BRASIL E ARGENTINA EM FOCO: UMA ANÁLISE SOBRE SUAS RELAÇÕES FASCISTAS DURANTE A DÉCADA DE 1930 POR MEIO DO JORNAL A OFFENSIVA Daniela Moraes de Almeida A época que abrange os anos entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial foi marcada por uma intensa agitação política. Em todo o mundo governos assistiram a uma guinada à direita, culminando na ascensão de movimentos fascistas e de forte caráter nacionalista. Na América Latina a influência dos grandes acontecimentos da Europa resultou no surgimento de governos autoritários, nacionalistas e simpatizantes das ideias do fascismo europeu. Um exemplo disso pode ser encontrado ao constatar-se que o maior partido de caráter fascista que se desenvolveu fora da Europa foi a Ação Integralista Brasileira (AIB) dirigido por Plínio Salgado. Já na Argentina, por exemplo, um movimento similar pode ser encontrado na chamada Liga Patriótica Argentina, que durante a década de 1930 tendeu fortemente a evoluir para o fascismo. O estudo destes movimentos dentro de uma perspectiva interna foi amplamente debatido e estudado. No entanto, por meio da análise de jornais da época, como o jornal integralista A Offensiva, é possível observar que houve um acentuado intercâmbio de ideias entre estes países. O objetivo deste trabalho, portanto, é apresentar os resultados iniciais de minha pesquisa sobre o assunto, apontando o tipo de relação que se dava entre estes movimentos, bem como suas contribuições intelectuais e suas similitudes e discordâncias. Palavras-chave: Fascismo; Integralismo; Argentina. BRASIL E ARGENTINA EM FOCO: UMA ANÁLISE SOBRE SUAS RELAÇÕES FASCISTAS DURANTE A DÉCADA DE 1930 POR MEIO DO JORNAL A OFFENSIVA Daniela Moraes de Almeida Assim como Eric Hobsbawm demonstra em sua obra A Era dos Extremos, o século XX foi uma época de intensas transformações que marcaram o mundo e influenciaram os rumos de diversas nações. O período sobre o qual me dedicarei, contudo, será o entreguerras que marcado por fortes tensões e situações extremas mudou a trajetória política de todo o globo e deixou consequências que nos cercam ainda hoje. Uma das grandes mudanças que se pode notar é a grande ascensão da extrema direita no poder. Isso se deve à acentuada perda de espaço da democracia liberal na política em consequência dos graves acontecimentos do início do século como a Grande Guerra de 1914. Ao fim da guerra, portanto, os governos das grandes nações assimilaram os ideais conservadores da direita que se expandia por toda a Europa. Não foi apenas essa parte do globo, porém, que assistiu a essa guinada à direita. A América Latina, que se espelhava nos feitos e ideologias destas grandes nações, também viu ascender e brotar em seu solo governos direitistas e movimentos políticos com características fascistas. Estes movimentos se introduziram na região primeiramente por meio das inúmeras colônias de imigrantes que vinham se estabelecendo como a alemã, espanhola e principalmente a italiana. Apesar da influencia das colônias, houve também o surgimento de movimentos nacionalistas de cunho fascista como se pode observar no Brasil com a chamada Ação Integralista Brasileira (AIB), tida como o maior partido fascista fora da Europa, na Argentina com a Liga Patriótica Argentina, bem como no Uruguai, Chile, México, entre outros. Um fator de extrema importância e que auxiliou grandemente o desenvolvimento destes grupos foi a utilização da imprensa escrita. Por meio dela os ideais políticos e sociais destes movimentos em formação se difundiam pela sociedade, o que engrossava as fileiras de apoiadores como também consolidava a ideologia pregada e sustentava a base de apoio aos governos conservadores. Muitos historiadores, entre eles Hélgio Trindade, Sandra Deutsch, José L. B. Beired e João Fábio Bertonha se dedicaram ao estudo das particularidades destes movimentos nacionalistas de caráter fascista e atualmente seus estudos já atingiram um considerável nível de desenvolvimento. A vasta produção destes pesquisadores revela um grande volume de informações acerca da história destes grupos, bem como de sua inserção nas sociedades em que atuaram e seus fracassos e