Revista Brasileira de Geografia Física v.09, n.02 (2016) 601-613. Revista Brasileira de Geografia Física ISSN:1984-2295 Homepage: www.ufpe.br/rbgfe Análise da vulnerabilidade natural e do risco de degradação no alto curso do rio BanabuiuCE Renê Pedro de Aquino – Universidade Estadual do Piauí – Teresina – Piauí – Brasil. [email protected] Gustavo Souza Valladares – Universidade Estadual do Piauí – Teresina – Piauí – Brasil. [email protected] Cláudia Maria Sabóia de Aquino – Universidade Estadual do Piauí – Teresina – Piauí – Brasil. [email protected] Clécia Cristina Barbosa Guimarães – Universidade Federal do Ceará – Fortaleza – Ceará – Brasil. [email protected] Ricardo Marques Coelho – Instituto Agronômico de Campinas – São Paulo – Brasil. [email protected] Artigo recebido em 04/03/2016 e aceito em 16/05/2016 RESUMO O presente trabalho teve como objetivos caracterizar o meio físico na região do alto curso do rio Banabuiu, Sertão Central do Ceará, a partir de uma abordagem sistêmica, identificando diferentes unidades de relevo, avaliando seus graus de vulnerabilidade natural, bem como os riscos de degradação frente ao uso das terras. Para tanto, foram elaborados mapas de geologia, declividade, unidades de relevo e de solos. A sobreposição dos referidos mapas a partir do método de multicritério aditivo, permitiu a geração do mapa de vulnerabilidade natural, que cruzado ao mapa de uso e cobertura das terras pelo mesmo método, originou o mapa de risco de degradação. Foram identificadas as seguintes unidades de relevo Interflúvios Estruturais, Cristas Residuais, Superfície Colinosa, Encosta Estrutural Dissecada, Pediplano Dissecado, Vale do rio Banabuiu e os Inselbergues. Quanto à vulnerabilidade natural constatou-se que em 10,10%, 44,84%, 19,52%, 12,59% e 11,82% esta variou de baixa, moderada, alta, muito alta e altíssima respectivamente. A analise do mapa de degradação, resultado da sobreposição do mapa de fragilidade ao de uso e cobertura das terras permitiu inferir que 2,97%, 25,83%, 35,57%, 17,10% e 15,60% das terras da área de estudo apresentaram risco de degradação baixo, moderado, alto, muito alto e altíssimo, respectivamente. Constatam-se mudanças substanciais entre as classes, revelando uma forte pressão antrópica, e o comprometimento dos recursos naturais. Palavras-Chave: Abordagem sistêmica. Vulnerabilidade. Degradação. Analysis of natural vulnerability and risk of degradation in upper course of Banabuiu River – CE ABSTRACT This study aimed to characterize the physical environment in the region of the upper course of the river Banabuiú, Ceará Central Wilderness, from a systemic approach, identifying different landscape units, assessing their degree of natural vulnerability and the risk of degradation by the use of land. Therefore, geology maps were drawn, slope, relief and soil units. The overlap of these maps from multicriteria additive method, allowed the creation of a map of natural vulnerability, which crossed with the map of use and coverage of land by the same method, originated the degradation risk map. The following relief units were identified: structural interfluves, residual ridges, hilly area, dissected structural hill, dissected pediplain, Banabuiú river valley and inselbergs. As the natural vulnerability, is found that for 10.10%, 44.84%, 19.52%, 12.59% and 11.82% this varied from low, moderate, high, very high and very high, respectively. The analysis of the degradation map, resulting from the overlap of the fragility map and the use and coverage of land map allowed to infer that 2.97%, 25.83%, 35.57%, 17.10% and 15.60% of the land of the study area showed low risk of degradation, moderate, high, very high and very high, respectively. Substantial changes are seen between