O GENOCÍDIO EM RUANDA 1994 COMISSÃO DOS DIREITOS HUMANOS / COMITÊ HISTÓRICO DIRETORES JÚLIA BONIFÁCIO LAURA JAMAL CAIXETA GABRIEL VALADARES PROFESSORES REDATORES FLÁVIA DIAS DE OLIVEIRA JOYCE DE LIMA PEDRA MARIA RAQUEL REIS COLÉGIO BATISTA MINEIRO 1 INTRODUÇÃO A questão dos direitos humanos se encontra em pauta nas discussões internacionais, e principalmente o assunto da violação desses direitos em países pautados como instáveis. Os países considerados instáveis são normalmente carentes, não possuem uma estrutura política interna consolidada, tendo como uma das grandes consequências o surgimento de conflitos internos. Ruanda foi uma colônia belga, em que existe uma clara divisão étnica, entre hutus e tutsis, estes possuem uma rivalidade muito grande; os hutus correspondiam aproximadamente a 85% de sua população. Em 1962, na independência da nação ruandesa, os hutus se tornaram a classe política dominante, porém tradicionalmente os tutsis eram considerados a elite do país; durante vários anos este novo governo tomou medidas de repressão contra os tutsis e assim muito destes fugiram do país nesta época, pelo medo da perseguição, violência, etc. Em 1994 ocorre um dos maiores massacres étnicos da história em Ruanda, em que a posição da ONU foi questionada durante e depois do conflito. CONTEXTO HISTÓRICO No séc. XIX, quando os europeus chegaram a Ruanda, estes criaram um estereótipo de uma raça de guerreiros poderosos, que detinham rebanhos de gado (tutsis), e uma raça de camponeses (hutus) que eram subordinados da primeira raça; julgando que esta era a tradição da região. Em 1885, as potências europeias se reuniram em Berlim para traçar as fronteiras dos territórios africanos colonizados, as delimitações fronteiriças não condiziam, muitas vezes, com as tradições políticas ou territoriais antes existentes. Diversos reinos e povos que detinham sua própria história e sua cultura foram divididos ou acumulados sobre o domínio dos europeus. Porém Ruanda e Burundi não foram reformulados territorialmente, estes dois países foram instituídos como províncias alemãs. Em 1895 a morte do chefe Rwabugiri colocou Ruanda numa grande instabilidade política e em 1897, a Alemanha começa a instituir os primeiros centros administrativos no país africano. A estrutura política em Ruanda, após a intervenção alemã, ficou conhecida como um “colonialismo dual”, em que as elites tutsis utilizaram a proteção e a liberdade de ação dada pelos alemães para efetivar sua hegemonia sobre os hutus. Após a I Guerra Mundial a Liga das Nações repassou à Bélgica a colônia de Ruanda, neste momento as nomenclaturas se tornaram identidades étnicas díspares; os belgas utilizaram desta questão como o aspecto central na sua política de colonização. Os novos colonizadores enviaram a Ruanda chefes administrativos e militares, e ainda cientistas. O propósito dos cientistas era analisar as características de hutus e tutsis, como o tamanho das pessoas, as características faciais, etc., para reiterar as próprias ideias de dominação e submissão já existentes no país. Em que os tutsis detinham dimensões “mais nobres” e os hutus dimensões “mais rústicas”. Em 1930, a elite de Ruanda adquiriu autonomia dos belgas para arrecadar impostos e explorar o trabalho dos hutus. Três anos depois os colonizadores, para aprimorarem seu sistema de segregação, solicitaram a criação de carteiras de identidade que rotulavam cada cidadão de acordo 2 com sua “etnia” (os hutus, que representavam a maioria da população, os tutsis e os twa). A discriminação em relação aos hutus começou a ser difundida nas escolas, os tutsis possuíam favorecimentos na educação, e nas oportunidades de trabalho em cargos públicos e administrativos. Os tutsis temiam a possibilidade de no futuro serem rechaçados, porém os belgas impunham a forma que os hutus deveriam ser tratados. Gourevitch (2006) relata as palavras de um tutsi em relação a ordem colonial imposta pela Bélgica: “Você açoita um hutu ou nós açoitamos você”. Desta forma, o princípio de uma identidade nacional coletiva foi destruído após a colonização de Ruanda. Após a II Guerra Mundial, autoridades internacionais da Igreja Católica passaram a se aproximar da causa hutu e os incentivavam a se unirem por mudanças políticas. Concomitantemente, as Nações Unidas faziam certa pressão para a independência do Estado ruandês, e desta forma a Bélgica foi induzida a estabilizar a situação de sua colônia para repassá-la ao poder local. Desta forma, políticos hutus passaram a requerer o poder do Estado justificando pelo princípio da maioria e por uma revolução social. Em 1959, o espancamento de um ativista político hutu