sucessos obtidos. Estes estudos, porém, têm sido realizados mais enfaticamente sobre a ótica do campo nacional e, assim, deixam de analisar um aspecto interessante da eclosão destes movimentos: seus relacionamentos e interligações. Pouco se sabe, por exemplo, sobre a visão que cada movimento exercia sobre o outro ou se houve algum tipo de união prática entre estes grupos baseados nas mesmas ideologias e ações políticas do fascismo europeu. Com base na análise de jornais da época, como o jornal integralista amplamente difundido por todo o país, A Offensiva, mantido pelo líder integralista Plínio Salgado e principal porta-voz do movimento, e também nos jornais argentinos de caráter nacionalista como Crisol e Bandera Argentina, é possível observar que houve um acentuado intercâmbio de ideias entre estes países e que, portanto, os movimentos não desenvolviam de maneira isolada, e sim em comunhão de ideias e com vistas a consolidar um bem comum entre todos. Desta forma, a proposta deste trabalho é apresentar os resultados iniciais de minha pesquisa sobre o assunto, apontando como se deu o surgimento desses movimentos e o tipo de relação que se estabelecia entre os movimentos de caráter fascista surgidos no Brasil e na Argentina, bem como suas contribuições intelectuais e suas similitudes e discordâncias. A Argentina, influenciada pelos acontecimentos do período pós-Primeira Guerra Mundial e, portanto inserida no contexto de forte turbulência política, econômica e social, também vivenciou um período de bastante instabilidade política e marcado por um forte caráter radical já que o governo em exercício daquele momento não conseguiu amenizar es efeitos drásticos causados pela crise. Sob a forte insatisfação popular, Hipólito Yrigoyen, presidente do país e em seu segundo mandato, sofre no ano de 1930 um golpe de Estado comandado pelo general José Félix Uriburu. A partir de então este país, assim como outros, também veria seu governo se voltar para o conservadorismo na tentativa de solucionar os problemas causados pela democracia liberal. No que se refere ao golpe sofrido por Yrigoyen, contudo, é importante apontar que tal situação não se deu apenas devido às consequências da crise de 1929. Segundo Francisco Luiz Corsi, apesar do PIB argentino ter caído 14,3% no período de 1929 a 1932 e de seus impactos iniciais na economia ter sido um dos fatores determinantes para o declínio do governo constitucional, o golpe que derrubou o presidente da época não foi um resultado direto da crise. Para ele, tal situação estava condicionada a fatores mais complexos e que se remetiam ao período anterior a crise de 1929, e portanto, “a queda de Yrigoyen deveu-se, sobretudo, a luta política interna, que estava, todavia, entrelaçada e condicionada pelos interesses e projetos econômicos das classes dominantes” (CORSI, 2012, p. 4). Foi neste contexto, portanto, que os movimentos nacionalistas de extremadireita surgiram no país e que, devido à intensa influência ideológica dos movimentos similares europeus, tenderam fortemente a evoluir para o fascismo, o que desencadeou em uma nova experiência política e social na sociedade argentina, e que se estenderia por muitos anos. Conforme Trindade, assim como na Europa “o fascismo e o nazismo foram respostas nacionais a uma conjugação de crises de natureza política, social, econômica, financeira e internacional” (TRINDADE, 2004, p.14), a partir desse cenário conturbado que se estabeleceu na América Latina, também se desenvolveria na Argentina um acentuado combate, por meio de um nacionalismo exacerbado, às consequências do sistema capitalista, visto como o grande mal das sociedades baseadas na democracialiberal, e causador dos diversos problemas surgidos naquele país e no mundo. Entendese assim, que estes países latino-americanos que se encontravam em um nível mais avançado de desenvolvimento também apresentaram as mesmas tendências políticas dos países da Europa que encontraram na extrema-direita fascista um meio para combater os males da sociedade liberal. Para o sociólogo Juan Linz, apesar do surgimento de algumas importantes características da ideologia fascista