REALIDADES E DESAFIOS DA CRIAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL DO PAU FURADO ENQUANTO MEDIDA COMPENSATÓRIA DA CRIAÇÃO DAS USINAS CAPIM BRANCO EM UBERLÂNDIA-MG Mireille Paula Machado - Graduanda em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia / Bolsista PET Geografia ([email protected]) Diego Alves de Oliveira – Graduando em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia e graduando em Direito pela Universidade de Uberaba, Bolsista do Programa de Educação Tutorial do Curso de Geografia – UFU ([email protected]) Vânia Silvia Rosolen – Professora Doutora da Universidade Federal de Uberlândia ([email protected]) O presente trabalho discute a importância da unidade de conservação denominada Parque Estadual do Pau Furado, no Triângulo Mineiro, criado a partir da construção de duas unidades geradoras de energia a fim de compensar e mitigar os impactos ambientais gerados por estas. Dessa forma, faz-se necessária a compreensão e análise da gestão desta unidade de forma a diagnosticar sua representatividade no cenário ambiental. Palavras-chave: Parque Estadual do Pau Furado; Unidade de Conservação; Impactos Ambientais. This article discusses the importance of the conservation unit called Parque Estadual do Pau Furado in the Triângulo Mineiro, created by the construction of two generating units of energy to offset and mitigate the environmental impacts generated by these. Thus, it is necessary to understand and analyze the management of this unit in order to diagnose their representation in the environmental scenario. Key-words: Parque Estadual do Pau Furado; Conservation Unit; Environmental Impacts. Introdução A partir da concepção do uso econômico do espaço ocupado pelo homem, que ocorre segundo interesses e condições diversas como forma de ordenar o espaço, surgiu a necessidade da criação do Parque Estadual do Pau Furado, na região oeste do estado de Minas Gerais conhecida como Triângulo Mineiro. A ocupação do espaço nesta região iniciou-se no século XVII como via de circulação de mercadorias entre São Paulo e o Centro-Oeste do país. Analisando este uso do espaço de modo mais específico, compreende-se que o mesmo se deu de modo diferenciado, variando conforme o tipo de relevo encontrado. Assim, as áreas de topo de chapadas, geralmente bastante planas foram intensamente modificadas não restando vegetação natural, exceto em pequenos fragmentos ao longo de veredas ou importantes cursos d’água perenes. É neste cenário que se encontra o parque estudado, cuja criação deu-se no ano de 2007 por meio de um Decreto Estadual sem número sancionado pelo governo do Estado de Minas Gerais, em 26 de janeiro do mesmo ano. A partir do ano 2000, estabeleceu-se no curso do Rio Araguari, o empreendimento do Consórcio Capim Branco Energia (atualmente denominado Complexo Amador Aguiar) que construiu duas unidades geradoras, as usinas Capim Branco I e Capim Branco II. Durante o processo de licenciamento ambiental ficou determinado que, entre as condicionantes do empreendimento, fossem criadas duas unidades de conservação no entorno da região afetada pela atividade. Contudo, durante a implantação das unidades decidiu-se pela criação de uma única área compreendendo um total de 22 km², situados entre os municípios de Araguari e Uberlândia. Os estudos para a criação da unidade de foram feitos pelo Consórcio Capim Branco. Já a implantação e administração da unidade ficaram a cargo do Instituto Estadual de Florestas (IEF). A unidade foi criada com base na legislação vigente onde, na lei federal 9.985 de 2000 no artigo 36, há a definição de que todo empreendimento com grande impacto ambiental deve prever a criação de unidades de conservação como medida de compensação ambiental pela atividade promovida. Desta forma, é imprescindível realizar estudos sobre a unidade criada bem como sobre a sua representatividade na região do estudo como área de conservação da biodiversidade do ecossistema cerrado. Materiais e Métodos A área total afetada pelo complexo hidrelétrico é de aproximadamente 6.400 hectares incluindo a calha do rio Araguari. A área de influência dos reservatórios é de 1.151,91km2 e a área de entorno, integrante