ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL Área de interesse: Economia Política Tipo de trabalho: Trabalho completo Título: O contrato social brasileiro e as lutas por mudanças estruturais Autor (a): Hugo Clapton Nogueira E-mail: [email protected] Instituição: Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Projeto: Bolsista do Programa de Educação Tutorial em Economia Endereço postal: Rua Plácido de Castro, nº 150, centro. Telefone: (77) 8807-4419 Coautor (a): Sofia Padua Manzano E-mail: [email protected] Instituição: Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL O contrato social brasileiro e as lutas por mudanças estruturais RESUMO: A recente onda de manifestações pelo mundo, em busca de regimes democráticos, demonstra a indignação, que se acumulou com o tempo, contra os governantes autoritários. No Brasil não é diferente, o constante desrespeito aos direitos dos cidadãos, por parte do Estado, promove a transgressão do contrato social. Considerando estes aspectos, o objetivo deste trabalho foi analisar a conjuntura econômica e política do Brasil e investigar as causas que levaram os indivíduos à reclamar seus direitos civis. Constata-se, no atual cenário, uma crise social e política no país. Por que existe conflito se houve avanço nos indicadores de desenvolvimento socioeconômico? Para alcançar os objetivos propostos a metodologia utilizada lançou mão de revisão bibliográfica e análise comparativa. As referências utilizadas foram os filósofos contratualistas, como uma das explicações para a formação e consolidação do Estado; Manuel Castells, teorizando a Sociedade do Conhecimento; e, por fim, John Galbraith, esclarecendo o papel da educação nas grandes organizações. Os resultados apontam que o acesso da população ao conhecimento e a informação, possibilitou a politização dos indivíduos para exigir melhores condições de vida e a aplicação eficiente dos recursos públicos. Portanto, é possível afirmar que a educação é o mecanismo para a democratização de uma sociedade. Palavras-chave: Manifestações. Contrato Social. Reformas estruturais. INTRODUÇÃO Há diversas teorias sobre a construção e a consolidação de um Estado civil, dentre elas, os contratualistas apregoam a necessidade do Estado para garantir a paz (Hobbes, 2004), a propriedade privada (Locke, 1998) e a justiça social (Rousseau, 1978). Estes filósofos, que produziram suas teorias no alvorecer da sociedade capitalista, perceberam que essa sociedade nascente, cujas relações sociais passavam a ser mediadas pelo mercado, necessitava de uma superestrutura jurídico-política que obrigasse o cumprimento dos contratos livremente estabelecidos no mercado. Caso contrário, as contradições entre os interesses particulares levariam a um permanente estado de guerra (segundo Hobbes); a propriedade privada, direito inalienável do homem por ser originário de seu trabalho, não seria garantida (segundo Locke); e a sociedade seria destruída pela injustiça e a vontade particular iria sobrepujar sobre a vontade geral (segundo Rousseau). Para Coutinho (2011, 35-39), foi Rousseau o precursor da defesa da democracia, na era moderna. Para o exercício da democracia, o Estado deve ser constituído pela Vontade Geral que não se resume à somatória dos interesses Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL particulares, mas sim, pela formulação de “regras do jogo” que leve em consideração aquela Vontade1. Nesse sentido o exercício da democracia requer dos governos o cumprimento do contrato social, garantindo os direitos civis dos cidadãos e promovendo o desenvolvimento e, consequentemente, o bem-estar socioeconômico. A onda de manifestações que surgiu recentemente em todas as partes do mundo, tem como objetivo reivindicar a consolidação de governos democráticos, que respeitem a liberdade e assegurem a participação dos indivíduos no sistema político. A sensação que perpassa essas sociedades é de que os governos não cumprem sua função social, enquanto os cidadãos respeitam as “regras do jogo” estabelecidas e renunciaram o uso da força particular submetendo-se ao Estado, não encontram, em contrapartida, o atendimento de suas necessidades. No Brasil não é diferente, a constante omissão dos direitos dos cidadãos, por parte das autoridades públicas, promove a transgressão do contrato social. Os brasileiros não se sentem representados pelas autoridades públicas, as quais presumiram que foram eleitas com o intuito de preservar a nação e atender as demandas sociais. Outro aspecto que leva ao agravamento desse quadro é o sistema de tributação brasileiro que não cumpre a sua função de promover a justiça social e a distribuição de renda, proporcionando a todos os cidadãos acesso aos serviços públicos. Pois, os serviços oferecidos pelo Estado são de péssima qualidade e o seu usufruto torna-se inviabilizado por não haver quantidade disponível para atender a todos. Nesse sentido, faz-se necessário a realização de reformas estruturais que garanta o direito dos cidadãos e desenvolva o país. O objetivo deste trabalho é investigar quais os motivos que levaram às manifestações de junho passado, tendo em vista que houve melhora nos indicadores sócio-econômicos. O texto está organizado em seis partes. Na primeira seção, efetua-se uma análise de conjuntura, para identificar o atual momento. Na segunda seção, discorre-se sobre a crise social brasileira, expondo os motivos e as contradições. Em seguida, na terceira seção, apresenta-se o referencial teórico utilizado. Na quarta seção, discorre-se sobre o contrato social brasileiro, abordando os serviços públicos, os tributos e os partidos 1 “O grande mérito de Rousseau, no que se refere à construção da teoria da democracia, é precisamente o de ter colocado com justeza essa problemática decisiva: a democracia implica a gestação de uma vontade geral, o que pressupõe um consenso – expresso em um contrato – tanto sobre conteúdos como sobre procedimentos” (COUTINHO, 2011, 36). Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL políticos brasileiros. Na quinta seção, pondera-se as mudanças estruturais necessárias para o Brasil. E, por fim, a última seção são traçadas algumas considerações finais. 1. ANÁLISE DE CONJUNTURA A conjuntura é um conjunto de forças que têm a capacidade de influenciar/determinar o resultado final dos fatos que irão acontecer. Logo, a análise de conjuntura observa as variáveis e mensura a intensidade do conflito entre as tendências antagônicas, este último denomina-se correlação de forças. Dessa maneira, é possível definir táticas para viabilizar as estratégias e, então, chegar ao objetivo desejado. A análise de conjuntura é uma ferramenta vital para mensurar a realidade, não apenas econômica, mas, também, política e social com o intuito de subsidiar a tomada de decisão através da modelação de cenários. Nesta situação, o objetivo primordial é identificar as variáveis2 que influenciam/determinam os acontecimentos. Todavia, a conjuntura não é estática, pelo contrário, está em constante mudança, pois as variáveis que dela participam estão em movimento e os participantes podem mudar de estratégia. 1.1. Cenário Econômico Neste momento, o cenário econômico nacional e mundial está em ritmo fraco. A economia mundial ainda sofre as consequências da crise do subprime, em 2008, que desestabilizou o mercado financeiro; promoveu a falência de empresas; aumentou a concentração e oligopolização da economia e contribui para o caos, através do aumento da desigualdade de renda e dos transtornos sociais, causados pela falta de perspectiva em relação ao futuro. De acordo com o BACEN (2014) o ritmo de crescimento do país se intensificou e o crescimento real do PIB brasileiro em 2013 foi de 2,3%. Logo, o PIB per capita alcançou US$11.141,95 ficando atrás de países como Chile e Argentina (US$ 15.812,05 e US$ 12.028,32 respectivamente). Em relação ao desemprego, a taxa foi de 4,3% e a PEA e a PIA encerraram o ano em 24.391 milhões (∆-0,81) e 43.055 milhões (∆ 1,12) respectivamente. No que diz respeito aos preços, o IPCA avançou 5,91% em 2013 e a taxa SELIC encerrou o ano em 10,00% a.a., (∆ 2,75 no ano), e com taxas reais de 4,09% a.a.; o superávit da Balança Comercial alcançou US$ 2.558 bilhões e a entrada do IED registrou o valor de US$ 64.045 bilhões, 2,86% do PIB em 2013. As reservas 2 Conjunto de fatores. Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL internacionais somaram US$ 376 bilhões no período supracitado. No entanto, apesar da desvalorização da moeda nacional em relação ao Dólar, fechando em R$ 2,34, a Conta Corrente encerrou o ano deficitária em -3,6% do PIB. É importante ressaltar que o fraco desempenho da economia mundial tem forçado os países a restringirem as importações, através das barreiras comerciais, com o objetivo de equilibrar3 o balanço de pagamentos. O grau de abertura4 da economia brasileira foi de 23,45% do produto nacional em 2013. As finanças públicas estão cada vez mais se deteriorando. Pois, enquanto os países da União Europeia estão aplicando políticas econômicas de contração fiscal, o Brasil adotou uma política inversa, efetuando expansão fiscal, para manter a demanda agregada, contribuindo para o baixo superávit primário5 de 1,6% do PIB em 2013. Todavia, a eficiência dos gastos públicos não tem sido satisfatória, fato que pode ser comprovado pela elevada carga tributária, em relação aos serviços prestados, de 35,4% do PIB, R$ 1.701.643.048.877,40, de acordo com dados do (IMPOSTÔMETRO, 2014). A dívida líquida do setor público terminou em 33,8% do PIB e a dívida pública bruta encerrou o ano em 58,5% do PIB. Em relação à indústria, o índice de Utilização Média da Capacidade Instalada FGV (BACEN, 2014) indica que a indústria, em geral, terminou o ano em pleno emprego, pois a indústria de transformação encerrou o ano com utilização de 84,9% da sua capacidade instalada; em contrapartida, a indústrias de bens de capital e material de construção finalizaram o ano com 81,8% e 90,1%, respectivamente, da utilização de sua capacidade instalada. A relação do crédito sobre o PIB terminou o ano em 56,5%. O Levantamento Sistemático de Preços Agrícolas (LSPA, 2014, p. 7) informou que a produção agrícola no Brasil, em 2013, foi de 188,2 milhões de toneladas de grãos e a área colhida foi de 52,8 milhões de hectares. O rendimento6 da produção agrícola em 2013 foi de 3.564 kg por hectare. Neste momento, estão sendo realizados estudos e debates que tratam da eficiência energética do país, tendo em vista que no ano de 2014 haverá copa do mundo e, em 2016, as olimpíadas. Levando-se em consideração as mudanças climáticas que 3 No caso dos países periféricos o balanço de pagamentos é estruturalmente deficitário, contribuindo para as pressões inflacionárias estruturais, de acordo com a teoria da Cepal. 4 O grau de abertura de uma economia é a relação da soma das exportações com as importações sobre o produto interno bruto em um determinado período. 5 No entanto, o Brasil ainda é um dos poucos países que possuem superávit primário. 