nos movimentos argentinos, como o forte sentimento antiliberal, antidemocrático, nacionalista, reacionário e populista, não se desenvolveu neste país nenhum notável partido fascista durante a década de 1930. Esta afirmação, porém, parece ser de certa forma questionável visto que Deutsch nos apresenta uma vasta obra ressaltando o importante papel da denominada Liga Patriótica Argentina que, criada em 1919, se estendeu por um longo período sendo reconhecida como a primeira e mais importante organização contrarrevolucionária argentina criada nesta época. No que se refere a estes grupos de características fascistas surgidos na Argentina é importante mencionar que alguns deles, como já apontado, se deram em forte comunhão com os movimentos fascistas e nazistas europeus por meio da intensa imigração alemã e principalmente italiana da época, proporcionando o dinamismo do movimento. Apesar de essa relação internacional ter se dado, porém, isso não impediu a eclosão de órgãos fascistas nacionais autônomos. Quanto a esta relação do movimento com a imigração, deve-se ressaltar que ela foi mais intensa com as coletividades italianas devido tanto a sua enorme proporção quanto a maior facilidade de incorporação com os ideais difundidos pela ideologia fascista, já que que ao se voltar para o nazismo alemão se deparavam com uma forte barreira de assimilação: o arianismo. É importante apontar, ainda, que esta questão está diretamente ligada à ascensão da extrema-direita ao poder na conjuntura política do país. Essa característica foi um relevante traço do período entreguerras praticamente no mundo todo, e isso se deveu, principalmente, às situações extremas causadas pela Grande Guerra. Este fenômeno político, que tinha como metas combater o liberalismo e os grandes males causados por este como o comunismo, o anarquismo, a democracia e um governo incapaz de guiar uma grande nação, consolidou-se na sociedade argentina após o conturbado período de manifestações populares que desembocaram em 1919 com a chamada Semana Trágica. Segundo Deutsch foi nessa ocasião que muitos trabalhadores argentinos clamaram por seus direitos por meio de atos radicais, causando grande temor aos setores conservadores da sociedade que, já atentos para a “ameaça vermelha”, deram início à formação da chamada Liga Patriótica Argentina, reconhecida como a primeira organização antiesquerdista na época. O movimento argentino de extrema-direita que vinha se desenvolvendo também esteve relacionado com o âmbito religioso por meio do apoio do setor católico da sociedade que colaborou com o movimento através de um respaldo moral, já que via na subordinação social, aliada as novas ideias conservadoras baseadas em uma ideologia de caráter fascista, uma forma de se transformar a sociedade argentina e introduzi-la nos moldes de uma nação contrária a democracia-liberal e baseada em um forte espírito nacionalista. Há, efetivamente, uma notável diferença capaz de ser detectada no que se refere aos polos ideológicos que sustentavam os grupos da direita nacionalista argentinos e brasileiros. Enquanto na Argentina a conjuntura desta ideologia apresentava-se sob a forma de uma estrutura diádica, referentes aos dois polos de maior destaque no movimento: o católico e o fascista; no Brasil esta situação se dava de maneira diversa já que se apresentava sob uma conformação triádica, configurada por seus três relevantes polos: o fascista (expresso através do Integralismo), o católico e o cientificista. A influência destes elementos em suas respectivas sociedades será, porém, pormenorizada ao longo de minha pesquisa. Na obra La iglesia católica en política argentina Jose Maria Ghio demonstra que o comportamento de apoio deste âmbito religioso argentino para com o governo conservador e os movimentos nacionalistas de direita estava ligado a um processo de transformação do setor católico que vinha se desenvolvendo desde épocas remotas, muito anteriores as turbulências vivenciadas durante a década de 1930. Com a ascensão de regimes autoritários na América Latina, porém, o caráter da Igreja Católica foi lentamente se alterando e se adequando ao novo cenário