O Modelo Ricardiano KRUGMAN & OBSTFELD, CAP. 2; WTP, CAP. 5; NBERWP7195 OBS.: ESTAS NOTAS DE AULA NÃO FORAM SUBMETIDAS A REVISÃO, TENDO COMO ÚNICA FINALIDADE A ORIENTAÇÃO DA APRESENTAÇÃO EM CLASSE. COMENTÁRIOS SÃO BEM VINDOS E PODEM SER ENVIADOS A [email protected]. REPRODUÇÃO SOB QUAISQUER MEIOS OU DISTRIBUIÇÃO PROIBIDA SEM AUTORIZAÇÃO PRÉVIA DO AUTOR. Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 1 15/02/2007 INTRODUÇÃO o Economia Internacional: Análise da lógica subjacente aos fluxos internacionais de recursos reais e financeiros, incluindo aspectos institucionais. o Comércio Internacional é o conjunto de transações envolvendo fluxos reais de bens, serviços e fatores entre diferentes nações. o Comércio Internacional: fatos notáveis (em lista apenas exemplificativa) – a) Volume internacional do Comércio aumenta drasticamente após o término da 2a.GG: início da “Globalização” b) Volume de comércio internacional no séc. XIX era bastante similar, quando medido em termos de participação nos PIBs, ao observado em meados do séc.XX c) Apesar da similaridade entre os volumes de comércio internacional anterior e posterior ao entre-guerras, o grau de abertura das economias aumentou muito: o Considerando apenas a participação do comércio como porcentagem do valor da produção de bens comercializáveis, o comércio aumenta substancialmente após a 2a. GG se comparado ao observado antes da 1a. GG; o O comércio internacional de serviços (anteriormente considerados, via de regra, “bens não comercializáveis, também aumentou muito) o A importância e inserção das empresas multinacionais é uma característica notável do final do séc. XX. d) Relevantes desenvolvimentos institucionais ocorreram na órbita institucional: GATT, OMC e diversos arranjos comerciais discriminatórios. o Teoria do Comércio Internacional: o O fundamento lógico econômico para a existência e funcionamento do Comércio Internacional é idêntico ao usado para entender a existência dos mercados domésticos, tendo as transações internacionais como peculiaridades a ocorrência de (normalmente) maiores custos de transportes e seguros, de barreiras artificiais ao comércio (tarifas, cotas, restrições administrativas, por exemplo), de diferentes moedas e sistemas políticos e jurídicos envolvidos. Os fundamentos lógicos, entretanto, são idênticos. o Apesar de ser um tema básico e fundante em Economia, a análise do comércio (internacional e interno) apresenta inúmeros desafios e questões não resolvidas. Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 2 15/02/2007 o A grande utilidade da abordagem econômica moderna aos complexos temas comerciais está na apresentação de argumentos simples, compreensíveis e testáveis para que se possa ampliar o potencial de ganho de bem-estar associado às trocas nas sociedades e entre elas, assim como no potencial de antecipar e mitigar os potenciais conflitos inerentes. o A análise moderna dos temas de comércio internacional deve muito a economistas e filósofos do passado, desde Hume, passando por Smith, Ricardo, mais já no séc. XX, Hecksher e Ohlin. As contribuições e análises, entretanto, não cessam. Hoje já se fala na Nova Teoria do Comércio Internacional, com Krugman e Helpman como expoentes, notando-se sensíveis ganhos de entendimento com a evolução e aprimoramento das teorias e técnicas econômicas e econométricas de análise. 