𝑃𝑟𝑜𝑑𝑢çã𝑜 6 𝑅𝑒𝑛𝑑𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 = Área colhida Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL obrigam os consumidores a demandarem mais energia e o aumento do consumo por causa da chegada dos turistas e, sobretudo, a falta de chuvas nos reservatórios, há possibilidade de apagão no decorrer do ano, o que colocará em risco a produção industrial e, consequentemente, os investimentos no país. O consumo de energia elétrica na rede alcançou 463,7 mil gigawatts-hora (GWh) em 2013, aumento de 3,5% em relação ao ano de 2012, EPE (2014, p. 1). Em relação à economia internacional, em 2013, o PIB mundial cresceu 3,0%. O preço do petróleo Brent encerrou o ano em US$ 110,53 o barril, o PIB real das economias desenvolvidas avançou 1,3% e a taxa de desemprego ficou em 8,1%. No que se refere aos países emergentes, o PIB real avançou 4,7% e a taxa de inflação alcançou 6,1%. Na América Latina e Caribe existe o cenário do produto nacional baixo e inflação alta, pois o PIB real avançou 2,6%, em 2013, e a taxa de inflação alcançou 6,7% no período supracitado. O grande empecilho de nossa economia, segundo as projeções do ITAÚ (2014), é a parceira comercial Argentina que vem enfrentando grave crise econômica, no qual o índice de preços está em 28,4%, segundo estimativas privadas, e a taxa BLADAR7 alcançou 21,63%, o que irá impactar a produção nacional no futuro. Ademais, a política de redução das importações, contribuiu para amenizar a Balança Comercial deficitária que encerrou com saldo de US$ 9 bilhões. Fato semelhante ocorre na Venezuela em que há um desequilíbrio macroeconômico intenso, causando alta inflação e escassez de produtos básicos, como alimentos e produtos de higiene pessoal. 1.2. Cenário Social O Brasil, neste momento, está vivenciando acontecimentos históricos, a saber: deslocou 22 milhões de brasileiros da extrema pobreza8 (BRASIL, 2014, p. 5); receberá megaeventos internacionais como a copa do mundo de futebol da FIFA, no presente ano, e Olimpíadas de verão, em 2016, na cidade do Rio de Janeiro. Ademais, a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) ocorreu, também no Brasil, em meados de julho de 2013. Dessa forma, pode-se alegar que o país está ganhando visibilidade internacional pelas ações políticas e eventos internacionais de grande porte. No entanto, nem só de boas novas vivem os brasileiros, grandes fatos marcaram, negativamente, a memória dos 7 Taxa semelhante à taxa SELIC no Brasil que serve como indicador para as demais taxas de juros cobradas no país. 8 De acordo com o IBGE apud Seides (s/d) “(...) a linha de extrema pobreza foi estabelecida em R$ 70,00 per capita considerando o rendimento nominal mensal domiciliar. Deste modo, qualquer pessoa residente em domicílios com rendimento menor (até sem rendimento) ou igual a esse valor é considerada extremamente pobre”. Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL cidadãos de nosso país, a saber: corrupção excessiva; precarização dos serviços públicos; supressão dos direitos civis; ineficiência da alocação dos recursos públicos, dentre outros problemas. Estes problemas sociais foram se acumulando com o passar do tempo. Pois, a inexistência de políticas sérias de distribuição de renda proporcionou a manutenção e a intensificação das diferenças sociais. Desde a colonização, quando a produção, baseada no latifúndio, monocultura e trabalho escravo, era determinada e destinada ao mercado externo europeu (PRADO Jr., 2006; MANZANO, 2011), até os dias atuais, o modelo de desenvolvimento econômico adotado no país configurou um tipo de capitalismo cuja modernização é sempre conservadora (OLIVEIRA, 1989). Além disso, podemos caracterizar o capitalismo brasileiro atual como completo, integrado e subordinado ao capital-imperialismo internacional (MANZANO, 2013). Para a tomada de decisões políticas é necessário utilizar a análise histórica e, sobretudo, os fatos e acontecimentos presentes, para que seja possível projetar o futuro e corrigir os desvios sociais. 1.3. Cenário em 2013 Em junho de 2013, ocorreram manifestações no Brasil que há muito tempo não se via, a mídia afirmava que “o gigante acordou” e os manifestantes convidavam, com gritos de “vem pra rua” e com o objetivo de mobilizar toda a nação brasileira, a reivindicar os direitos civis e pressionar os gestores públicos para se atentarem às demandas sociais. A pauta de exigências foi extensa, desde a rejeição da PEC 37 até os gastos com a copa do mundo no Brasil. A PEC 37 tinha como objetivo limitar os poderes investigativos do Ministério Público, transferindo, de maneira integral, a responsabilidade exclusiva à polícia para realizar investigações criminais. Entretanto, a proposta foi derrubada na Câmera dos Deputados por limitar a fiscalização e facilitar as condições de ocorrer a impunidade dos julgamentos. Em seguida, tramitava, na mesma casa, o PDC9 234/11 que “Susta a aplicação do que estabelece normas de atuação para os psicólogos em relação à questão da orientação sexual”, (CSSF, 2011, p. 1). Deste modo, a homossexualidade deveria ser 9 Projeto de Decreto Legislativo. Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL tratada como doença e, então, buscar a cura através de terapia para alterar a orientação sexual. Todavia, o projeto foi abortado em decorrência das manifestações populares. A pauta de manifestações também abordou os atos de corrupção no interior do Estado, bem como influências políticas para favorecimento de empresários, enriquecimento relâmpago e aumento repentino do patrimônio dos envolvidos. Ademais, as reinvindicações abordavam também pautas como a precarização dos serviços prestados à população, tais como: o direito à saúde de qualidade, à moradia, à educação de excelência, à mobilidade urbana, ao trabalho decente e à segurança pública. No que diz respeito à saúde, o Sistema Único de Saúde (SUS) é bastante deficiente para tratar de uma população de 200 milhões de habitantes. Em relação à moradia, há a desapropriação dos moradores sem a devida indenização e muitos são expropriados; os habitantes não podem usufruir da cidade em que residem por causa do aparthaid social e do imenso déficit habitacional. Em relação à educação, exigiam maiores investimentos nas instituições públicas e a valorização dos professores. No que diz respeito à mobilidade urbana, o