político. As mudanças ocorridas dentro do catolicismo resultaram novas práticas sociais causadas principalmente pela grande participação deste setor nas questões governamentais e nos rumos políticos do país. Sobre a reação católica aos acontecimentos de 1919 na Argentina, por exemplo, Ghio afirma: Con la represión obrera conocida como la “Semana Trágica” (1919) la Iglesia vuelve a alzar su voz para condenar a los “extremistas extranjeros”, sumándose a la reacción nacionalista de otros sectores altos de la sociedad expresados en organizaciones tradicionalistas como la Liga Patriótica (GHIO, 2007, p.57). Aos poucos, portanto, foram sendo introduzidos na instituição católica argentina a ideologia dos movimentos conservadores surgidos no país e já no início da década de 1930 era possível observar a difusão dos principais ideais fascistas entre os principais sacerdotes do setor católico. A absorção de características destes movimentos como o antiliberalismo, o nacionalismo e o antissemitismo pode ser comprovada no seguinte trecho: El presbítero Julio Meinvielle presentó en los Cursos¹ su ciclo sobre “Concepción Católica de la Política” en 1932. Sin duda para aquellos jóvenes deseosos de encontrar en los Círculos algo más que la educación católica que la universidad liberal les negaba, el contacto con las ideas de Meinvielle les permitia descubrir los fundamentos cristianos de un nuevo orden, distinto al de la democracia liberal que destonaban. Meinvielle, quien se convertirá en unos de los referentes intelectuales de esta nueva generación de militantes católicos, predicaba una especie de fascismo como alternativa a la “decadente” democracia liberal, y su discurso contenía una fuerte dosis de antisemitismo (GHIO, 2007, p.59). O novo modelo da prática social da Nova Cristandade argentina, que já vinha se desenvolvendo ao longo dos anos e que durante o período entreguerras se mostrava mais intenso, coincidiu com as conturbações políticas e a quebra da ordem institucional no país. Após o golpe sofrido por Hipólito Yrigoyen perante o Exército a Igreja Católica demonstrou um grande entusiasmo, revelando a partir de então uma estreita relação entre Igreja e Estado. Após a adoção desse novo perfil, houve por toda a Argentina a proliferação de inúmeras dioceses e paróquias que surgiam com um novo caráter baseado no antiliberalismo, no corporativismo social-cristão e até mesmo puro fascismo. Aliada ao governo, a Igreja Católica e seu principal veículo de comunicação, a revista Criterio, foram incluem-se entre os principais meios de difusão de ideias, de agregamento e de sustentação do governo. Originada em 1928, essa revista católica desempenhou intensamente seu papel, e segundo Ghio, foi por meio dela que a ideologia nacionalcatolicista de direita se expandiu com grande força: En sus primeros años, Criterio, se orienta hacia la fundamentación ideológica de distintas formas de corporativismo en notas de fuerte tono antiliberal y antidemocrático. El contenido de sus artículos es la más clara demostración del grado de derechización a que se había llegado en los medios católicos nacionalistas en los comienzos de la década. Desde sus páginas se elogió a Mussolini, se aplaudió la victoria de Franco en la Guerra Civil española y se fustigó a los socialistas, a los comunistas y a los judíos (GHIO, 2007, p.68). Deste modo, a união entre o nacionalismo e o catolicismo, bem como a assimilação dos ideais conservadores foi a principal causa para o ressurgimento da Igreja como uma das forças mais poderosas da sociedade argentina. Este conjunto de forças consolidou o projeto de transformação e expansão iniciado pelo setor católico desde o século XIX e foi responsável por profundas mudanças na sociedade que prevaleceriam por um longo período e que gerou consequências capazes de serem sentidas ainda nos dias atuais. Apesar da relevância atribuída ao papel desempenhado pela Igreja Católica no processo político de “direitização” da sociedade na Argentina, é imprudente aceitar que o nacionalismo assumiu um papel secundário em tal processo. Assim como ocorreu nos demais países tanto da Europa quanto da América