Figueiras, vespas e o sexo à distância

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Figueiras, vespas e o sexo à distância
Plantas e insetos selaram um pacto. Os insetos voam de flor em flor transportando o pólen necessário para
fertilizar os óvulos. Em troca coletam o néctar que necessitam para se alimentar. Para grande parte das plantas e
insetos esta é uma relação promíscua onde diversas espécies de insetos polinizam uma mesma espécie de vegetal.
Mas a fidelidade impera na relação entre a figueira africana Ficus sycomorus e a vespa Certosolen arabicus. A
vespa é o único inseto capaz de polinizar a figueira que por sua vez é a única fonte de alimento da vespa. Seus
destinos estão intimamente interligados. A vespa nasce no momento em que a figueira produz suas flores do sexo
masculino, ricas em pólen e pobres em néctar. Como só vive dois dias, e a figueira na qual nasceu só vai produzir
flores femininas semanas depois, só resta à vespa procurar alimento nas figueiras da vizinhança. Ao penetrar nas
flores femininas a vespa deposita o pólen, sorve o néctar e coloca seus ovos. Novas vespas eclodem na próxima
floração e o ciclo se repete.
Com o desmatamento a distancia entre as figueiras vem aumentando e os cientistas temiam que de um momento
para outro a distancia entre as árvores se tornaria maior que a autonomia de vôo das vespas. Neste momento
vespas e figueiras desapareceriam. Era preciso descobrir a autonomia de vôo das vespas. O truque foi estudar as
figueiras ao longo do rio Ugab, no deserto da Namíbia. Como o rio corta o deserto e as figueiras só se
desenvolvem nas margens úmidas, um grupo de cientistas percorreu os últimos 253 km do rio e identificou todas
as figueiras que cresciam nas margens do Ugab. A localização de cada uma das 79 figueiras foi determinada com
um sistema de GPS. As distancias entre as árvores variou de alguns metros a 84 km. Folhas de cada uma das
árvores foram coletadas e seu DNA extraído. De cada uma das árvores também foram coletadas dezenas de
sementes, que após germinarem no laboratório, tiveram seu DNA purificado. De posse das amostras de DNA os
cientistas utilizaram um teste de paternidade (semelhante aos testes de paternidade usados para identificar o pai de
uma criança) para descobrir a árvore “pai” (aquela da qual havia produzido o pólen que havia fecundado o óvulo)
de cada semente. Assim, por exemplo, foi descoberto que uma semente produzida pela árvore #1 tinha como pai a
árvore #3. Como os dados do GPS permitem calcular a distancia entre a árvore #1 e a árvore #3 foi possível
deduzir a rota percorrida pelas vespas carregando o pólen das flores macho da árvore #3 para as flores fêmeas da
árvore #1. Este tipo de análise foi repetido para cada uma das sementes coletadas. Os resultados demonstram que
a menor distância entre uma árvore doadora de pólen e uma árvore produtora de semente foi de 14,2 km, que a
maior foi de 160 km e que a distancia média voada pelas vespas carregando pólen foi de 88,6 km.
Este resultado é surpreendente uma vez que estas pequenas vespas só vivem dois dias e voam somente durante a
noite. O que se acredita é que as vespas são carregadas pelo vento e, ao sentirem o cheiro do néctar, voam
ativamente em direção às figueiras em flor. Este resultado demonstra que utilizando sua colaboração com as
vespas, as figueiras são capazes de praticar o sexo mesmo quando o parceiro esta localizado a mais de 150 km de
distância. O time figueira/vespa, com seus milhões de anos de experiência, é sem dúvida o campeão na pratica do
sexo a distancia.
Mais informações: Wind-borne insects mediate directional pollen transfer between desert fig trees 160 kilometers
apart. Proc. Nat. Acad. Sci. USA vol.106 pag. 20.342 2009
Fernando Reinach ([email protected])
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