direito de ir e vir dos cidadãos, dificultado em razão não só do trânsito caótico das grandes capitais, que diminuem o bem-estar dos cidadãos, mas também pelo elevado preço das passagens dos transportes públicos que inviabilizam este direito. No que diz respeito ao trabalho, luta-se contra a precarização das condições de trabalho. Em relação à segurança, luta-se para que o Estado cumpra seu dever de proteger os cidadãos contra a generalização da violência urbana. A Copa do Mundo da FIFA, que será realizada no Brasil, foi tema de grande indignação dos manifestantes pelo fato de o evento consumir grande quantidade de recursos públicos advindo dos tributos e, no entanto, os serviços ofertados a população são negligenciados. Portanto, há a desconfiança de que os custos sociais da promoção do evento sejam maiores que os benefícios, não deixando o legado prometido pelas autoridades públicas. Outra insatisfação manifestada é em relação aos partidos políticos, cujo senso comum não se sente representado, demonstrando o fracasso do sistema de participação política em que os altos gastos nas campanhas eleitorais são responsáveis pela eleição e não a real vontade geral. As manifestações populares ganharam proporções não previstas. Logo, para que o Estado não perdesse o controle social, foram propostos os Cinco Pactos10 pelo Brasil, 10 Os pactos anunciados foram: Responsabilidade Fiscal; Reforma Política; Saúde; Transporte Público e Educação. Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL com o intuito de melhorar os serviços públicos para a população e atender algumas solicitações das manifestações sociais. 1.4. Cenário em 2014 O ano de 2014 tem projetado um período de grandes mobilizações sociais e políticas, dando continuidade ao que foi iniciado em junho de 2013. Os manifestantes prometem dificultar a realização das partidas da Copa do Mundo da FIFA e revelar os verdadeiros problemas que o país enfrenta. Frequentemente, pelas redes sociais, os manifestantes estão marcando encontros para a realização das mobilizações. A condução do Estado, nesse tipo de presidencialismo de coalisão, em que o governo é obrigado a atender as reivindicações, muitas vezes extemporâneas e particulares, da base parlamentar, fica refém dos acordos e formação de blocos nem sempre homogêneos. Periodicamente o governo é obrigado a atender as demandas da sua base no congresso e restringir seu espaço de ação. No que tange o cenário internacional, existem conflitos internos em grande parte das nações. Não somente no continente da América Latina, mas, também, na Europa e na Ásia. Essa conjuntura originou-se mais intensamente desde a crise de 2008, que provocou grande colapso mundial e o impacto direto nas famílias. Posteriormente, a crise se espalhou para o resto do mundo e, principalmente, para o continente europeu, que até hoje enfrenta os impactos da crise mundial. Dessa maneira, ocorreram protestos desde o Ocupe Wall Street, na cidade de Nova York, até as crises socioeconômicas nos chamados PIIGS11. Na América Latina, crises originadas em fatores econômicos, como escassez de gêneros na Venezuela, inflação, na Argentina e reivindicações trabalhistas no Paraguai, rapidamente têm se transformado em crises políticas. Ou seja, a conjuntura internacional está praticamente no mesmo da conjuntura brasileira, em que, a crise econômica refletida na crise social, gera impasses políticos. Além disso, há crescentes conflitos que envolvem as grandes potências mundiais, como os conflitos no Egito, na Líbia e na Síria, e, mais recentemente, na Ucrânia. Esses conflitos preocupam todo o mundo, pois envolvem a retomada de práticas típicas da Guerra Fria, ocorrida no passado, porém agora, com possibilidades de se tornarem guerras “quentes”, ou seja, enquanto no passado a corrida armamentista entre Estados Unidos e União Soviética gerava uma constante instabilidade na paz, mas 11 Termo pejorativo utilizado para identificar a crise fiscal nos países: Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e a Espanha. Para uma análise da crise nos países que adotaram o Euro, ver: MANZANO (2012). Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL que não se efetivou em termos bélicos, hoje as potências, todas convertidas ao capitalismo (como a Rússia e as antigas Repúblicas Soviéticas), lutam abertamente por um novo processo de “recolonização” dos espaços de exploração e influência. 2. CRISE No Brasil, na última década, as políticas públicas proporcionaram avanços nos indicadores sociais. O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) brasileiro avançou em comparação aos anos de 1991 e 2000, houve um salto quantitativo. Gráfico 1: IDHM brasileiro entre 1991 e 2010 0,9 0,8 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0 1991 2000 2010 Renda 0,647 0,692 0,739 Educação 0,279 0,456 0,637 Longevidade 0,662 0,727 0,816 GERAL 0,493 0,612 0,727 Fonte: Elaboração própria com base nos dados da PNUD. O IDHM brasileiro avançou 47,5% entre 1991 e 2010. O país estava classificado como Muito Baixo Desenvolvimento Humano (0,493), em 1991, e avançou para Alto Desenvolvimento Humano (0,727), em 2010. A educação, indubitavelmente, foi a que mais se desenvolveu neste período, tendo um crescimento de 128%. A expectativa de vida cresceu 9,2 anos (14%), entre 1991 e 2010. Dessa maneira, percebe-se que houve aumento da renda, da educação e da longevidade. Portanto, houve melhoria na condição de vida, proporcionando aumento do bem-estar social. 