A PAISAGEM FLORESTAL NA RESERVA BIOLÓGICA GUARIBAS NO ANO DE 1970 Maria José Vicente de Barros (Acadêmica Geog. - UFPB I) Conrad Rodrigues Rosa (Acadêmico Geog. - UFPB I) Paulo Roberto de O. Rosa (Prof. Geog. - UFPB I) Palavras chave: delimitação; quantificação; superposição Introdução A Reserva Biológica Guaribas localiza-se na zona da mata paraibana, a 70 km de João Pessoa entre os municípios de Mamanguape e Rio Tinto, e está dividida em três áreas, assim denominadas: SEMA 1 com 616,4 ha, SEMA 2 com 3.378,2 ha e SEMA 3 com 327,0 ha. As duas primeiras áreas localizam-se no município de Mamanguape e a terceira, no município de Rio Tinto. Nossa pesquisa abrange apenas as SEMAS 1 e 2, tendo em vista a proximidade entre elas. A SEMA 1 localiza-se aproximadamente entre 6º40’ e 6º43’ de Latitude Sul/35º07’ e 35º08’ de Longitude Oeste. Já a SEMA 2 encontra-se entre 6º41’e 6º45’ de Latitude Sul/35º07’ e 35º12’ de Longitude Oeste. O território da REBIO Guaribas demonstra em sua paisagem uma estrutura tipológica heterogênea na cobertura vegetal, tornando-se assim o objeto do nosso estudo. O trabalho consiste em delimitar, mapear e quantificar a formação estrutural da vegetação dentro do território da REBIO Guaribas tomando como dimensão épocas diferentes, ou seja, no intervalo de tempo entre 1970, 1991 e atualmente. Tomamos como parâmetro inicial para esta primeira fase da pesquisa, imagens da década de 1970, época anterior à implantação institucional da Reserva enquanto Unidade de Conservação, pois a mesma só foi oficializada em 1988 Referencial Teórico-conceitual Com referência ao embasamento teórico, trabalhamos com os princípios da Geografia Geral e da Causalidade expostos na obra de Emmanuel De Martonne, e são essenciais para o conhecimento geográfico. O princípio da Geografia Geral, segundo esse autor, utiliza-se da análise e da analogia, ou seja, “absorve-se na contemplação do facto local; volta seu olhar para outras regiões onde se observam factos análogos, (...)” (1953:13); com referência ao princípio da causalidade o autor observa para “nunca contentar-se com o exame de um fenômeno sem tentar remontar as causas que determinam sua extensão e procurar as conseqüências” (id.: 18) Considerando a paisagem como categoria de análise geográfica, e neste caso específico, a paisagem vegetal torna-se uma generalidade que tomamos como objeto. Nesse sentido nos pautamos em Dolfuss quando considera que “O geógrafo situa no espaço as estruturas que compõem um mosaico (...) com o objetivo de extrair seu significado. Seja qual for a natureza dos fenômenos analisados, (...) adota o mesmo procedimento a fim de decompor seu domínio (...) trazer à tona a originalidade (ou singularidade) de cada conjunto (...)” (1973: 32), estabelecendo como meta, definir e quantificar a tipologia estrutural da população, destacando, a partir da estatura da população, e daí então proceder a delimitação, mapeamento e a quantificação de cada formação encontrada na área. Optamos por adotar a análise como método, procurando interpretar inicialmente documentos primários (aerofotos) e secundários (cartas topográficas), bem como, recorremos à técnica de fotointerpretação de imagens. Segundo Loch (1984: 31), a fotointerpretação da vegetação se iniciou, quando se tornou necessário o levantamento de áreas de difícil acesso por terra, porém no nosso trabalho as fotos aéreas são importantes devido à época em que foram feitas, pois não há registro empírico com maiores qualificações e quantificações referentes ao ano da documentação fotográfica. Dentro desta perspectiva, utilizamos como referências as técnicas propostas por Troppmair, Carlos Loch e Evaristo Atêncio Paredes. Troppmair (1988: 46) realizou trabalhos na área de Biogeografia dos quais, alguns de interpretação das formações vegetais, e nos propõe em Metodologias Simples para Pesquisar o Meio Ambiente, um mapeamento de vestígios de vegetação originária descrevendo o uso de fotografias aéreas e de trabalho de campo para delimitações das formações vegetais atribuindo-se cores e sinais para o lançamento dos dados no mapa. É uma metodologia simples, contudo, bastante eficiente para ser utilizada na delimitação de diferentes formações, o que se adequou muito bem ao estudo que