Marjorie de Oliveira

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
FACULDADE DE ADMINISTRAÇÃO CIÊNCIAS CONTABÉIS E TURISMO
CURSO DE TURISMO
DEPARTAMENTO DE TURISMO
MARJORIE SOUZA DE OLIVEIRA
TURISMO DE SAÚDE NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO: A DIMENSÃO
ESTÉTICA
Niterói
2012
2
MARJORIE SOUZA DE OLIVEIRA
TURISMO DE SAÚDE NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO: A DIMENSÃO
ESTÉTICA
Trabalho de Conclusão apresentado ao Curso
de Turismo da Universidade Federal
Fluminense como requisito final de avaliação
para obtenção do grau de Bacharel em
Turismo.
Orientadora – Prof. Msc. Carolina Lescura
Niterói
2012
3
TURISMO DE SAÚDE NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO: A DIMENSÃO
ESTÉTICA
Por
Marjorie Souza de Oliveira
Trabalho de Conclusão apresentado ao
Curso de Turismo da Universidade Federal
Fluminense como requisito final de avaliação
para obtenção do grau de Bacharel em
Turismo.
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________________
PROF. MSC. CAROLINA LESCURA – Orientadora
___________________________________________________________
PROF. MSC. ERLY MARIA DE CARVALHO E SILVA – Convidada
___________________________________________________________
PROF. MSC. ARI DA SILVA FONSECA FILHO – Departamento de Turismo
Niterói,
de
de 2012.
4
Dedico este trabalho aos meus pais e à
minha irmã, por todo o apoio e amor
incondicional.
5
AGRADECIMENTOS
O que antes parecia um sonho impossível, agora se tornou realidade. Esse
trabalho é a prova disso. E ele não estaria completo se não fosse todo o amor, apoio
e compreensão da minha família. Aos meus pais e à minha irmã, o meu muito
obrigada e todo o meu amor.
Agradeço a Deus, por nunca me deixar na mão e pela iluminação nas horas
em que achei que tudo ia dar errado.
À minha avó Rosalina, aos meus padrinhos Solange e Jorge Henrique e aos
meus primos Danilo e Agatha, obrigada pelo acolhimento, compreensão, palavras de
carinho, almoços, viagens ao sítio, jogos de cartas e filmes no final de tarde.
Aos meus primos Renata e José Maria, o meu imenso obrigada pelo
acolhimento em sua casa por todo esse tempo, pelas conversas, pelo apoio e pelo
carinho. À Ana Carolina, pelas suas risadas e “conversas” que sempre me
alegraram!
Meu agradecimento à Professora Erly Carvalho por ter iniciado a minha
orientação, dando conselhos e encaminhando meu pensamento. À Professora
Carolina Lescura, por me receber e ajudar no final da monografia. Sem vocês, não
teria conseguido terminar esse trabalho. Ao Professor Ari Fonseca, por fazer parte
da banca examinadora, muito obrigada.
Obrigada aos médicos da Clínica Ivo Pitanguy e Hospital da Plástica, por me
receberem para as entrevistas com gentileza e por ajudar a construir esse trabalho
com seus depoimentos.
O meu agradecimento aos meus amigos de longa data, Yasmin, Larissa,
Thaísa, Marianna e Flávio, por me apoiarem, oferecerem chocolates, entenderem a
minha ausência e, principalmente, por estarem ao meu lado por todo esse tempo.
Às “meninas da UFF”, Bia, Kamila, Luiza, Marjorie e Naira, obrigada pelas
choppadas, almoços com marmita, filmes, discussão de livros, conversas e risadas.
Meu agradecimento especial à Naira, pelo apoio, por ficar comigo ao telefone por
horas e por nunca ter me deixado duvidar de que conseguiria terminar esse trabalho.
6
Para conquistar coisas importantes,
devemos não apenas agir, mas também
sonhar, não apenas planejar, mas também
acreditar.
Anatole France
7
RESUMO
O turismo de saúde vem ganhando espaço na mídia, devido ao seu grande
crescimento nos últimos anos. Dentro desse segmento, destaca-se o turismo de
estética, quando os pacientes se deslocam para a realização de tratamentos
estéticos. O Rio de Janeiro ganhou fama através do médico Ivo Pitanguy e, junto
com os preços mais acessíveis do mercado brasileiro emergente, colocaram a
cidade no mapa da plástica, atraindo ao país centenas de pacientes que buscam a
excelência brasileira. Sendo assim, o presente estudo tem como objetivo investigar o
Turismo de Saúde na cidade do Rio de Janeiro, com foco na Estética. Para isso,
pretende-se fazer um levantamento bibliográfico sobre turismo de saúde,
privilegiando a dimensão estética, entrevistar gestores de clínicas renomadas da
cidade do Rio de Janeiro e analisar os relatos dos entrevistados, verificando a
relação com o desenvolvimento do turismo de saúde. Para atingir a este objetivo,
optou-se por uma pesquisa qualitativa de natureza exploratória, a partir de
entrevistas com um roteiro semi-estruturado. Os principais resultados encontrados
foram o crescente fluxo de pacientes estrangeiros que chegam ao país em busca de
tratamentos estéticos, o pouco interesse por parte dos gestores de saúde em
relação ao turismo, a divergência de opiniões entre os gestores de saúde a respeito
de parcerias entre eles e gestores do turismo e a incipiência de estudos
relacionados com o tema. As principais conclusões desse trabalho são a
necessidade de um estudo mais profundo na área, a criação de parcerias entre
gestores da saúde e do turismo, criação e aprimoramento de cursos e
especializações e a proposta de uma pesquisa direta com o consumidor de saúde.
Com isso, deseja-se que os pacientes-turistas sejam mais bem recepcionados e que
as clínicas e hospitais tenham mais segurança em lidar com esse público.
Palavras-chave: Turismo de Saúde. Cirurgia Plástica. Estética. Rio de Janeiro.
8
ABSTRACT
The health tourism has been gaining space in the media, due to its great growth in
recent years. Within this segment, the highlight is the esthetic tourism, when patients
travel for performing aesthetic treatments. Rio de Janeiro won fame through Doctor
Ivo Pitanguy and, along with the low prices of the Brazilian emerging market, placed
the city on a map, attracting to the country hundreds of patients who seek the
Brazilian excellence. Thus, the present study aims to investigate the Health Tourism
in the city of Rio de Janeiro, with a focus on aesthetics. For this, were intend to do a
literature review on health tourism, focusing on the aesthetic dimension, interview
managers of clinics renowned in the city of Rio de Janeiro and analyze the
interviewees, verifying the relationship with the development of health tourism. To
achieve this goal, were opted for a qualitative research exploratory in nature, from a
route semi-structured interviews The main results were found the growing flow of
foreign patients coming into the country in search of aesthetic treatments, the little
interest on the part of health managers in relation to tourism, the divergence of
opinions among the managers of health concerning partnerships between them and
tourism managers and the precarious studys. The main conclusions of this work are
the need for a deeper study in the area, the creation of partnerships between
managers of health and tourism, creation and improvement of courses and
specializations and the proposal of a forward lookup with the health consumer. With
this, it is hoped that patients are more well welcomed tourists-and that the clinics and
hospitals have more security in dealing with this audience.
Key-words: Health Tourism. Plastic Surgery. Esthetic. Rio de Janeiro.
9
LISTA DE SIGLAS
ANVISA
Agência Nacional de Vigilância Sanitária
CEM
Código de Ética Médica
CFM
Conselho Federal de Medicina
CMET
Código Mundial de Ética no Turismo
DICQ
Sistema Nacional de Acreditação Ltda
DNV
Det Norske Veritas
FCAV
Fundação Carlos Alberto Vanzolini
GL
Germanischer Lloyd Certification
IAC
Instituições Acreditadoras Credenciadas
IAHCS
Instituto de Acreditação Hospitalar e Certificação em Saúde
IPASS
Instituto Paranaense de Acreditação de Serviços em Saúde
IQG
Instituto Qualisa de Gestão
ISAPS
Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica e Estética
MTur
Ministério do Turismo
ONA
Organização Nacional de Acreditação
SBA
Sistema Brasileiro de Acreditação
SBCP
Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica
SBHM
Sociedade Brasileira de História da Medicina
SLACP
Sociedade Latino Americana de Cirurgia Plástica
WTO
Organização Mundial do Turismo
10
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO ..............................................................................
12
2
SEGMENTAÇÃO DO TURISMO DE SAÚDE ...............................
15
2.1
TURISMO DE SAÚDE ...................................................................
17
2.1.1
Acreditação das instituições de saúde .....................................
20
2.1.2
Ética no Turismo de Saúde ........................................................
21
2.2
CONTEXTO HISTÓRICO DO TURISMO DE SAÚDE ..................
23
2.2.1
A Medicina desde os Tempos Antigos ......................................
23
2.2.2
A Saúde Moderna: busca por tratamentos eficientes ..............
27
2.3
TURISMO MÉDICO .......................................................................
32
3
TURISMO DE ESTÉTICA .............................................................
34
3.1
A BUSCA PELA BELEZA: DOS ENFEITES AO BISTURI ............
38
3.2
O TURISMO DE ESTÉTICA NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO .
42
3.3
AS CLÍNICAS CARIOCAS: RENOME INTERNACIONAL ............
43
3.4.1
Clínica Ivo Pitanguy ....................................................................
44
3.4.2
Hospital da Plástica .....................................................................
44
4
A VISÃO DOS ATORES DO TURISMO DE ESTÉTICA ..............
46
4.1
RESULTADOS DAS ENTREVISTAS ............................................
48
4.1.1
Pesquisa anterior a entrevista ...................................................
48
4.1.2
Análise das entrevistas ...............................................................
49
4.1.2.1 Dados gerais sobre os turistas de saúde .................................
49
4.1.2.2 Relação entre gestores de saúde e serviços turísticos ...........
51
11
4.1.2.3 Relação entre pacientes e serviços de saúde ..........................
54
4.1.2.4 Relação entre pacientes e equipamentos turísticos ................
56
5
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..........................................................
59
REFERÊNCIAS .............................................................................
62
APÊNDICE ....................................................................................
68
12
1 INTRODUÇÃO
O Brasil recebe milhares de turistas durante o ano. Suas regiões
heterogêneas e singulares possibilitam a formação de produtos turísticos atrativos,
que são oferecidos no mercado para satisfazer distintas necessidades ou desejos
das pessoas. Muitos destinos propiciam aos turistas o entretenimento e lazer. Mas,
ao valorizar os elementos que conferem identidade à oferta turística do país, podese identificar a existência de diferentes segmentos.
Embora haja várias motivações de viagem que dinamizem o setor turístico, os
mais reconhecidos e citados são aqueles voltados para o turismo de lazer e de
negócio. No entanto, nos últimos anos, o turismo de saúde vem passando por um
processo de resignificação, obtendo destaque como um segmento promissor. Muitas
pessoas viajam para localidades fora de seu entorno habitual em busca de
tratamentos médicos ou recuperação de sua saúde. De acordo com dados da
Organização Mundial de Saúde (OMS apud JORNAL PANROTAS, 2011), o turismo
de saúde movimenta US$ 60 bilhões por ano no mundo, com média de 35% de
crescimento ao ano. Além disso, a projeção de crescimento desse segmento para o
Brasil, nos próximos cinco anos, é também de 35% (JORNAL PANROTAS, 2011).
Conforme explicado por Adalto Felix Godoi (2010), nos últimos anos o turismo
de saúde passou a crescer nos países menos desenvolvidos, atraindo um fluxo
considerável de pacientes internacionais. Dentre os fatores que contribuíram para
este desenvolvimento, pode-se citar o aumento do custo de tratamentos de saúde
nos países mais ricos, ao mesmo tempo em que os países menos desenvolvidos
passaram a oferecer serviços de saúde a baixo custo, boa eficiência e qualidade.
Alguns países da Ásia e América Latina apresentam-se como destinos
relevantes para o turismo de saúde. Neste âmbito, pode-se destacar o Brasil,
referência internacional em cirurgia plástica, ortopedia, fertilização humana,
ortodontia, entre outras especialidades:
O Brasil tornou-se um importante destino médico atraindo parte importante
da demanda internacional e consolidando a imagem de referência em
diversas especialidades médicas. Com uma ampla e avançada estrutura
hospitalar, o país tem sido reconhecido por órgãos internacionais e se
mostrado no mesmo nível que os grandes centros de excelência mundiais.
(GODOI, 2010, p.5)
13
Algumas instituições médicas brasileiras seguem padrões rigorosos de
qualidade, buscando por certificações de organizações que comprovam a garantia e
excelência dos serviços de saúde prestados. Dentre os destinos procurados no país,
que apresentam instituições acreditadas por alguma organização, destacam-se as
cidades de São Paulo, Recife e Rio de Janeiro (COLLUCCI, 2010). Entretanto, de
acordo com Fernandes e Fernandes (2011), os estados brasileiros que possuem o
maior número de hospitais, particulares e públicos, são: São Paulo, Minas Gerais,
Paraná e Rio de Janeiro.
Neste contexto, destaca-se o turismo de saúde voltado para a estética,
realizado quando a viagem tem como maior motivação a busca por tratamentos
médicos voltados para beleza e autoestima. Os deslocamentos com esta finalidade
incluem uma estada pré e/ou pós-operatória, fazendo com que o paciente possa
realizar atividades amenas, mas respeitando as recomendações médicas. Desta
forma, para aquelas localidades que já apresentam atrativos turísticos, é possível
que os pacientes sintam vontade de conhecê-los.
O Rio de Janeiro, além de ser visitado por turistas internacionais motivados
em conhecer seus atrativos naturais, culturais e históricos, passou a ser frequentado
nos últimos anos, também, por estrangeiros em busca de tratamentos estéticos
(MIRON; POPOV, 2010). Tal fato se deve, principalmente, pela qualidade e fama
que o Brasil ganhou com o Dr. Ivo Pitanguy, considerado referência mundial em
cirurgia plástica.
De um modo geral, pacientes e seus acompanhantes costumam utilizar
equipamentos turísticos durante sua estada na cidade. No entanto, são poucos os
estudos acadêmicos que mostram como a área de saúde estética da cidade do Rio
de Janeiro está buscando atender a este público internacional. Sendo assim, o
presente estudo tem como objetivo investigar o Turismo de Saúde na cidade do Rio
de Janeiro, com foco na Estética. Para isso, pretende-se fazer um levantamento
bibliográfico sobre turismo de saúde, privilegiando a dimensão estética, entrevistar
gestores de clínicas renomadas da cidade do Rio de Janeiro e analisar os relatos
dos entrevistados, verificando a relação com o desenvolvimento do turismo de
saúde.