por um grupo de ativistas tutsis foi a causa imediata para atos de violência sistemáticos entre os dois grupos. A revolução social reivindicada pelos hutus ocorreu, em uma semana hutus assassinaram e torturaram uma grande porcentagem de tutsis. Forças belgas que ainda se encontravam em Ruanda mudaram o seu posicionamento, passaram a favorecer os hutus e seus atos de violência contra os tutsis. Independência de Ruanda. Em 1960 ocorre um golpe de Estado, apoiado pelo governo belga, em que os chefes hutus substituiriam o tutsis no governo de Ruanda. Desta forma a onda de violência contra os tutsis cresceu, e muitos ficaram desalojados e tentavam o exílio em outros países. Em 1961, a monarquia em Ruanda foi extinta e se instituiu uma república que ficou encarregada de gerir o governo de transição. Neste momento as Nações Unidas alertavam que a revolução ocorrida poderia ocasionar uma “ditadura racial” e que mudaria a situação no Estado ruandês. Porém as autoridades belgas desconsideraram os avisos e concederam em 1962 a independência de Ruanda. Grégoire Kayubanda foi empossado presidente, os hutus se tornam a classe política dominante e a repressão contra os tutsis se agravava, para se ter conhecimento da gravidade da situação, em dezembro de 1963 durante quatro dias, 14 mil tutsis foram mortos em uma província ao sul do país. As vítimas passaram a não ter distinção, homens, mulheres e crianças eram mortas. Ruanda Pós Independência Em 1973, Juvenal Habyarimana foi declarado presidente da segunda república, pregando um governo multipartidário e propondo uma trégua contra os tutsis, porém a exclusão e o preconceito persistiram. O programa do novo presidente era o desenvolvimento da nação por meio da regulação do governo, e como consequência a economia de Ruanda cresceu significativamente e se estabilizou a partir dos anos 80. A França tinha interesse em expandir sua influência em território africano, e passou conceder assistência militar ao 3 governo de Ruanda. Do orçamento anual do Estado africano, 60% advinham de verbas estrangeiras. Em 1986 Ruanda passa a ter graves problemas econômicos, já que os preços dos principais produtos que eram exportados (café e chá) caíram drasticamente. A solução do governo para angariar fundos foi o desvio de verbas advindas de projetos estrangeiros. Dois anos depois, programas de ajuste estrutural foram requeridos pelo F.M.I e pelo Banco Mundial, e o governo de Habyarimana decide aumentar os impostos e a exploração dos trabalhadores. Um exército rebelde, denominado como Frente Patriótica Ruandesa (RPF), em 1990 se declara opositor do governo de Habyarimana e sugere um programa político que extinguisse a ditadura, a ideologia de exclusão e a corrupção. A RPF começa a entrar em território ruandês e combater grupos do governo. O governo adere a ideia de que todos os tutsis eram considerados aliados do exército rebelde e também os hutus que defendessem os tutsis (eram denominados de hutus moderados); assim todos eram vistos como inimigos e deveriam ser detidos. A democracia multipartidária proposta pelo governante de Ruanda foi instaurada em 1991, porém a maioria dos partidos era subordinado ao governo, tendo somente um que consistia como oposição (formado por tutsis). Porém não foi suficiente para que as desavenças “étnicas” desaparecessem. O plano de massacrar a etnia dos tutsis estava sendo arquitetado desde 1990, o governo hutu conseguiu manipular sua população aumentando ainda mais as desavenças entre tutsis e hutus. A mídia teve um importante papel na construção deste ódio, rádios e jornais do governo simulavam ataques tutsis a hutus, manipulavam notícias e passavam uma mensagem de ódio contra a minoria tutsi. O governo começou a se armar e armar sua população, pois segundo a sua ideologia a única forma de que uma sociedade se enquadre nas metas do seu líder seria se os “rebeldes” não fizessem parte desta. Em 1993 as Nações Unidas enviam a Ruanda peace-keepers. A UNAMIR (Missão de Assistência das Nações Unidas em Ruanda) tinha como objetivo ajudar a manter a paz no Estado devido a um acordo entre o governo e a FPR, denominado de Acordos de Arusha. Este acordo consistia em questões acerca da natureza do poder presidencial, este seria controlado por um governo transitório; o acordo também estabelecia uma assembleia nacional de transição. Além disso, havia a proposta de integrar as duas forças em um único exército nacional; o acordo de Arusha foi firmado por ambas as partes que consequentemente concordaram com o cessar-fogo. Porém Habyarimana se mostrava resistente à implementação dos acordos e os ataques de rebeldes hutus a tutsis se tornavam