do empreendimento, ocupa uma superfície de 261,41 km2 (Silva, 2007). A avaliação do fragmento de vegetação que compõe o parque e sua representatividade como área de conservação da biodiversidade e dos recursos hídricos está amparada nos referenciais teóricometodológicos da ecologia da paisagem que permite a análise do desenvolvimento e da dinâmica da heterogeneidade da paisagem no tempo e no espaço e suas influências nos processos bióticos e abióticos, ressaltando a incorporação da ação antrópica no ambiente (Bertrand, 1972; Metzger, 1999). As referências sobre os aspectos legais das Unidades de Conservação foram amparadas na Lei número 9.985 de 18 de julho de 2000, que regulamenta o artigo 225, § 1º, incisos I, II, III e IV da Constituição Federal, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC. A definição que a Lei faz de Unidades de Conservação é: “espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção.” (Lei 9.985, art. 2º, I). Quanto aos Parques Estaduais, o Decreto nº 21.724 de 23 de novembro de 1981 aprova o regulamento destes e explicita, no artigo 3º, que o objetivo principal de um parque desta categoria é garantir a preservação dos ecossistemas naturais, possibilitar a realização de estudos e trabalhos científicos e oferecer condições para recreação e atividades educativas. O Parque Estadual do Pau Furado é uma Unidade de Proteção Integral e admite apenas o uso indireto de seus recursos naturais. As unidades desta categoria são de domínio público, sendo que as áreas particulares dentro dos limites são passíveis de desapropriação, o que está sendo realizado na região desde a implantação das usinas hidrelétricas instaladas na localidade. Resultados e discussões Alguns entraves relacionados à área demarcada e ao próprio uso da terra podem comprometer os objetivos inerentes à criação do Parque. Uma primeira observação refere-se à delimitação da própria Unidade que deveria estar amparada por critérios científicos. A configuração e a localização espacial do Parque do Pau Furado revelam um entorno com forte ocupação humana, datada de mais de cem anos de história, de intenso uso agropecuário, refletindo-se na degradação da paisagem natural. Chama atenção o fato do contorno do fragmento ou a área correspondente à Unidade de Conservação não respeitar nascentes de importantes córregos tributários do rio Araguari, cortando bacias existentes e não incluindo em sua área o próprio rio Araguari em sua configuração, conforme figura 1. Fig. 1: Delimitação do Parque Estadual do Pau Furado. Org.: MACHADO, M.P., 2008. Considerando que o empreendimento afetaria o meio ambiente do entorno, foi proposto no Plano Diretor da Bacia de Contribuição dos Aproveitamentos Hidrelétricos Capim Branco I e II diretrizes de uso e ocupação do solo para a bacia e de utilização dos reservatórios e de seu entorno (Silva, 2007). Uma explicação para tal fato é que, as propostas originalmente estabelecidas previam a criação de duas Unidades de Conservação (Rola Cavalo e Terra Branca), porém, apenas uma foi instituída. A delimitação da área sugere o rearranjo da proposta inicial, pois manteve-se o traçado de duas unidades diferenciadas, estas ligadas apenas por uma linha, que inclusive atravessa o rio Araguari, não incluindo suas margens e tão pouco a área do lago ao parque. Por esses motivos é discutível o papel que o parque assume para a preservação do ecossistema cerrado das nascentes dos rios. Vários outros pontos críticos comprometem o efetivo cumprimento das funções do parque, tais como os trâmites para desapropriação das terras, que ainda não estão finalizados, a proximidade da mancha urbana das cidades de Uberlândia e Araguari, o que pode gerar consideráveis impactos no ecossistema, principalmente por não contar com um plano de manejo ou qualquer tipo de cercamento ou restrição à entrada. Ainda, se apoiados nos critérios de categoria de análise que estabelecem a bacia hidrográfica como uma unidade efetiva de planejamento, o Parque do Pau Furado também não se adequa. Para este caso, verifica-se que a área adotada como unidade de conservação não está situada no interior dos limites da bacia hidrográfica dos cursos hídricos que drenam a