A INFLUENCIA DA PRECIPITAÇÃO NA PROLIFERAÇÃO DA DENGUE E DA LEPTOSPIROSE EM FORTALEZA-CE Gledson Bezerra Magalhães1 RESUMO O clima torna-se de grande relevância em estudos que tratam da qualidade de vida da população, em particular, no que se refere à saúde, visto que há uma forte relação entre as características climáticas e a incidência de algumas doenças em ambientes tropicais, principalmente nos grandes centro urbanos, onde atrelado a outros fatores eminentemente urbanos causam o adensamento de determinadas doenças. Como exemplo tem-se a dengue que em Fortaleza apresenta a maior concentração do Estado, sendo o município onde há o maior numero de casos da doença, e onde há um maior investimento por parte do Governo no combate a mesma. A leptospirose é ouro exemplo, sendo registrado em Fortaleza a média de 50% de casos em relação a todo o Estado do Ceará, indicando uma forte relação entre incidência da doença com as condições climáticas locais. O presente estudo analisou as relações entre chuvas, casos de dengue, as inundações e casos de leptospirose, elaborando um estudo temporal da dengue entre os anos de 2001 a 2008 e espacio-temporal da leptospirose para o período de 2004 a 2007 para a cidade de Fortaleza. Os resultados indicam que o maior número de casos de leptospirose concentra-se no primeiro semestre do ano, principalmente na quadra chuvosa, evidenciando que a doença segue um padrão sazonal de ocorrência e que sua espacialização é influenciada pelas condições de moradia e de saneamento básico, tornando-se mais freqüentes nas áreas sujeitas as inundações. Palavras-chave: saúde, precipitações, leptospirose, Fortaleza. 1 Mestrando em Geografia da Universidade Federal do Ceará [email protected] Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 1 INTRODUÇÃO No estudo das relações entre o clima e as enfermidades humanas em ambientes tropicais, tem-se as que estão relacionadas diretamente a tropicalidade climática, como as doenças parasitárias transmitidas por vetores (esquistossomose, febre amarela, malária, dengue, etc.), e as que estão relacionadas indiretamente com o clima (amebíase, cólera, micoses, leptospirose, etc.). Os fatores que favorecem a propagação destas se vinculam diretamente às questões de ordem socioambiental, como a precariedade das habitações, a falta de saneamento básico e a ocupação de áreas de risco sujeitas a inundações. Destaca-se que as conseqüências desses problemas sociais se tornam mais evidentes durante a ocorrência de eventos pluviométricos intensos. As situações supracitadas se acentuam nos grandes centros urbanos, onde o inadequado planejamento urbano e a lógica econômica do capital potencializam os vários problemas socioambientais. A cidade de Fortaleza, assim como as outras metrópoles brasileiras, se enquadra nesse processo, sendo a dengue e a leptospirose doenças de freqüentemente verificadas na cidade. A dengue apresenta-se como uma doença socialmente complexa, afetando seres humanos independente da sua classe social e constituindo-se, atualmente, dentre as mais importantes doenças transmissíveis do mundo, especialmente nos países tropicais, onde as condições ambientais, em particular as climáticas, associada à ineficácia das políticas públicas de saúde favorecem o desenvolvimento e proliferação de seus vetores (mosquitos do gênero Aedes aegypti e Aedes albopictus). A incidência da dengue tem mostrado uma tendência crescente no Ceará, a partir da introdução do vírus em 1986. Fortaleza, capital do Estado, é o município onde se concentra o maior numero de casos da doença, e onde há um maior investimento por parte do Governo no combate a mesma. No caso da leptospirose, dados do Ministério da Saúde indicam que no período dos anos de 2004 a 2006 foram confirmados 10.981 casos em topo o país. Para a Região Nordeste, na mesma época, foram registrados 2.346 casos, o que representa 21.3% do total de casos nacionais. No estado do Ceará, para o mesmo período, foram registrados 268 casos, representando 11.4% do total de casos de sua Região, sendo que a cidade de Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 2 Fortaleza representa 