O declínio do Norte Ocidental José Eustáquio Diniz Alves1 Os países que compõem o G-7, Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá, representavam mais de 50% do Produto Interno Bruto (PIB) do mundo até a década de 1990. A ocidentalização do mundo foi uma realidade incontestável nos últimos dois ou três séculos. Os países do Norte Ocidental (banhados pelo oceano Atlântico) adquiriram um papel de destaque no mundo, desde a Revolução Industrial, que teve início por volta de 1750. Na verdade, a Ocidentalização é quase um sinônimo de Europeização, pois Estados Unidos e Canadá possuem cultura européia. Adicionalmente, o Japão se tornou o primeiro país não-ocidental a atingir níveis elevados de desenvolvimento, transformando-se em uma potência econômica mundial. Estes sete países dominaram a economia, a política e a cultura mundial na segunda metade do século XX. Contudo, como mostra o gráfico 1, o G-7 (países do Norte e predominantemente Ocidentais) vêm perdendo participação relativa no PIB mundial desde o início do século XXI. Em 1999, o G-7 possuía uma fatia de 49,5% do produto global, caindo para 41%, em 2009 e devendo chegar a 36% em 2015. Todos os sete países perderam participação relativa, embora tenham apresentado crescimento absoluto. Estes países deixaram de ser a locomotiva da economia internacional e, em termos populacionais e econômicos, crescem em ritmo menor do que o restante do mundo. Gráfico 1: Participação nacional no PIB mundial (em ppp) do “primeiro G-7”: Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá, 1992-2015 55 50 45 40 35 % 30 25 20 15 10 5 Canadá Itália França Reino Unido Alemanha Japão 2015 2014 2013 2012 2011 2010 2009 2008 2007 2006 2005 2004 2003 2002 2001 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 1992 0 EUA Fonte: FMI, http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2010/01/weodata/index.aspx Dados de 2010 a 2015 = projeção do FMI. PPP = poder de paridade de compra. Visitado em 16 de julho de 2010. 1 Professor titular da Escola Nacional de Ciências Estatísticas - ENCE/IBGE. Tel: (21) 2142 4689. E-mail: ([email protected] ). Publicado em APARTE (http://www.ie.ufrj.br/aparte/) – 14/08/2010. 1 Em contraposição, o “outro G-7”, países que não são considerados do Norte Ocidental (que completam as 14 maiores economias do mundo, com a exceção da Coréia do Sul), forma um bloco de países que têm apresentado maior dinamismo econômico e vêm aumentando a participação relativa no PIB global. O gráfico 2 mostra que China, Índia, Rússia, Brasil, México, Indonésia e Turquia formam um bloco de países que tinham entre 19 e 21% do PIB global, entre 1992 e 1999. Contudo, a partir do ano 2000 passaram a ganhar posições, chegando a 27% em 2008, aumentando para 28,2% em 2009, mesmo com toda a crise mundial, e devendo alcançar 33,6% do PIB global em 2015. Ou seja, neste ritmo, antes do final da segunda década, o “segundo G-7” (dos países com menor renda per capita) deve superar o “primeiro G-7” (dos países com maior renda per capita e maior Índice de Desenvolvimento Humano - IDH). Gráfico 2: Participação nacional no PIB mundial (em ppp) do “segundo G-7”: China, Índia, Rússia, Brasil, México, Indonésia e Turquia, 1992-2015 35 30 25 % 20 15 10 5 China Índia Rússia Brasil México Indonésia 2015 2014 2013 2012 2011 2010 2009 2008 2007 2006 2005 2004 2003 2002 2001 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 1992 0 Turquia Fonte: FMI, http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2010/01/weodata/index.aspx Dados de 2010 a 2015 = projeção do FMI. PPP = poder de paridade de compra. Visitado em 16 de julho de 2010. Os dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) mostram que o mundo está assistindo a um rápido deslocamento da produção de bens e serviços dos países do Norte/Ocidental para os países do Norte/Leste e do Sul. O mapa da riqueza mundial está em processo de modificação e, pela primeira vez em muitos anos, está havendo uma alteração na distribuição internacional da renda, com os países de menor IDH crescendo mais rápido que os países ricos e de desenvolvimento avançado. Muito tem se falado dos BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China) e de outros países emergentes como Indonésia, Turquia, África do Sul, e outros países não pertencentes à Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). De fato, além do Leste Asiático, a África e 2 a América Latina têm apresentado alto crescimento econômico na última década e conseguiram recuperar de maneira mais rápida da crise econômica mundial de 2009. As perspectivas para a África e a América Latina na próxima década nunca foram tão boas. Contudo, como mostra o gráfico 3, o destaque do crescimento mundial pertence a dois países: China e Índia. Enquanto os países ricos têm perdido participação relativa e enquanto Rússia, Brasil, Indonésia, México e Turquia têm mantido uma participação aproximadamente constante no PIB mundial, os dois países mais populosos do mundo conquistam um percentual cada vez maior no bolo da riqueza mundial. Ou seja, os países emergentes são em número bem maior do que simplesmente os 4 BRICs, mas, entre todos os emergentes, há de se destacar o desempenho bem acima da média de Índia e China, especialmente deste último país. Assim, quando analisamos o famoso acrônimo BRIC, devemos ter claro que o BR (Brasil e Rússia) está em um patamar de dinamismo econômico muito abaixo do IC (Índia e China). Gráfico 3: Participação nacional no PIB global (em ppp) das 14 maiores economias do mundo, 1992-2015 20 25 20 15 15 % % 10 10 5 5 Itália França Reino Unido Alemanha Japão EUA China Índia Rússia Brasil México Indonésia 2015 2014 2013 2012 2011 2010 2009 2008 2007 2006 2005 2004 2003 2002 2001 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 2015 2014 2013 2012 2011 2010 2009 2008 2007 2006 2005 2004 2003 2002 2001 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 1992 Canadá 1992 0 0 Turquia Fonte: FMI, http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2010/01/weodata/index.aspx Dados de 2010 a 2015 = projeção do FMI. PPP = poder de paridade de compra Visitado em 16 de julho de 2010. Esta nova realidade internacional fica ainda mais evidente, agora em meados de 2010, quando os países desenvolvidos discutem a possibilidade de um “duplo mergulho” (double dip recession), com os Estados Unidos estando sem meios de recuperar suas taxas históricas de crescimento e a Europa atolada na “euroesclerose”. Não é de se estranhar que os Estados Unidos e a Europa estejam preocupados com a evaporação do respeito à liderança do G-7 e ao modelo de democracia e cultura Ocidental. Crescem as preocupações e os estudos sobre as reconfigurações geográficas da economia internacional, com a desocidentalização do mundo e com o modelo, cada vez mais influente, chamado “Consenso de Beijing”. 3