Para ajudar na compreensão do tema, o seguinte estudo foi encaminhado
através de uma pesquisa qualitativa, de natureza exploratória. Para atingir os
objetivos propostos, foram levantados, em um primeiro momento, dados e
14
informações sobre as clínicas cariocas especializadas em cirurgia plástica, a partir
de uma pesquisa bibliográfica, por meio virtual e impresso. Posteriormente, foram
realizadas duas entrevistas com roteiros semi-estruturados com representantes da
Clínica Ivo Pitanguy e Hospital das Plásticas, ambas localizadas no bairro Botafogo,
Zona Sul da cidade. A partir da coleta e organização das informações, a pesquisa
apontou dados sobre o crescente fluxo de pacientes estrangeiros que chegam ao
país em busca de tratamentos estéticos, o pouco interesse por parte dos gestores
de saúde em relação ao turismo, a divergência de opiniões entre os gestores de
saúde a respeito de parcerias entre eles e gestores do turismo e a incipiência de
estudos relacionados com o tema. Sendo assim, pretende-se contribuir para futuras
pesquisas sobre turismo de estética na cidade do Rio de Janeiro, facilitando o
entendimento do tema pelos gestores, além de melhor recepcionar os pacientesturistas, fazendo com que as clínicas e hospitais tenham mais segurança em lidar
com esse público.
O presente estudo está estruturado em 6 (seis) partes, sendo esta a primeira,
a introdução do trabalho. O capítulo 2 (dois) refere-se a uma abordagem teórica
sobre o tema turismo de saúde, sendo apresentados conceitos e ideias de autores já
conceituados na área. São feitas considerações sobre acreditação de instiruições,
ética no turismo, contexto histórico e turismo médico (sub-segmento do turismo de
saúde).
O capítulo 3 (três) faz uma abordagem específica a respeito do turismo de
estética, foco principal deste trabalho. É apresentada a história desse segmento do
turismo, a fim de melhor compreensão. Para inclusão do tema na atualidade, são
apresentados dados recentes de reportagens e estudos sobre turismo e saúde, além
de situá-los na cidade do Rio de Janeiro. Posteriormente é apresentada a clínica e
hospital onde as entrevistas foram realizadas.
No capítulo 4 (quatro) é explicada a metodologia da pesquisa, tanto da
análise bibliográfica quanto das entrevistas realizadas em campo. Já no capítulo 5
(cinco) são apresentados os resultados da pesquisa descrita no capítulo anterior. E,
por fim, todo o estudo leva a constituição das considerações final, tendo este como o
último capítulo.
15
2 SEGMENTAÇÃO DO TURISMO DE SAÚDE
Os avanços tecnológicos nos meios de transportes e comunicação, no final do
século XX permitiram o crescimento do turismo mundial. Com o encurtamento da
distância e a facilidade em produzir e difundir informações, novos destinos se
formaram e os existentes se consolidaram. A globalização facilitou o deslocamento
de pessoas para diferentes partes do mundo. Com isso, o mercado turístico cresceu,
recebendo relevantes investimentos para o desenvolvimento do setor, além de
contribuir para a formação de novos segmentos turísticos (BENI, 2003).
Segundo o Ministério do Turismo - (BRASIL, 2010, p.7),
[...] em um mundo globalizado, onde se diferenciar adquire importância a
cada dia, os turistas exigem, cada vez mais, roteiros turísticos que se
adaptem às suas necessidades, sua situação pessoal, seus desejos e
preferências.
O Ministério adota essas tendências de consumo como oportunidades de
valorizar a diversidade do Brasil.
A segmentação do mercado turístico pode ser analisada a partir da demanda
ou da oferta. Segmentar a demanda significa agrupar pessoas que apresentam
características, motivações e necessidades parecidas, que tendem a consumir
produtos que se adéquam ao perfil analisado. Por sua vez, a segmentação da oferta
seria combinar os elementos da oferta turística de um local, de modo a formar
produtos turísticos singulares que atenda às expectativas de um perfil da demanda.
A permanente busca de novos produtos turísticos pelos consumidores tem
levado a certas mudanças nas estratégias de planejamento, gestão e promoção do
turismo, privilegiando a segmentação da oferta de produtos turísticos. Sendo assim,
aumenta, cada vez mais, a criação e oferta de produtos direcionados para
demandas específicas, visando oferecer diferentes experiências para os visitantes
(BRASIL, 2010). Sendo assim, a segmentação é importante para a elaboração de
produtos e políticas públicas específicas para uma determinada demanda.
É importante ressaltar que a segmentação do turismo pode ser analisada a
partir de diferentes e inúmeras variáveis. Analisando o turismo a partir da variável
meio de transportes, por exemplo, encontram-se categorias, como náutico, aéreo,
rodoviário, ferroviário, marítimo ou fluvial. Outro critério de segmentação pode ser a
16
análise a partir das motivações, importante para o presente estudo. As pessoas
podem viajar para se divertir, por motivos profissionais, para visitar amigos e
parentes, realizar tratamentos de saúde, entre outros.
Para o Ministério do Turismo (BRASIL, 2010), segmentar o turismo é mais do
que alojar produtos e serviços turísticos semelhantes para uma mesma demanda. É
conhecer o comportamento do turista em um todo, planejando “estratégias e ações
com o objetivo de promover uma posição competitiva do destino junto aos nichos de
mercado que se deseja” (BRASIL, 2010, p.11). Assim, haverá uma melhor
profissionalização e aperfeiçoamento da atividade turística oferecida.
A partir dessas motivações, um lugar pode procurar desenvolver um ou mais
segmentos, conforme possibilidades de combinar sua oferta turística. Esta questão
pode ser ilustrada, citando os diferentes tipos de turismo: de lazer, negócio,
ecoturismo, religioso, gastronômico, de saúde, de pesca, entre outros. Esse trabalho
acadêmico dará foco ao turismo de saúde, mais especificamente o voltado para
tratamentos estéticos.
A figura 1, adaptada de Licínio Cunha (2006), mostra a segmentação do
Turismo, onde o Turismo de Saúde é subsegmentado em médico e bem-estar. O
subsegmento de turismo médico pode envolver medidas cirúrgicas e não cirúrgicas.
No segundo caso, utiliza equipamentos de saúde semelhantes ao do turismo de
saúde bem-estar. No caso do turismo de estética, precisa da intervenção de um
médico e, muitas vezes, cirurgias.
Figura 1: Motivação do Turista
Fonte: Licínio Cunha (2006, p.83) (adaptado pela autora)
17
Percebe-se, com isso, que a demanda de turistas específicos para o turismo
de saúde é diferenciada dos demais segmentos turísticos. A partir disso, podem-se
entender melhor os desejos e expectativas dos viajantes, melhorando o atendimento
e a prestação de serviços,
2.1 TURISMO DE SAÚDE
Para Ruiz-de-Chavez et al (1994, apud MATOS, 2011, p.17) “o turismo e a
saúde são dois conceitos estreitamente relacionados, ambos incidem diretamente no
desenvolvimento econômico dos países e são parte importante da política social a
cargo dos governos”.
Já de acordo com o Ministério do Turismo (BRASIL, 2010, p.15), o “Turismo
de Saúde constitui-se das atividades turísticas decorrentes da utilização de meios e
serviços para fins médicos, terapêuticos e estéticos”. Para Silva (1994), o Turismo
de Saúde são atividades realizadas pelas pessoas que procuram meios de
manutenção ou bom funcionamento de seus físicos e/ou saúde mental. A cartilha
“Ética, Meio Ambiente e Cidadania para o Turismo” do Ministério do Turismo
(REGULES et al, 2007, p.56) relata que:
Turismo de saúde é toda a atividade praticada na procura da conservação
ou obtenção de bem-estar físico e mental. Essa modalidade se caracteriza
pelo deslocamento e utilização de serviços turísticos associados à cura.
Outra particularidade relevante é que se trata de um turismo que não sofre
com a sazonalidade, podendo ser praticado o ano todo.
Para o Ministério do Turismo, existem algumas terminologias que podem ser
utilizadas como sinônimos de turismo de saúde: “turismo hidrotermal, turismo
hidromineral, turismo hidroterápico, turismo termal, turismo de bem-estar, turismo de
águas, turismo medicinal, turismo médico-hospitalar, entre outros” (BRASIL, 2010,
p.15). Entretanto, algumas delas, podem ser utilizadas como sub-segmentos do
Turismo de Saúde, como será visto nesse trabalho.
O deslocamento de pessoas para outras localidades, com a finalidade de
tratamentos e recuperação da saúde não é algo recente. O que ocorre é que
18
atualmente o turismo de saúde vem ganhando mais espaço nas questões sobre o
desenvolvimento econômico de uma região, com base na atividade turística. Dentro
do segmento de turismo da saúde há os subsegmentos, que consistem em
pequenos grupos que caracterizam ainda mais o Turismo de Saúde. Desta forma, o
segmento de saúde pode ser dividido em termalismo, talassoterapia, climatismo,
recuperação da forma, turismo médico e turismo estético (FERNANDES;
FENANDES, 2011).
O Turismo de Saúde é comumente confundido com Saúde do Viajante. Esse
segundo, no entanto, refere-se a “uma área que trata dos riscos, individuais e
coletivos, ocasionados pela movimentação de pessoas e por sua interação com
diversos ambientes”, segundo Matos (2010; p.1). Essa área tem importância dentro
do Turismo, pois a estrutura da atividade turística está diretamente relacionada com
a interação das atividades humanas. Os estudos nessa área são, ainda, restritos a
algumas recomendações médicas sobre como proceder em localidades com risco
de contaminação de certas doenças.
O uso de recursos naturais para efeitos terapêuticos é o que define,
basicamente, o Termalismo. O termo é usado, de maneira genérica, para designar o
emprego de águas minerais em estâncias naturais com o fim curativo (SILVA;
BARREIRA, 1994). O termo “estância” é utilizado pelo Governo do Estado de São
Paulo1 para caracterizar os municípios com perfis semelhantes. São quatro
categorias de estâncias: Turística, Hidrominerais, Climáticas e Balneárias.
Atualmente são 67 municípios paulistas cadastrados, que contam com o auxílio do
Departamento de Apoio ao Desenvolvimento das Estâncias (DADE) (FONSECA
FILHO, 2007). Segundo o Ministério da Saúde (2008), o Termalismo deve ser
empregado de
maneira complementar
aos outros tratamentos de saúde,
principalmente por que o Brasil dispõe de recursos naturais ao seu desenvolvimento.
O perfil das estâncias está mudando com o passar do tempo. Antigamente, os
frequentadores mais comuns era um público de meia-idade ou idade avançada.
Atualmente, “as famílias também passaram a frequentar as estâncias e, com a
tendência dos tratamentos preventivos, o público jovem é cada vez mais frequente
nesses espaços” (REGULES et al, 2007, p.56).
1
Link para a página do Governo de São Paulo sobre o Departamento de Apoio ao Desenvolvimento
das Estâncias (DADE): <http://www.turismo.sp.gov.br/dade/o-que-e-o-dade.html>.
19
A Talassoterapia pode ser confundida com o tratamento por águas termais,
porém utiliza a “água do mar além de outros recursos naturais (climas, maresia,
ondas, sol, areia, algas, lamas etc.) para fins profiláticos e terapêuticos” (BRASIL,
2010, p.22). De acordo com Fernandes e Fernandes (2011), esse tratamento tem
por finalidades a prevenção e regeneração de doenças, pois a água do mar é
suavizadora de diversas doenças e atenua o envelhecimento.
Outra modalidade de turismo de saúde é a Climaterapia: exposição a
diferentes condições climáticas (calor, frio, umidade, luz, ar), estimulando
naturalmente o organismo e promovendo a capacidade de autocura do paciente.
Essa ativação do metabolismo ajuda no sistema cardiovascular, respiratório e
nervoso.
Muitos lugares ficaram conhecidos pelo seu clima mais ameno e propício para
a cura de certas doenças, principalmente as respiratórias. É o caso de Campos do
Jordão, em São Paulo, que é conhecida como a Suíça Brasileira pelo seu clima
(PAULO FILHO, 2012). Outras cidades, como Águas de São Pedro, igualmente
localizada em São Paulo, não só possui um clima favorável, como também possui
águas medicinais. Nesse caso, a cidade é uma estância Hidrotermal. (FONSECA
FILHO, 2007).
Já os spas são conhecidos pela procura para a recuperação da forma, mas
também são instalações (centros ou clínicas) que prestam serviços à saúde física e
mental, a partir de tratamentos feitos pelas propriedades terapêuticas da água com o
objetivo de prevenção, cura, reabilitação, fitness e/ou beleza (FERNANDES;
FERNANDES, 2011). De acordo com Silva (in REGULES et al, 2007), os spas, hoje
em dia, têm como característica principal oferecer toda a infraestrutura de serviços
sofisticados e tratamentos relacionados à “perda de peso, alívio do estresse,
rejuvenescimento, desintoxicação e melhora da aparência estética” (p.57). Esses
“hotéis de luxo” foram criados para atender a uma demanda de turistas que, além do
relaxamento e do lazer, procuram tratamentos medicinais.
De acordo com Ann Dis (2002), os spas tiveram origem na cidade belga
chamada Spa, ainda no século XIV, quando uma terma de água curativa foi
descoberta. Dis (2002) também associa o nome à expressão latina spagere,
(umedecer), ou, até mesmo, ao acrônimo para a frase em latim sanitas per aquas
(saúde através da água). Os spas, entretanto, sofreram algumas transformações ao
longo dos anos. O início se deu através das águas termais curativas, a fim de lazer e
20
relaxamento e seu perfil, hoje em dia, está associado à estética e dietas,
especialmente no Brasil (DIS, 2002).
Sendo assim, oferecem “uma dieta balanceada, programas de esportes e
recreação, tratamentos corporais, massagens, salas de banho, salão de beleza,
palestras relacionadas à saúde, venda de produtos naturais, etc” (REGULES et al,,
2007, p.57). Para tal, dependem de outros fatores, como a temperatura, a pressão e
a composição química das águas. Os tratamentos de hidroterapia estão associados
a outros, como massagens, dietas (nutriterapia), músicas ambientes (musicoterapia),
aromas (aromoterapia), entre outros, criando uma perspectiva do bem-estar integral
(corpo, mente e espírito) (FERNANDES; FERNANDES, 2011).
De acordo com Hall (2011), os turistas de saúde necessitam dos mesmos
requisitos médicos que os moradores locais, sendo que, como aumentam o número
de pacientes em tratamento, deve haver uma reorganização da saúde local para
atender à demanda. Além do mais, qualquer tipo de turista carrega em sua bagagem
seus costumes, cultura, tecnologia, mas também um grande risco de bioseguridade,
devido às doenças dos locais de origem, comida, roupas, hábitos higiênicos entre
outros (WILSON, 1995; HALL, 2005 apud HALL, 2011).
O Turismo de Saúde é, portanto, um segmento do turismo que engloba os
tratamentos relacionados à saúde física e psicológica, utilizando tanto os
equipamentos turísticos, quanto os de saúde.
2.1.1 Acreditação das instituições de saúde
Ao realizar um tratamento de saúde, o paciente deve saber se o hospital,
clínica ou consultório está de acordo com as regras de prestação de serviço e
vigilância sanitária. Para mensurar o grau de qualidade de uma instituição de saúde
foi criada o Sistema Brasileiro de Acreditação (SBA).
O SBA é coordenado pela Organização Nacional de Acreditação (ONA), uma
organização não governamental com atuação nacional que conta para a
regulamentação e vistoria com o Ministério da Saúde e a Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVISA). A ONA tem como objetivo a acreditação de
instituições de saúde através das Instituições Acreditadoras.
21
Segundo Gastal et al (2004, p.1), acreditação é “um sistema de avaliação e
certificação da qualidade de serviços de saúde, voluntário, periódico e reservado”.