classes, revealing a strong anthropic pressure, and the commitment of natural resources. Keywords: Systemic Approach. Vulnerability. Degradation. Introdução O conhecimento das condições ambientais é fundamental para o entendimento de sua dinâmica, bem como para um manejo mais adequado dos recursos naturais, possibilitando, dessa forma, o uso sustentável de tais recursos. A abordagem integrada permite a análise e compreensão dos processos dinâmicos atuantes na paisagem, bem como as relações entre os elementos e fatores geomorfológicos, climatológicos, pedológicos, hidrológicos e antropológicos no meio considerando para isso a transferência de matéria e energia. 601 Aquino, R. P., Valladares, G. S., Aquino, C. M. S., Guimarães, C. C. B., Coelho, R. M. Revista Brasileira de Geografia Física v.09, n.02 (2016) 601-613. Bertrand (2004) considera a paisagem, entendida como uma porção do espaço, resultante de uma combinação dinâmica, portanto instável, de elementos físicos, biológicos e antrópicos que, reagindo dialeticamente uns sobre os outros, a fazem um conjunto único e indissociável, em perpetua evolução. A dialética tipo-indivíduo é o próprio fundamento do método de pesquisa. Segundo Tricart (1977), a organização ou reorganização do território exige um diagnóstico preliminar que permita o conhecimento das características e das aptidões e, principalmente, das limitações das áreas a serem utilizadas, a fim de escolher corretamente o tipo de ocupação do solo compatível com tais limitações. As atividades agropastoris de baixo nível de tecnificação são marcantes no Sertão Central do Ceará, prevalecendo a agricultura itinerante e pecuária extensiva, atividades altamente dependentes de fatores de ordem natural, como a chuva, por exemplo, em um ambiente marcado pelos baixos e irregulares índices pluviométricos, o que limita a capacidade de suporte do meio para estas atividades. Nesse sentido, torna-se necessário o estudo do meio a partir de uma metodologia integrativa com o fim de atender ao planejamento em termos de manejo e conservação do ambiente. Esta perspectiva metodológica vem sendo largamente empregada nos estudos de vulnerabilidade ambiental, valendo-se do uso das ferramentas geotecnológicas, que permitem integrar dados contidos em vários mapas temáticos por meio de sistemas de informações geográficas possibilitando estimar a vulnerabilidade e os riscos de degradação ambiental. Nessa perspectiva, apontam-se trabalhos importantes, a exemplo de Spörl e Ross (2004); Navas et al., (2005) Telles et al. (2011); Mota e Valladares, (2011); Mota et al., (2012). O presente trabalho teve como objetivo caracterizar o meio físico na região do alto Banabuiu, Sertão Central do Ceará, a partir de uma abordagem sistêmica, identificando diferentes unidades de paisagem e avaliando seus graus de vulnerabilidade natural, bem como os riscos de degradação frente ao uso das terras. Material e métodos A área de estudo localiza-se no Sertão Central do Ceará, inserida na bacia do Rio Banabuiu, região de médio Jaguaribe, com extensão de 149.035 hectares que se distribui de forma descontínua entre as coordenadas UTM 9347590 e 9407637 de latitude e 405338 e 464624 de longitude, zona 24, abrangendo parcialmente os municípios de Pedra Branca, Mombaça, Piquet Carneiro, Quixeramobim e Senador Pompeu. O diagnóstico físico do meio foi obtido a partir da elaboração e sobreposição dos mapas de geologia, compartimentos geomorfológicos, declividade e pedologia a partir do software Arcgis 10. O mapa geológico resultou de compilações das folhas SB.24-V-D-VI – Senador Pompeu (CPRM, 2011), SB.24-V-D-II – Boa Viagem (UFC/CPRM, 2008) e SB.24-V-D-V – Mombaça (CPRM, 1993), na escala de 1:100.000, disponibilizadas pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM). O