50% do total de casos do Estado, com 134 casos registrados para o mesmo período. Na tentativa de compreender o comportamento geográfico dessas doenças, o estudo analisou a relação das precipitações, com numero de casos das mesmas, assim como a evolução do número de casos, buscando um estudo temporal e espacial para Fortaleza. O município de Fortaleza localiza-se na faixa central da zona litorânea do Estado do Ceará. Insere-se entre as coordenadas geográficas 3°45’47’’ S e 38° 37’35’’ W (figura 01), e possui uma área de 313,14 km², correspondendo a 0,21% do território do Estado do Ceará (IPECE, 2007, p. 5). O município é composto por 118 bairros divididos em 6 regiões administrativas e possui uma população de 2.505.552 habitantes, representando quase 30% da população do Estado. (IBGE, 2009). A característica climática de Fortaleza é representada pela sazonalidade da precipitação e por elevadas temperaturas o ano todo. A sua localização territorial favorece uma intensa insolação o ano todo, proporcionando elevadas temperaturas. A atuação de diferentes sistemas atmosféricos estabelece a sazonalidade da precipitação. Ressalta-se que Fortaleza se encontra próximo ao oceano sofrendo influencia marítima e conseqüentemente temperaturas mais amenas do que outros municípios do interior do Estado. Zanella (2005: 172) afirma que as chuvas se concentram, principalmente nos meses de fevereiro/março/abril/maio, denominado quadra chuvosa, quando o estado fica sob a influência da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT), principal sistema atmosférico causador de precipitação. Os Vórtices Ciclônicos de Ar Superior (VCAS), as Linhas de Instabilidade, os Complexos Convectivos de Mesoescala (CCMs), as Ondas de Leste, as Frentes de Brisa e as repercussões da Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS) muitas vezes associados a ZCIT, intensificam as chuvas na quadra chuvosa, e podem gerar precipitação nos demais meses. As temperaturas de Fortaleza são elevadas durante o ano todo, apresentando uma média anual de 26,6°C. A média das máximas é de 29,9°C e a média das mínimas é de 23,5°C. Possui um alto índice de umidade relativa do ar, com mínima de 73% e Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 3 máxima de 82,5%, devido à influência marítima e alta taxa de evaporação (FORTALEZA, 2009: 23). Figura 01 – Mapa de localização da área de estudo METODOLOGIA A escolha temporal para analise da doença dengue - 2001 a 2008, e da leptospirose – 2004 a 2007 foi feita levando em consideração a maior probabilidade de registros de casos dessas doenças nos órgãos de saúde do município e do Estado. Seguindo a linha proposta por Mendonça (1999, 2001) a abordagem climática adotada na pesquisa será elaborada em conformidade com a concepção sistêmica, sendo a manifestação dos elementos climáticos a energia do sistema clima e, a incidência das doenças em estudo influenciada por este sistema. A pesquisa foi dividida em três momentos. No primeiro momento, foi feito o levantamento bibliográfico e cartográfico a respeito do assunto abordado e da área de estudo, a fim de que se obtivesse um aporte teórico sobre a temática desenvolvida e sobre os procedimentos a serem executados dentro da escala de pesquisa - cidade de Fortaleza. O segundo momento da pesquisa consistiu no desenvolvimento do banco de dados da pesquisa com o levantamento das seguintes variáveis: Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 4 Totais de dias com chuva a cada mês e totais pluviométricos mensais e anuais junto a FUNCEME (Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos) e ao INMET (Instituto Nacional de Meteorologia) entre os anos de 2001 e 2008; Casos confirmados de dengue e taxa de incidência, mensais e por bairro, através da SESA (Secretária de Saúde do Estado do Ceará) e da SMS (Secretária Municipal de Saúde de Fortaleza), para os anos de 2001 a 2008; Coleta de dados de casos confirmados de leptospirose no Centro de Controle Zoonoses do Município, referentes aos bairros de Fortaleza; Numero de pessoas por região administrativa, junto a Secretária Municipal de Planejamento e Orçamento (SEPLA). A terceira etapa da pesquisa abrange o tratamento geoestatístico dos dados coletados, onde foram organizados e analisados no ambiente computacional Microsoft Excel. Para a análise da dengue foram realizados cálculos de médias mensais de precipitação, construção de gráficos justapostos e a classificação climática de acordo com XAVIER (2001), onde se divide os estado em regiões pluviometricamente homogêneas traçando um perfil pluviométrico característico entre determinadas áreas estabelecendo valores pluviométricos padrões na definição de anos muito secos, secos, habituais ou normais, chuvosos e muito chuvosos. Na análise da leptospirose ocorreu a tabulação dos dados e da elaboração de gráficos e tabelas dos mesmos. A elaboração do banco de dados referentes à precipitação e aos casos confirmados de leptospirose, assim como os gráficos justapostos, foi feito no software Excel 2003. Também houve o lançamento do banco de dados referentes aos casos confirmados de leptospirose no programa ArcView 3.2 para a construção de um mapa de espacialização dos casos da doença no período em estudo, seguido de sua respectiva análise. RESULTADO E DISCUSSÕES DENGUE A respeito da caracterização pluviométrica para os anos analisados observou-se que as chuvas seguiram um padrão de comportamento, não havendo tendência Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 5 significativa em relação ao aumento ou diminuição da chuva na série investigada, todavia ocorre uma concentração de chuvas no primeiro semestre do ano, o que é considerado típico do Estado (Figura 02). Os meses que apresentaram mais dias de chuva foram fevereiro (135), março (166), abril (171) e maio (124) e os meses com maiores índices pluviométricos foram março (2515,5mm), abril (3093,7 mm), maio (1731,1mm) e junho (1274,4mm). Figura 02 – Total de precipitação mensal entre os anos de 2001 a 2008 Considerando a tipologia climática proposta por XAVIER (2001), e adotada pela FUNCEME na definição das áreas pluviometricamente homogêneas no estado do Ceará, na qual categoriza os anos em muito chuvoso (superior a 1.355,6 mm), chuvoso (1.121,6 a 11355,5mm), habitual ou normal (798,3 a 1.121,5mm), seco (625,4 a 798,2mm) e muito seco (0 a 625,3mm), de acordo com o total de precipitação da quadra chuvosa (fevereiro, março, abril e maio), verifica-se que para Fortaleza, não houve nenhum ano seco ou muito seco, isso porque Fortaleza raramente apresentara uma tipologia de ano seco ou muito seco visto que ele se localiza em na zona litorânea sofrendo ações mais freqüentes e intensas de sistemas atmosféricos causadores de chuva e atuantes no litoral como é o caso das ondas de leste, das brisas marinhas e das linhas de instabilidade. Ao contrário dos municípios que ficam mais no interior do continente. Observando o que foi exposto nota-se que o ano de 2003 apesar de ter sido muito chuvoso apresentou apenas o 6° ano com maiores números de casos de dengue, dos 8 analisados. Os outros anos apresentaram uma tipologia climática habitual, todavia os anos de 2001, 2005, 2006, 2007 e 2008 apresentaram casos de dengue maiores do que o ano de 2003. Isso se justifica pelo fado de poder ter ocorrido uma baixa circulação Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 6 do vírus entre os vetores, assim como a intensidade e freqüência das chuvas pode ter prejudicado a reprodução e ploriferação dos mosquitos, visto a redução dos intervalos de água parada, também os planos de controle e prevenção da dengue podem ter tido mais eficiência naquele ano e o vírus não ter circulado de forma tão intensa como nos outros anos. O ano de 2004 registrou o menor numero de casos de dengue (594), com a menor taxa de incidência (22,59), e seus dados não apresentaram uma anormalidade para os anos analisados (tabela 01), mostrando que a variação significativa no numero de casos da doença em anos com condições climáticas similares é uma característica da dinâmica da doença, que leva em conta outros fatores além dos climáticos. Tabela 01 – Dados climáticos e clínicos anuais Ano Total de Precipitação Dias de Chuva Taxa de incidência Nº de casos 2001 1076,5 