As Instituições Acreditadoras são organizações de direito privado, com ou sem fins
lucrativos, credenciadas pela ONA, com a responsabilidade de realizar a avaliação e
a certificação da qualidade dos serviços de saúde, dentro das normas técnicas
previstas (GASTAL, 2004).
Atualmente, o Brasil conta com sete Instituições Acreditadoras Credenciadas
(IACs): DNV (Det Norske Veritas); DICQ (Sistema Nacional de Acreditação Ltda);
FCAV (Fundação Carlos Alberto Vanzolini); GL (Germanischer Lloyd Certification);
IAHCS (Instituto de Acreditação Hospitalar e Certificação em Saúde); IPASS
(Instituto Paranaense de Acreditação de Serviços em Saúde); e IQG (Instituto
Qualisa de Gestão) (ONA; 2012).
Segundo o site oficial da ONA, a Organização alcançou em 2012 a marca de
300 certificações válidas em todo o Brasil. São instituições de 19 estados brasileiros
e São Paulo é o que apresenta maior quantidade de instituições de saúde
certificadas (ONA, 2012).
A região Sudeste detém a maior parte das certificações (São Paulo, Minas
Gerais e Rio de Janeiro, são os três primeiros lugares, respectivamente), seguida
pela região Sul. O estado do Rio de Janeiro conta com 17 instituições (ONA, 2012).
Para uma instituição, a acreditação serve como uma forma de credibilidade,
garantindo a qualidade dos serviços prestados ao paciente e diminuindo os riscos à
saúde. Para o paciente, é uma forma de estar seguro do serviço que será realizado,
principalmente por que está relacionado à sua saúde (FERNANDES; FERNANDES,
2011).
Mensurar a qualidade de um serviço é difícil, pois ele não é tangível e as
pessoas têm opiniões diferentes. A acreditação de uma instituição é uma forma de
tangibilizar o serviço e padronizar o atendimento.
2.1.2 Ética no Turismo de Saúde
A ética é um conjunto de deveres, normas, princípios e regras de conduta que
fazem parte indissociavelmente de uma atividade (FERNANDES; FERNANDES,
22
2011). Para que ela seja cumprida, são aprovados códigos específicos para cada
uma dessas atividades.
Por se tratar de uma atividade multidisciplinar, o turismo de saúde é regido
tanto pela ética do turismo, exposta no Código Mundial de Ética no Turismo, quanto
pela ética da saúde, encontrada no Código de Ética Médica.
O Código Mundial de Ética no Turismo (CMET)2 foi criado pela Organização
Mundial do Turismo (WTO, no original em inglês) e tem por finalidade a promoção do
turismo responsável e sustentável, de forma acessível a todas as pessoas, levando
em consideração que qualquer indivíduo tem o direito de utilizar o seu tempo livre
em lazer ou viagens.
O Código de Ética estimula os deslocamentos por motivo de saúde, religião,
educação e intercâmbio cultural, pois os consideram como “formas particularmente
interessantes de turismo que merecem ser encorajadas” (CMET, p.6). Entretanto, a
maior parte das referências à saúde está relacionada à saúde do viajante e
precauções em relação a lugares propensos a epidemias.
O Código de Ética Médica (CEM)3 foi criado pelo Conselho Federal de
Medicina (CFM) e contém as normas éticas que devem ser seguidas pelos médicos
no exercício de sua profissão, independentemente da função ou cargo que ocupem.
As organizações de prestação de serviços médicos também estão sujeitas às
normas do Código.
O CEM não menciona o tratamento de pacientes que sejam provenientes de
outras cidades ou países, porém, faz referência ao fato de que o agente de saúde
não deve ter preconceito à pessoa que será tratada. Além do mais, o médico deve
exercer sua função com autonomia, salvo em casos prejudiciais ao paciente (Art. 7°
- CEM), não pode utilizar a medicina como forma de comércio (Art. 9° - CEM) e deve
respeitar todos aqueles que trabalhem na área de saúde, independentemente de
seu cargo (Art. 18° - CEM).
O grande impasse atual a respeito da ética no turismo de saúde é exposto por
Rothenberg (2010) como a saúde pública de alguns países sofrendo com o turismo
de saúde. Ele afirma que alguns governos estão sacrificando alguns setores da
saúde pública, particularmente das camadas mais pobres da população e do setor
2
Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/novocodigo/legislacao.asp>. Acesso em: Acesso em
24 abr. 2012.
3
Disponível em: <http://ethics.unwto.org/en/content/global-code-ethics-tourism>. Acesso em 24 abr.
2012.
23
rural, em função de facilitar a ida dos turistas estrangeiros aos seus países cuidar
das suas saúdes. Rothenberg (2010) diz, ainda, que essa atitude é antiética por
parte dos governantes, pois é dever deles levar a saúde a toda a população.
Entretanto, também diz que seguir a ética é uma opção do setor de saúde e da
população, pois a opinião acerca dos benefícios do turismo de saúde pode mudar.
No turismo em geral, a qualidade, a excelência, a segurança e a ética estão
indissociavelmente associadas, sendo sinônimos de qualidade no atendimento de
serviços (FERNANDES; FERNANDES, 2011). No turismo de saúde, em especial, os
serviços devem inspirar confiança nos pacientes, pois os prestadores estão lidando
com a saúde de outra pessoa. A ética se torna uma forma de proteção ao turista e
um atributo de qualidade.
2.2 CONTEXTO HISTÓRICO DO TURISMO DE SAÚDE
A preocupação com a saúde não é algo recente. A busca por cura de males
que afligiam às pessoas já existia na idade da Pedra, segundo Moraes et al (2004).
Com o passar do tempo, novos métodos de tratamento foram sendo descobertos e,
hoje em dia, os melhores médicos são reconhecidos no mundo todo e atraem um
grande fluxo de turistas que procuram por seus tratamentos de saúde.
2.2.1 A medicina desde os tempos antigos
A preocupação com doenças e males é algo tão antigo quanto à condição
humana. As pessoas sempre procuraram curandeiros, ervas e plantas que
pudessem de alguma forma, ajudar em suas saúdes. O poder de cura era passado
de geração em geração pela tradição oral (MORAES et al, 2004).
Os homens da Idade da Pedra, segundo Moraes et al (2004), já haviam
identificado algumas funções e órgãos vitais do organismo e já utilizavam técnicas
para facilitar o parto, realizavam cirurgias, trepanações (abertura do crânio para
retirada de tumores e sucção de líquidos) e participavam de rituais místicos
realizados por feiticeiros-médicos. Ainda segundo Moraes et al (2004), foram
encontrados crânios pré-históricos com sinais de incisões cirúrgicas, realizadas com
24
o paciente ainda vivos. Foram descobertos, também, sinais de que muitos desses
pacientes sobreviveram à cirurgia, morrendo tempos depois por outros motivos.
O principal medicamento dessa época, entretanto, era a água. O seu uso para
tratamento de males, de acordo com Silva e Barreira, (1994), remonta aos homens
primitivos, que descobriram quando lavadas, suas feridas e machucados
cicatrizavam de maneira mais rápida. Na Idade Antiga, os banhos foram utilizados
como forma de prevenção de doenças e utilizavam águas minerais.
Sendo assim, percebe-se que a saúde sempre foi uma preocupação da
humanidade. Entretanto, com o passar das eras, essa preocupação passa da
recuperação para a prevenção.
Com a expansão da economia do Mediterrâneo, a cultura e os ensinamentos
dessa região foram difundidos por todo o mundo. Algumas civilizações arcaicas
tinham grande influência sobre a região da Europa, como as civilizações do Norte da
África (Egito) e Ásia ocidental (Mesopotâmia). Os conhecimentos médicos da época
eram escritos em papiros e seu conteúdo continha:
[...] diagnósticos, tratamentos, prognósticos já estabelecidos; conhecimento
exato de muitas afecções de causa visível; aplicação de conhecimentos
práticos eficazes associados à magia e a encantamentos (MORAES et al,
2004).
Os primeiros deslocamentos para a busca por tratamentos de saúde
remontam às civilizações antigas, que utilizavam águas medicinais, principalmente
sobre a forma de banhos, para curas de doenças. Hammerl e Oliveira (2007)
afirmam que o Turismo de Saúde, como o conhecemos hoje, começou com as
Termas em Roma, quando as pessoas viajavam para se curarem com águas termais
e utilizavam de certos equipamentos turísticos, com a concepção parecida com a
dos atuais, como meios de transporte, meios de hospedagem, entre outros.
Eram comuns as viagens realizadas por grupos de pessoas que procuravam
por tratamentos nessas águas, principalmente quando seus lugares de origens não
possuíam termas. Estas, então, foram ganhando força, tanto para sua forma de
tratamento como de repouso. Os gregos e romanos são os povos com termas mais
populares, apesar de serem conhecidas, também, termas no Egito, Índia e terras
árabes (FERNANDES; FERNANDES, 2011).
25
Os famosos banhos públicos eram presentes em quase todas as cidades, e
somente os homens ricos podiam frequenta-los. Muitas casas de banho possuíam
um sofisticado sistema de aquecimento e algumas utilizavam, também, as
propriedades medicinais das águas minerais. A expressão Termalismo, referente ao
uso das termas, teve origem na região de Roma, durante o auge do período termal
(SILVA; BARREIRA, 1994).
As propriedades terapêuticas da água foram tendo seu declínio com a queda
do Império Romano do Ocidente e a chegada da Idade Média. Os deslocamentos de
pessoas durante esse período não tiveram como finalidade a saúde e bem-estar.
Estavam ligados às expansões e Cruzadas promovidas pela Igreja Católica, que
teve grande influência na época Medieval. Entre os Séculos V e XV, a doutrina
católica imperou nos feudos, fazendo com que o pensamento fosse voltado para a
religião e ensinamentos bíblicos (SCHMIDT, 2001). A Igreja Católica baniu as casas
de banhos, alegando serem espaços pecaminosos e de perversão. A limpeza
espiritual era mais importante que a limpeza física (FERNANDES; FERNANDES,
2011). As pragas e epidemias que assolaram essa época também colaboraram para
que o uso de banhos públicos fosse abandonado (SILVA; BARREIRA, 1994).
No Século XVI, com a Renascença, intensificou-se o movimento de produção
artística e científica, apreciando a razão e natureza, valorizando o ser humano e
seus pensamentos. Mudanças nos hábitos e costumes possibilitaram o retorno do
Termalismo (SILVA; BARREIRA, 1994). Houve, também, grande progresso na
medicina e anatomia, colocando um novo olhar sobre a saúde. Assim, a procura por
termas e águas medicinais, principalmente pelo fato de os estudos médicos usarem
fontes antigas com bases gregas e romanas, volta a fazer parte do cotidiano das
pessoas (ALVES, 2009).
Já nos séculos XVII e XVIII, os reis frequentavam as termas com suas
comitivas, fortalecendo o redescobrimento das termas. Como usavam apenas uma
parte do dia para se banharem, restava tempo para o desenvolvimento de outras
atividades. Segundo Silva e Barreira (1994, p.15), “criaram-se opções de
entretenimento que não tinham necessariamente alguma ligação com o aspecto
medicinal” e instalaram-se na região teatros, casas de ópera, cassinos, pistas de
corrida, livrarias, salões de baile, etc., fortalecendo o turismo a essas áreas (SILVA;
BARREIRA, 1994).
26
No Brasil, os índios já utilizavam a água para diversos tratamentos, mas as
primeiras fontes de água natural foram encontradas a partir do século XVIII e foram
introduzidas “junto com a colonização portuguesa, que trouxe ao País seus hábitos
de usar águas minerais para tratamento de saúde” (MTur, 2008, p.6). Muitas águas
possuíam gosto e odores diferentes, o que as diferenciavam das águas comuns. As
águas que “brotavam” dos solos traziam consigo minerais que amenizavam sintomas
de algumas doenças (MTur, 2010). Os donos das terras onde as fontes se
encontravam começaram, então, a comercializar seu produto, criando um aspecto
comercial para a atividade.
A partir do século XIX, a instalação de ferrovias impulsionou ainda mais o
deslocamento por tratamentos com águas termais, pois facilitou o acesso às fontes
naturais. O avanço da ciência também ajudou, pois comprovou as propriedades
medicinais das águas (BRASIL, 2010). Com a crescente demanda pelas termas,
foram sendo criados equipamentos para receber esses viajantes, como hospedarias,
alimentação, transporte. Nasce, assim, o Turismo de Saúde.
Villar (2004) afirma que há um grande avanço da medicina nos séculos XVIII,
XIX e início do XX, devido às muitas epidemias e enfermidades da época. Com a
Segunda Guerra Mundial, houve um avanço da indústria farmacêutica, começando a
era dos antibióticos e corticoides. O efeito rápido de medicamentos fez com que a
terapia com águas fosse, novamente, decaindo (SILVA; BARREIRA, 1994). De
acordo com o Ministério do Turismo, com esse avanço na medicina aumentou o
interesse das pessoas nessas novas formas de cura. Houve, então, uma busca por
“centros urbanos, dotados de instalações e avançados equipamentos médicohospitalares” (BRASIL, 2010, p.14).
Por outro lado, o progresso também trouxe o chamado “estresse urbano” ao
cenário social. Este, somado à crescente valorização da estética levou as pessoas,
segundo o Ministério do Turismo, a procurarem por tratamentos anti-estresse e
estéticos. Há a volta dos tratamentos com águas termais, a procura por balneários e
o surgimento de spas e hotéis de lazer, com produtos e serviços específicos para
esse público.
27
2.2.2 A saúde moderna: busca por tratamentos eficientes
Hoje em dia, a prática do Turismo de Saúde é diferente dos tempos antigos.
O deslocamento para tratamentos deixou de ser excepcionalmente para a cura de
doenças, mas também para descanso e relaxamento (cura da mente cansada) e
estética (tratamentos de beleza com ou sem cirurgias). De acordo com Silva e
Barreira (1994) há, também, uma preocupação com a manutenção e prevenção de
doenças, o que influencia as pessoas a procurarem por destinos com melhores
médicos e tratamentos. Alguns destinos foram entrando em declínio, enquanto
outros foram sendo consolidados, pois oferecem novos tratamentos e criam
diferenciais atrativos aos olhos dos turistas.
A saúde é algo muito importante para ser arriscada por um profissional
inexperiente ou por um hospital que não seja adequado às normas de higiene e
segurança. Cada vez mais as pessoas buscam por melhores tratamentos, mesmo
que sejam em outros países. Segundo Godoi (2009, p.15), os fatores que levam os
pacientes a viajar por saúde são:
[...] falta de um convênio ou seguro médico que custeie as despesas
médicas e/ou hospitalares; inexistência de cobertura pelo convênio ou
seguro médico para o procedimento solicitado; redução de custo ou
economia com o procedimento; restrições do sistema de saúde local, de
infraestrutura e/ou legais; conciliar turismo e tratamento médico; país ser
referência internacional em determinada especialidade com intervenção de
qualidade similar ou superior à local e diáspora.
Com o passar do tempo, muitos países se destacaram no atendimento
médico e tratamentos de saúde. O estímulo ao crescimento tem grande influência da
globalização, quando o acesso à saúde e à informação ficou mais fácil. Além do
mais, houve um grande avanço tecnológico no mundo moderno, que fez com que a
cura e soluções de problemas tivessem que ser mais rápidas (GODOI, 2009).