mapa de unidades geomorfológicas foi resultante do uso da imagem morfométrica, formada por uma composição falsa cor contendo altimetria, declividade e curvatura do terreno, onde os compartimentos de relevo foram demarcados e, em seguida, digitalizados. Foram identificados sete compartimentos distintos: Interflúvios Estruturais, Cristas Residuais, Superfície Colinosa, Encosta Estrutural Dissecada, Pediplano Dissecado, Vale do rio Banabuiu e os Inselbergues. Figura 1- Localização do alto curso do Rio Banabuiu –CE. Fonte: Aquino (2013). Para a elaboração do mapa de declividade fez-se uso do software arcgis 10, tendo por base a fonte de dados da Shuttle Radar Topography Mission (SRTM), disponibilizada pelo INPETOPODATA com resolução espacial de 30 metros. 602 Aquino, R. P., Valladares, G. S., Aquino, C. M. S., Guimarães, C. C. B., Coelho, R. M. Revista Brasileira de Geografia Física v.09, n.02 (2016) 601-613. Para elaboração do mapa de solos, valeu-se de dados iconográficos, com o uso de imagem morfométrica e imagens do RapidEye para identificação de pontos de interesse para as atividades de campo, com 5 m de resolução espacial, onde foram realizadas descrições morfológicas de perfis, conforme Santos et al. (2005) bem como a coleta de perfis completos e complementares para análises físicas e químicas e posterior interpretação, à luz do Sistema Brasileiro de Classificação dos Solos – SiBCS (EMBRAPA, 2006). As unidades de mapeamento de solos estabelecidas neste trabalho seguiram os conceitos e definições até o quarto nível categórico estabelecido pelo SiBCS. Foram reconhecidas 31 unidades de mapeamento, em uma escala de 1:100.000, sendo, praticamente todas as unidades compostas (associações e complexos de solos) o que denota uma notável variabilidade de solos na área de estudo. Crepani (1996) destaca a importância da Geologia, da Geomorfologia e da Pedologia para a definição das unidades de paisagem e para os seus graus de vulnerabilidade. Sendo assim, a Geologia oferece informações importantes sobre o grau de coesão das rochas e informações a respeito da história da evolução do seu ambiente tectônico. Por outro lado, a Geomorfologia, fornece subsídios importantes sobre a estabilidade das unidades de paisagem, a partir da análise de parâmetros como altos valores de amplitude de relevo, declividade e grau de dissecação do relevo. O conhecimento desta e de outras informações geomorfológicas permitem inferir nas diferentes unidades de paisagem identificadas a atuação de processos morfogenéticos ou pedogenéticos. A pedologia, por sua vez, fornece o indicador básico da posição ocupada pela unidade dentro da escala da ecodinâmica: a maturidade dos solos. Para a avaliação da vulnerabilidade natural das terras do Alto Banabuiu foram sobrepostos os mapas de geologia, declividade, geomorfologia e pedologia, a partir do método de multicritério aditivo utilizando um algoritmo do tipo média ponderada, como foi definido por Xavier da Silva (2000), aplicado para a definição de posições territoriais ao longo de um eixo integrador das unidades territoriais, conforme demonstrado pela equação a seguir: n Aij = Σ (Pk. Nk) (Eq. 1) k=1 Em que: Aij = qualquer célula da matriz (alternativa); n = número de parâmetros envolvidos; P = peso atribuído ao parâmetro transposto o percentual para a escala de 0 a 1; N = nota na escala de 0 a 10, atribuída à categoria encontrada na célula. Para obtenção do mapa de risco de degradação, o mapa de vulnerabilidade natural das terras foi sobreposto ao mapa de uso e cobertura das terras, elaborado por Guimarães (2013) utilizando o mesmo algoritmo identificado anteriormente. O mapa de uso e cobertura das terras foi elaborado com base em imagens do RapidEye com 5m de resolução