77 621,17 13674 2002 1440 137 223,44 4473 2003 2170,6 149 549,59 9012 2004 1705,4 129 22,59 594 2005 1095 110 497,78 11776 2006 1423 148 644,83 15865 2007 1335,3 144 493,67 11447 2008 1450,1 106 - - - 33845 Uma análise mensal dos totais de casos de dengue (figura 03) mostra que os meses onde ocorreram maiores números de casos de dengue em Fortaleza foram os meses de abril, maio, junho e julho, não coincidindo com a temporada completa da quadra chuvosa. Observando o total de chuva por mês nos anos em análise nota-se que os meses onde se teve maiores dias com chuva coincidiram com a quadra chuvosa (fevereiro, março, abril e maio). Portanto não houve uma relação perfeita entre os maiores números de casos e os meses com mais dias de chuva. Assim como não houve uma relação perfeita entre os números de caso e os meses onde houve os maiores índices pluviométricos (março, abril, maio e junho). Essa imperfeição na relação entre os dados clínicos e climáticos é natural se considerarmos o processo de circulação do Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 7 vírus onde se inclui o período de incubação do vetor, e o intervalo de dias entre um repasto de sangue infectado até o mosquito estar apto a transmitir o vírus.2 Figura 03 - Casos mensais de dengue entre os anos de 2001 a 2008 Observa-se que o mês onde se teve o maior numero de casos de dengue para os anos analisados foi o mês de maio, quando as chuvas da quadra chuvosa diminuem de freqüência, possibilitando um maior tempo de água parada. Favorecendo dessa forma, o desenvolvimento do vetor da Dengue, aja vista que os ovos do Aedes aegypti e Aedes albopictus necessitam de água parada e limpa para eclodirem. O total de casos de dengue na quadra chuvosa corresponde a 54,6%, com destaque para o mês de maio, como já foi comentado anteriormente. Esse aumento no numero de casos de dengue na quadra chuvosa é favorecido pela precipitação mais abundante que ocorre nesses meses, favorecendo o acumulo de água em reservatórios que propiciam o desenvolvimento do mosquito. Vale ressaltar que a casos em que os surtos de dengue ocorrem durante a estação seca porque o Aedes aegypti prolifera-se abundantemente em reservatórios, todavia esse tipo de situação não ocorreu no período estudado. A análise das variáveis epidemiológicas por região administrativa, permitiu verificar que a Regional 5 destaca-se como a região administrativa onde se obteve o 2 O guia de Vigilância Epidemiológica do Ministério da Saúde afirma que o período de incubação do vetor varia de 3 a 15 dias, sendo em média de 5 a 6 dias, e que o período entre o repasto de sangue infectado até o mosquito estar apto a transmitir o vírus é de 8 a 12 dias. Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 8 maior numero de casos de dengue dentro dos anos analisados. Apesar de ser constituída por apenas 18 bairros, é a que concentra o maior numero de habitantes (540.769) segundo a Secretária Municipal de Planejamento e Orçamento. Essa regional apresentou entre os anos de 2005 e 2007 os maiores números de casos da doença. Pode-se afirmar que a alta densidade populacional favorece a disseminação do vírus, isso foi observado também nos trabalhos de CORDEIRO et al (2008) para Pernambuco e no estudo de DE SIMONE et al (2004) para o Estado do Rio de Janeiro. Os dados mostram que o numero de caos de dengue nem sempre vão ter uma relação direta com a incidência, como se observa no ano de 2006 e 2007 onde a SER V apresentou os maiores números de casos, todavia as maiores incidências foram nas SER III. Essa anormalidade para os anos de 2006 e 2007, pode ser explicada pelo fato de que a população da SER III (398.382 mil habitantes) ser menor do que a população da SER V (530.175 mil habitantes), logo o numero de pessoas infectadas proporcionalmente é maior na SER III para esses dois anos. No restante dos anos os maiores números de casos de dengue foram nas mesmas regionais que apresentaram maiores incidências. A figura 04 mostra que a linha de tendência para cada Regional é crescente no que concerne ao numero de casos de dengue, verificando assim um aumento no numero de casos para os