nos propomos a realizar. Quanto a Loch e Paredes, estes nos deram respaldo no que se refere à interpretação de fotografias aéreas, desde noções básicas de interpretação e fotointerpretação como as situações mais complexas referentes às tonalidades de cores, texturas e até noções mais específicas, de como montar os mosaicos e a obtenção de esteoscopia mais complexa. Metodologia Para a realização de toda e qualquer pesquisa é necessário estabelecer previamente a metodologia a ser utilizada. Nesta fase leva-se em consideração, além dos objetivos definidos, a técnica que melhor se adapte ao tipo de pesquisa e que seja a mais acessível. Definida a generalidade e a área de estudo, optamos por adotar a técnica de fotointerpretação de fotos e aerofotos como campo virtual de uma realidade já não mais presente, pois os documentos são referentes à decada de 1970, que constitui a primeira fase da pesquisa. Selecionamos então aerofotos de 1970/71 da G.A.V. – FAB na escala 1:30.000 que contemplasse toda a área que hoje constitui o território da Reserva (SEMA 1 e 2), das quais fizemos cópias a laser, para se ter uma boa resolução, assim como cartas topográficas da SUDENE, escala 1:25.000 de 1974. A próxima etapa, foi fazer a reconstituição da área através da montagem do mosaico não-controlado proposto por Paredes (1987: 422), que afirma o mosaico “oferece um bom quadro do terreno, mas contém erros de escala e de direção”. O mosaico não-controlado consiste no ajustamento das aerofotos pela combinação de detalhes e foi montado a partir das cópias sobre uma superfície mais rígida (cartolina). Para trabalhar com o mosaico, foi feito um pré-teste com papel manteiga e após, em papel vegetal, optamos por fim, então, em trabalhar com acetato sobre o mosaico, pois este oferece ótima transparência; em seguida, passamos à confecção da imagem dos elementos sobre o acetato. As fotografias são em preto e branco e, embora ofereçam boa resolução, fez-se necessário, para melhor determinação dos elementos estruturais da população, a utilização de estereoscópio de espelho (modelo ST4 WILD HEERBRUG), bem como o uso das cartas topográficas visando trabalhar de forma comparativa e, assim, aumentar o nível de confiança na leitura da paisagem no documento. A partir de então, iniciamos as identificações e delimitações de cada formação. A utilização do acetato, permitiu destacar as estruturas pertinentes à formação vegetal com caneta para retroprojetor, atribuindo símbolos e cores diferentes para cada tipologia. Terminadas as delimitações, trabalho laboratorial, foram feitas visitas ao campo para confirmação dos dados referentes ao contorno de algumas áreas que ainda mostravam-se idênticas ao contorno expresso no documento fotográfico. Isso nos forneceu maior confiança, pois foi possível confirmar o tipo de formação da referida área contida na imagem e sua pertinente permanência na atualidade. Após delimitadas virtualmente as áreas ocupadas pelas diferentes formações, estabelecemos as coordenadas de acordo com a carta topográfica, onde tomamos como base pontos referentes e existentes na carta topográfica e nas aerofotos, como estradas, áreas desmatadas etc.; a última etapa foi a planimetria de cada formação e, para execução desta atividade, fizemos uso do planímetro analógico (modelo LASICO U.S.A.). Caracterização da paisagem vegetal Segundo o Plano Emergencial da REBIO Guaribas (1995: 09), baseando-se no Projeto RADAN Brasil (1981), a Reserva apresenta dois tipos de vegetação: a floresta estacional semidecidual das terras baixas e a savana arbórea aberta. Contudo pela descrição feita, a savana “caracteriza-se por um contínuo tapete gramíneo-lenhoso (...)” (RADAM Brasil, 1981: 501), o que nos leva a deduzir que o tapete gramíneo tratava-se da formação herbácea e o elemento lenhoso é de característica arbustiva. A partir do documento aerofotográfico referente ao ano de 1970, construimos a carta que denuncia a tipologia estrutural da população, os aglomerados populacionais e sua distribuição no espaço territorial da REBIO Guaribas (ver figura 1). Foram identificados três grandes classes de estatura da cobertura vegetal: formação arbórea, formação arbustiva e formação herbácea. De acordo com a planimetria das áreas de