espacial. Ressaltase que para gerar os mapas de vulnerabilidade natural e de risco de degradação, foram atribuídos pesos e notas a cada um dos parâmetros analisados por uma equipe especializada em estudos integrados do meio físico. Resultados e discussão Do ponto de vista geológico, a área de estudo insere-se no domínio das áreas cratônicas brasileiras, que se caracterizam, segundo Ross (2000), por uma grande complexidade litológica, prevalecendo as rochas metamórficas muito antigas (Pré-Cambriano Médio a Inferior, com 2 a 4,5 bilhões de anos). Também ocorrem rochas intrusivas antigas (Pré-Cambriano Médio a Superior, com 1 a 2 bilhões de anos e resíduos de rochas sedimentares datadas do Pré-Cambriano Superior, conforme demonstrado na Figura 2. O fator declividade relaciona-se com a velocidade do escoamento superficial, com a infiltração e consequentemente com a susceptibilidade para erosão dos solos. A Figura 3 apresenta o mapa com as classes de declividade encontradas na área de estudo. A análise do mapa de declividade permite sintetizar as características topográficas da área de estudo em seis classes de declividade, conforme demonstrado na Tabela 1. Como afirmado anteriormente o mapa de unidades geomorfológicas do Alto Banabuiu-CE foi obtido a partir da utilização da imagem de morfometria, formada por uma composição falsa cor contendo altimetria, declividade e curvatura do terreno, onde os compartimentos de relevo foram demarcados, levando-se em consideração a tonalidade e a maior ou menor proximidade das curvas de nível, que estavam sobrepostas ao raster da morfometria. Em seguida realizou-se a digitalização dos polígonos em formato vetorial representando as distintas unidades do relevo. Os compartimentos identificados foram os seguintes: Interflúvios Estruturais, Cristas Residuais, Superfície Colinosa, Encosta Estrutural 603 Aquino, R. P., Valladares, G. S., Aquino, C. M. S., Guimarães, C. C. B., Coelho, R. M. Revista Brasileira de Geografia Física v.09, n.02 (2016) 601-613. Dissecada, Pediplano Dissecado, Vale do rio Banabuiu e os Inselbergues, conforme Figura 4. Figura 02 – Mapa geológico do alto Banabuiu-CE. Fonte: CPRM, 2003. Figura 3 - Mapa Declividade do Alto Banabuiu-CE. Fonte: Aquino 2013, dados TOPODATA-INPE 604 Aquino, R. P., Valladares, G. S., Aquino, C. M. S., Guimarães, C. C. B., Coelho, R. M. Revista Brasileira de Geografia Física v.09, n.02 (2016) 601-613. Figura 4: Compartimentos geomorfológicos do Alto Banabuiu-CE. Fonte: Aquino (2013) Figura 5: Mapa de solos com o principal componente da unidade de mapeamento do alto Banabuiu. Fonte: Valladares, Coelho e Aquino (2013) 605 Aquino, R. P., Valladares, G. S., Aquino, C. M. S., Guimarães, C. C. B., Coelho, R. M. Revista Brasileira de Geografia Física v.09, n.02 (2016) 601-613. Tabela 1: Classes de declividade e caracterização do relevo da área de estudo. Classes de Declividade (%) Tipo de relevo Área (ha) Representatividade % 0a3 Plano 8.455 5,72 3a8 Suave ondulado 82.067 55,55 8 a 13 Moderadamente ondulado 26.676 18,06 13 a 20 Ondulado 15.839 10,72 20 a 45 Forte ondulado 14.268 9,65 >45 Montanhoso e escarpado 432 0,30 Total 147.737 Fonte: Aquino, 2013 O mapa de solos, em nível de reconhecimento de alta intensidade, em escala 1:100.000, possibilitou o reconhecimento de 31 unidades de mapeamento, sendo praticamente todas as unidades compostas (associações e complexos de solos) o que denota uma notável variabilidade de solos na área de estudo. Esta variabilidade justifica-se em função da diversidade litológica e de material de origem, bem como as influências do fator geomorfológico, considerando as distintas unidades especializadas na Figura 4, bem como, os diferentes níveis de semiaridez climática da área. A Figura 5 apresenta o mapa de