1. Recordação de Conceitos o Função de Produção – é uma relação tecnológica (problema de engenheiros, não de economistas), que associa as quantidades produzidas de determinado bem ou serviço por intervalo de tempo à utilização de insumos no mesmo intervalo de tempo. Lembrese que não se produz um bem ou serviço com capital ou trabalho diretamente, mas com o uso dos serviços do capital ou do trabalho. Q x = f x (K , L, Z , ") o Produtividade Marginal (PMg) e Produtividade Média (PMe) – são indicadores formais de determinadas características das tecnologias. Ajudam no sentido de melhor explicitar as propriedades da função de produção. ∂Q x = PMg K ; ∂K Qx = PMeK K ∂Q x = PMg L ; ∂L Qx = PMe L L ∂Q x = PMg Z ; ∂Z Qx = PMeZ Z o “Lei” dos Rendimentos Marginais Decrescentes: Um aumento na utilização de um fator de produção mantendo os demais constantes tende, empiricamente, a implicar na redução da Produtividade Marginal do fator aumentado.(O importante é a existência de pelo menos um fator fixo, para a caracterização da “lei”). Algebricamente, supondo que todos os fatores diferentes de L estejam fixos, a “Lei” poderia ser escrita da seguinte forma: ∂PMg L <0 ∂L Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 3 15/02/2007 o O símbolo ∂ , usado quando a diferenciação é parcial, já indica que apenas o insumo considerado no denominador da derivada está sendo alterado. Todos os demais argumentos da função produção são supostos constantes no cálculo de uma derivada parcial. o A “Lei” dos Rendimentos Marginais Decrescentes, ao supor a presença de pelo menos um fator fixo, é aplicável a situações de curto-prazo. Lembre-se que, em Economia, curto e longo prazos não se distinguem pelo número de meses ou anos considerados. No curto-prazo existe algum fator fixo, no longo prazo todos os fatores são variáveis. o Maximização dos Lucros na produção de uma mercadoria: RMg=CMg a) Custos Marginais, supondo que L seja o único fator variável e que seu preço seja dado e igual a w (os custos marginais indicam qual a variação nos custos totais associada a (derivada de) uma alteração na quantidade produzida): CT = CF + CV (Q ) = CF + wL Q = f (K , L ) dCT ∂CV d (wL ) dL 1 = = =w =w dQ dQ dQ dQ PMg L b) Receita Marginal, supondo mercados competitivos (preços dados): RT = PQ dRT d (PQ ) = =P dQ dQ c) Logo, para a maximização dos lucros: P= w PMg L 2. Conceitos Introdutórios da Teoria do Comércio o Razão básica para a existência de comércio internacional: OBTENÇÃO DE VANTAGENS PELOS PAÍSES ENVOLVIDOS. Principais vantagens: a) Ganhos com as trocas b) Ganhos com a especialização o Costuma haver potencial de comércio internacional, entre outros motivos, quando: a) Os países são diferentes Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 4 15/02/2007 b) Pode-se auferir economias de escala (redução nos custos médios de produção à medida em que a escala produtiva aumenta – é um conceito de longo-prazo) o Teoria das Vantagens Absolutas - Adam Smith: O comércio entre os países é explicado em termos das vantagens absolutas, se um país é mais eficiente do que outro (tem vantagens absolutas) na produção de uma mercadoria, e é menos eficiente do que o outro na produção de outra mercadoria (desvantagem absoluta), então existe potencial de ganhos decorrentes do comércio internacional. Cada país se especializa na produção da mercadoria em que tem vantagens absolutas. o Teoria das Vantagens Comparativas - David Ricardo: O comércio entre os países é explicado em termos das vantagens comparativas, se um país tem custos de oportunidade menores do que outro (tem vantagens comparativas) na produção de uma mercadoria, então existe potencial de ganhos decorrentes do comércio internacional. Cada país se especializa na produção da mercadoria em que têm vantagens comparativas, mesmo que não tenha vantagens absolutas em nenhum setor. o Custo de Oportunidade (=Custo Econômico): é o custo medido pelos valores (perdidos, não ganhos) com a utilização dos recursos na segunda melhor alternativa ao seu uso. A primeira melhor alternativa - supõe-se - é aquela em que os recursos estão sendo efetivamente usados. Na noção