anos analisados. Nas Regionais (SER) III, V e VI se observou incidências crescentes mais significativas. As SER V e VI também se destacam como as regionais onde apresentaram o maior numero de casos de dengue entre o período em análise, tendo respectivamente 19.734 e 19.065 casos. O período em análise não apresentou tendência significativa de chuvas, mostrando que o aumento da incidência foi pouco influenciado pela chuva considerando a série histórica, todavia ao mensurar o numero de casos de dengue nota-se uma sazonalidade, concentrando-se o maior numero de casos no primeiro semestre do ano. Em relação ao gênero, o numero de mulheres com dengue corresponde ao 52.3% do total de casos, com apenas uma diferença de 4.6% (homens 52,3%). Para o ano de 2003, houve 14 casos de Dengue no qual não constava o sexo do portador da doença. A diferença entre o numero de casos de mulheres e homens que tiveram a doença é estatisticamente insignificativa ao considerar o total da população. A pequena diferença Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 9 encontrada se deve ao fato da mulher buscar mais assistência que os homens, logo o numero de casos do gênero feminino torna-se maior. No estudo elaborado pela Secretária Municipal de Saúde de Fortaleza (1999) para os anos de 1994 a 1998 verificou-se que o numero de casos de dengue no sexo feminino (57.7%) era significativamente maior que no masculino (42.3%) com uma diferença de 15.4% em Fortaleza. Estudos como os de Cordeito et al (2008) para Pernambuco, e de Travassos da Rosa et al (2000) para Belém, encontraram diferenças significativas entre os casos de dengue de acordo com o sexo, sendo maior numero de casos no sexo feminino, apontando que as mulheres estavam mais sujeitas ao risco de infecção por dengue devido a exposição familiar. Figura 04 – Incidência de Dengue Incidência de dengue por Regional e suas respectivas linhas de tedência entre os anos de 2001 a 2008 1800 1600 SER I SER II 1400 SER III N° de casos 1200 SER IV SER V 1000 SER VI Linear (SER I) 800 Linear (SER II) 600 Linear (SER V) Linear (SER IV) 400 Linear (SER III) Linear (SER VI) 200 0 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 Anos Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 10 LEPTOSPIROSE Fortaleza é onde há mais registros de casos de leptospirose no Estado. No ano de 2004 foram confirmados 51 casos da doença, tendo uma significante diminuição no ano de 2005, com 24 casos confirmados, voltando a subir em 2006 - 59 casos confirmados e tendo um pequeno decréscimo no ano de 2007 - 41 casos (Tabela 02). Os totais de precipitação para os anos de 2004, 2005, 2006 e 2007 foram de 1705,4, 1095, 1423, 1335,3 mm respectivamente. Inúmeros eventos de chuvas diárias com índices pluviométricos superiores a 60 mm foram observados em referidos anos: 8 em 2004; 3 em 2005; 3 em 2006; e 5 em 2007, conforme dados do posto meteorológico da FUNCEME. Esses eventos causaram impactos em vários pontos das cidades, sendo mais evidenciados nas áreas próximas aos leitos dos rios e lagoas. Observa-se, a partir dos anos analisados, que os casos confirmados de leptospirose têm um decréscimo maior no ano que houve menor precipitação anual na cidade. De acordo com os dados registrados na tabela 02, observou-se que os maiores números de casos de leptospirose concentram-se no primeiro semestre do ano. Para o primeiro semestre dos anos de 2004, 2005, 2006 e 2007 foram registrados respectivamente 33, 17, 49 e 39 casos da doença (Tabela 02) e uma precipitação que corresponde a 78.6%, 93.3%, 94.9%, 93.2%, da precipitação anual, relativo a cada ano supracitado. Há que se destacar o mês de fevereiro de 2004 que apresentou um número mais elevado de casos (9) em relação aos mesmos meses dos demais anos. Isso pode ser justificado pela ocorrência do evento de chuva extremo ocorrido no dia 29 de janeiro desse mesmo ano quando 250 mm se precipitaram sobre a cidade de Fortaleza. Esse evento corresponde ao valor máximo observado desde 1974, quando iniciaram os registros de chuvas pela FUNCEME. O referido episódio gerou inundações em toda a cidade de Fortaleza, principalmente nas áreas de risco junto ao rio Maranguapinho e Cocó. Como a doença se manifesta entre 7 e 21 dias a partir da contaminação com o Leptospira, o elevado número de casos do mês de fevereiro muito provavelmente ocorreu em virtude da invasão da água nas casas que se localizam junto às margens dos principais rios que drenam a cidade, contaminando um maior número de pessoas. Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 11 Tabela 02 – Número de casos de leptospirose ano/mês Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho Julho Agosto Setembro Outubro Novembro Dezembro TOTAL 2004 1 9 9 8 2 4 7 8 2 0 0 1 51 2005 3 2 1 3 3 5 4 2 1 0 0 0 24 2006 2 2 8 8 19 10 0 5 1 1 1 2 59 2007 5 2 15 10 6 1 1 0 1 0 0 0 41 Fonte dos dados: Centro de Controles de Zoonozes de Fortaleza Há que se considerar que a incidência da doença na quadra chuvosa (fevereiro a maio) corresponde a 61% dos casos no período de 2004 a 2007, o que evidencia a concentração maior de casos no período de fevereiro a maio, que correspondem aos meses de maiores totais mensais. Entretanto, cabe ressaltar que no mês de junho os casos de leptospirose também se equipararam aos meses da quadra chuvosa, assim como seu índice de precipitação. A figura 05 evidencia a sazonalidade da Leptospirose para a cidade de Fortaleza, mostrando que esta, apresenta uma maior incidência no primeiro semestre do ano, período em que ocorrem os maiores índices de precipitação, favorecendo a incidência de inundações nas margens dos rios da cidade, os quais concentram um grande numero de famílias, predominantemente de baixo poder aquisitivo, e onde há um elevado índice de doenças de veiculação hídrica, como é o caso da leptospirose. Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 12 Figura 05 - Precipitação x casos de leptospirose nos anos de 2004 a 2007 Referente à análise espacial da leptospirose na cidade de Fortaleza, levou-se em consideração as áreas de ocupação da população, visto que o risco de ocorrência da leptospirose se relaciona diretamente com o sítio urbano, e com a qualidade de vida das pessoas inserida nele. A qualidade de vida da população urbana apresenta-se de forma diferenciada espacialmente e é permeada de uma série de variáveis que a qualifica, Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 13 como: problemas ligados às altas densidades demográficas, a favelização, a falta de saneamento básico, a poluição, as enchentes, dentre outras. Verificou-se que o número de casos de leptospirose no período analisado foi maior nos bairros que são drenados pelos rios de maior volume da cidade (Rio Maranguapinho e Rio Cócó) e seus afluentes. Suas margens são densamente ocupadas, predominando uma população pobre, com um ambiente propício as inundações e enquadradas pelo Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Fortaleza – PDDU (2006), como áreas de risco (Figura 03). Observou-se ainda, registros de casos em outros bairros mais afastados dos rios que também apresentam áreas de risco, principalmente relacionado ao campo de dunas. Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 14 CONCLUSÕES Analisando o numero de casos de dengue e a incidência da mesma para cada regional nota-se que as regionais que precisam de mais atenção são as regionais 5 e 6 por apresentarem os números de casos mais elevados assim como as taxas de incidência mais significativas e crescentes ao longo do anos em análise. Mesmo durante o período de chuvas, a incidência de dengue não aumenta quando o controle do vetor permanece ativo. O estudo de Pontes et al (2000), aponta que as epidemias dos anos de 1986, 1989, 1994 e 1998, ocorreram após um relaxamento no monitoramento vetorial. Uma das causas que levam ao aumento do numero de casos de dengue é o aumento no numero de vetores, e isso ocorre principalmente devido a precariedade do saneamento básico, incluindo sistemas de abastecimento de água, esgotamento sanitário e coleta de resíduos sólidos, problemas que se tornam mais relevantes no período chuvoso. Ressalta-se que, o que foi feito, foi apenas uma análise de algumas variáveis envolvidas na dinâmica da dengue, relacionando dados