solos da área de estudo: O mapa de vulnerabilidade natural do Alto Banabuiu foi gerado a partir de um método 100 multicritério aditivo, utilizando um algoritmo do tipo média ponderada, conforme demonstrado anteriormente (Equação 1), considerando pesos iguais para todos os temas. O emprego desta metodologia permitiu a identificação de cinco classes de vulnerabilidade natural: baixa, moderada, alta, muito alta e altíssima, conforme demonstrado na Figura 6. A Tabela 2 sintetiza os resultados obtidos no mapa de vulnerabilidade natural da área de estudo. Considerando a vulnerabilidade natural constatou-se que em 10,10%, 44,84%, 19,52%, 12,59% e 11,82% esta variou de baixa, moderada, alta, muito alta e altíssima respectivamente. Tabela 2: Vulnerabilidade natural do alto Banabuiu - CE Grau de Área ocupada (ha) vulnerabilidade natural Baixa 15.054,92 Moderada 66.879,08 Alta 29.101,56 Muito alta 18.752,96 Altíssima 17.614,80 Fora de análise 1.644,72 TOTAL 149.048,04 Fonte: Org. Os autores. Representatividade (%) 10,10 44,87 19,52 12,59 11,82 1,10 100,00 606 Aquino, R. P., Valladares, G. S., Aquino, C. M. S., Guimarães, C. C. B., Coelho, R. M. Revista Brasileira de Geografia Física v.09, n.02 (2016) 601-613. Figura 6 – Mapa de vulnerabilidade natural do Alto Banabuiu – CE. Fonte: Aquino, 2013 De maneira geral, a Encosta Estrutural Dissecada, os Interflúvios Estruturais e os Inselbergues, foram os compartimentos geomorfológicos que apresentaram maior vulnerabilidade natural. Isto se justifica em virtude de o relevo apresentar declividades superiores a 20%. Aliado a esse fator, a cobertura pedológica apresenta um amplo predomínio de solos pouco desenvolvidos, ou seja, com ausência de horizonte B (neossolo litólico) ou com horizonte B incipiente (cambissolo). A classe de vulnerabilidade muito alta, que representa 12,59%da área de estudo, predomina nas Cristas Residuais, onde prevalecem declividades entre 13 e 20%, o que caracteriza um relevo ondulado. Nesse compartimento, a cobertura pedológica é caracterizada pela Associação de Argissolo Vermelho eutrófico, típico, abrúptico e nitossólico, A moderado e chernozêmico, textura média/argilosa e média e por Argissolo Vermelho-Amarelo e Vermelho Eutrófico não abrúptico e abrúptico, A moderado, textura média/argilosa. Os argissolos, de maneira geral, são “solos constituído por material mineral, apresentando horizonte B textural com argila de atividade baixa imediatamente abaixo do horizonte A ou E” (Embrapa, 2013). Isso significa que são solos bem desenvolvidos, podendo apresentar boa fertilidade natural, a exemplo dos eutróficos, dominantes nas cristas residuais. No entanto, o fator declividade pode ser considerado como limitante para a exploração dos mesmos, o que requer um manejo adequado sob pena de intensificação dos processos erosivos. 607 Aquino, R. P., Valladares, G. S., Aquino, C. M. S., Guimarães, C. C. B., Coelho, R. M. Revista Brasileira de Geografia Física v.09, n.02 (2016) 601-613. No Vale do rio Banabuiu, caracterizado pelo controle estrutural sobre a drenagem, verificam-se classes de declividade variando de 3 a 13%, caracterizando relevo de suave ondulado a moderadamente ondulado. O domínio de solos pouco desenvolvidos, a exemplo dos Neossolos Litólicos, Neossolos Regolíticos e Neossolos Flúvicos, justificam a ocorrência de classes de vulnerabilidade alta e muito alta, apesar de possuir classes de declividade inferiores às das cristas residuais, onde predominam os Argissolos. Na Superfície Colinosa, que tem seu relevo marcado pela presença de colinas amplas com declividades variando de 3 a 13%, podendo ser caracterizado como suave ondulado a moderadamente ondulado. A cobertura pedológica, caracterizada pelo domínio dos chernossolos (Chernossolo Argilúvico