O que mais estimula o crescimento do turismo médico mundial, hoje em dia,
são as alterações na tecnologia, no comportamento e na demografia. Ou seja, há
muitas inovações tecnológicas, que tornam a busca por serviços mais rápida e
eficiente e o risco de intervenções cirúrgicas menores; a mudança na mentalidade
das pessoas, que buscam serviços médicos melhores e em vista da prevenção de
28
doenças e o envelhecimento da população, que teve a necessidade maior por
serviços de saúde, além da longevidade e a busca por melhor qualidade de vida.
O turismo de saúde passou a ser mais do que o deslocamento de pessoas
em busca de médicos, pois há a “possibilidade de envolvimento do paciente em
alguma atividade turística, cultural ou de lazer durante o tratamento” (GODOI, 2009,
p.17), conciliando necessidade com prazer, conhecimento e experiências culturais.
Conforme explicado por Godoi (2010, p.1), o turismo de saúde: “pode ser
entendido simplesmente como o deslocamento de pessoas entre países em busca
de tratamento médico a um custo menor sem abrir mão da segurança e da
qualidade do serviço médico prestado”.
Vários fatores contribuíram para o desenvolvimento do turismo de saúde.
Com base em Bolis (2001; apud FROZÉ; GIANOTTI; GIANOTTI, 2010), as razões
para as pessoas buscarem serviços de saúde no exterior são: a falta de serviços no
país de origem, baixo custo e boa qualidade nos países pouco desenvolvidos,
sentimento de segurança de pessoas residentes no exterior, regressando ao seu
país de origem para receber tratamentos médicos e integração regional, que
promove facilidade das pessoas em transladar de um lugar para o outro.
Segundo Fernandes e Fernandes (2011), os países receptores que mais
atraem turistas para tratamentos médicos são: África do Sul, Brasil, Chile, Colômbia
Coréia do Sul, Costa Rica, Cuba, Dubai, El Salvador, Filipinas, Guatemala, Hungria,
Índia, Israel, Jordânia, Malásia, México, Panamá, Singapura, Tailândia, Tunísia,
Turquia e Vietnã.
Os procedimentos médicos mais procurados no mundo são, de acordo com
Godoi (2009), os de ortodontia, cirurgia plástica, ortopedia e cirurgia cardiovascular.
A medicina do bem-estar também está em alta, como uma alternativa aos
tratamentos que tenham intervenções médicas. A indústria de turismo médico
movimenta US$ 40 bilhões em cirurgias, como cardíaca e plástica, e em tratamentos
como dentário e de fertilidade, de acordo com a reportagem da Natália Paiva do
jornal Folha de São Paulo4.
Segundo a reportagem “Recife discutirá turismo de saúde”5, a cidade com
maior fluxo de turistas de saúde é São Paulo, seguida por Recife e Rio de Janeiro. O
país está investido, cada vez mais, em tecnologias para as cirurgias e na
4Folha de São Paulo, São Paulo, Turismo médico mundial gira US$ 40 bilhões, 21/02/2012.
5 Jornal do Commércio, Pernambuco, Recife discutirá turismo de saúde, 01/09/2011.
29
capacitação de profissionais da área de saúde. Segundo dados do Ministério do
Turismo (BRASIL, 2011), esse segmento atrai cerca de 31 mil pacientes por ano ao
Brasil.
Com a globalização, ficou mais fácil para os países em desenvolvimento
terem uma tecnologia e profissionais no mesmo nível de qualidade do que os dos
países desenvolvidos. Há um aumento na pesquisa médica dos países do terceiro
mundo, por conta dessa demanda em crescimento. As que estão em alta são
cirurgia bariátrica e tratamento com células-tronco (PAIVA, 2012).
Segundo, ainda, a reportagem de Natália Paiva6, Cingapura contou com um
apoio em larga escala de agências estatais para se tornar um dos principais centros
de diagnóstico avançado. Mesmo assim, seus hospitais mais caros chegam a cobrar
até 40% menos que os dos Estados Unidos. A Coreia do Sul teve um aumento de
8.000 pacientes estrangeiros para 82 mil de 2009 para cá e ainda pretende chegar a
300 mil até 2015. Oferece cirurgia robótica e terapia de proton beam para tratar
câncer por radiação a "preços acessíveis".
A reportagem completa dizendo que por ano são 6 (seis) milhões de viajantes
em busca de tratamentos de saúde e que a maior parte desses estrangeiros provém
dos Estados Unidos, onde os serviços médicos são um dos mais caros do mundo,
tendo, ainda, muitas pessoas sem seguros ou subseguradas.
O Brasil vem se destacando no turismo médico internacional, não somente
pelos preços baixos, mas também pela qualidade no atendimento. A figura abaixo
(Figura 2) mostra que os países de terceiro mundo vêm ganhando força no turismo
médico internacional, pois oferecem preços mais competitivos em relação aos
Estados Unidos.
6 Folha de São Paulo, São Paulo, Turismo médico mundial gira US$ 40 bilhões, 21/02/2012.
30
Figura 2: Pelo Mundo: principais destinos e tratamentos dos “pacientes-turistas”
Fonte: Folha Online, 2012.
Com o crescimento que o Brasil vem tendo com o turismo de estética, não é
difícil encontrar empresas especializadas em trazer pacientes de outros países para
se tratarem nas clínicas e hospitais brasileiros. É o caso da SPHERA Internacional,
uma empresa que lida com os trâmites burocráticos para que o paciente possa ser
tratado me outro país.
A SPHERA Internacional afirma em seu sítio eletrônico7 que o Brasil está se
destacando na saúde, por sua tecnologia, dedicação e competência nos setores de
cirurgia plástica, cirurgia para redução de peso, tratamentos odontológicos,
ortopedia, dermatologia, implante capilar, medicina esportiva, procedimentos de
reabilitação, check-ups completos. Além disso, mostra em sua página que o Brasil é
perfeito para a prática do turismo, com muitas possibilidades de lazer, descanso e
cultura, alegando que o paciente e sua família poderão ter uma temporada
agradável, enquanto cuidam da saúde.
A Universidade de Montreal realizou um estudo sobre o turismo de saúde na
América Latina, divulgado pelo jornal Developing World Bioethics. De acordo com o
pesquisador Williams-Jones, a última década foi marcada por um boom de clínicas
7
SPHERA INTERNACIONAL. Disponível em: <http://www.brazilmedicaltourism.com/>. Acesso em 28
abr. 2012.
31
de fertilidade privadas nos países em desenvolvimento. O principal atrativo desses
lugares é justamente o preço mais baixo. Além do mais, as clínicas divulgam um
pacote completo: preços fixos, hospedagem, traslados, intérpretes e tratamentos de
fertilidade (UNIVERSIDADE DE MONTREAL, 2009).
Williams-Jones continua, dizendo que os países com maior envolvimento na
área de fertilidade são, ainda, a Índia e a Polônia, mas já encontram concorrência no
mercado latino-americano. Países como Brasil, Chile, México e Argentina já estão
virando o alvo de pacientes da América do Norte e Europa. A principal via de
informação é a Internet (UNIVERSIDADE DE MONTREAL, 2009).
Em vista desse grande crescimento do turismo de saúde, os hospitais e
clínicas enfrentam uma concorrência que não existia anos atrás. Há, então, uma
tendência sobre o Turismo de Saúde: uma maior preocupação com a Hotelaria
Hospitalar, pois, segundo Taraboulsi (2009; p.2) é: “uma tendência que veio para
livrar os hospitais da ‘cara de hospital’ e que traz em sua essência uma proposta de
adaptação a nova realidade do mercado, modificando e introduzindo novos
processos, serviços e condutas”.
Essa nova compreensão dos serviços hospitalares veio a partir do
reconhecimento de alguns gestores sobre quem é realmente o cliente de saúde:
pessoas enfermas, familiares, acompanhantes e visitantes. Segundo Taraboulsi
(2009), esse cliente se difere do hospitalar, pois, em muitos casos, não está doente,
como o paciente que busca uma cirurgia estética, por exemplo.
Uma mudança que o aumento da demanda por serviços médicos trouxe
foram as novas oportunidades de negócios ligados ao atendimento de um cliente de
serviços. Atender a esse tipo de cliente traz implicações próprias, pois se trata de
um produto intangível e com consequências diretas ao cliente, por se tratar se sua
saúde. Para isso, são necessários equipamentos próprios voltados para a saúde,
além da adaptação de outros para o turista de saúde. Essa mudança impacta no
desenvolvimento econômico do país e na distribuição de renda (GODOI, 2009).
32
2.3 TURISMO MÉDICO
O Turismo Médico envolve as práticas de tratamentos curativos, baseados em
cirurgias, transplantes e tratamentos de saúde que necessitem da intervenção de um
médico especializado e conceituado, além de uma infraestrutura própria adequada,
com clínicas e hospitais que prestem os cuidados necessários ao paciente
(FERNANDES; FERNANDES, 2011).
Godoi (2009, p.14) afirma que o Turismo Médico pode ser definido como:
[...] a viagem de uma pessoa a outro país em busca de tratamento, de
cuidado médico ou bem-estar físico, psicológico e espiritual, normalmente
associado a benefícios, podendo ou não envolver atividades turísticas,
culturais e de lazer.
O autor completa, ainda, dizendo que o turismo médico vem sendo entendido
como um conjunto de serviços com alto valor agregado, com viagens para
tratamentos médicos ou recuperação da saúde.
A definição que inclui a estética como uma das práticas do Turismo Médico
vem do Ministério do Turismo (BRASIL, 2010, p.17):
Deslocamentos motivados pela realização de tratamentos e exames
diagnósticos por meio do acompanhamento de recursos humanos
especializados e integrados em estruturas próprias, tendo como objetivo
tanto a cura ou a amenização dos efeitos causados por diferentes
patologias, como fins estéticos e terapêuticos.
Hall (2009, apud HALL, 2011) traz dois conceitos das Nações Unidas e
Comissão Social da Ásia e Pacífico: a diferença entre medical travel (“viagem
médica”, tradução livre) e medical tourism (“turismo médico”, tradução livre). Essa
“viagem médica” seria um deslocamento individual de pessoas que buscam por
tratamentos médicos em outros países por não existir em seu país de origem, ou por
longas filas de espera ou por simplesmente ser melhor em outro lugar. O “turismo
médico” seria especificamente a tendência mundial que essas “viagens médicas”
estão tendo em combinação com serviços turísticos comuns. Ou seja, para ser
turismo médico, tem que utilizar equipamentos turísticos.
33
Um conceito mais simples de turismo médico é apresentado por Balaban e
Marano (2010, apud HALL, 2011), alegando ser qualquer viagem com o propósito de
realizar um tratamento médico.
Segundo Godoi (2009), o termo “Turismo Médico” é mais conhecido pelo
mundo, embora o termo “Turismo de Saúde” seja bastante empregado. No Brasil, a
definição mais utilizada é a de “Turismo de Saúde”, pois é mais abrangente e
relaciona-se, também, a outros tipos de tratamentos que não exigem intervenção
médica. Porém, com o crescimento da medicina brasileira e a exportação cada vez
maior de médicos e tratamentos, o termo “Turismo Médico” está sendo cada vez
mais usado no país. Esse trabalho acadêmico terá como tema principal o Turismo
de Estética, sub-segmento do Turismo de Saúde e que será abordado a seguir.
34
3 TURISMO DE ESTÉTICA
O turismo de estética envolve “tratamentos profiláticos, terapêuticos ou de
reabilitação, bem como de relaxamento, recuperação e beleza ou estética”
(FERNANDES; FERNANDES, 2011, p.36) e deve ser considerado como “uma
modalidade de turismo médico e abrange diversos tipos de tratamentos,
principalmente cirurgias plásticas, muitas vezes designado turismo de bisturi”
(FERNANDES; FERNANDES, 2011, p.89)
Esses tratamentos podem compreender intervenções cirúrgicas, como
lipoaspirações e colocações de próteses de silicone que, segundo Godoi (2009),
vêm colocando o Brasil no ranking dos destinos estéticos mais procurados para a
realização desses procedimentos ou, simplesmente, pode ser um tratamento
simples, como aplicação de botox ou peeling facial, que vêm tendo grande
crescimento no país, segundo a repostagem Plástica não invasiva se torna a mais
comum8 (AGÊNCIA ESTADO, 2010).
O depoimento do médico e Professor Ivo Pitanguy para o sítio eletrônico de
sua clínica diz que:
A busca da cirurgia plástica emana de uma finalidade transcendente. É a
tentativa de harmonização do corpo com o espírito, da emoção com o
racional, visando estabelecer um equilíbrio que permita ao indivíduo sentirse em harmonia com sua própria imagem e com o universo que o cerca
(PITANGUY, 2012).
De acordo com a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética
(ISAPS, no original em inglês), o Brasil é o terceiro país em número de cirurgias
plásticas realizadas no mundo, atrás somente dos Estados Unidos e da China.
O turismo de estética conta com um agravante: o tratamento tem que ser
perfeito. Há um grande risco de insatisfação por parte do paciente aos resultados
obtidos, já que, por se tratar da estética, o resultado deve ser perfeito. Segundo
Fernandes e Fernandes (2011), os tratamentos devem ser realizados durante o
período de outono ou inverno, pois as exposições ao calor e ao sol podem
8
AGÊNCIA ESTADO. Plástica não invasiva se torna a mais comum. Disponível em:
<http://g1.globo.com/brasil/noticia/2010/08/plastica-nao-invasiva-se-torna-a-mais-comum.html>.
Acesso em: 20 abr. 2012.
35
comprometer o resultado final esperado. Para isso, além de um bom diálogo anterior
com o paciente, a clínica ou hospital deve contratar cirurgiões acreditados, utilizar
tecnologia de ponta, estar dentro das normas da vigilância sanitária e obedecer a
todos os requisitos previstos pelo conselho Federal de Medicina (CFM)
(FERNANDES; FERNANDES, 2011).
O Brasil vem demonstrando os seus avanços na área de saúde com médicos
competentes, hospitais de primeira linha, investimentos em tecnologia e, tudo isso, a
preços acessíveis. O mesmo vem acontecendo com a medicina estética. O médico e
professor Ivo Pitanguy colocou o Brasil no mapa das cirurgias plásticas. O país atrai
pacientes do mundo todo, em busca do “corpo brasileiro”.
Entre os países que realizaram mais cirurgias plásticas, a Sociedade
Internacional de Cirurgia Plástica e Estética (ISAPS, no original em inglês) afirma
que são os Estados Unidos, seguido pelo Brasil, China, Índia e Japão,
respectivamente, de acordo com Fernandes e Fernandes (2011). Os autores
destacam, também, Argentina, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Itália, Malásia,
México, Tunísia e Turquia (FERNANDES; FERNANDES, 2011). Os procedimentos
mais realizados são: Lipoaspiração (remoção de gorduras), Mamoplastia (redução
dos seios femininos), Blefaroplastia (levantamento das pálpebras), Rinoplastia
(plástica do nariz) e Abdominoplastia (remoção de gorduras e peles do abdômen). A
colocação dos países se repete no que diz respeito aos procedimentos estéticos não
cirúrgicos, sendo os mais realizados: aplicação de Toxina Botulínica tipo A (Botox
Dysport), injeção de ácido hialurônico (preenchimento de rugas e aumento de
volume de certas áreas do corpo), injeção autóloga de gordura (enxerto de gordura),
depilação a laser, tratamento Laser IPL (emissão de ondas de calor para perda de
gordura) (FERNANDES; FERNANDES, 2011).