de custo de oportunidade, os desembolsos, entradas ou saídas monetárias não são importantes. O que interessa é o uso potencial dos recursos. o Ilustração: Tabela 1 Portugal tem vantagens absolutas na produção de vinho e Inglaterra tem vantagens absolutas na produção de tecido. Portugal tem vantagens comparativas na produção de vinho e Inglaterra tem vantagens comparativas na produção de tecido. Portugal Inglaterra Vinho (barris/hora de trabalho) 6 1 Tecido (rolos/hora de trabalho) 4 5 Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 5 15/02/2007 Tabela 2 Inglaterra não tem vantagens absolutas na produção de vinho ou de tecido. Portugal tem vantagens comparativas na produção de vinho e Inglaterra tem vantagens comparativas na produção de tecido. Portugal Inglaterra Vinho (barris/hora de trabalho) 6 1 Tecido (rolos/hora de trabalho) 4 2 3. Modelo Básico de Ricardo – Modelando as Economias Individualmente o Característica básica do modelo Ricardiano: Utilização de um único fator de produção para explicar o comércio: o trabalho (teoria do valor do trabalho): a) O trabalho é suposto como o único fator escasso de produção; b) Toda a mão de obra é homogênea e recebe a mesma remuneração por hora em todos os setores (a remuneração por hora de trabalho só pode diferir entre os países, não dentro dos países); o A produtividade marginal da mão de obra é constante (PMgL= PMeL = cte.). o 2 países x 1 fator x 2 bens a) país doméstico x país estrangeiro (representado por “*”) b) único fator escasso: “L” c) 2 bens podem ser produzidos em cada país: queijo e vinho (1) Quantidade produzida de queijo na economia doméstica: QQ (2) Quantidade produzida de vinho na economia doméstica: QV (3) Quantidade produzida queijo na economia estrangeira: QQ* (4) Quantidade produzida de vinho na economia estrangeira: QV* d) “necessidades de unidades de trabalho na produção”: coeficientes de insumoproduto - aij indica a quantidade do insumo i necessária à produção de uma unidade da mercadoria j. Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 6 15/02/2007 o Exemplo para a Produção de Queijo na economia doméstica : QQ = f Q (LQ ); dQQ dL = PMg LQ = 1 1 ⇒ a LQ = a LQ PMg LQ PMg LQ = cte ⇒ PMg LQ = PMe LQ LQ 1 1 1 1 ⇒ a LQ = = = = ⇒ a LQ PMg LQ PMeLQ QQ QQ LQ a LQ QQ = LQ o Exemplo para a Produção de Vinho na economia estrangeira : QV* = f V* (L*V ) ; dQV* 1 1 * * = PMg LV = * ⇒ a LV = * * dLV a LV PMg LV * a LV QV* = L*V e) Cada país pode produzir dois bens (vinho e queijo), o conjunto de possibilidades de produção é o conjunto composto por todas as possíveis combinações de produções de queijo e vinho no país. O fator limitante, dada a tecnologia, é apenas a quantidade disponível de mão de obra em cada país. Assim, o conjunto de possibilidades de produção para o país local pode ser descrito da seguinte forma: Tecnologias: ( ) dQ Q ( ) QQ dQV 1 = PMg LV = = ⇒ QV a LV = LV dL LQ a LV QQ = f Q LQ ; QV = f V LV ; dL = PMg LQ = 1 a LQ = QQ LQ ⇒ Q Q a LQ = L Q Restrição de Trabalho: LQ + LV ≤ L Conjunto de Possibilidades de Produção (usando as restrições tecnológicas na restrição de trabalho): a LQ QQ + a LV QV ≤ L , ou Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 7 15/02/2007 QV ≤ a LQ L − QQ a LV a LV Graficamente: QV FPP : QV = L a LQ − QQ aLV aLV Cjto. de Possib. de Produção QQ f) A Fronteira de Possibilidades de Produção ( FPP : QV = L aLQ − QQ ) é a curva aLV aLV (neste caso de tecnologia linear, uma reta) que mostra as possibilidades máximas de produção de um país. Sobre a FPP, todos os recursos estão completamente empregados: pleno emprego. A área abaixo da FPP corresponde a situações possíveis, que podem ser observadas na prática, mas em que não há pleno emprego. Os pontos acima da FPP não são factíveis (com os recursos e tecnologias disponíveis). g) Note que a inclinação da FPP é igual a a LQ dQV =− , indicando qual a redução dQQ a LV necessária na produção de vinho para que (i) a produção de queijo possa aumentar, e, (ii) os recursos permaneçam plenamente empregados. É um valor negativo e de magnitude definida pela razão das “necessidades de mão de obra” na produção de queijo e de vinho. Para conseguir uma unidade adicional de queijo, são necessárias a LQ horas de trabalho. Como os recursos estão plenamente empregados, esta hora de trabalho precisará sair da produção de vinho, de forma que a quantidade produzida de vinho diminuirá em − a LQ a LV unidades. h) a LQ a LV , como ficou claro, pode ser interpretado como o Custo de Oportunidade Relativo da Produção de Queijo. A produção de uma unidade adicional de queijo custaria a LQ a LV unidades de vinho “não produzidas”. No caso de tecnologias Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 8 15/02/2007 lineares, como a considerada, o custo de oportunidade é constante. Geralmente, entretanto, a inclinação da FPP e, portanto, os custos de oportunidade relativos, costumam variar (como será visto em tópicos subseqüentes). o Sendo conhecidos os preços dos produtos, PQ e PV, é possível calcular os salários diretamente. A relação entre custos de produção e preços do produto depende, é claro, do tipo de estrutura de mercado considerada. Em se tratando de mercados competitivos, como se supõe aqui, a maximização dos lucros ocorre com RMg=CMg, e os lucros (econômicos) são nulos. Assim: PQ = PQ w = wa LQ ⇒ wLQ = PMg LQ a LQ da mesma forma: wLV = PV a LV o Note que sendo o trabalho homogêneo, os trabalhadores se deslocam para os setores que pagam maiores salários. Dados o preço dos bens e as tecnologias, para que existam trabalhadores dispostos a trabalhar em ambos os setores, é necessário que os salários pagos os dois setores sejam iguais. Assim, para que a economia produza ambos os bens é necessário que wLV = PQ PV = = wLQ a LV a LQ ou, rearranjando os termos: PQ PV = a LQ a LV o Conclui-se, assim, que para que haja a produção de ambos os bens, o preço relativo do queijo (em termos de vinho) precisa ser igual ao custo relativo de produzir queijo (em termos de vinho). Se esta condição não se verificar, a economia irá se especializar na produção do bem que melhor remunere aos trabalhadores: PQ PV PQ PV > < a LQ a LV a LQ a LV - especialização na produção de queijo - especialização na produção de vinho Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 9 15/02/2007 o Não se dispõe, ainda, das informações necessárias à determinação dos preços dos bens, algo que exigiria a análise de aspectos do lado da demanda (os preços são sempre determinados pela interação entre as forças de oferta e de demanda!). Sabemos, contudo, que se ambos os bens estiverem sendo produzidos, os preços serão dados pela inclinação da FPP. 4. Modelo Básico de Ricardo – Modelando o Comércio o Até o momento, a análise ocorreu para uma economia individual (situação de autarquia ou “autárquica”). Para estudar a lógica do comércio internacional, considerações adicionais precisam ser feitas. o Vamos supor que as economias tenham custos de oportunidade na produção de queijo (ou de vinho) diferentes. Isto pode decorrer de diferenças internacionais: a) nas tecnologias; b) nas preferências (ou gostos). c) Se houvesse mais um fator de produção escasso, seria possível justificar o comércio, ainda, pelas diferenças nas dotações dos fatores. o O caminho mais simples, como ainda não se discutiram os aspectos de demanda (preferências), é supor que as tecnologias de produção sejam diferentes. Assim, vamos admitir que a economia doméstica seja mais produtiva do que a estrangeira na