2.1. Motivos A melhora do indicador de renda pode ser explicada pelo controle da inflação com a chegada do Plano Real, em 1994. Logo, foi possível planejar a economia e realizar investimentos de longo prazo, por causa da estabilização do poder de compra dos consumidores. Ademais, as políticas públicas de transferência de renda tiveram importante papel para eliminar o consumo reprimido, dando renda para quem não tinha Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL condições de consumir e houve o processo da valorização das commodities, impactando diretamente a Balança Comercial, gerando emprego e renda por causa do espraiamento nos demais setores da economia. Em relação à educação, diante da a necessidade de aumentar a oferta de mão-deobra especializada, com a implementação de empresas transnacionais e o aumento da concorrência e da globalização, tornou-se crucial ter mão-de-obra qualificada. Logo, houve a expansão das Instituições de Ensino Superior (IES), redução da evasão escolar12, exigências mínimas de formação para conseguir emprego e, sobretudo, a mudança da mentalidade em relação à importância dos estudos. No que diz respeito aos avanços da expectativa de vida, houve avanços na área da medicina e a maior oferta de profissionais da área de saúde, a consolidação do Sistema Único de Saúde (SUS)13 e a maior adesão aos planos de saúde, decorrente do aumento da renda do trabalhador. 2.2. Contradição Apesar do avanço quantitativo nos indicadores de desenvolvimento socioeconômico, por que há crise social e política no Brasil? A crise se justifica pelo acúmulo da indignação social em relação às condições de vida. Como a situação era extremamente miserável, pequenas injeções de recursos públicos promoveram a elevação dos indicadores. O efeito multiplicador da aplicação de recursos nas camadas mais vulneráveis é alto, porque o beneficiado sai de uma situação de miserabilidade, em que não tinha as necessidades básicas atendidas, para a condição de vida mínima que um ser humano necessita. Em contrapartida, o benefício decorrente do Estado, que as classes mais avantajadas possuem em relação aos mais necessitados, gera uma indignação quanto à ostentação de riqueza e ao mesmo tempo o usufruto privilegiado dos aparatos estatais, tais como: segurança privilegiada, construção de obras em bairros nobres, a localização geográfica dos serviços públicos próximo às zonas ricas das cidades, entre outros. Ademais, as classes mais abastadas possuem incentivos14 do Estado para desenvolver suas atividades econômicas. 12 A política de transferência de renda permitiu que os estudantes não largassem os estudos para trabalhar e ajudar a compor a renda familiar. Pois, os benefícios só seriam adquiridos se o aluno frequentasse as aulas. 13 Apesar de estar em condições deploráveis, o SUS possui uma cobertura nacional e realiza tratamentos e cirurgias de alta complexidade. 14 Nesta situação, torna-se necessário a ação do Estado em promover o investimento público em infraestrutura para que haja o investimento privado, aumentando a confiança do empresariado. Pois, deve- Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL O desenvolvimento das forças produtivas promoveu o avanço educacional, por causa da necessidade da disponibilidade de mão-de-obra qualificada para produção e da formação de tecnocratas15 para a composição da tecnoestrutura16. Dessa maneira, uma parte da sociedade saiu da obscuridade da ignorância e tomou conhecimento das causas, caindo por terra as falsas crenças e eliminando os dogmas. Portanto, houve a politização da sociedade e, logo, houve a cobrança por melhores condições de vida e eficiência na aplicação dos recursos públicos, que pertencem aos contribuintes. A politização dos indivíduos e o acesso à educação e à informação deram origem à Sociedade do Conhecimento, tornando-se uma sociedade mais exigente. Dessa maneira, os cidadãos têm ciência dos seus direitos e não somente dos seus deveres. 3. REFERENCIAL TEÓRICO 3.1. CONTRATUALISMO A teoria do Estado desenvolvida pelos contratualistas surge justamente no momento em que se está consolidando a economia capitalista. Essa teoria reflete a construção de um tipo específico de Estado que tem como principal função, ser o guardião dos contratos estabelecidos no âmbito da sociedade civil, ou seja, no mercado. Nesse sentido, a partir do estudo das obras dos autores fundamentais dessa corrente teórico-filosófica, a saber, Thomas Hobbes (2004), John Locke (1998) e Jean-Jacques Rousseau (1978) pode-se chegar à conclusão de que o Estado de Direito deve, em primeiro lugar, resguardar a liberdade e a igualdade jurídica, garantir a propriedade privada e, na medida do possível, construir um arcabouço legal justo. A ideia que se tem do contrato, pacto ou consenso, construído pelos indivíduos, isolados, livres e iguais, supostamente existentes no “estado de natureza”, ideia que pode ser absorvida da leitura da obra dos três autores citados, pode também ser entendida como uma metáfora da sociedade em transformação, no declínio da sociedade estratificada feudal, para uma sociedade mediada pelo mercado e que necessita tanto da se levar em consideração que o promotor de riqueza de uma sociedade capitalista é o setor privado. No entanto, cabe ao Estado promover o desenvolvimento econômico através da distribuição de renda, promovendo a equidade e a justiça social. 15 Técnicos e especialistas que promovem o planejamento e a gestão da grande empresa. 16 Refere-se à empresa moderna por causa da complexidade de suas ações, não sendo mais possível ser gerida unicamente pelo empresário individual, que torna necessário a formação de técnicos para o planejamento. Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL liberdade de estabelecimento dos contratos, quanto da igualdade jurídica, pois não se faz um contrato justo entre desiguais17. 