O grande problema do turismo médico estético hoje em dia é a banalização
das cirurgias plásticas. Um repórter do programa Fantástico, na reportagem
Brasileiras se ariscam em cirurgias plásticas no Paraguai e na Bolívia9, declarou que
“é cada vez maior o número de pacientes brasileiras em cirurgiões plásticos
estrangeiros. O motivo são os preços baixos”. Um cirurgião boliviano chega a
realizar até 10 cirurgias por dia. O médico José Horácio Aboudib, presidente da
Sociedade Brasileira de Cirurgiões Plásticos, declarou que “não há a intenção de
9
Programa Fantástico, Rede Globo, Brasileiras se ariscam em cirurgias plásticas no Paraguai e na
Bolívia, 20/11/2011.
36
oferecer um bom serviço” nesses outros países. Até porque, a paciente realiza a
cirurgia e volta ao seu país de origem, não tendo mais contato com o médico10.
O presidente do Conselho Federal de Medicina alerta para a conduta antiética
dos médicos em geral: aceitar tudo o que o paciente diz, pois ele vai com ânsia, na
vontade de realizar várias cirurgias ao mesmo tempo e, em muitos casos, nem são
necessárias; fazer consulta por telefone, pois o médico não analisa o que realmente
o paciente precisa; exames de última hora, pois podem não acusar algum problema
sério que levará a complicações na cirurgia; oferecer serviços grandes de graça,
pois todo serviço médico necessita de uma mão de obra de ajuda, como
anestesistas, enfermeiros, instrumentadores, que precisam ser pagos e clínicas sem
Unidade de Tratamento Intensiva (UTI), pois o paciente pode precisar com urgência
de tratamento por causa de alguma complicação11.
Segundo o presidente da Associação Boliviana de Cirurgiões Plásticos, o
médico Marcelo Salvatierra para a reportagem do programa Fantástico12, esse tipo
de turismo médico vem sustentando a economia das cidades que fazem fronteira
com o Brasil e onde a fiscalização é pequena. Ele afirma, inclusive, que muitas
cirurgias são realizadas por médicos que não possuem especialização em Cirurgia
Plástica.
Esse tipo de turismo médico sem fiscalizações e com resultados negativos
não vem ocorrendo no Brasil. Médicos como o Ivo Pitanguy elevaram o status dos
procedimentos estéticos que vem sendo realizados dentro do país. Por isso é
comum que cada vez mais, estrangeiros e brasileiros procurem médicos brasileiros
para a realização de cirurgias plásticas.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), o
universo da plástica está presenciando a chamada “revolução dos 60”. Esse termo é
usado para designar a pessoas maiores de 60 anos que estão realizando plásticas
hoje em dia. Os cirurgiões afirmam que, antigamente, realizar uma cirurgia plástica
em uma pessoa maior de 60 anos era perigoso, um risco. Atualmente, com o avanço
da medicina e das tecnologias empregadas nas cirurgias, esse risco diminuiu muito.
Há 20 anos não havia os cremes combatentes dos primeiros sinais de rugas,
que hoje já são aplicados por jovens de 25 anos, nem produtos como Botox, laser e
10
Programa Fantástico, Rede Globo, Brasileiras se ariscam em cirurgias plásticas no Paraguai e na
Bolívia, 20/11/2011.
11
Idem nota 10.
12
Idem nota 10.
37
preenchimentos, que suavizam a expressão dos 40 ou 50 anos. A pele da mulher
moderna é mais elástica, devido aos tratamentos de beleza que estão submetidas
desde sempre. Isso, somado a melhoria das condições gerais de saúde, dos
hospitais e a maior quantidade de informações sobre as cirurgias, tem como
resultado a diminuição significativa das complicações cirúrgicas e os resultados são
mais naturais.
De acordo com o Portal G1 de Notícias (2010), a Sociedade Internacional de
Cirurgia Plástica Estética (ISAPS) realizou uma pesquisa13 sobre os procedimentos
estéticos mais realizados e o resultado é de que os cirurgiões plásticos realizam hoje
mais procedimentos não invasivos, como aplicações de Botox, colágeno e ácido
hialurônico, do que cirurgias estéticas propriamente ditas.
A pesquisa14 aponta o Brasil como o terceiro país em número de cirurgias
plásticas realizadas no mundo, atrás somente dos Estados Unidos e da China. A
ISAPS informou que não existem pesquisas anteriores para comparação de dados,
mas não ignora o fato de que houve uma grande mudança no cenário da estética
mundial. Segundo o médico João Carlos Sampaio Góes, ex-presidente da ISAPS,
essa mudança é uma tendência que vem de anos atrás. O cirurgião plástico
somente identificou uma oportunidade em um nicho de mercado que antes era
ocupado apenas por dermatologistas (AGÊNCIA ESTADO, 2010).
Ainda segundo a reportagem do Portal G115,o crescimento dos procedimentos
estéticos não cirúrgicos se deve ao fato de que possuem um custo mais baixo em
relação às cirurgias e seu uso está sendo feito por muitos pacientes jovens, que não
necessitam de grandes intervenções.
Enquanto o mundo tem por padrão de beleza a magreza exagerada, no Brasil
as curvas estão sendo cada vez mais valorizadas16. Brasileiras e estrangeiras
pagam para serem esculpidas nas mesas de cirurgia e terem seios e nádegas
maiores, além de cintura e quadris, buscando o chamado corpo curvilíneo perfeito. O
Brasil ser considerado como o país das mulheres bonitas e sensuais faz com que o
fluxo de pacientes para realizar cirurgias plásticas aumente cada vez mais,
13
AGÊNCIA ESTADO. Plástica não invasiva se torna a mais comum. 15/08/2010.
Idem nota 13.
15
Idem nota 13.
16 Roberta Jansen para O Globo online. Pela cirurgia plástica, brasileiras buscam seios e nádegas
maiores. 15/08/2010.
14
38
valorizando o Turismo Estético e divulgando os avanços da medicina brasileira pelo
mundo.
O que mais contribui para o crescimento do turismo de estética no Brasil é a
fama das mulheres brasileiras no exterior. A nação brasileira é formada por
diferentes perfis genéticos (principalmente indígena e africana), o que ajudou a
mulher a ter o corpo mais curvilíneo e com mais formas. Além disso, existe o fato de
o Brasil ter uma grande extensão de praias e ter clima tropical faz com que muitas
pessoas usem roupas pequenas e que deixem o corpo mais à mostra. Isso
influencia para a busca de um corpo perfeito (GOLDENBERG, 2002).
3.1 A BUSCA PELA BELEZA: DOS ENFEITES AO BISTURI
A preocupação com a beleza remonta aos tempos antigos. O ser humano
sempre procurou adornos para enfeitar-se, mostrando beleza e, na maioria dos
casos, seu status dentro da sociedade. Algumas práticas para a beleza incluíam
modificações corporais permanentes em uma busca pelo perfeito. Desde aqueles
tempos e até os dias de hoje a mulher é a que mais procura atingir a esse padrão de
beleza.
Há 25 mil anos o conceito de estética estava diretamente relacionado com o
conceito de fertilidade. A mulher precisava ser gorda, para poder aguentar a
gravidez e dar sustento ao seu filho. A reprodução mais famosa desse período é a
Vênus de Willendorf, também conhecida como Mulher de Willendorf. Trata-se de
uma estatueta com cerca de 14 centímetros, representando uma mulher com barriga
e seis fartos (KRINOY, 2011).
Em seu livro Nova História Crítica, o Professor e Historiador Mario Schmidt
(2001) afirma que no período paleolítico, o homem começa a se reunir em grupos,
fixando-se na terra e ficando mais sedentário. É nesse período que surgem os
primeiros sinais de vaidade. O homem pré-histórico já se enfeitava, usando a pele
de sua caça como uma espécie de vestimenta, não só para proteger-se do frio, mas
também como uma forma de mostrar sua força e poder dentro de seu grupo.
Pedaços de ossos e pedras serviam como pingentes de colares e adornos para os
cabelos. Já os feiticeiros e curandeiros adornavam o corpo com pinturas “mágicas”.
39
Com a evolução do homem, surgiram as primeiras pinturas de guerras. Com o
surgimento das civilizações, o homem procurou formas diferentes de se enfeitar.
Surgem, assim, os produtos de maquiagem a base de carvão para os olhos, henna e
outros resíduos naturais. No Egito Antigo, os homens e mulheres mais ricos
utilizavam as sedas mais finas, colares de ouro e pedras preciosas, perucas e kohl,
a maquiagem típica egípcia, conhecida pelos olhos bem marcados. Cleópatra
mostrou que não era somente com a maquiagem que a mulher precisava se
importar. A eterna rainha do Egito imortalizou seu tratamento de beleza, banhandose em leite, cobrindo as faces com argila e maquilando seus olhos com pó de kohl
(PANDOLFO, 2008).
Em Roma, a preocupação com a beleza se dava através do banho diário e os
banhos de sol; atividades físicas; uso de maquiagem, perfumes e unguentos e as
ervas mastigadas para evitar o mau hálito. Algumas mulheres usavam máscaras de
farinha, miolo de pão e leite durante a noite sobre o rosto para melhorar a pele
(PANDOLFO, 2008). Já na Grécia, estátuas de deuses eram criadas com
proporções perfeitas, mostrando o padrão de beleza da época e deixando o bordão
“deus grego” na história. Para os gregos, a aparência de seu corpo era mais
importante do que a maquiagem que usavam (ULLMANN, 2005).
Na China, as mulheres quebravam os pés e os dobravam, para que ficassem
pequenos. Na Europa Medieval as pessoas usavam roupas que cobriam o corpo
todo, com tecidos grossos e bordados (SCHMIDT, 2001).
No século XV o Renascimento trouxe outro padrão de beleza para o ocidente.
Vigarello (2006) comenta que ateliês ficaram repletos de pinturas de mulheres nuas,
exibindo seus corpos “rechonchudos”. A beleza ideal era o oposto do que a Europa
Medieval estava acostumada: saem os quadros com temas religiosos e pinturas de
paisagem e entram os quadros com as mulheres belas.
É nesse mesmo período que surgem os espartilhos, peças do vestuário íntimo
da mulher que apertavam as cinturas, levantavam os seios e valorizavam a forma
feminina. O espartilho, entretanto, era praticamente um objeto de tortura, pois
dificultava a respiração e, em alguns casos, impedia a mulher de se sentar
(PRIORE, 2000).
Nessa intensidade de informação sobre o corpo perfeito, cresce a
preocupação com a beleza. Concomitantemente, é mais aceita a preocupação com
os cuidados com o corpo e o apego à estética e ao prazer. No mesmo período dos
40
quadros nus, os escritores descreviam com palavras aquilo que era belo para a
época (VIGARELLO, 2006).
Esse período é conturbado, pois, se por um lado a beleza e a estética
estavam cada vez mais presentes no mundo ocidental, os padrões não estavam
bem definidos. O culto ao corpo ainda é algo recente na sociedade e começou pelos
olhares de cada um e foi passando para aquilo que os pintores e escritores
colocavam como belo. Começa, então, a padronização do “belo” e da busca pela
moda.
No século XX houve a revolução do mundo da moda. Estilistas como
Christian Dior, Coco Chanel e Yves Saint Laurent ditavam as tendências em roupa,
maquiagem e acessórios. Começam os grandes desfiles e as modelos de passarela
passam a ser o padrão de beleza (GARCIA, 2012).
Foi também no século XX que a medicina teve um grande salto. Segundo o
médico Lybio Martire Junior, da Sociedade Brasileira de História da Medicina
(SBHM)17 a descoberta da anestesia geral impulsionou os estudos de cirurgias no
mundo. Mas foi com a Primeira Guerra Mundial e a necessidade de cirurgias
reparadoras que a Cirurgia Plástica oficializa-se como especialidade médica (alguns
registros mostram que por volta de 1840 alguns transplantes de pele para reparar
feridas foram bem sucedidos) (MARTIRE JUNIOR, 2005).
É importante ressaltar que, dependendo da localização da civilização, o
padrão de beleza é diferente por causa da cultura e costumes locais. Sendo assim,
as práticas realizadas para se atingir esse padrão serão diferentes.
Com o grande avanço da medicina e das cirurgias, o padrão de beleza foi
sendo elevado a outro nível. Surgiram as cirurgias reparadoras e construtoras,
aplicações de silicone e lipoaspirações. A busca pela beleza chegou ao nível de
mudança radical na aparência das pessoas. Passou dos espartilhos para o bisturi.
Segundo Martire Junior (2005), a vinda da Família Real para o Brasil em 1808
trouxe consigo o avanço nas escolas de medicina. D. João VI cria, estimulado pelo
cirurgião-mor do reino de Portugal, José Maria Picanço (brasileiro de Recife formado
em Lisboa), as Escolas de Cirurgia, a primeira na Bahia e a segunda no Rio de
Janeiro, marcos do nascimento do ensino superior de medicina no país.
17
Médico Lybio Martire Junior; Sociedade Brasileira de História da Medicina (SBHM). Disponível em:
<http://www.sbhm.org.br/>
41
A primeira clínica específica em cirurgia plástica no Brasil surge na década de
30, na cidade de São Paulo, criada por José Rebello Netto na Santa Casa de
Misericórdia. No final dessa década a cirurgia plástica brasileira já era conhecida e
respeitada em outros países. Em 1939 o médico argentino Ernesto Malbec procura
pelo cirurgião brasileiro Antonio Prudente, sugerindo a criação de uma sociedade
que congregasse especialistas em cirurgia plástica de toda a América Latina
(MARTIRE JUNIOR; 2005).
Surge, então, a Sociedade Latino Americana de Cirurgia Plástica, em 6 de
julho de 1940, com sede em São Paulo. A cirurgia plástica brasileira começava a
delinear seu papel de liderança na América Latina e a salientar-se mundialmente
(MARTIRE JUNIOR; 2005).
Em 1948, de acordo com Martire Junior (2005), Rebello Neto sugere a criação
da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, tendo 07 de Dezembro como data de
fundação. E em 1949, o médico Ivo Pitanguy iniciou suas atividades no pronto
socorro do Hospital Souza Aguiar e, posteriormente, em 1954 criou o serviço de
Cirurgia Plástica Reparadora da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro.
A partir de 1950 os serviços de cirurgia plástica em hospitais nas capitais
brasileiras e em outras cidades passam a se multiplicar, começando a surgir novos
cirurgiões, especialistas com formação específica e dedicando-se integralmente à
especialidade. A partir das décadas de 60 e 70, a cirurgia plástica brasileira já é vista
como uma das melhores do mundo (MARTIRE JUNIOR; 2005).