produção de queijo. Isto poderia ser posto da seguinte forma: a LQ a LV < * a LQ * a LV o É evidente que isto implica em preços relativos de queijos (em termos de vinho) menores na economia doméstica do que no estrangeiro. Há, assim, potencial para ganhos com o comércio, fundamentados em vantagens comparativas (custos de oportunidade diferentes). Note que as necessidades de mão de obra doméstica na produção dos dois bens podem ser menores do que as estrangeiras em termos absolutos e, ainda assim, o comércio ser factível. Para que haja comércio, no modelo de Ricardo, é suficiente (e necessário) que: a LQ a LV ≠ * a LQ * a LV . o Evidentemente, para que o país local tenha interesse em exportar, é necessário que consiga trocar os bens no mercado mundial a termos pelo menos iguais (senão melhores) do que os que dispõem domesticamente. A mesma lógica se aplica para o país estrangeiro. Com as suposições feitas, a economia doméstica exportará queijo e importará vinho, nunca o contrário. Assim, se os preços internacionais do queijo forem Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 10 15/02/2007 menores do que PQ PV = a LQ a LV , esta economia estará fora do comércio internacional. Da mesma forma, se o preço do vinho no mercado internacional (em termos de queijo) for menor do que aquele praticado dentro do país com vantagem comparativa na produção de vinho, não haverá comércio internacional. o Exemplo: Suponha que o país doméstico gaste 1 hora de trabalho para produzir 1 quilo que queijo ( a LQ = 1 ) ou 2 horas de trabalho para produzir 1 litro de vinho ( a LV = 2 ). O país estrangeiro, para produzir o mesmo quilo de queijo gasta 6 horas de * * trabalho ( a LQ = 6 ) e 3 horas para produzir um litro de vinho( a LV = 3 ). a) Calcule os custos de oportunidade relativos para cada país: a LQ a LV 1 = = 0,5 ; 2 * a LQ a * LV = 6 =2 3 b) Sendo os custos de oportunidade diferentes (a nação doméstica tem vantagem comparativa na produção de queijo e a estrangeira na produção de vinho, mesmo que estas vantagens não sejam absolutas para o país estrangeiro), pode haver comércio. Atente para as unidades utilizadas: a LQ (horas/quilo de queijo ) a LV (horas /litro de vinho ) = 1 (1/quilo de queijo ) = 0,5 litros de vinho quilo de queijo 2 (1 /litro de vinho ) c) O intervalo de preços em que este comércio interessa aos países precisa ser definido: o A economia que tem vantagens comparativas na produção de queijo (economia doméstica), não aceitará trocar menos do que a LQ a LV = 0,5 litros de vinho por quilo de queijo. o A economia que tem vantagens comparativas na produção de vinho (economia estrangeira), não aceitará trocar mais do que * a LQ a * LV = 6 = 2 litros de 3 vinho por quilo de queijo. o Assim, os preços internacionais para os quais o comércio é factível estão compreendidos entre: a LQ a LV Prof. Roland Veras Saldanha Jr = 0,5 ≤ Página 11 PQ PV ≤2= * a LQ * a LV 15/02/2007 o As condições para que o comércio seja factível podem ser mostradas graficamente e, de pronto, revelam as vantagens potenciais com o comércio: QV Sem Comércio Com Comércio QQ Figura 1 Q*V Com Comércio Sem Comércio Q*Q Figura 2 a) Aos novos preços (de comércio), as possibilidades de produção em cada país permanecem iguais (linha cheia), mas as possibilidades de trocas (linha tracejada) aumentam. b) Supondo, como nas figuras, que o comércio implica a especialização completa na produção dos bens (cada país se especializa na produção do bem para o qual tem vantagens comparativas), a possibilidade de trocar os bens a termos mais favoráveis no mercado mundial faz com que as possibilidades de consumo aumentem, mesmo sem alteração nas tecnologias e/ou nas dotações de fatores. o Dentro do intervalo de preços relevante, a determinação dos preços relativos passa a ser internacional. Neste caso, a determinação dos preços precisa ser compreendida sob um arcabouço de equilíbrio geral: todos os mercados, para todos os produtos e países são avaliados simultaneamente. Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 12 15/02/2007 o Há diversos caminhos para a modelagem do equilíbrio geral internacional, aqui nos restringiremos ao utilizado por Krugman e Obstfeld: A construção do equilíbrio baseado nas Curvas de Demanda Relativa e de Oferta Relativa Mundiais (Fig. 2.3). o Para compreender o raciocínio, siga os seguintes passos: a) Para a Curva de Oferta Relativa Mundial o Determine o Intervalo Preços Relativos para o qual o comércio internacional é possível. Coloque os limites no eixo vertical de um gráfico. o Lembre-se que para que um dos países esteja produzindo ambos os bens, é necessário que o preço relativo do queijo, em termos de vinho, seja igual ao seu custo relativo de produção: (1) Para o país doméstico: (2) Para o país estrangeiro: PQ PV PQ* PV* = = a LQ a LV * a LQ * a LV o Para que em ambos os países haja especialização completa, portanto, é necessário que os preços relativos estejam dentro do intervalo (sem igualdade!): a LQ a LV < PQ PV < * a LQ * a LV o Mas a especialização completa significa que toda a mão de obra no país local está alocada no setor em que o país tenha vantagens comparativas. Assim, mantendo a suposição de que o país local tenha vantagens comparativas na produção de queijos, as produções totais serão, em cada país: (1) Para o país doméstico: QQ = L ; a LQ (2) Para o país estrangeiro: QQ* = 0; QV = 0 QV = L* * a LQ o Finalmente, no eixo horizontal, perceba que estão sendo medidas a produção mundial de queijo em termos da produção de vinho [(QQ + QQ* ) (QV + QV* )] . b) Para a Curva de Demanda Relativa Mundial: Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 13 15/02/2007 o Aqui apenas se supõe que, como costuma acontecer, um preço relativo maior do queijo estimule a sua substituição por vinho (Efeito Substituição). Assim, a curva de demanda relativa mundial é negativamente inclinada. c) Graficamente (w=vinho (wine) e c=queijo (cheese)): 5. Ganhos com o comércio o A partir deste momento, vamos supor que ocorra a especialização completa em ambos os países. Assim, observando as figuras 1 e 2, nota-se que o país local só produz queijo, mas consegue trocá-los a preços mais favoráveis do que sob autarquia. O mesmo fenômeno ocorre no país estrangeiro, que se especializa na produção de vinho. o Note que com as produções locais e estrangeiras, as possibilidades de trocas internacionais ampliam as possibilidades de consumo dos dois países (linhas tracejadas nas duas figuras). A inclinação da linha internacional de preços, dada pelo preço de equilíbrio mundial, permite que ambos os países ganhem com o comércio, mesmo sem qualquer mudança tecnológica ou nas dotações de fatores. o Tudo ocorre como se, com o comércio, fosse possível produzir queijo (ou vinho) indiretamente com vinho (ou queijo) que se deixa de produzir dentro do país para importar. Trata-se de uma re-alocação das produções mundiais no sentido de permitir que os países mais eficientes (em temos relativos) na produção de cada bem, se especialize na sua produção. Os benefícios internacionais são óbvios: ganho de bem-estar em todos os países associados à alocação mais eficiente dos recursos. Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 14 15/02/2007 6. Salários Relativos o Imagine que o preço relativo internacional (compatível com a especialização completa em ambos os países) seja igual. PQ PV = 1 . Isto seria compatível com um preço monetário do queijo igual a $12 e do vinho também igual a $12 (ou quaisquer outros valores iguais por unidade). * (1) Usando os dados da Tabela 2, em que a LQ = 1 , a LV = 2 , a LQ =6 e * a LV = 3. (2) E relembrando a relação entre salários e preços: wLV = PV PQ ; = wLQ a LV a LQ (3) Pode-se perceber que os salários serão iguais a wLQ = * = wLV PQ a LQ = 12 = $12 1 PV* 12 = = $4 * 3 a LV (4) Efetivamente, o comércio ocorre pelas diferenças nos custos de oportunidade que se refletem na diferença entre os salários monetários. Uma das explicações modernas para as diferenças salariais entre os países (por que um operário da construção civil no Japão recebe um salário muito maior por hora do que um operário com as mesmas habilidades no Brasil), encontra-se exatamente nos diferenciais de produtividade. Para melhor avaliar isto, divida os salários nominais (cotados numa mesma moeda) para obter o salário doméstico relativo: wLQ w * LV = $12 =3 $4 (5) Veja a Tabela 2-3 no livro texto para evidências empíricas que suportam a efetiva existência de uma forte correlação entre salários e produtividades. 7. Concepções equivocadas sobre as Vantagens Comparativas b) Mito 1: o livre comércio só é benéfico se o país for suficientemente forte para enfrentar a concorrência estrangeira o Vantagens comparativas x absolutas Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 15 15/02/2007 c) Mito 2: a concorrência estrangeira é desonesta e prejudica outros países quando baseada em salários baixos (empobrecimento da mão de obra) o Salário absoluto não é boa referência d) Mito 3: o comércio explora um país e o torna pior economicamente se seus trabalhadores recebem salários muito mais baixos que os trabalhadores de outras nações o O comércio apenas expõe as ineficiências relativas, não as cria. 8. Vantagens comparativas com diversos bens: o A limitação do modelo apresentado, que considera a possibilidade da produção de apenas dois bens por país pode ser superada com facilidade. (1) Considere que cada país possa produzir n bens, n = 1,..., N. (2) Tome as produtividades relativas de cada um destes bens no país doméstico, em termos das internacionais, e coloque-as em ordem crescente: a a L1 a L 2 a L 3 < * < * " < LN * * a L1 a L 2 a L 3 a LN (3) Mantendo a suposição de que a mão de obra seja homogênea dentro de cada país (os trabalhadores de um setor podem mudar para o outro imediatamente e sem custos ou perda de produtividade), pode-se esperar que os produtos sejam produzidos nos países em que tenham menor custos para fazê-lo: (4) A referência, então, são os salários relativos mundiais, pois para qualquer bem “i”: a Li a Li* Pi w* = w = w Pi w* (5) De forma que, a ordenação acima poderia ser re-escrita: w* wL*1 wL* 2 wL* 3 < < " < LN wL1 wL 2 wL 3 wLN ou Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 16 15/02/2007 w wL1 wL 2 wL 3 > * > * " > LN * * wL1 wL 2 wL 3 wLN o Suponha, agora, que os salários relativos sejam conhecidos, e iguais a wLk .O * wLk país doméstico produzirá os bens para os quais seus custos relativos sejam menores que * wLk , deixando os demais bens para o país estrangeiro. Bens cujo wLk custo relativo sejam iguais a wLk , podem ser produzidos nos dois países.: * wLk o A ilustração gráfica desta generalização para N bens pode ser feita, mas exige alterações em relação ao gráfico da demanda e oferta relativas mundiais de queijo, mostrado anteriormente. Entenda-as: (1) Como conhecemos o critério de “corte”, baseado em wLk , é desejável * wLk que esta variável apareça no eixo vertical, no lugar dos preços relativos. (2) A oferta relativa mundial, então, deixa de se referir a mercadorias, passando a medir a relação entre a quantidade de mão de obra local e estrangeira (L/L*). Esta é uma magnitude fixa (supondo forças de trabalho constantes), independente dos salários relativos. (3) A