clínicos com os elementos climáticos, dessa forma salienta-se que a dengue, por sua complexidade também deve ser abordada em suas outras dimensões: biológica (vírus, vetor, ser humano), da conduta (comportamento cultural das sociedades), econômica, política e ecológica. Estes subsistemas se entrelaçam (re)produzindo as condições da existência da dengue como problema sanitário. No caso da análise da leptospirose, apesar de ter ocorrido variações no número de casos da doença entre os anos de 2004 e 2007, não se pode afirmar que essas variações ocorreram unicamente devido aos índices de precipitação, visto que a infecção humana da leptospirose não se dá apenas por vinculação hídrica e que qualquer ambiente propicio há existência de ratos tem um potencial de transmissão da doença ao homem. Entretanto a quantidade de chuva é um fator de grande influência para o aumento dos casos de leptospirose, pois aumenta a probabilidade de uma pessoa entrar em contato com o agente vetor da doença. Conforme o Guia de Vigilância Epidemiológica (2006: 503), Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 15 A infecção humana resulta da exposição direta ou indireta à urina de animais infectados. O contato com a água e a lama contaminadas demonstra a importância do elo hídrico na transmissão da doença ao homem. Outras modalidades de transmissão são relatadas, porém com pouca freqüência: contato com o sangue, tecidos e órgãos de animais infectados, transmissão acidental em laboratórios e ingestão de água ou alimentos contaminados. Observou-se que nos meses de dezembro de 2004, de outubro, novembro e dezembro de 2006 e de setembro de 2007, mesmo sem ter havido precipitação significante, foram registrados casos de leptospirose. E em alguns bairros distantes dos rios, também houve registros de casos da doença. Cabe ressaltar que há bairros fora do alcance das inundações, ocasionadas pelas enchentes dos rios e lagoas, que apresentam áreas de risco. Estas apresentam outras áreas com acontecimento possível diferentes da inundação, como por exemplo, o desabamento de moradias construídas sob dunas ou o auto índice de poluição do ar. Nestas áreas, assim como em áreas que não se enquadram na categoria de áreas de risco, foram registrados casos de leptospirose apesar de em menor número, nos conduzindo a crer, assim como nos estudos de Mendonça e Paula (2003) para a cidade de Curitiba, que excessos de meios favoráveis à proliferação de roedores, como localidades com más condições de saneamento básico, com esgoto a céu aberto e lixões, proximidade com córregos, e outros locais que propiciam o contato direto com as águas contaminadas com a urina de roedores e de cães contaminados, é outro fator para a propagação da doença. No estudo das relações entre o clima e algumas doenças humanas em ambientes tropicais, tem-se as que estão relacionadas diretamente a tropicalidade climática, como as doenças parasitárias transmitidas por vetores (esquistossomose, febre amarela, malária, dengue, etc.), e as que estão relacionadas indiretamente com o clima (amebíase, cólera, micoses, leptospirose, etc.). Os fatores que favorecem as propagações das mesmas se encontram evidentes nos problemas sociais, como a precariedade das habitações e falta de saneamento básico, enfrentados por parcela da população que esta submetida a essas doenças. Cabe destacar que as conseqüências desses problemas sociais se tornam mais evidentes durante a ocorrência de eventos pluviométricos intensos. Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 16 REFERÊNCIAS: BRASIL. Ministério da Saúde. Secretária de Vigilância em Saúde. Guia de vigilância epidemiológica. 6ª ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2006. CORDEIRO, M. T. (et al). Vinte anos de evolução da dengue no Estado de Pernambuco. Recife: UFPE, 2008. DE SIMONE, T. S.; NOGUEIRA, R. M. R.; ARAÚJO, E. S. M. Dengue vírus surveillance: the co-circulation of DENV-1, DENV-2 and DENV-3 in the state of Rio de Janeiro, Brazl. In.: Transactions of the Royal Society of Tropical Medicine and Hygiene, v.98, p. 553 – 562, 2004. 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