O grande boom da indústria de beleza brasileira ocorreu com a abertura do
mercado na pós-ditadura militar. A transição da democracia para o neoliberalismo,
de acordo com Goldenberg (2002), somada à estabilização da moeda brasileira com
o Plano Real, possibilitaram o aumento das cirurgias plásticas no país. De acordo
com a reportagem da revista Veja, Brasil, o império dos bisturis18, o Brasil superou
os Estados Unidos como o país com maior número de cirurgias plásticas per capita
do mundo.
Dweck, 1999 (apud GOLDENBERG, 2002) expõe uma série de fatores que
possibilitaram a explosão da indústria da beleza no mundo, tais como: mulheres
ocupando postos de trabalho, competição e discriminação nos lugares de trabalho,
estímulo à “vaidade” por meio da mídia e “medo de envelhecer”.
18
Daniela Pinheiro para Veja online. Brasil, Império do bisturi. 17/01/2001.
42
Seja por meio de espartilhos ou por cirurgias e métodos estéticos gerais, a
preocupação pela beleza sempre esteve presente na humanidade, principalmente
nas mulheres.
3.2 O TURISMO DE ESTÉTICA NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO
O Rio de Janeiro é a terceira cidade brasileira que mais atrai turistas para o
tratamento de saúde (por conta de seu polo hospitalar), perdendo apenas para São
Paulo e Recife, segundo o Jornal do Commércio de Pernambuco19. Em
compensação, para o turismo estético, é a primeira cidade a ser mencionada pelos
estrangeiros.
O padrão de beleza brasileiro começou com a chegada da família real ao
Brasil, em 1808. Quando a corte aportou no Rio de Janeiro, os brasileiros
inspiravam-se nas roupas e penteados da nobreza para vestir-se. As historiadoras
Braick e Mota (2006) afirmam que toda a cidade adquiriu um “ar imperial”,
ocasionando uma verdadeira mudança cultural e estética. Até os mais abastados
financeiramente tentavam imitar os hábitos europeus (BRAICK; MOTA, 2006):
A Rua do Ouvidor, no centro do Rio, ganhou ares de cidade européia.
Surgiram elegantes cabeleireiros, costureiras francesas, lojas de roupas,
joalherias, chapelarias e tabacarias, entre outras novidades. [...] As damas
da corte exibiam seus chapéus, luvas e leques. Os homens usavam
casacas com golas altas enfeitadas por lenços coloridos e gravatas de
renda, calções até os joelhos e meias. Tudo isso era observado pelos
brasileiros. (BRAICK; MOTA, 2006, p.190)
É também com a vinda da Família Real que o Brasil ganha duas faculdades
de medicina, uma na Bahia e outra no Rio de Janeiro. É, entretanto, na década de
1930 que São Paulo, ganha a primeira clínica específica em cirurgia plástica,
segundo Martire Junior (2005).
No Rio de Janeiro, em 1949, Ivo Pitanguy iniciou suas atividades no pronto
socorro do Hospital Souza Aguiar e, posteriormente, em 1954 criou o serviço de
Cirurgia Plástica Reparadora da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. Em
1963, inaugura a sua clínica em Botafogo, zona sul da cidade do Rio de Janeiro. O
19
Jornal do Commércio, Pernambuco, Recife discutirá turismo de saúde, 01/09/2011.
43
médico Ivo Pitanguy contribuiu para a projeção internacional e difusão da
especialidade (MARTIRE JUNIOR, 2005).
De acordo com Goldenberg (2002), a preocupação com a aparência e a
juventude chega a ser uma obsessão nos dias de hoje e está cada vez mais
disseminada em todas as classes. Esse dado, somado ao fator de que o Rio o
Janeiro é considerado como um dos lugares mais belos do mundo, tanto pela sua
natureza quanto por suas mulheres esculturais, tornou a cidade um lugar privilegiado
para estudar o culto ao corpo.
A grande visibilidade do Rio de Janeiro no exterior criou uma espécie de
estereótipo do corpo da carioca. Como dito anteriormente, quando se fala da cidade,
as praias vêm em primeiro lugar. Nas fotos dos turistas, mulheres com fio dental e
corpos malhados criam um imaginário do corpo perfeito, tanto nos homens, quanto
nas mulheres. Essa imagem carioca ajudou no desenvolvimento do Turismo de
Estética da cidade.
3.3 AS CLÍNICAS CARIOCAS: RENOME INTERNACIONAL
O Brasil está atraindo, cada vez mais, pacientes do mundo todo, em busca
dos tratamentos de saúde oferecidos no país (FOLHA, 2011). A cidade do Rio de
Janeiro, por sua vez, atrai pessoas interessadas em realizar tratamentos
relacionados à estética, fato que colocou o Brasil como um dos países que mais
recebem turistas para cirurgias plásticas (PINHEIRO, 2001). Tendo em vista esse
fator, podem-se selecionar inúmeras clínicas e consultórios que recebem pacientes
estrangeiros na cidade. Mas uma clínica e um hospital destacam-se por seu
reconhecimento e excelência em serviços prestados: Clínica Ivo Pitanguy e Hospital
da Plástica.
44
3.3.1 Clínica Ivo Pitanguy20
A Clínica do Doutor Ivo Pitanguy fica localizada no bairro de Botafogo, na
cidade do Rio de Janeiro. O professor Ivo Pitanguy comanda sua equipe desde 1963
e conta com uma equipe de cirurgiões e profissionais altamente qualificados que
atuam e acordo com suas técnicas e filosofia.
De acordo com o site da clínica, a recepção dos pacientes é feita por
secretárias trilíngues. A estrutura do centro hospitalar é moderna e conta com quatro
salas de cirurgia planejadas e equipadas, uma sala de terapia intensiva, seis salas
para atendimento ambulatorial com suporte pós-operatório e check-up pré-operatório
completo. Além disso, dispõe de 14 suítes para conforto dos pacientes e seus
acompanhantes.
A
administração
da
clínica
é
feita
pela
Gisela
Pitanguy,
médica-
psicoterapeuta, que implantou um serviço de apoio aos pacientes para pré e pósoperatório. A clínica ainda segue a filosofia do médico Ivo Pitanguy, que acredita
que, assim como o procedimento cirúrgico, os tratamentos estéticos também fazem
parte do processo que integra beleza, saúde e qualidade de vida.
Sendo assim, a clínica conta com um centro de tratamentos estéticos não
cirúrgicos, tais como: aplicação de Botox, peeling facial, massagens e drenagens
linfáticas, entre outros. Esse setor é chefiado pela médica, que deu seu depoimento
sobre Turismo de Saúde Estética para esse trabalho acadêmico.
3.3.2 Hospital da Plástica21
O Hospital da Plástica fica localizado em Botafogo, na cidade do Rio de
Janeiro, e foi fundado em 1971 pelo médico Farid Hakme, ex-aluno do Doutor Ivo
Pitanguy. Atualmente, o doutor Farid é o único cirurgião plástico carioca acreditado
pela Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica e Estética (ISAPS), de um total de
oito brasileiros acreditados.
20
Informações retiradas do sítio eletrônico oficial da Clínica Ivo Pitanguy. Disponível em:
<http://www.pitanguy.com.br/>. Acesso em: 22 out. 2011.
21
Informações retiradas do sítio eletrônico oficial do Hospital da Plástica. Disponível em:
<http://www.hospitaldaplastica.com.br/>. Acesso em: 22 out. 2011.
45
Segundo o sítio eletrônico do Hospital da Plástica22, já foram realizadas cerca
de 35.000 intervenções cirúrgicas no hospital e não houve nenhum caso de infecção
hospitalar até hoje. Possui o Selo de Qualificação da Sociedade Brasileira de
Cirurgia Plástica, estando adequada às normas da Vigilância Sanitária e mantendo
atualizados todos os requesitos de documentação.
Suas instalações possuem um Centro Cirúrgico com 12 salas equipadas com
aparelhos de alta tecnologia; uma Sala de Recuperação Pós Anestésica com quatro
leitos; um Centro de Tratamento Intensivo (CTI) para caso haja complicações
cirúrgicas com médicos de plantão 24 horas; 22 suítes para recuperação de
pacientes e permanência de acompanhantes; farmácia, central de esterilização e
lavanderia próprias e estacionamento para 100 veículos.
O Hospital da Plástica possui parceria com alguns equipamentos turísticos,
facilitando a vinda de pessoas para tratamentos na cidade: Ipanema Tower Apart
Hotel (Ipanema), Parthenon Arpoador (Arpoador), Parthenon Sorocaba (Botafogo),
indicação ao serviço de van para translados e passeios e indicação de aluguel de
quarto na casa de uma enfermeira.
Um dos médicos responsáveis pela clínica na ausência do doutor Farid
Hakme é o médico conhecido por ser um dos primeiros cirurgiões plásticos
brasileiros a usar a tecnologia de simulação em 3D para mostrar a seus pacientes
como será o resultado pós-operatório (e-Stetix), antes mesmo da cirurgia ser
realizada. Esse foi o cirurgião que deu seu depoimento sobre Turismo de Saúde
Estética para esse trabalho acadêmico.
22
Disponível em: <http://www.hospitaldaplastica.com.br/>. Acesso em: 22 out. 2011.
46
4 A VISÃO DOS ATORES DO TURISMO DE ESTÉTICA
O Turismo de Saúde, como dito anteriormente, é um segmento antigo, que
vem ganhando espaço na mídia, devido ao crescimento e reconhecimento que o
segmento vem tendo no país, nos últimos anos. Este fato pode ser percebido a partir
do aumento de reportagens e entrevistas com especialistas da área, em diferentes
meios de comunicação. No entanto, as informações e dados sobre turismo estético
encontram-se dispersos e não sistematizados, dificultando estudos a respeito do
tema.
A integração entre os gestores do turismo e da saúde é cada vez mais
notada, principalmente pelo aumento no fluxo de pacientes que vão se tratar em
outros países. Sendo assim, essa pesquisa teve por objetivo procurar entender o
ponto de vista dos gestores de saúde em relação ao turismo de saúde,
especificamente o turismo de estética, que recebem turistas estrangeiros, na cidade
do Rio de Janeiro.
Para atingir o objetivo proposto e favorecer uma reflexão sobre o tema, optouse por uma pesquisa qualitativa, de natureza exploratória. Uma pesquisa qualitativa
é aquela em que os dados coletados são predominantemente descritivos e a análise
dos dados tende a seguir um processo indutivo (LUDKE; ANDRE, 1986). A pesquisa
exploratória é quando há pouco conhecimento sobre o assunto e procura-se
conhecê-lo com maior profundidade, a fim de torná-lo claro e construir um
pensamento para outras pesquisas (RAUPP; BEUREN, 2004).
A princípio, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, a fim de levantar e reunir
dados e informações sobre turismo de saúde e cirurgia plástica. A primeira fonte de
busca foi a internet, onde foram encontrados todos os artigos e teses deste trabalho.
Foram utilizados os portais do Periódico CAPES, EMERALD, Scielo e Google
Acadêmico.
Alguns
artigos
foram encontrados
em bases
de
editoras
e
universidades. Pela internet foram identificados, também, 7 (sete) consultórios
médicos e 4 (quatro) clínicas localizados na cidade do Rio de Janeiro que recebem
turistas estrangeiros para tratamentos estéticos e que receberam contato para a
pesquisa.
Os livros sobre o tema que foram utilizados como fonte de pesquisa faziam
menção, em sua maioria, ao Turismo de Saúde como Bem-estar, o que dificultou a
47
formação de uma linha de pensamento em relação ao Turismo de Saúde Estética.
Outros tinham como tema a Hotelaria Hospitalar. Os que não mencionavam o
turismo foram utilizados para pesquisa sobre história do turismo e da saúde,
conceitos de beleza e hospitalidade.
Em um segundo momento foram avaliadas as informações contidas nos sítios
eletrônicos das 4 (quatro) clínicas e 7 (sete) consultórios que recebem turistas
estrangeiros para tratamentos estéticos na cidade do Rio de Janeiro, investigando
se elas estavam disponíveis em outros idiomas e se haveria alguma informação
sobre serviços turísticos, como hospedagem e traslados, por exemplo.
Após isso, foram enviadas mensagens por correio eletrônico para saber qual
clínica/consultório estaria disponível para uma entrevista posteriormente. Não houve
nenhuma resposta. Sendo assim, entrou-se em contato através do telefone e,
novamente, nenhum resultado foi obtido. Em seguida, o contato foi pessoal, indo às
clínicas/consultórios
localizados
na
Zona
Sul
da
cidade.
Duas
clínicas
disponibilizaram médicos para atender a pesquisa.
Foram, então, realizadas duas entrevistas semi-estruturadas com os médicos
que responderam ao contato. Esse tipo de entrevista foi escolhida, pois possibilita
discorrer sobre o tema, além das perguntas propostas. Cabe ao entrevistador dirigir
a entrevista para o assunto que achar oportuno (BONI; QUARESMA, 2005). O
objetivo da pesquisa de campo foi coletar dados mais específicos sobre a relação da
clínica/consultório com algum tipo de serviço turístico, para assistência aos
pacientes oriundos do exterior.
As entrevistas foram realizadas na primeira quinzena de Novembro de 2011
com a Clínica Ivo Pitanguy e com o Hospital da Plástica, ambos localizados no bairro
de Botafogo, Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro. A principal limitação encontrada
para a realização das entrevistas foi o desinteresse por parte dos gestores de saúde
em relação ao tema. Muitos tiveram receio sobre para que fim as informações
obtidas seriam utilizadas. Outro problema encontrado foi a falta de conhecimento
dos gestores de saúde sobre Turismo de Saúde, já que muitos não sabiam sobre o
que se tratava.
Sendo assim, a pesquisa não teve o caráter conclusivo, mas passível de
contribuição para as discussões e estudos sobre a relação entre serviços turísticos e
clínicas de estética no Rio de Janeiro.
48
4.1 RESULTADOS DAS ENTREVISTAS
Os resultados que aqui serão apontados referem-se tanto à pesquisa
bibliográfica anterior às entrevistas, quanto aos resultados obtidos com as
entrevistas realizadas com médicos representantes da Clínica Ivo Pitanguy e
Hospital da Plástica, ambos localizados no bairro de Botafogo, na cidade do Rio de
Janeiro
4.1.1 Pesquisa anterior à entrevista
O primeiro contato com as clínicas foi feito por meio do e-mail. Por ele foi
explicado sobre o tema Turismo de Saúde, o trabalho acadêmico, o motivo das
entrevistas, nome da professora orientadora, data prevista para apresentação do
trabalho acadêmico, disponibilidade da agenda (explicando que se entendia a rotina
do médico, e que a entrevista seria breve). O e-mail foi enviado duas vezes.
Como não houve respostas, o segundo contato com as clínicas foi realizado
por telefone. Em todos os casos, os médicos não estavam disponíveis, o que
dificultou o entendimento do tema por parte de suas secretárias e assistentes. Foi
explicado por telefone sobre o que se tratava Turismo de Saúde, já que nenhum
gestor de saúde sabia do seu significado. O contato posterior foi realizado
pessoalmente, indo às clínicas e falando diretamente com médicos e enfermeiras,
que também tiveram que ser esclarecidos sobre o tema.