formação vegetal, obtivemos os resultados expressos no quadro 1. Figura 1 - mapa de cobertura vegetal da REBIO Guaribas em 1970. SEMA 1 REPRES. SEMA 2 REPRES. TOTAL ARBÓREA 178,17 ha 28,90% 2.241,45 ha 66,35% 2.419,62 ha ARBUSTIVA 227,72 ha 36,95% 740,88 ha 21,94% 968,6 ha HERBÁCEA 185,87 ha 30,15% 133,92 ha 3,96% 319,79 ha SEM VEGETAÇÃO 24,64 ha 4,00% 261,95 ha 7,75% 286,59 ha TOTAL 616,4 ha 100,00% 3.378,20 ha 100,00% 3.994,60 ha Quadro 1 - formações vegetais no território da REBIO Guaribas em 1970. Diante deste quadro é possível avaliar a representação de cada formação vegetal de acordo com a área especificada. Foramções vegetais da SEMA 1 (616,4ha) 1970 SEM VEGET. 4% HERBÁCEA 30% ARBUSTIVA 37% ARBÓREA 29% Formações vegetais da SEMA 2 (3.378,2ha) 1970 SEM VEGET. HERBÁCEA 8% 4% ARBUSTIVA 22% ARBÓREA 66% Fazendo uma interpretação comparativa entre as áreas ocupada pelas formações vegetais, e o que nos chama a atenção imediatamente é a presença de espaço sem ocupação vegetal. Esse elemento vazio é decorrente de antropismos como estradas ou mesmo áreas sem vegetação. Em um outro momento analítico, fica destacado que na área referente à SEMA 1, há quase um equilíbrio em relação à ocupação espacial pela diversidade tipológica populacional, predominando a formação arbustiva sobre as demais: herbácea e arbórea. Em relação a área referente a SEMA 2, há uma significativa mudança em termos de ocupação espacial pela população vegetal, pois a formação arbórea é predominante, seguida pela arbustiva e, em pequena concentração, surge a formação herbácea. Há um volume populacional diferenciado entre as áreas, pois há na SEMA 2 maior presença da tipologia florestal, sendo esta decorrente da combinação de diversos fatores, dentre eles acreditamos que a presença da rodovia BR-101 junto à área 1, se torna um fator antrópico importante pois é, a nosso ver, agente facilitador degradante, tanto referente ao desmatamento como ao próprio elemento fogo, sendo esta uma situação típica nos períodos de longas estiagens, pois o fluxo de veículos pela rodovia é elemento que proporciona essa situação devido ao uso de cigarros por parte dos motoristas. Considerações Finais A produção do mapa com a tipologia estrutural da população florestal tem um significado administrativo, pois se torna instrumento valioso não só para o planejamento e gestão da área, como também é um documento que realça a dinâmica da paisagem contida no território da Unidade de Conservação. A paisagem realçada no documento, é na realidade, uma formação vegetal em regeneração pois, segundo informações de moradores do lugar, aquela vegetação foi quase que totalmente degradada por desflorestamento antes e ao longo da década de 1970. Nessa perspectiva, ressaltamos as proposições de De Martonne quando afirma: “a distribuição geográfica [das plantas]1 não é exclusivamente condicionada pelo meio físico(...)”(1953: 32). Contudo, com a implantação da Reserva Biológica na década de 1980, a vegetação ganha mais força em relação ao uso antrópico, se regenerando assim de forma significativa. Bibliografia DE MARTONNE, Emmanuel. Panoramas da geografia. Vol 1 e 2. Lisboa: Edições Cosmos, 1953. DOLFUSS, Olivier. A análise geográfica. Série saber atual. São Paulo: Difusão Européia do Livro, 1973. LOCH, Carlos. A interpretação de imagens aéreas: noções básicas e algumas aplicações nos campos profissionais. Série didática. Florianópolis: Editora da UFSC, 1984. HARTSHORNE, Richard. Propósitos e natureza da Geografia. Trad. Thomaz Newlands Neto. São Paulo: HUCITEC: EDUSP, 1978. MANUAL TÉCNICO DA VEGETAÇÃO BRASILEIRA. Série manuais de Geocências. Rio de Janeiro: Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, 1992. PAREDES, Evaristo Atêncio. Introdução à aerofotogrametria para engenheiros. Maringá: CONCITEC, 1986. PLANO DE AÇÃO EMERGENCIAL. Reserva Biológica Guaribas. Brasília: Programa Nacional do Meio Ambiente, 1995. RAWITSCHER, Felix. Elementos básicos de Botânica: uma introdução ao estudo de Botânica. 3ª ed. São Paulo: Editora Centro Universitário, (s.d.). TAVARES, João de Lira. A Parahyba. Vol 2. Parahyba: Imprensa Official, 1910. 1 Destaque inserido por nós. TROPPMAIR, Helmut. Metodologias simples para pesquisar o meio ambiente. São Paulo: GRAFF SET, 1998.