo status que vem sendo atribuído ao país no cenário
político mundial.
De fato, Senhor Presidente, o peso econômico relativo
do Brasil e a participação ativa do governo brasileiro nas
articulações que levaram à movimentação coordenada dos
países emergentes na seara internacional, nos últimos
tempos, guindaram o país à condição de ator importante
nas negociações na esfera global. Em Londres, a
excelência
do
trabalho
diplomático
que
vem
referenciando o Brasil nesta matéria, foi potencializada
pelo talento político e o carisma pessoal do presidente
Lula que honrou o país pelos gestos de consideração e
reconhecimento de sua lideranças expressos por algumas
das mais altas autoridades mundiais.
Considero muito difícil um balanço da efetividade do
‘Comunicado’, de nove páginas, emitido pelos líderes do
G20, em Londres, no que tange ao tratamento da crise
econômica. Somente o tempo revelará as medidas que de
fato serão implementadas com a amplitude e a qualidade
exigidas pela crise, e aquelas que foram anunciadas para
evitar ‘crise no G20’. Ocorre que dificuldades ou
interesses nacionais poderão obstar a implementação de
determinadas medidas. A Suíça deixará de ser um
paraíso fiscal ou se sujeitará a um controle
internacional? O Congresso americano dará um flexível
mandato negociador ao governo Obama para continuar a
Rodada Doha da OMC cedendo para valer no
protecionismo interno? E em tempos de crise? Ale, do
mais, ao que tudo indica, persistem os equívocos sobre o
real diagnóstico da crise, o que tende a invalidar algumas
prescrições. Países como os EUA apontam o subprime
como o núcleo da crise. Distante disso, Senhor
Presidente, a crise decorre de desequilíbrios
macroeconômicos severos entre as nações. Em última
instância, é resultante dos efeitos dos enormes
desequilíbrios entre países superavitários e deficitários
de poupança. O subprime foi o ponto de erupção da crise!
Com as ponderações acima, a reunião de Londres,
observada sob a ótica política, anima a se pensar sobre
um outro padrão para a governança global. Nesta direção,
vale salientar, em primeiro lugar, a frustração das
expectativas de frustração que antecederam a reunião.
Longe do clima de disputas e do fracasso prognosticado
por muitos analistas, notadamente por conta das
posições antagônicas entre EUA e UE no tema da
regulação do sistema financeiro, a Cúpula do G20
ocorreu, em tese, sem discordâncias dessa natureza e
dentro de um ambiente inquestionável de cordialidade e
cooperação entre os chefes de estado e de governo
presentes. Este fato pode parecer trivial ou meramente
protocolar, mas sinalizou o vigoramento do G20 e, por
extensão, o incremento das possibilidades do
deslocamento efetivo do fórum de formação das grandes
decisões políticas em escala global. Tanto que já foi
convocada nova Cúpula, ainda para este ano, com o
propósito de avaliar os encaminhamentos de Londres.
Abordei este tema em pronunciamento que fiz desta
tribuna no mês de novembro de 2008, ao comentar a
reunião do G20, em Washington. Naquela oportunidade
dei destaque à interpretação sobre indícios do fim da
onipotência dos EUA, secundarizada pelos países
hegemônicos da Europa, incluindo a Rússia, na definição
dos rumos do mundo. Os prenúncios de um uma nova
ordem mundial estavam dados. Defendi e defendo que, na
base da mesma estão a inviabilidade do avanço do
multilateralismo e da globalização sem o maior
protagonismo dos países emergentes, dadas as vastas e
profundas relações de interdependência constituídas no
plano mundial no presente bloco histórico. Ora, na
atualidade, os mercados emergentes representam 50%
do mercado mundial. O Brasil, mesmo tendo em conta a
sua relativamente baixa participação geral no comércio e
no PIB mundial, exerce inegável influência em setores de
alta sensibilidade. A economia global das commodities e
questões estratégicas para o presente e o futuro do
planeta a exemplo da segurança alimentar, das energias
renováveis, biodiversidade, aquecimento global, etc,
dependem de forma direta da posição brasileira, No caso
da China, muito mais ainda. Além do peso brutal da
economia chinesa no comércio mundial, o país detém mais
de 2 trilhões de dólares em reservas internacionais, o
que contribui decisivamente para a administração do
déficit americano e para o equilíbrio relativo da moeda
de referência mundial. A índia não fica distante, e
tampouco a Argentina, na oferta alimentar mundial.