Antes de realizar as entrevistas, foi pesquisado sobre a apresentação das
clínicas em meio virtual (sítio eletrônico e e-mail). Ambas disponibilizam informações
sobre a clínica, instalações e os tipos de procedimentos estéticos realizados em dois
idiomas: português e inglês. Ao pesquisar se as clínicas disponibilizam informações
sobre serviços relacionados ao turismo, foi verificado que somente a clínica Ivo
Pitanguy não fornece nenhum tipo de dado. O Hospital da Plástica apresenta os
contatos para três opções de hospedagem localizadas na Zona Sul da cidade, para
o serviço de traslado e para uma enfermeira que está disponível para dar assistência
ao paciente em recuperação. Essas informações foram importantes para a
elaboração de perguntas durante as entrevistas.
49
4.1.2 Análise das entrevistas
As entrevistas foram analisadas qualitativamente, buscando sistematizar as
informações através da criação de categorias de análise. Desse modo, as
entrevistas foram ouvidas exaustivamente, a fim de encontrar dados que pudessem
ser agrupados.
No caso desse trabalho acadêmico, foram criadas 4 (quatro) categorias de
análise: dados gerais sobre os turistas de saúde; relação entre gestores de saúde e
serviços turísticos; relação entre os pacientes e serviços de saúde e relação entre os
pacientes e equipamentos turísticos.
4.1.2.1 Dados gerais sobre os turistas de saúde
Em relação à média de turistas estrangeiros que as clínicas recebem por ano,
a Clínica Ivo Pitanguy, informou que aproximadamente 20% dos pacientes atendidos
na clínica eram provenientes de localidades fora do Brasil. O informante do Hospital
da Plástica afirmou que a clínica recebe um número considerável de pessoas vindo
do exterior, mas devido ao grande quadro de doutores no local, a quantidade de
pacientes que cada um recebe não se encontra agrupada, dificultando uma análise
estatística. O entrevistado pediu para que fosse verificado o número de pacientes
por médico com a responsável pelos documentos do Hospital. Entretanto, não
existem dados desse tipo arquivados. Segundo a responsável, os médicos usam as
dependências da clínica, mas os dados dos pacientes ficam sob suas
responsabilidades, não com o Hospital.
Os períodos do ano em que a Clínica e o Hospital recebem os turistas
estrangeiros para os tratamentos estéticos são diferentes. A entrevistada da Clínica
Ivo Pitanguy afirma que fluxo de pacientes internacionais é maior durante o verão
(entre os meses de Novembro e Fevereiro), pois, devido ao clima quente do Brasil e
à proximidade das festas de fim de ano e o Carnaval, os pacientes aproveitam para
realizar outros tipos de turismo na cidade, sem importar-se, com as manchas roxas
do pós-operatório.
Já no Hospital da Plástica a maioria de seus pacientes estrangeiros realiza os
procedimentos estéticos no inverno brasileiro, pois aproveitam as férias de verão do
50
hemisfério norte para virem à cidade e para o pós-operatório. O Hospital orienta-os a
não se exporem ao sol, pois as cicatrizes dos procedimentos cirúrgicos poderão ficar
marcadas. Os médicos estão sempre acompanhando os pacientes, pois, assim,
evitam que eles “abusem” e prejudiquem os resultados do procedimento.
Quanto ao tempo de permanência dos pacientes na cidade, depende do
tratamento realizado: quanto mais procedimentos e quanto mais complicados forem,
mais tempo de reabilitação será necessário. O entrevistado do Hospital da Plástica
enfatizou a questão da ética médica, ao se referir sobre observar o paciente no pósoperatório, evitando liberá-lo rapidamente. Segundo ele, o acompanhamento do
turista deve ser feito da mesma maneira que o paciente local, pois a
responsabilidade pelas consequências é a mesma.
“No caso da cirurgia plástica, ou de qualquer tipo de cirurgia, a gente tem
que ter uma ética médica. Você não pode operar o paciente e mandar ele
embora.” (Entrevistado – Hospital da Plástica).
Tanto ele quanto a entrevistada da clínica Ivo Pitanguy informaram sobre a
importância de orientar o paciente estrangeiro a permanecer na cidade após o
tratamento, num período de 15 a 30 dias. Segundo eles, esse é um bom período de
recuperação para que possam realizar a viagem de retorno ao país de origem. O
médico do Hospital da Plástica afirma:
“A gente pede, no mínimo, de 15 a 30 dias, que é o normal, dependendo do
tamanho da cirurgia. De 15 a 30 dias você tem uma segurança, para
quando ele voltar [ao seu país de origem], ter um acompanhamento mais
estético.” (Entrevistado – Hospital da Plástica).
O médico do Hospital da Plástica informou, ainda, a respeito do tempo de
chegada anterior à cirurgia:
“Tem que chegar com, no mínimo, uma semana, cinco dias antes. Porque a
gente exige que os exames sejam daqui, o pré-operatório. [...] Exatamente
tem isso também. [sobre a possível embolia por permanecer muito tempo
sentado em um vôo] Você não pode. Porque dentro de uma cirurgia você
tem que ter uma rotina.” (Entrevistado – Hospital da Plástica).
51
Os dois entrevistados responderam que os estrangeiros costumam vir com
acompanhantes e que estes quase sempre realizam outro tipo de turismo na cidade,
como cultural ou sol e praia. Porém, os médicos não tem a preocupação de divulgar
a cidade e seus atrativos turísticos, deixando-os visitarem o que quiserem. Alguns
pacientes e acompanhantes têm o interesse de procurar os atendentes da clínica e
do hospital para saberem mais sobre locais para visitação. O médico do hospital da
Plástica ainda afirma que os acompanhantes já vêm ao Rio de Janeiro com a
finalidade de realizar outro tipo de turismo na cidade:
“É natural de quem vem pro Rio de Janeiro, que não tá envolvido com
cirurgia, que tá aqui de acompanhante, turismo pra ela é questão principal.
[...] Então, geralmente, o acompanhante vem com essa finalidade. E tem
que conhecer atrativo, né, do turismo. [...] Geralmente os hotéis que fazem
tudo.” (Entrevistado – Hospital da Plástica).
O acompanhante, segundo os relatos dos entrevistados, vem para que o
paciente possa ter alguém para ajudá-lo no pós-cirúrgico. Esse acompanhante, que
não precisa ficar de repouso, pode aproveitar os atrativos da cidade. A vinda de um
paciente estrangeiro envolve não só gestores da saúde, mas também serviços
turísticos.
4.1.2.2 Relação entre gestores de saúde e serviços turísticos
Sobre a relação entre os gestores de saúde e os serviços turísticos oferecidos
pela cidade, a entrevistada da Clínica Ivo Pitanguy informou que eles não divulgam a
cidade para os pacientes realizarem outro tipo de turismo e que eles já procuraram
na internet os pontos turísticos cariocas antes de virem ao Brasil. Segundo a
doutora, eles perguntam sobre lugares bons para fazer compras:
“Eles me perguntam muito onde comprar, onde é mais barato. Eles gostam
muito de feira. Então eu falo para ir na feira de Ipanema. A gente vê o mais
próximo [...].” (Entrevistada – Clínica Ivo Pitanguy).
A preocupação com o paciente estrangeiro deixa de ser exclusivamente a
cirurgia, mas também com os cuidados que devem tomar durante um passeio pela
52
cidade. A médica da Clínica Ivo Pitanguy disse que alerta os turistas a respeito da
vestimenta, para evitar possíveis assaltos. Entretanto, ela afirma ao final que
acredita que a cidade está melhorando o seu policiamento para os turistas:
“[...] sempre na preocupação de mandar não andar com joia, porque eles
[os turistas] são caracterizados, é estrangeiro mesmo. Só tomar um pouco
de cuidado mesmo. Apesar de que melhorou muito o Rio de Janeiro nessa
parte de turista [...] Copacabana, Ipanema, achei que o policiamento tá bem
mesmo.” (Entrevistada – Clínica Ivo Pitanguy).
O Hospital da Plástica possui informações sobre alguns serviços turísticos em
seu site. Ao perguntar sobre a relação entre a clínica e os serviços pontuados, foi
afirmado não ter qualquer tipo de parceria. O motivo do Hospital da Plástica colocar
em sua página eletrônica alguns serviços se deve ao fato de auxiliar seus pacientes
na escolha de hospedagem e deslocamento. Além disso, a clínica conhece os hotéis
divulgados e acredita que seus clientes serão atendidos de forma hospitaleira:
“Não há uma parceria, mas uma indicação. Não uma indicação para
questões financeiras; acredito que receber o paciente de fora já é um
grande lucro pra gente. Mas indicação para saber que o paciente vai tá num
lugar apropriado, bem assegurado. [...] É muito importante pra que a gente
saiba distinguir que esse, esse e esse hotel são indicações nossas, que o
paciente vai ser bem tratado lá, entendeu? Não é um hotel errado, não é um
hotel que vai oferecer uma dieta errada, não é um hotel que vai oferecer
você ficar trancado no quarto, porque o paciente tem que andar. Tem que
estimular, mas sem que complique a sua forma [recuperação].”
(Entrevistado – Hospital da Plástica).
Como a Clínica Ivo Pitanguy não tem em seu site qualquer tipo de informação
turística foi perguntado se há alguma parceria com serviços ligados à hospedagem e
deslocamento de seus pacientes. A informante respondeu que a clínica não possui
nenhuma parceria e não indica nenhum serviço. A explicação para isso são os
possíveis problemas que podem ser gerados por conta de mal-entendimentos entre
clínica e paciente:
“Normalmente a gente não faz isso porque o nosso púbico é muito
complicado. Então, se a gente der qualquer tipo de informação fora do
nosso domínio e da nossa prestação de serviço, eles entram com processo
por conta de tudo”. (Entrevistada – Clínica Ivo Pitanguy).
53
E completa dizendo que fornece uma lista de hotéis que ficam próximos à
clínica, quando solicitado pelo paciente, mas não nega ajuda ao turista estrangeiro:
“A gente não tem parceria nenhuma. A gente indica os melhores.”
(Entrevistada – Clínica Ivo Pitanguy).
“Eu posso ajudar, mas me dá o seu CPF, me dá o seu cartão, me dá os
seus dados”. (Entrevistada – Clínica Ivo Pitanguy).
Assim, a clínica não se envolve financeiramente nem por responsabilidade
com outros serviços. É importante ressaltar que, nas duas clínicas, é informado
anteriormente ao turista que qualquer serviço turístico deve ser reservado e pago
pelo próprio paciente.
Com relação a disponibilidade de funcionários que falem outra línguas, a
Clínica Ivo Pitanguy afirma ter recepcionistas bilíngues e alguns médicos trilíngues.
Segundo a doutora, são os próprios pacientes que exigem que tenha alguém de fale
suas línguas nativas:
“Eles chegam aqui falando a língua deles. Eles não aceitam outro tipo. A
gente pergunta em inglês e eles ‘não, falo francês, quero alguém que fale
francês.’” (Entrevistada – Clínica Ivo Pitanguy).
Também foi questionado se os doutores entrevistados achariam interessante
haver uma relação mais direta entre a clínica e algum serviço turístico. As respostas
foram distintas. A representante da Clínica Ivo Pitanguy não considera ser
significante estabelecer parcerias entre hotéis e empresas de traslados. Ela elucida
que a ligação entre a clínica e esses tipos de serviços pode acarretar em possíveis
problemas, como o não pagamento do serviço pelo cliente e a cobrança ser
direcionada à clínica:
“Muitas pessoas chegam aqui, vão para o hotel, falam: ‘eu tô na Clínica Ivo
Pitanguy’ e depois que eles vão embora, eles mandam a conta pra gente”.
(Entrevistada – Clínica Ivo Pitanguy).
Visando proteger a imagem e qualidade e evitar possíveis associações
negativas, a clínica não possui vínculos com serviços externos, até mesmo com
54
aqueles ligados a saúde. Por sua vez, o representante do Hospital da Plástica,
acredita ser interessante haver uma relação mais direta com serviços que os
pacientes utilizam, principalmente, no período pós-operatório:
“O Rio de Janeiro tem uma hotelaria ótima e a gente unindo isso a um bom
serviço de cirurgia plástica, fecha um casamento perfeito.” (Entrevistado –
Hospital da Plástica).
Ele ainda afirma que é importante haver tranquilidade após a cirurgia, para
uma boa recuperação, ao ratificar que o procedimento não acaba quando o último
ponto se fecha. Principalmente pelo fato de que a cirurgia é estética, e o resultado
tem que ser o melhor. Desta forma, ressalta que a parceria com bons hotéis, por
exemplo, possibilitaria dar confiança e segurança ao paciente e ao médico:
“[...] a cirurgia não acaba quando a gente fecha o último ponto. A cirurgia é
50% nossa e 50% do que o paciente vai fazer depois. O pós-operatório é
muito importante. [...] dentro da área de medicina, é uma especialidade [a
cirurgia plástica] que nos traz uma cobrança maior. [...] mas na cirurgia
plástica é diferente. O paciente já vem buscando a estética corporal. Você
tem que oferecer um estilo de vida pro paciente. [...] A gente não faz pacote.
[...] mas ele gosta que a gente indique, até porque ele se sente seguro. O
paciente quando entra no cento cirúrgico ele oferece a vida dele nas suas
mãos. Então, assim, se ele tá te confiando isso, com certeza ele também
quer que indique qual hotel ele vai ficar, qual hotel ele vai ser bem cuidado,
a pesar do hotel não ter essa parte de hotelaria e enfermagem.”
(Entrevistado – Hospital da Plástica).
O Hospital da plástica oferece, também, o contato de uma enfermeira, caso o
paciente deseje. O “home care” é pago pelo paciente, por dia, pelo tempo que
desejar. Isso possibilita mais segurança e descanso, até mesmo para o
acompanhante.
4.1.2.3 Relação entre pacientes e serviços de saúde
Há uma concordância entre os dois entrevistados a respeito dos tipos de
tratamentos estéticos mais realizados pelos pacientes estrangeiros. Ambos afirmam
que são a mamoplastia de aumento, lipoaspiração e face, tendo o público feminino
ainda como predominante. A Clínica Ivo Pitanguy oferece, ainda, intervenções não
55
cirúrgicas (“lifting sem cirurgia”, segundo a entrevistada), como aplicação de botox,
massagens e tratamentos que não necessitem de corte.
Muitos pacientes acabam retornando ao Brasil para realizarem outras
cirurgias, pois o resultado da primeira foi satisfatório. A médica da Clínica Ivo
Pitanguy afirma, ainda, sobre a possibilidade da realização do turismo:
“Volta pra cá, normalmente sim. Vêm aqui, fazem a primeira cirurgia e volta
pro país, fica um ano, aí volta, faz outra. E passeia! (Entrevistada – Clínica
Ivo Pitanguy).
O Hospital da Plástica, por sua vez, não só confirma o retorno, como o
associa ao mérito brasileiro nas cirurgias plásticas, que vem aumentando no
exterior:
“Muito comum [o retorno de pacientes para uma segunda cirurgia]. São
pacientes que são diferenciados, né? Paciente que vêm até o Brasil fazer
cirurgia plástica, como se você for até a Rússia para tomar uma vodca, que
é a melhor vodca do mundo. Aqui, graças a Deus, tá virando a melhor
cirurgia plástica do mundo. O Ivo Pitanguy deixou um legado imenso,
entendeu? Então eles vêm na fonte, buscar mesmo o melhor tratamento
estético do mundo. [...] Então a gente cria clientes de anos, assim. A gente
tem bastante retorno.” (Entrevistado – Hospital da Plástica).