Órtico típico, léptico e vertissólico, textura média/argilosa – Chernossolo Háplico Órtico léptico e vertissólico, textura média) justifica o predomínio da classe de moderada vulnerabilidade ambiental desse compartimento. No Pediplano Dissecado, maior compartimento geomorfológico e que apresenta a maior variabilidade de solos, a classe de alta vulnerabilidade natural está condicionada principalmente ao fator pedológico, pois nesse compartimento predominam baixas declividades, prevalecendo o relevo plano a suave ondulado. Nesse sentido, a presença de solos com mudança textural abrupta como os planossolos e luvissolos, justificam a maior vulnerabilidade, devido à rápida saturação do horizonte A em função da baixa permeabilidade do horizonte B, favorecendo, portanto, o arraste de materiais do horizonte A. A classe baixa vulnerabilidade natural, presentes no Pediplano Dissecado, está relacionada à presença de Argissolo Vermelho Eutrófico típico e abrúptico, A moderado, textura média e média/argilosa. Por serem solos bem desenvolvidos, com argila de atividade baixa e com gradiente textural muitas vezes menor que dos Luvissolos e Planossolos, estes solos permitem uma maior infiltração de água, sendo, portanto, melhor drenados que os anteriores. A classe de moderada vulnerabilidade natural ocorre principalmente nas unidades de mapeamento de solos onde os argissolos aparecem como primeiro componente, associada aos pediplanos dissecados. Onde predominam chernossolos a feição do relevo predominante é colinosa. A partir da sobreposição do mapa de uso e cobertura das terras, elaborado por Guimarães (2013), conforme Figura 7, ao mapa de vulnerabilidade natural, Figura 6, obteve-se o mapa de risco de degradação das terras do alto Banabuiu, que apresenta cinco classes de risco de degradação, demonstrado na Figura 8. O cruzamento dos dados de vulnerabilidade natural com o uso e cobertura das terras permitem inferir que a utilização predatória dos recursos naturais na região, caracterizada pela pecuária extensiva e agricultura itinerante, potencializa substancialmente o aumento dos riscos de degradação do ambiente, tendo em vista que: A classe de baixa vulnerabilidade natural, considerada de pequena expressão espacial, sofre uma redução de 70,59%, passando a representar apenas 2,97% da área estudada. A classe de moderada vulnerabilidade natural, que representava 44,87% da área de estudo, sofre redução de 42,43%, passando a representar apenas 25,83% como de moderado risco de degradação antrópica. A classe de alta vulnerabilidade natural apresenta crescimento de 82,22%, passando a representar 35,57% , como área de alto risco de degradação antrópica, tendo em vista que áreas anteriormente consideradas como de baixa e moderada vulnerabilidade natural foram incorporadas. A classe de vulnerabilidade natural muito alta, que representava 12,59% da área de estudo, passa a representar 17,10% como área de risco muito alto de degradação antrópica, o que representa um incremento de 35,82%. A classe de altíssima vulnerabilidade natural, que representava 11,82% da área de estudo, passa a ocupar 15,60% como área de altíssimo risco de degradação antrópica. Os resultados obtidos a partir da comparação entre a vulnerabilidade natural do ambiente e os riscos de degradação antrópica indicam claramente uma pressão acima da capacidade de suporte do meio natural para a área de estudo, o que leva inevitavelmente à degradação ambiental, podendo ser, inclusive, um dos indicadores de possíveis processos de desertificação na área. 608 Aquino, R. P., Valladares, G. S., Aquino, C. M. S., Guimarães, C. C. B., Coelho, R. M. Revista Brasileira de Geografia Física v.09, n.02 (2016) 601-613. Figura 7 : Mapa de uso e cobertura das terras do alto Banabuiu-CE. Fonte: Guimarães, 2013 609 Aquino, R. P., Valladares, G. S., Aquino, C. M. S., Guimarães, C. C. B., Coelho, R. M. Revista Brasileira de Geografia Física v.09, n.02 (2016) 601-613. Figura 8: Mapa de risco de degradação das terras do alto Banabuiu – CE. Fonte: Aquino, 2013. 