3.2. CASTELLS A sociedade do conhecimento é um termo genérico utilizado pelos cientistas sociais, mas, especificamente, Manuel Castells utiliza o termo Sociedade Informacional, para descrever o processo de absorção da informação que a humanidade passou nas décadas de 1970 e 1980, com o intuito de reformular a dinâmica capitalista. Naquele momento, o Welfare State declinava por causa da crise no sistema econômico. As firmas estavam tendo lucros menores e era necessário implementar processos de otimização da produção, com o objetivo de reduzir custos e aumentar a produtividade. Deste modo, a automação da produção e a utilização das tecnologias da informação trouxeram um novo modelo produtivo, chamado Toyotismo, no qual dinamizou a produção e apresentou taxas de lucros crescentes. Assim sendo, o conhecimento torna-se ferramenta imprescindível no desenvolvimento econômico, e o capital humano passa a ser o principal ativo das empresas maduras. A construção e interpretação dos dados torna-se fundamental para a sobrevivência das empresas no atual sistema de concorrência oligopolística. 3.3. GALBRAITH No último século, o avanço tecnológico, alcançado a partir de investimentos maciços em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), proporcionou grandes ferramentas e acessórios que proporcionaram comodidade e permitiu o avanço da produção mundial. As informações entre as empresas são trocadas em tempo real, os dados econômicos estão ao acesso de todos e, principalmente, o conhecimento e a ciência estão se universalizando. Deste modo, faz-se necessário ter mão-de-obra qualificada para desempenhar as atividades da tecnoestrutura. Segundo Galbraith (1982, p. 269) “(...) a educação – particularmente a educação superior – é obviamente estratégica. (...) naturalmente adapta-se em grande extensão às necessidades do sistema de planejamento”. 17 Para o aprofundamento dessa temática, ver Cintra (2010), Macpherson (1979) e Boron (2006). Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL 4. O CONTRATO SOCIAL BRASILEIRO 4.1. Serviços Públicos Na sociedade capitalista, o consumo e o acesso à bens e serviços é realizado através do mercado. Deste modo, quem não possui renda para o consumo é excluído das relações de troca e impossibilitado de ter suas necessidades básicas atendidas. Deste modo, passou a ser função do Estado realizar a distribuição da renda e da riqueza geradas. Ademais, existem bens e serviços que o setor privado não tem interesse de ofertar, pelo fato de eles serem indivisíveis18 e não gerar lucros. Nestes ramos, o Estado é chamado a ofertar bens e serviços necessários para a população. Logo, a economia de mercado pura não otimiza o bem-estar social, tornando-se necessário, em ocasiões específicas, a entrada do Estado para corrigir falhas de mercado e evitar a trustificação da economia, através da garantia da concorrência no mercado e assegurando os direitos do consumidor/contribuinte. 4.2. Tributos Os tributos e impostos são os principais mecanismos de obtenção dos recursos públicos no sistema capitalista. Logo, o sistema de tributação deve ser o mais justo possível, para que possa cumprir sua função de eliminar os distúrbios sociais e corrigir as diferenças causadas pela concentração da renda. Deste modo, o princípio do benefício19 não é o mais adequado em uma sociedade com acentuada desigualdade e elevada concentração de renda. Pois, (...) a utilidade marginal da renda monetária diminui com o acréscimo da renda. Isso significa que R$ 100,00 é mais importante para um indivíduo pobre do que para um rico. Dado esse fato, se um indivíduo pobre e um indivíduo rico pagam um mesmo montante de tributos, verifica-se claramente que eles não fizeram o mesmo sacrifício. Devido à habilidade de pagamento, observa-se que o indivíduo pobre teve um sacrifício superior ao do rico. RIANI (2009, p. 104). O princípio da habilidade do pagamento20, em uma sociedade desigual, é o mais eficiente sistema de tributação, pois permite que os bens e serviços públicos sejam 18 “Os bens indivisíveis são aqueles cujos benefícios não podem ser individualizados, tornando ineficaz o estabelecimento dos preços via sistema de mercado”. RIANI (2009, p. 13). 19 “O princípio do benefício estabelece que cada indivíduo na sociedade pagará tributo de acordo com o montante de benefícios que recebe. Quanto maior o benefício, maior seria a contribuição e vice-versa”. RIANI (2009, p. 102). 20 “Esse princípio distribui o ônus da tributação entre os indivíduos na sociedade de acordo com sua [capacidade] de pagamento, medida usualmente pelo nível da renda”. RIANI (2009, p. 103). Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL ofertados sem a exclusão dos cidadãos que não possuem renda para adquiri-los e torna o sistema mais justo, pelo fato de o usufruto não depender exclusivamente do dispêndio da renda, porém irá depender da capacidade de pagamento do contribuinte. Em grande parte dos países, o imposto direto – imposto sobre a renda e a propriedade – é a maior fonte de receitas. Deste modo, é possível haver uma tributação mais justa e progressiva21 pelo fato de o Estado ser financiado pela capacidade de pagamento dos contribuintes e não sobrecarregando o setor de renda mais baixa. Ao atribuir valores homogêneos, o contribuinte de menor renda será penalizado ao pagar mais impostos proporcionalmente à sua renda, causando perda do poder de compra e elevando a concentração da renda. No Brasil, o sistema tributário é regressivo, porque a maior parte da receita adquirida para o financiamento do Estado não têm como origem os impostos diretos, o que significa que o sistema de tributação não está sendo executado de acordo com a habilidade de pagamento do contribuinte. Assim sendo, o sistema de tributação tem como principal fonte de financiamento os impostos indiretos – impostos que incidem sobre o consumo -, atingindo, indiscriminadamente, todos na sociedade. Portanto, constitui-se em um sistema de tributação em que se aplica a mesma alíquota de impostos para os diferente níveis de renda, não utilizando os mecanismos de equidade horizontal e a equidade vertical22. E, por fim, existem os Free riders no Brasil que desfrutam os serviços proporcionados pelo governo, exploram a atividade econômica e utilizam a infraestrutura construída pelo Estado. Entretanto, não contribuem para a arrecadação nacional, pelo fato de sonegarem impostos, descumprindo seu dever enquanto cidadão, usurpando o trabalho dos demais contribuintes, sobretudo, os setores mais carentes e participando da atividade econômica de forma ilegal, por levar vantagem em relação ao empresário que paga seus tributos corretamente. 