Latina, a ênfase no espírito da nação argentina foi ponto central para a ascensão do movimento, portanto se este fator não pode ser visto como o mais importante durante o processo, é mais cauteloso aceitar que foi tão indispensável quanto o catolicismo. Portanto, é fundamental ressaltar aqui a grande importância que o nacionalismo apresentou durante o desenvolvimento dessa nova sociedade argentina. Este nacionalismo de caráter autoritário foi de grande relevância para a consolidação da extrema-direita nos vários países e para os grandes líderes que estavam à frente do movimento argentino, o incentivo ao caráter nacionalista da população era um ponto essencial para sustentar a causa que defendiam, assim como pode se observar em Deutsch: (...) hay otra cuestión aún que ilustra la importancia de la contrarrevolución en la Argentina. (…) los contrarrevolucionarios argentinos lograron convencer a la mayor parte de sus conciudadanos de que ellos eran los únicos que debían ser identificados con la causa de la autonomía nacional frente a la dominación extranjera. Por esta razón, los especialistas se han referido generalmente a ellos como “los nacionalistas”. El hecho de haberse apropiado del término también demuestra su fuerza (DEUTSCH, 2003, p. 12-13). Para o historiador José L. B. Beired, o caráter nacionalista assumido pelo movimento da extrema-direita foi de intensa relevância para sua própria consolidação. Segundo ele, houve tanto no Brasil como na Argentina, e em demais países, a eclosão de um movimento político ultradireitista, no período entre guerras, que teve embasamento em ideais nacionalistas e antiliberais aliados a um ascendente e forte autoritarismo. O forte nacionalismo presente nessa sociedade pode ter sido um dos principais responsáveis pelo sucesso do movimento contrarrevolucionário, mas apesar dos benefícios, essa característica nacionalista também poderia apresentar dificuldades ao grupo já que, devido à sua própria essência, haveria a possibilidade de surgir dificuldades de integração com os demais movimentos nacionalistas latino-americanos também identificados com o ideal fascista. Referente a esta questão ainda, é importante destacar que, a partir da análise de obras de Beired e Deutsch, apesar das especificidades locais, os vários países simpatizantes ao ideal da direita radical em expansão não estavam isolados e até mesmo se uniam entre si com vistas a consolidar o movimento considerado um bem comum entre todos. Pode-se afirmar, portanto, que um clima antiliberal, em favor de um Estado autoritário e do corporativismo neste período assolou grande parte dos países na América Latina. No caso argentino, até o momento, as características que fundamentavam os movimentos como o anticomunismo, o antiliberalismo e o antissemitismo tem se sobressaltado perante as dificuldades, tendendo a aproximar os grupos. Ao analisar as páginas do jornal A Offensiva, que circulou por todo território brasileiro no período entre 1934 e 1938, é possível notar que se desenvolveu uma relação amistosa entre os movimentos do Brasil e da Argentina. Uma interessante demonstração do aspecto amistoso da relação entre os países da América Latina pode ser encontrado no nº 46 do segundo ano do jornal integralista A Offensiva referente ao dia 30 de março de 1935. Nele, é apontada uma reportagem do jornal nacionalista argentino Crisol em que fica clara a afetuosa relação política e ideológica dos movimentos contrarrevolucionários entre países como a Argentina e o Brasil: (...) Recebemos ontem em nossa casa a grata visita do chefe da Embaixada Nacionalista Brasileira, Sr. Herberto Dutra, desde alguns dias hospede da Argentina. (...) O fim da visita a “Crisol” foi conhecer o ambiente e as pessoas, bem como trazer as saudações do nacionalismo brasileiro, que surge vigoroso e pujante com características bem definidas anti-liberal, antipolítico, anti-marxista, patriota, integral em tudo e cheio de fé nas verdades eternas. (...) O companheiro que nos visitou conversou longamente com os amigos de “Crisol”, interessando-se por este jornal, que já conhecia e ao qual dirigiu palavras elogiosas e afetuosas (A