área protegida. Por exemplo, existem cursos que estão protegidos apenas em seu médio curso e estando tanto a nascente quanto a foz fora da área de proteção, isso significa que pode haver a degradação ou a contaminação do segmento dentro do parque. Outro problema verificado é a ocupação humana que ao longo do tempo instalou-se nas áreas de interflúvios dos principais córregos que compõem a região e as áreas periféricas das cidades de Uberlândia e Araguari que ocupam estas áreas de divisores de bacias hidrográficas. Por estes motivos torna-se importante o levantamento das condições ambientais desta região e formar um plano de ocupação desta área, pois os fenômenos que forem executados na parte alta do sistema hidrográfico certamente acusarão interferências nas partes baixas da bacia, local onde está situada a unidade de conservação. Este uso está sendo, portanto discordante dos objetivos a que se propõe a criação deste espaço de conservação da natureza. Conclusões Vários são os problemas relacionados à implementação efetiva do Parque Estadual do Pau Furado visando atender aos objetivos aos quais se propõem uma Unidade de Conservação. O Bioma Cerrado, que representa em torno de 5% da biodiversidade do planeta, possui aproximadamente 4% de sua área delimitada como unidades destinadas à conservação, muito abaixo da meta mundial de conservação ecológica, de 10% das regiões ecológicas do mundo, segundo previsões da Convenção sobre Diversidade Biológica, da qual o Brasil é signatário. Segundo Morsello (2006) são enormes as distâncias entre o que é descrito teoricamente como ideal para o manejo de Unidades de Conservação em seus aspectos ecológicos, econômicos e político-institucionais e o que ocorre na prática brasileira. Porém, ao considerar as grandes transformações na paisagem e os pequenos percentuais do território brasileiro protegidos legalmente, os fragmentos florestais assumem enorme importância (Zaú, 1998). Com base neste estudo, torna-se evidente a necessidade imediata de desapropriação das áreas privadas agrícolas dentro do parque, evitar o isolamento do ecossistema através da conexão com as áreas de mata ciliar para facilitar migrações e fluxos gênicos através da criação de corredores ecológicos e, fundamentalmente, recuperar a vegetação ciliar e fundos de vale. Porém, é necessário salientar que estes corredores não solucionam todos os problemas oriundos da fragmentação e diminuição do habitat. Apesar das dificuldades apontadas, a criação deste Parque reveste-se de grande importância ambiental para a região, pois ele representa a primeira iniciativa do Estado para promover a manutenção dos fragmentos do bioma cerrado no Triângulo Mineiro. Bibliografia: BERTRAND, G. 1972. Paisagem e Geografia física global – esboço metodológico. Caderno de Ciências da Terra, Instituto de Geografia, USP, 13: 1-27. BOTELHO, Rosangela Garrido Machado; SILVA, Antonio Soares da. Bacia Hidrográfica e Qualidade Ambiental. In: VITTE, Antonio Carlos; GUERRA, Antonio José Teixeira. Reflexões sobre a Geografia Física no Brasil. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004. Cap. 6, p. 153-192. BRASIL. Lei 9985. Disponível: em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9985.htm>. Acesso em 19 de abril de 2008. MINAS GERAIS. Decreto sem número de 26 de janeiro de 2007. Cria o Parque Estadual do Pau Furado. Disponível em: < http://hera.almg.gov.br/cgi-bin/nph. brs?d=NJMG&f=G&l=20&n=&p=1&r=1&u=http://www.almg.gov.br/njmg/chama_pesquisa.asp&SE CT1=IMAGE&SECT2=THESOFF&SECT3=PLUROFF&SECT6=HITIMG&SECT7=LINKON&SE CT8=DIRINJMG&SECT9=TODODOC&co1=E&co2=E&co3=E&s1=Decreto&s2=&s3=2007&s4=p arque+estadual+pau+furado+> Acesso em: 05 maio 2008. MORSELLO, C. Áreas protegidas públicas e privadas: seleção e manejo. 2. ed. São Paulo: Annablume: Fapesp, 2006. 343 p. Silva, F.B. Subsídios para o planejamento regional/territorial de bacias hidrográficas: análise da interface entre os Planos Diretores de Usinas Hidrelétricas de Capim Branco I e II e o Plano Diretor de Uberlândia. Tese de doutoramento, Instituto de Geografia, UFU, 199p. ZAÚ, A.S. Fragmentação da Mata Atlântica: Aspectos teóricos. Floresta e Ambiente, vol. 5, 1: 160170, jan./dez. 1998.