4.3. Partidos e participação política Para a maior parte da população brasileira, a percepção que se tem da política é bastante pejorativa. A corrupção que perpassa todas as esferas do governo e também das 21 “Por meio desse sistema, aplicam-se maiores percentuais de impostos para as classes de renda mais alta”. RIANI (2009, p. 108). 22 “Significa que os indivíduos com iguais habilidades devem pagar o mesmo montante de tributos. Por outro lado, a equidade vertical requer que os indivíduos com diferentes habilidades paguem tributos em montantes diferenciados.” RIANI (2009, p. 104). Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL empresas privadas; os descompassos entre as promessas feitas em período eleitoral e a ação concreta, quando no governo; a opção que os governantes fazem pelos grandes negócios, para a alavancagem do capital monopolista; a indiferenciação da maior parte dos partidos políticos. Tudo isso criou uma situação de descrédito quanto a participação política. Contudo, é extremamente necessária a participação política. De acordo com Dallari (1984, p. 2) “(...) ‘política’ se refere à vida na polis, ou seja, à vida em comum, às regras de organização dessa vida, aos objetivos da comunidade e às decisões sobre todos esses pontos. (...) tratar de política é cuidar das decisões sobre problemas de interesse da coletividade (...)”. O grande problema da política brasileira é que os partidos não exercem as funções que lhes foram atribuídas, a lei nº 9.096, de 19 de setembro de 1995, Título I, Artigo 1º diz “O partido político, pessoa jurídica de direito privado, destina-se a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal”. Todavia, não garantem o regime democrático, pelo fato de não atenderem às demandas sociais e, sobretudo, suprimirem os direitos fundamentais dos setores mais necessitados da população. No Brasil existem 32 partidos políticos registrados, segundo o TSE (2014). Contudo, apesar de haver um número expressivo, poucos são os partidos políticos coerentes no país. A maioria deles não cumpre seu programa político e os eleitores não conhecem o estatuto, que estabelece as diretrizes do partido. A maioria dos partidos não têm interesses pela coletividade, mas sim pelos interesses individuais de seus partidários. Portanto, lutam pelo poder e não pela democracia e o desenvolvimento da nação. 5. MUDANÇAS ESTRUTURAIS O Brasil possui, abundantemente, recursos físicos e naturais que deveriam ser utilizados para melhorar a qualidade vida dos cidadãos. Existem países que não possuem as condições ambientais, geográficas e de produção de riquezas semelhantes ao Brasil, entretanto, a sua população têm melhores condições de vida. Além disso, o país possui um dos maiores PIB do mundo, sobretudo entre as nações em desenvolvimento. Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL Figura 2: Produto Interno Bruto de países selecionados em 2013 (US$ bilhões) 10 000,0 9 000,0 8 000,0 7 000,0 6 000,0 5 000,0 4 000,0 3 000,0 2 000,0 1 000,0 0,0 Produto Interno Bruto Fonte: Elaboração própria com base nos dados do BACEN. Todavia, por que esta riqueza não se reflete na qualidade de vida dos cidadãos brasileiros? O IDH demonstra que o país está longe de ser um dos melhores locais para se viver. Deste modo, percebe-se que a riqueza produzida internamente não condiz com a qualidade de vida dos cidadãos. O crescimento econômico não proporcionou o desenvolvimento econômico, pois a riqueza gerada é concentrada em pequenos grupos. Tabela 1: IDH 2012 e Índice de Gini (2000-2010) de países selecionados PAÍS POSIÇÃO IDH ÍNDICE DE GINI Polónia 39 0,821 34,1 Chile 40 0,819 52,1 Argentina 45 0,811 44,5 México 61 0,775 48,3 Brasil 85 0,730 54,7 Turquia 90 0,722 39,0 China 101 0,699 42,5 Tailândia 103 0,690 40,0 África do Sul 121 0,629 63,1 Indonésia 121 0,629 34,0 Índia 136 0,554 33,4 Fonte: Elaboração própria com base nos dados da PNUD. Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL Pode-se perceber que países com produção de riquezas menor que o Brasil estão em posições superior no IDH pelo fato de possuírem longevidade, educação e renda per capita mais elevadas; garantindo uma qualidade de vida melhor. Percebe-se que o elevado nível de concentração de renda, medido pelo Índice de Gini, demonstra o nível de desigualdade no país. Neste grupo de países selecionados, o Brasil tem a segunda maior concentração de renda, atrás, apenas, da África do Sul. Além disso, os países com o IDH mais alto, geralmente, são os países em que há elevada carga tributária. Todavia, os serviços oferecidos pelo Estado são de alta qualidade e os cidadãos não precisam gastar parte de suas rendas com serviços privados. No Brasil, afirma-se que exista alta taxa de tributação. Entretanto, o problema não é a tributação excessiva, mas é a ineficiência e a má utilização dos recursos públicos. Ademais, é necessário realizar reformas estruturais no país e planejar o futuro, não se pode executar a gestão de um país executando reformas pontuais. Deste modo, é necessário atingir as oligarquias atrasadas, que servem a perpetuar a modernização conservadora no Brasil. Logo, é necessário realizar uma tributação progressiva, para