Offensiva, 30.03.1935, p.4). Nota-se, ainda, como sinal da boa relação entre estes movimentos, informações, relacionadas à questão do antissemitismo nestas nações encontradas, no nº101 do segundo ano deste mesmo jornal, referente ao dia 09 de fevereiro de 1936: No continente sul-americano, não foi somente o Brasil que despertou diante do perigo do judaísmo. A Argentina também está acordando. (...)Deus livre ao Brasil e a Argentina da instalação desse fermento em volta do Iguassú! Argentina e Brasil não têm mais razões para rivalidades. Devem se respeitar e amar reciprocamente como estão fazendo. Um Brasil Integral e uma Argentina Integral serão garantias da libertação da América das garras do judaísmo (A Offensiva, 09.02.1936, p.10). No entanto, é possível perceber também, nas páginas deste periódico, menções a temas delicados entre estes dois países como, por exemplo, a questão bélica. Informações como estas, entre outras, referentes à existência de uma possível aliança política, ou ainda às estadias de importantes nomes do poder argentino no Brasil nesta época, nos levam a crer o quão próximos eram e o quão afetuosa era sua relação. Assim como no jornal brasileiro, os jornais argentinos também demonstraram em suas páginas a forte relação de cordialidade entre seus movimentos nacionalistas. No jornal Crisol, por exemplo, pode-se encontrar diversas reportagens durante outubro de 1937 sobre o movimento integralista brasileiro e suas aspirações. Já no jornal Bandera Argentina, de agosto de 1937, encontra-se reportagens sobre o triunfante nacionalismo do Brasil com a AIB. No dia 26 de agosto do mesmo ano destaco o seguinte trecho: (...) es el movimiento integralista del Brasil (…) una marcha del pueblo hacia todas las alturas y hacia todas las grandezas, una marcha sin interrupciones, ni vacilaciones, ni aturdimientos. Y frente a ese espectáculo soberbio de disciplina en hombres, en voluntades y en ideas, nosotros, argentinos nacionalistas, nos sentimos llenos de admirativo júbilo (Bandera Argentina, 26.08.1937). Há ainda nesse jornal, reportagens intituladas “O espelho brasileiro”, que apontam o integralismo como um exemplo a ser seguido, e ainda, a menção a um Partido Integralista Argentino. Posto isso, nota-se que algumas questões se abrem. Sabemos que as atividades e ações do integralismo brasileiro eram notícia na argentina e o oposto também é verdade, mas até que ponto essas relações contribuíram para o desenvolvimento desses movimentos? O aspecto integral que Plínio Salgado (líder do movimento brasileiro) almejava para a América Latina chegou a ser visto com suspeita? Essas e outras questões serão abordadas no decorrer de minha pesquisa. Por ora, portanto, o que se pode concluir é que essa característica tão fundamental aos movimentos de extrema-direita, o nacionalismo, parece não ter afetado as colaborações entre os demais grupos semelhantes de seus vizinhos. Com base na bibliografia sobre o assunto e nas fontes apresentadas o que se revela é uma constante relação de amizade entre os movimentos corporativistas argentinos e brasileiros ao longo de toda a década de 1930. O que se observa é que as demais caraterísticas do movimento, ideologicamente baseadas no fascismo europeu, como o anticomunismo, o antiesquerdismo, o antiliberalismo, o antissemitismo e o extremismo de direita, sobrepujaram os obstáculos que porventura viessem a surgir no decorrer do desenvolvimento de tais movimentos. E assim, também, ao que parece, o ideal de Plínio salgado sobre o futuro integral da América do Sul não surtiu um efeito negativo sobre o movimento nacionalista da Argentina. Notas ¹ Em 1922 foram criados em Buenos Aires, os Cursos de Cultura Católica que tinham por objetivo preparar com maior eficácia a juventude intelectual católica. Este fato marcaria profundamente o renascimento do catolicismo argentino. REFERÊNCIA A OFFENSIVA. Rio de Janeiro: nº39, 07 fev.1935; nº46, 30 mar.1935; nº101, 09 fev. 1936; nº107, 27 fev.1936. BANDERA ARGENTINA. Buenos Aires: 24 ago. 1937; 26 ago. 1937; 02 out. 1937; 19 out. 1937. BEIRED, José Luis Bendicho. 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