Em suma, diferente das reuniões do G8 nas quais os
líderes dos países como o Brasil participavam apenas do
cafezinho servido após as decisões dos ricos, o ambiente
do G20, em Londres foi diferente, assim como já fora em
Washington. Por todos os fatos, com destaque para a
alta relevância atribuída por todas as nações
desenvolvidas, Londres deu um sinal a mais para a
provável definição do G20 como o grande fórum de
tomadas de decisões em escala planetária. Fiz menção,
antes, sobre os fatores que estriam na origem dessa
mudança estrutural, Contudo, destaco como elementos
de precipitação desse fenômeno: o protagonismo de
alguns países emergentes, incluindo o Brasil, na
coordenação dos respectivos interesses no âmbito
mundial e, mais recente, a solidariedade forçada dos
ricos diante da evidência de suas incapacidades isoladas
para debelar a gigantesca crise econômica.
Quanto aos pontos acordados pela Cúpula do G20, em
relação à crise, observam-se divergências extremas na
análise dos mesmos entre especialistas. A rigor, muitos
consideram que a decisão mais efetiva do G20 foi o
anúncio da constituição de um bolo internacional de 1.1
trilhão de dólares para a reanimação da economia global,
do qual o Brasil deverá participar com 10 bilhões de
dólares, o equivalente ao dobro do valor da quota do país
no FMI. Ainda assim, a operacionalidade desses
recursos, conforme especialistas mais pessimistas,
deverá tardar de um ano e meio a dois anos. Leve-se em
conta, ainda, o lembrete do Ministro da economia do
Japão segundo o qual aquele país levou 10 anos para
limpar os “ativos tóxicos” produzidos pela crise do
crédito que estagnou a economia japonesa na década de
1990.
De todo o modo, o volume de 1.1 trilhão de dólares
anunciado, será decomposto em US$ 250 bilhões para
um fundo que financiará o comércio mundial, US$ 750
bilhões para empréstimos em condições diferenciadas e
simples pelos FMI, e US$ 100 bilhões para socorro aos
países mais pobres.
Ainda que sem encaminhamentos mais concretos, houve
acordo a respeito da maior regulação do sistema
financeiro. Todavia, será um bom teste vermos o
“sistema regulatório americano” neste tema, submetido a
atos regulatórios de cunho multilateral. Ao que tudo
indica o presidente francês acredita nessa possibilidade,
pois antes da reunião prometeu abandona-la caso os
americanos bloqueassem a regulação do capital
financeiro, incluindo os fundos hedge que movimentam
bilhões de dólares e são atualmente livres de
regulamentação.
As grandes preocupações defendidas pelo governo
brasileiro também foram contempladas no documento
final. Além da injeção de recursos para a recuperação do
crédito, houve novo compromisso conjunto pela retomada
da Rodada Doha, da OMC, desta feita, a ser conduzida
diretamente pelos líderes mundiais e, não mais, pelos
lobistas corporativos travestidos de técnicos dos vários
governos. Controle e sanções a paraísos fiscais da mesma
forma constam do documento final do G20.
Enfim, Senhor Presidente, foram anunciadas várias
outras medidas com vistas à superação da crise
econômica global. O primeiro ministro da Inglaterra
estima uma expansão fiscal de até US$ 5 trilhões pelas
economias nacionais até o próximo ano.
A expectativa comum é que os estímulos anunciados
aumentem a produção mundial em mais de 2 pontos
percentuais e gerem mais de 20 milhões de empregos. A
meta é que em 2010, a crise seja deslocada da economia
para as preocupações de historiadores e economistas que
tenham interesse em decifrar-lhe as causas e
prescrever os antídotos contra recidivas. Vamos torcer;
com as devidas cautelas até pela necessidade de se
preservar o G20.
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