que haja uma distribuição de renda e a promoção da igualdade social; Reforma na educação, para que haja educação pública de qualidade desde a educação primária até as instituições de ensino superior (IES); Valorização do trabalho, eliminando a precarização e lutando contra a flexibilização das leis trabalhistas, tendo em vista que, nos momentos cíclicos da economia, as leis trabalhistas irão garantir proteção para que o trabalhador mantenha sua renda, o que minimizará os impactos negativos da crise na macroeconomia; Realizar a reforma política, aplicando sanções mais duras para corrupção e a ingerência nos serviços públicos. Eliminar o financiamento privado das campanhas eleitorais, utilizando somente o Fundo Partidário23. Pois, deste modo, as empresas privadas iriam ser impedidas de financiar os candidatos e, consequentemente, não teriam influência nas decisões governamentais; Realizar a reforma agrária, pois existem grandes latifúndios improdutivos que não têm nenhuma serventia à comunidade brasileira. Deste modo, deve-se fomentar a agricultura familiar que é a grande responsável pela produção que alimenta a população brasileira, garantindo a segurança alimentar do país; E, por fim, tratar da problemática da mobilização urbana. Pois, o 23 Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos. Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL custo social e o custo de oportunidade, causados pela perda de tempo no trânsito, geram prejuízos para a produção nacional e má qualidade de vida. CONSIDERAÇÕES FINAIS Pode-se perceber que há uma onda de manifestações pelo mundo, em que a sociedade está exigindo, cada vez mais, governos democráticos e rejeitando governos autoritários. Fatos semelhantes aconteceram no oriente médio, com a Primavera Árabe, em que manifestantes ocuparam as praças de seus respectivos países exigindo a derrubada de governos autoritários e corruptos e a implementação da democracia. No Brasil não é diferente porque há o aumento da politização da sociedade, através do conhecimento dos fatos passados, e do acesso à educação. A pauta das manifestações incluía a extrema corrupção no país. Pois, desde o tempo em que houve a onda de privatização das empresas públicas, por quantia irrisória ao seu valor de mercado atual, há um sentimento de revolta por parte da população. O modelo de tributação no Brasil é um modelo regressivo que tributa o consumo. Logo, como a Propensão Marginal à Consumir do assalariado é de quase 100% de sua renda, a tributação recai mais intensamente sobre a renda do trabalhador. O Estado tem realizado políticas de transferência de renda. No entanto, critica-se o caráter eleitoreiro e assistencialista. Esse tipo de política de renda focalizado e pontual não gera efeitos multiplicadores positivos que possam retirar o público alvo do assistencialismo. Ao atentar para as atuais condições do Estado brasileiro, percebe-se o descumprimento do contrato social, pelo fato de o Estado não atender as necessidades da população a partir do momento em que não fornece: segurança pública, educação de qualidade, saúde pública24 de qualidade, acesso à cultura. Vale ressaltar que a pobreza não é unidimensional. Todavia, é multidimensional e não diz respeito somente à renda de um indivíduo. O desenvolvimento humano e o progresso social obrigaram os indivíduos a se especializarem e adquirirem conhecimentos, para que estivessem aptos e fossem capazes de desenvolver as atividades produtivas que se tornaram mais complexas. Apesar de a divisão social do trabalho promover a especialização, promove também a 24 Apesar de o indicador de longevidade ter melhorado, a saúde pública brasileira é precária. Faltam medicamentos nos postos de saúde, especialistas de diversas áreas nos hospitais, médicos nas periferias e zona rural, médicos nas cidades do interior e, sobretudo, infraestrutura de equipamentos adequada para as proporções do Brasil. Anais da XIII Semana de Economia da UESB - 19 a 24 de maio de 2014 Vitória da Conquista/BA ÁREA: ECONOMIA POLÍTICA, HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E HISTÓRIA ECONÔMICA GERAL simplificação, pelo fato de o indivíduo realizar atividades extremamente repetitivas, assemelhando-se e sendo substituído, pelo processo de automação industrial, por máquinas. Deste modo, as exigências educacionais para exercer as atividades produtivas é uma faca de dois gumes, pois, ao mesmo tempo em que promove o acesso à informação, também promove a alienação do trabalhador pelo fato de o conhecimento adquirido ser tendencioso e altamente específico, não possibilitando o conhecimento do todo. Assim sendo, cabe ao cidadão que busca transformar a realidade e, consequentemente, a sociedade, buscar o conhecimento em sua plenitude. Portanto, é possível afirmar que o acesso ao conhecimento produziu uma sociedade politizada, pelo fato de os indivíduos terem acesso à informação, transformando-os em sujeitos críticos da realidade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BORON, Atílio (Org,). Filosofia política moderna. De Hobbes a Marx. Buenos Aires: CLACSO, 2006. 387p. BRASIL. Banco Central do Brasil. Indicadores econômicos consolidados. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/?INDECO>. Acesso em: 02 abr. 2014. BRASIL. Empresa de Pesquisa Energética. Resenha Mensal do Mercado de Energia Elétrica. Rio de Janeiro. 2014. 4 p. BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Levantamento Sistemático da Produção Agrícola: Pesquisa Mensal de Previsão e Acompanhamento das Safras Agrícolas no Ano Civil. Rio de Janeiro. 2014. 85 p. BRASIL. LEI Nº 9.096, DE 19 DE SETEMBRO DE 1995. Dispõe sobre partidos políticos, regulamenta os arts. 17 e 14, § 3º, inciso V, da Constituição Federal. 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