A entrevistada da Clínica Ivo Pitanguy não deixou claro qual é a sua opinião a
respeito da fama do Brasil no ramo das cirurgias plásticas, mas afirma que uma
grande motivação para os turistas é a qualidade do serviço prestado. Os preços,
segundo ela, não são sempre os mais baratos. O paciente, muitas vezes, paga o
mesmo valor que no seu país de origem, mas ele prefere o resultado final brasileiro:
“Eu pessoalmente acho que depende muito do ambiente lá fora e elas [as
pessoas] vêm fazer aqui. [...] Aqui dentro é a referência mundial, então ela
[a pessoa] vem buscando a referência. E quando chega aqui, se assusta,
porque não é aquilo que pensou [em relação aos valores da cirurgia].”
(Entrevistada – Clínica Ivo Pitanguy).
O Hospital da Plástica enfatiza, a respeito da ética médica a respeito das
visitas pós-operatórias com os pacientes-turistas. Segundo o médico entrevistado, o
acompanhamento do turista deve ser feito da mesma maneira que o paciente local,
pois, segundo ele, a responsabilidade pelas consequências é a mesma:
56
“No caso da cirurgia plástica, ou de qualquer tipo de cirurgia, a gente tem
que ter uma ética médica. Você não pode operar o paciente e mandar ele
embora. [...] A gente mantém o contato [depois do retorno do paciente ao
seu país de origem] porque uma vez operado, o paciente é seu pro resto da
vida, de acordo com o Código de Ética Médica.” (Entrevistado – Hospital da
Plástica).
O paciente confia no médico e na clínica/hospital que será operado. Segundo
o médico do Hospital da Plástica em sua entrevista, é necessário haver um contato
permanente com o paciente, mesmo após muito tempo. A fama da cirurgia plástica
brasileira no exterior é responsável, segundo o médico, pelo grande número de
estrangeiros operando-se no país. A entrevistada da Clínica Ivo Pitanguy diz que os
preços nem sempre são os mais baratos, mas a fama da clínica internacionalmente
atrai dezenas de pacientes por ano.
4.1.2.4 Relação entre pacientes e equipamentos turísticos
Segundo os médicos entrevistados, os pacientes buscam o Rio de Janeiro
para a realização de seus procedimentos estéticos não só pela sua fama, excelência
e preços baixos na cirurgia plástica, mas também por ser uma cidade conhecida
internacionalmente e com muitas oportunidades de passeios turísticos.
O Hospital da Plástica informou que alerta aos pacientes recém-operados a
não saírem do hotel onde estão hospedados para longas caminhadas e exposições
ao sol, somente para andar e não ficarem deitados o dia inteiro. O médico mantém o
contato constante com os pacientes para verificar as condições em que eles se
encontram e quando poderão viajar e voltar aos seus países de origem.
A Clínica Ivo Pitanguy, por sua vez, diz que alerta os pacientes recémoperados a respeitos dos riscos de saírem ao sol e à exposição ao calor, mas que,
mesmo assim, eles optam por sair na rua, principalmente aqueles que vêm ao país
na época do Carnaval. A entrevistada informa que eles colocam um chapéu grande,
e saem na rua, mesmo ainda roxos da operação:
“[...] durante mesmo eles aproveitam [referindo-se ao período de
recuperação do operatório] [...] roxinhos mesmo [...] chegam com o chapéu
desse tamanho, com uma aba enorme para poder proteger, por causa das
manchas. Eles não se incomodam, passeiam mesmo.” (Entrevistada –
Clínica Ivo Pitanguy).
57
Considerando a importância de uma estada pré e pós-operatória, perguntouse aos entrevistados se os pacientes realizavam atividades que envolviam o turismo,
durante sua permanência na cidade do Rio de Janeiro. Na Clínica Ivo Pitanguy,
muitos pacientes, mesmo sendo orientados para não realizarem atividades pré e
pós-tratamento, costumam fazer passeios turísticos antes, durante e depois. Como
citado pela médica entrevistada, os estrangeiros colocam um chapéu para amenizar
o sol, não se incomodam com as marcas roxas e passeiam pela cidade. Inclusive,
exemplificou com a ida desses turistas-pacientes ao Sambódromo durante o
Carnaval:
“Carnaval isso aqui lota! Aproveita, toda roxinha, e vai pra Sapucaí!”
(Entrevistada – Clínica Ivo Pitanguy).
A médica ainda faz uma previsão para a época da Copa do Mundo de Futebol
de 2014:
“Muita gente vai vir para a copa, vai fazer cirurgia e ainda vai pros jogos.”
(Entrevistada – Clínica Ivo Pitanguy).
Em relação aos pacientes do Hospital da Plástica, o entrevistado disse que
busca sempre frisar a importância do repouso. Além disso, grande parte do seu
público já visitou a cidade anteriormente, focando apenas no seu tratamento. No
entanto, os acompanhantes costumam visitar os atrativos turísticos, buscando
informações nos hotéis em que ficam hospedados:
“[...] não há muita possibilidade do que fazer no pós-operatório. [...] eles não
podem ficar andando em locais públicos. Pacientes que já moram aqui a
gente fala para não trabalhar, não pegar metrô. A gente deixa isso bem
claro, porque eles ficam ‘puxa, eu to viajando!’ [referindo-se à vontade de
sair e visitar a cidade, por ser uma viagem]. Só que, geralmente, eles são
pacientes diferenciados, já conheceram a cidade, então vem pra cá com
outra cabeça, vem pra repousar mesmo.” (Entrevistado – Hospital da
Plástica).
Os entrevistados informaram que os pacientes comentam com eles sobre os
pontos positivos e negativos da cidade. O hospital da Plástica informou que não
58
possui dados exatos a respeito do retorno dos turistas em relação ao Rio de Janeiro,
mas que, em geral, é positivo:
“Nesse feedback, a gente fica um pouco por fora disso, tá? O paciente
quando chega aqui, ele chega com a cabeça muito voltada para a cirurgia.
Então se acontece ou não acontece [alguma intempérie com o paciente], a
gente fica um pouco em falha em te passar isso. [...] O que a gente sabe é
que, no geral, eles gostam muito da vinda, entendeu? Tem retornado e eu
acredito que para eles gostarem da vinda, realmente deve ter sido bem
agradável. [...] Se você vem de turismo, você já tem um limite de tolerância,
mas para cirurgia, a sua tolerância tá bem diminuída.” (Entrevistado –
Hospital da Plástica).
Já na Clínica Ivo Pitanguy, como a maioria de seus pacientes estrangeiros
provém dos Estados Unidos, a entrevistada informou que eles acabam
surpreendendo-se com o estilo de vida brasileiro e a economia atual e mudam a sua
imagem pessoal do Brasil como um país não civilizado:
“Não, porque, principalmente dos Estados Unidos. Estão vivendo uma fase
que nós já estamos carecas de viver. E agora nós estamos mais
estabilizados economicamente e eles estão sentindo isso; Antigamente era
um sub-mundo, que eles vinham aqui, faziam o que queriam, achavam que
tinha macaco na rua e que hoje é um outro tipo de realidade. Eu digo,
também, porque a minha filha vai todo anos pros Estados Unidos e lá,
muitas das vezes, o pessoal pergunta: ‘mas lá tem prédio?’, quem nunca
veio. Então eles acham que as pessoas aqui no Brasil, os brasileiros, são
muito primitivos, que não têm uma cultura. Então ele já vem cheio de pose,
aí levam aquele choque, porque tem a impressão melhor do que têm nos
Estados Unidos. Lá é uma coisa, então quando você chega aqui, você tem
uma secretária que fica diariamente na sua casa, que você tem carro para
se locomover. Então eles acham assim, que é uma coisa que não existe lá,
entendeu? Lá é tudo muito prático, as coisas são muito caras, o dia-a-dia, a
comida é cara, e aqui, tá indo pro mesmo caminho, né? [risos]”
(Entrevistada – Clínica Ivo Pitanguy).
Para os médicos, o repouso e a pouca exposição ao sol e ao calor são fatores
importantes para a boa recuperação da cirurgia. Entretanto, mesmo com as
recomendações médicas, muitos pacientes optam por realizar outros tipos de
turismo. O que não impede um feedback positivo em relação à cidade. Para os
entrevistados, o ponto de vista dos pacientes a respeito do Rio de Janeiro é positivo.
59
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Brasil é um país que possui uma enorme diversidade de produtos turísticos,
atraindo milhares de turistas durante todo o ano. As paisagens naturais,
principalmente as praias, ainda são a maior motivação dos visitantes. Porém,
atualmente percebe-se o aumento da demanda pelo turismo de saúde,
especialmente para o turismo estético, com foco no Rio de Janeiro, um destino
reconhecido internacionalmente pela prática de tratamentos estéticos.
Esse segmento do turismo possibilita que o paciente possa realizar outro tipo
de turismo na cidade, enquanto realiza o seu tratamento estético. Com isso, mais
gestores são beneficiados e podem virar potenciais parceiros. Sendo assim, como
dito anteriormente, a pesquisa teve por objetivo analisar o ponto de vista dos
gestores de saúde, mais especificamente das clínicas de estéticas da cidade do Rio
de Janeiro, que recebem pacientes estrangeiros, relacionam-se com serviços
ligados ao turismo.
Percebe-se, a partir da coleta de dados e entrevistas, que as clínicas recebem
um grande e crescente fluxo de turistas estrangeiros para a realização de
tratamentos estéticos. Entretanto, não há o interesse em pesquisas na área de
turismo de saúde. Essa foi a principal limitação encontrada para a realização das
entrevistas, pois os gestores de saúde não se mostraram disponíveis e/ou
interessados para a realização de uma entrevista.
É possível observar, também, uma divergência de opiniões por parte dos
entrevistados. Enquanto o Hospital da Plástica mostra interesse em apresentar
informações sobre serviços turísticos, a Clínica Ivo Pitanguy, referência mundial em
cirurgia plástica, não informa e não mostrou interesse em estabelecer futuras
parcerias. Acredita-se, no entanto, que uma parceria entre clínicas de estética e
serviços turísticos pode dar mais segurança para o paciente. Hospedar-se em um
meio de hospedagem indicado pela clínica gera um conforto ao turista estrangeiro,
pois, assim, ele sabe que será bem atendido, que o quarto será bem limpo e que,
caso haja alguma decorrência do seu tratamento estético, o hotel estará preparado
para melhor atendê-lo e encaminhá-lo ao médico.
Em um mundo no qual a diferenciação de serviços e a percepção da
qualidade vêm sendo cada vez mais procuradas pelos consumidores, e levando em
60
consideração o reconhecimento que o Rio de Janeiro vem tendo na saúde estética,
acredita-se que uma relação mais estreita entre as clínicas e os serviços turísticos
possibilitaria uma melhor recepção aos turistas do segmento de turismo de saúde.
Além disso, seria possível gerar mais confiança para os estrangeiros e credibilidade
para as clínicas, criando um diferencial no mercado. É importante ressaltar que,
caso haja uma interação entre as duas áreas, um planejamento é inevitável para que
ambas previnam-se de possíveis problemas.
A falta de pesquisas específicas na área de turismo de saúde e a pouca
bibliografia sobre o tema tornam a sua compreensão mais difícil. Os gestores de
saúde não mostraram interesse em aprofundar seus conhecimentos na área, sendo
assim, a pesquisa contou com uma amostra limitada e poucos detalhes específicos
sobre os pacientes-turistas. A divergência citada anteriormente pode, inclusive, ser
fruto da pouca quantidade de pesquisas e estudos na área, pois os gestores não
têm onde informarem-se sobre o assunto. Sendo assim, é preciso haver um estudo
mais profundo na área de turismo de saúde, para que todos os gestores de saúde e
turismo possam estar mais informados sobre esse segmento e terem o interesse de
envolver-se mais com as atividades de saúde e turismo.
Ao início da pesquisa, pensou-se em realizar uma pesquisa quantitativa
diretamente com os consumidores do turismo de saúde, ou seja, os pacientes.
Entretanto, por questões éticas, os médicos não autorizaram a entrega de
questionários. Por isso, é interessante e útil, também, que seja realizada uma
pesquisa direta com os turistas, a fim de saber quais são suas reais expectativas, se
estas foram atendidas durante a sua estada, se têm interesse em realizar atividades
turísticas na cidade, antes ou depois do procedimento estético, o que acharam do
Rio de Janeiro, se têm o interesse em retornar futuramente para a realização de
outro tipo de turismo.
Com o resultado de uma pesquisa específica com os turistas-pacientes,
podem-se criar pacotes turísticos específicos para aqueles que vêm realizar algum
tratamento estético; certos passeios turísticos podem ser adaptados para que o
recém operado não sofra com o calor e sol (passeios noturnos, por exemplo); os
meios de hospedagem podem adaptar-se para uma hotelaria hospitalar mais
acolhedora, entre muitos outros.
Não se deve esquecer, entretanto, que mesmo que esses estrangeiros sejam
pacientes, ainda são turistas que possivelmente têm o interesse em conhecer a
61
cidade. Mesmo que isso não ocorra durante o pré e/ou pós-operatório, é
interessante cativar o paciente para que ele deseje retornar futuramente como
turista. Essa demanda potencial deve ser identificada tanto pelos gestores de saúde,
quanto pelos gestores de turismo.
Para melhor atender ao público desse segmento, alguns cursos e
especializações na área também poderiam ser criados e os poucos já existentes
poderiam ser atualizados. Atualmente, poucas faculdades oferecem pós-graduações
para Turismólogos na área de Turismo de Saúde.
Mesmo com todo o atual desinteresse por parte dos gestores de saúde,
considera-se que o presente estudo possa ser um impulsor para futuras pesquisas,
sendo investigado por especialistas de ambas as áreas e com maior amplitude, para
que haja uma melhor recepção dos turistas estrangeiros e uma maior segurança das
clínicas para lidar com esse público.
62
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68
APÊNDICE – ROTEIRO SEMI-ESTRUTURADO PARA A ENTREVISTA
1. Qual a média de turistas estrangeiros que a clínica recebe por ano? E de turistas
nacionais?
2. Quais desses tratamentos o paciente pode realizar atividades no pré e pós
operatório?
3. Os pacientes oriundos de outras localidades costumam retornar para outros
tratamentos?
4. Em relação aos estrangeiros, qual sua opinião a respeito da escolha da clínica? E
os nacionais?
5. Os pacientes costumam vir acompanhados?
6. Saberia informar a procedência desses turistas?
7. Os pacientes e acompanhantes costumam fazer turismo na cidade no período do
procedimento (pré e pós)?
8. Eles costumam pedir dicas ou orientações a respeito de quais serviços turísticos
utilizarem (hospedagem, alimentação, passeios...)?
9. Acha que há a possibilidade em relacionar o deslocamento da pessoa para
tratamento estético e fazer turismo na cidade?
10.
É orientado um tempo de permanência na cidade antes e depois desses
tratamentos?
11.
Qual sua opinião em realizar turismo pré e pós operatório?
12.
Quais são os tratamentos estéticos mais realizados na clínica pelos turistas?
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