curva de demanda relativa (por trabalho), é definida pelos salários reais pagos para produzir as diferentes mercadorias. Trata-se de uma curva de demanda derivada, posto que conhecendo a demanda por trabalho (na produção de cada tipo de bem), serão conhecidas (indiretamente) as demanda pelos bens produzidos com esta mão de obra. (4) Graficamente: Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 17 15/02/2007 o No gráfico observa-se que a economia doméstica se especializa na produção de maçãs, bananas e caviar. O país estrangeiro produz tâmaras e “enchiladas”. Esta alocação internacional da produção é determinada pelo salário relativo igual a 3. o As seções negativamente inclinadas da curva de demanda relativa por trabalho decorrem das mudanças abruptas na alocação mundial da produção quando os salários relativos se alteram. A elevação nos salários reais dos trabalhadores domésticos em relação aos salários estrangeiros faz com que a demanda pelos bens domésticos diminua (os estrangeiros estão mais pobres e importam menos), o que diminui, internamente, a demanda por trabalho. Se os salários domésticos aumentarem o suficiente para tornar a produção de determinado bem mais barata no estrangeiro, passa-se a uma seção horizontal da curva de demanda relativa por trabalho. o Nas seções horizontais da curva de demanda relativa por trabalho, é possível que ambos os países produzam o bem associado. o Conclui-se que os salários relativos e os tipos de bens que serão produzidos em cad país dependem: (1) Do tamanho relativo das forças de trabalho dos países (L/L*) – que determina a posição da curva de oferta relativa; (2) Das produtividades relativas e das preferências dos consumidores dos dois países – que determinam a posição e a forma da demanda relativa por trabalho. 9. Evidências Empíricas sobre o Modelo Ricardiano Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 18 15/02/2007 o O Modelo Ricardiano, entendidas suas limitações, é um ótimo instrumental para explicar a realidade: (1) Estudo de MacDougall para o pós II GG, revela que, apesar de mostrar desvantagens absolutas em quase todos os setores, a Inglaterra comercializava com os EUA de forma importante, dando suporte à hipótese das vantagens comparativas. (2) Bela-Balassa compara as produtividades relativas dos EUA e GrãBretanha, percebendo que os EUA tendem a exportar mais aqueles produtos com maior produtividade relativa (menores custos de oportunidade relativos) (3) Apesar de mostrarem desvantagens absolutas na produção de tecido e vestuário, países menos industrializados como China e Brasil, exportam estes produtos para os países industrializados. o Principais Inconsistências do Modelo Ricardiano (1) Presença de bens não comercializáveis limita a especialização internacional; (2) Desconsidera a distribuição de renda dentro do país, que pode ter efeitos redutores do bem estar; (3) Desconsidera diferenças na qualidade e quantidade dos diferentes recursos para explicar as trocas internacionais; e, (4) Desconsidera a possibilidade de economias de escala pra explicar o comércio internacional entre países muito parecidos. Perguntas Problemas do Capítulo 2 – Krugman & Obstfeld: Todas Bibliografia Bordo, Michael D., Barry Eichgreen, and Douglas A. Irwin. "Is Globalization Today Really Different Than Globalization a Hundred Years Ago?." NBER WP. W7195. USA, June 1999 Caves, Richard E., Frankel, Jeffrey A., Jones, Richard W. World, Trade and Payments: An Introduction. USA: Addison Wesley, 1999. Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 19 15/02/2007 Krugman, Paul R., Obstfeld, Maurice. Economia Internacional: Teoria e Política, 4a. Edited by. Brasil: Makron Books, 1999. Prof. Roland Veras Saldanha Jr Página 20 15/02/2007