Texto complementar África: periferia abandonada? Cristina Pessanha Mary GEOGRAFIA 1 Geografia Assunto: Desenvolvimento africano África: periferia abandonada? Hoje as causas de mortalidade no mítico Canadá são doenças não transmissíveis: câncer, diabetes, falhas cardiovasculares. Na Mãe-África globalizada elas são velhas conhecidas: varíola, crupe, tifo, difteria. Por essas e por outras é que, em minha métrica de civilização, Américas, África e Ásia permanecem barradas no convescote global (SANTOS, 1996). No contexto de uma Nova Ordem Mundial os olhares sobre a África estão claramente divididos: ou vemos a descrença quanto ao seu futuro – o termo “africanização” foi cunhado para exprimir o forte sentido da exclusão que perpassa a imagem do continente – ou notamos a convicção na capacidade sul-africana de agir como locomotiva de um pretenso desenvolvimento do continente, como meio de “religar” a África ao sistema internacional (ZORGBIBE, 1996). Sob outros ângulos encontramos divisões acerca do papel da África no momento atual: enquanto a ideia de um desenvolvimento da África do Sul seduz o Ocidente, o norte vem sendo, cada vez mais, associado ao “perigo muçulmano”. O islamismo parece polarizar o norte africano, não sendo poucos os indícios dessa ligação. As manifestações populares no interior de países dessa região apoiando as ações do Iraque contra a coligação ocidental durante a Guerra do Golfo; a existência de grupos ligados ao Irã, projetando a criação de um Estado islâmico no interior argelino são alguns dos exemplos. Em contrapartida, detectamos uma Europa preocupada em “proteger-se” do assédio do Terceiro Mundo. O empenho europeu em estancar o fluxo de imigrantes toma sua forma mais literal nos planos de construção de um muro em torno de Ceuta, enclave espanhol no extremo norte de Marrocos, considerado o principal ponto de passagem dos africanos que buscam clandestinamente integrarem-se à União Europeia. [...] Já é fato o grande interesse dos países emergentes asiáticos na África, mormente na compra de suas matérias-primas, principalmente diamantes, ouro, chá e algodão. Segundo a mesma fonte, mesmo com os preços em baixa, a amplitude da demanda asiática permitiria bons negócios aos africanos. Mesmo levando em conta que [...] exista uma proposta de manter a África como periferia exportadora de matérias-primas, não descartamos a possibilidade de que alguns países africanos reconvertam a sua economia nesta direção, almejando galgar posição melhor dentro da globalização econômica que, mais do que nunca, é um processo ferozmente excludente. Afinal, a trajetória dos Tigres Asiáticos transformou-se em “modelo” que, embora dificilmente transportável e eivado de contradições, ainda encanta a muitos. Neste difícil momento para a África e demais periferias, quando as portas do “sucesso” estão, rapidamente, se fechando, fica difícil fazer previsões, especialmente quando a tomamos como um conjunto. Para nós, qualquer prognóstico nesse sentido seria precipitado. Sabemos que as soluções para os dilemas da África variam de intensidade e complexidade segundo a região e mesmo segundo o contexto histórico: as esperanças para os africanos são tantas quanto as desesperanças projetadas para o continente neste fim do século XX. MARY, Cristina Pessanha. In: HAESBAERT, Rogério (org.). Globalização e fragmentação no mundo contemporâneo. Niterói: Ed. da UFF, 2001. p. 303-305. 1