Como se iu no tópico anterior, o autor é o criador da o ra literária

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TEORIA DA LITERATURA I
AULA 02: CONOTAÇÃO, RECEPÇÃO, AUTORIA
TÓPICO 03: O AUTOR E A INTENÇÃO
Como se viu no tópico anterior, o autor é o criador da obra literária. Na
moderna concepção do fato literário, porém, não se atribui ao escritor o
estatuto de senhor da obra, como se fosse um deus onipotente que cria seres
e faz deles o que quer.
A interferência da vida do autor no texto literário hoje é bastante
relativizada. Sua biografia, seu estilo de vida, suas crenças são elementos de
importância secundária na análise de uma obra. A compreensão do texto não
se subordina mais nem à vida do escritor nem a sua intenção, ao seu “querer
dizer”. Pode-se até admitir, como dizia Marcel Proust, importante escritor
francês do final do século XIX e início do XX, que haja uma intenção
existente no eu literário do escritor (um “outro eu”, um eu fictício), e não no
eu físico.
A obra literária, portanto, supera a intenção do autor — o texto
sobrevive sem ela. Mesmo admitindo-se a intenção do “outro eu”, a
significação de um texto nunca se esgota nesse propósito, o sentido do texto
não é determinado necessariamente pelo “querer dizer” de quem escreveu.
O abalo na autoridade do autor conforme a crítica literária atual derruba
um outro mito do passado: o “primado das primeiras recepções”. Como a
obra está cronologicamente mais próxima do autor, consideravam-se as
primeiras leituras como as mais “corretas”, por serem circunvizinhas do
autor e, portanto, de sua intenção ou de seu desejo. Atualmente, não se
considera mais a primazia da primeira recepção sobre as demais. Ao
contrário, as abordagens subsequentes tendem a enriquecer a obra, ou a
diversificar a sua compreensão. Compreender uma obra fora de sua época de
publicação significa compreendê-la diferente, e não pior ou melhor.
Para um melhor entendimento da autonomia do leitor perante a obra de
arte literária, leia o texto “A morte do autor (Visite a aula online para realizar
download deste arquivo.)”, de Roland Barthes.
Porém, há que se entender que a obra literária não paira absoluta sobre
um tempo e um espaço e sua origem é, muitas vezes, ponto de
enriquecimento para a interpretação, apesar de não ser obrigatória.
Alguns autores, como o brasileiro José de Alencar, ao buscar formar
uma identidade nacional na literatura brasileira, traçou um plano literário
bem delineado e suas obras apresentam uma espécie de guia de leitura que
vem a ser motivo de crítica por alguns pensadores contemporâneos. No
entanto, para um maior enriquecimento do trabalho do autor, podemos
entender que a interpretação de suas obras podem ser feitas de duas
maneiras:
1.excluindo-se a intencionalidade do autor.
2.considerando o seu projeto de nacionalização da literatura, em um
contexto histórico bem definido.
ATIVIDADE DE PORTFÓLIO
A QUESTÃO DA INTENCIONALIDADE
A controvertida questão da intencionalidade do autor na obra
literária é discutida no texto “Intenção e recepção em Iracema, de José
de Alencar”, de Cid Ottoni Bylaardt, publicado na Revista de Literatura
SCRIPTA, da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, em
junho de 2008.
Nesse ensaio, o autor trabalha a ideia de que o sentido de um texto
supera sempre as intenções de seu autor, porque os intérpretes e
leitores futuros terão uma carga de acumulação histórica adicional em
relação a ele. Isso não significa que os intérpretes têm uma
compreensão melhor, em que pese sua superioridade histórica em
relação ao autor, mas uma compreensão diferente. É sob esse ponto de
vista que o autor investiga as relações entre o texto de Iracema, de José
de Alencar, as intenções de seu autor, e a recepção da obra no decorrer
do tempo e, principalmente, na era contemporânea. Alencar teve para
com seu texto cuidados especiais, tentando não permitir que ele
errasse pelo mundo ao sabor de variadas interpretações.
O que o ensaísta chama “cuidados especiais” são os textos
adicionais que normalmente acompanham o romance. São eles: o
“Prólogo da primeira edição”, o “Argumento histórico”, a “Carta ao Dr.
Jaguaribe”, publicada como posfácio à primeira edição, o “Pós-escrito
à segunda edição” e as 116 notas que acompanham os capítulos num
montante de textos que seguramente equivalem ao tamanho do
próprio romance, quase como se cada palavra da narrativa tivesse um
correspondente metalinguístico a explicar-lhe a existência. O que o
ensaio pretende demonstrar é que, apesar de tantos cuidados e
explicações, o autor não conseguiu evitar que o tempo trouxesse novas
visões e interpretações à obra.
Antes de fazer a atividade, é necessário que você leia o romance
Iracema, de José de Alencar, se ainda não o leu. Ele pode ser
encontrado em qualquer biblioteca, ou na internet, no site da
Biblioteca Nacional, que indicamos por apresentar o texto completo, e
com todas as notas e comentários do autor:
http://objdigital.bn.br/Acervo_Digital/livros_eletronicos/iracema.pdf
[1] (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.)
Após a leitura da obra e do texto de Roland Barthes, “A morte do
autor”, reflita e elabore um texto de aproximadamente 30 linhas,
comentando as duas formas de abordagem de Iracema pelo leitor
contemporâneo.
1. O papel da teoria da literatura;
2. A atitude que o autor de Gargântua espera dos leitores de seu livro;
3. Como as circunstâncias de produção podem ser responsáveis pela
recepção da obra em “Pierre Ménard, autor do Quixote”;
4. Como Proust encara a questão de intenção na obra literária;
5. Como se colocam as relações entre texto e contexto na obra;
6. Qual a função do “querer dizer” do autor;
7. A concepção de hermenêutica de Gadamer;
8. A diferença entre “compreender diferente” e “trair” o texto;
9. O conceito de “história efeitual”;
10. Os “cuidados especiais” de José de Alencar com seu texto;
11. O conteúdo do “argumento histórico” de Iracema;
12. A preocupação de José de Alencar com a linguagem;
13. A língua “brasileira” de José de Alencar;
14. Alencar e a questão da verossimilhança;
15. As medidas de proteção ao “filho de minha alma”;
16. O primado da primeira recepção;
17. Mesmo com tantos cuidados, pode haver outras leituras de
Iracema?
18. A irresistível “visão européia” alencariana;
19. As passagens de Iracema que denunciam o eurocentrismo;
20. A concepção de Sílvio Romero sobre os índios e o Indianismo;
21. As relações entre o que o texto diz e o que o autor quis dizer.
Depois, baixe o texto “Intenção e recepção em Iracema", de José
de Alencar, clicando aqui (Visite a aula online para realizar download
deste arquivo.).
REFERÊNCIAS
ALENCAR, José de. Iracema. Lenda do Ceará. Fortaleza: Edições
UFC, 1985.
BARTHES, Roland. O rumor da língua. São Paulo: Martins Fontes,
2004.
FONTES DAS IMAGENS
1. http://objdigital.bn.br/Acervo_Digital/livros_eletronicos/iracema.pdf
Responsável: Prof. Marcelo Peloggio
Universidade Federal do Ceará - Instituto UFC Virtual
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