610 Aquino, R. P., Valladares, G. S., Aquino, C. M. S., Guimarães, C. C. B., Coelho, R. M. Revista Brasileira de Geografia Física v.09, n.02 (2016) 601-613. A Tabela 3 apresenta os dados referentes ao risco de degradação da área de estudo. Tabela 3: Risco de degradação das terras do alto Banabuiu-CE. Grau de risco à Área ocupada (há) Representatividade degradação (%) Baixo 4.424,96 2,97 Moderado 38.498,32 25,83 Alto 50.033,48 35,57 Muito alto 25.490,68 17,10 Altíssimo 23.257,08 15,60 Fora de análise 7.326,16 4,91 TOTAL 149.035,68 100,00 Fonte: Org. Os autores Conclusões Os resultados permitem concluir: Foram identificadas as seguintes unidades de relevo Interflúvios Estruturais, Cristas Residuais, Superfície Colinosa, Encosta Estrutural Dissecada, Pediplano Dissecado, Vale do rio Banabuiu e os Inselbergues. As unidades de relevo identificadas em face de suas características geológica, geomorfológicas e pedológicas apresentam vulnerabilidades distintas, constatação que indica a necessidade de planejamento para fins de ordenamento territorial. Considerando a vulnerabilidade natural constatou-se que em 10,10%, 44,84%, 19,52%, 12,59% e 11,82% esta variou de baixa, moderada, alta, muito alta e altíssima respectivamente. A Encosta Estrutural Dissecada, os Interflúvios estruturais e os inselbergues, foram os compartimentos geomorfológicos que apresentaram maior vulnerabilidade natural. A classe de vulnerabilidade muito alta, que representa 12,59%da área de estudo, predomina nas Cristas Residuais. As classes baixa e moderada vulnerabilidade natural, presentes no Pediplano Dissecado, somadas totalizam 54,97% da área de estudo. Considerando que em 45,03% da área com vulnerabilidade natural variou de alta a altíssima, em um ambiente de clima semiárido, com chuvas torrenciais e vegetação de caatinga, pode-se afirmar tratar-se de um ambiente instável, sobretudo nas áreas de relevo mais dissecado a exemplo das áreas de Encosta Estrutural Dissecada, dos Interflúvios Estruturais e dos Inselbergs. A análise da degradação, resultado da sobreposição do mapa de fragilidade ao de uso e cobertura das terras permitiu inferir que 2,97%, 25,83%, 35,57%, 17,10% e 15,60% das terras da área de estudo apresentaram risco de degradação baixo, moderado, alto, muito alto e altíssimo, respectivamente. Constatam-se mudanças substanciais entre as classes, revelando uma forte pressão antrópica, e o comprometimento dos recursos naturais. As classes de alta, muito alta e altíssima degradação considerando a ação antrópica perfazem 68,27% evidenciando condição de instabilidade, podendo coadunar em desertificação. É fundamental ações relativas à extensão rural a serem proporcionadas pelos órgãos públicos no sentido de orientar formas de uso e ocupação racional das terras para fins de otimização e uso racional dos recursos naturais na área de estudo. Referências Amaral, R., Ross, J.L.S. 2009. As unidades Ecodinâmicas na análise da fragilidade ambiental do Parque estadual do Morro do Diabo e entorno, Teodoro Sampaio/SP. GEOUSP – Espaço e Tempo 26, 59-78. Aquino, C.M.S. 2010. Estudo da degradação/desertificação no Núcleo de São Raimundo Nonato-Piauí. São Cristóvão, 2010. Tese (Doutorado). Aracaju, Núcleo de PósGraduação em Geografia, Universidade Federal de Sergipe). Aquino, C.M.S, Oliveira, J.G.B. 2012. Estudo da Dinâmica do Índice de Vegetação por Diferença Normalizada (NDVI) no núcleo de São Raimundo Nonato-PI. 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