mais frequentes. Havia grande desconfiança do poder da UNAMIR, pois naquela época várias missões de paz realizadas pela ONU fracassaram e seu poder era limitado comparado a outras missões; pois os capacetes azuis não estavam autorizados a utilizar a força, somente em autodefesa e tinham munição escassa. Os próprios participantes da missão da ONU perceberam que o poder hutu se armava rapidamente, armas financiadas pela França, facões importados da China. Diversos relatórios foram enviados, pelas operações de paz, a ONU e ao Conselho de Segurança alertando que um extermínio étnico poderia ocorrer, porém nenhuma resolução eficaz foi tomada. Durante quatro anos, vários conflitos entre hutus e tutsis ocorreram, a Frente Patriótica Ruandesa adentrava o território e exigia maior participação política. Em Abril de 1994 o avião em que estavam o presidente de Ruanda e o de Burundi cai, ambos os presidentes morrem. A administração hutu acusa os tutsis pela morte do presidente 4 e ao mesmo tempo a RPF prevê a possibilidade de tomar o governo. A reação do governo foi imediata e a retaliação aos tutsis foi rápida; um novo regime foi instaurado em Ruanda, sendo composto por militares do poder hutu. A milícia extremista hutu e integrantes do exército ruandês iniciam o assassinato sistemático aos tutsis, não importando se fossem civis. Consequentemente a represália aos hutus também ocorre. Ruanda era vista como a personificação do caos, em aproximadamente cem dias 800 mil tutsis e hutus foram mortos. A falta de tecnologia não foi um problema para o extermínio, o governo hutu manipulou seu povo e esta era sua maior arma, o objetivo do poder hutu era que toda sua população exterminasse a população tutsi. Os soldados da UNAMIR não conseguiram manter a ordem, já que detinham poucos recursos e um número bastante inferior a força hutu. O trabalho desses soldados foi limitado a proteger a vida de civis que procuravam asilo e tentar que os direitos humanos não fossem desrespeitados. Com o agravamento do conflito, e a morte de peace-keepers dentro de Ruanda, a ONU decide a retirada de suas tropas do território; somente um pequeno grupo ficou como voluntário. Em Julho de 1994, a frente patriótica ruandesa chega à capital Kigali conseguindo mais adeptos e a milícia hutu junto com o exército são enfraquecidos. Representantes da RPF anunciaram um novo governo, composto por líderes da frente patriótica e ministro que já estavam selecionados para o governo de transição (seguindo os Acordos de Arusha). POSICIONAMENTO DOS PRINCIPAIS ATORES França O estado francês, com suas ações, se mostrou como um dos principais atores externos que influenciaram o conflito em Ruanda. O governo francês comercializou grandes remessas de armamentos para o exército hutu e para a sua milícia. No final do conflito, com a perda de forças do exército hutu, o país europeu salientou a necessidade de uma intervenção humanitária dentro do estado ruandês para a promoção dos direitos humanos e o auxílio à reconstrução do Estado. Canadá O Canadá surgiu como um dos líderes para combater o desrespeito aos direitos humanos em Ruanda, e se esforçou para garantir que ações humanitárias ocorressem dentro do território e fora dele (a questão do auxílio aos refugiados de Ruanda). O estado canadense foi o propulsor na questão da discussão, em diversas agências da ONU principalmente no Conselho de Segurança e na Comissão de Direitos Humanos, sobre o massacre que estava ocorrendo em Ruanda; exigindo uma ação mais enérgica da organização de dos Estados participantes desta. Estados Unidos da América e Reino Unido Os EUA e o Reino Unido se posicionavam contra o massacre que estava ocorrendo no 5 território ruandês, salientavam a necessidade da ajuda humanitária e da promoção dos direitos humanos no território africano. Porém se mostravam receosos em admitir que o conflito em Ruanda poderia ser considerado um genocídio, pois se aprovassem esta terminologia estes deveriam que tomar ações mais enérgicas contra o conflito. E se encontravam temerosos com a instabilidade do território, principalmente depois do assassinato de peacekeepers¹. ¹Peacekeepers : Pacificadores; responsáveis pela manutenção da paz. Bangladesh Bangladesh foi um dos importantes Estados na ação humanitária e nas operações de paz dentro de Ruanda. Posicionava-se a favor do fim do conflito e da ajuda de outros Estados dentro do território, para a manutenção da paz, ajuda humanitária e a promoção dos direitos humanos. Demonstraram grande preocupação em relação a morte de agentes das Nações Unidas que estavam em Ruanda, salientando a necessidade de maior proteção dentro do Estado. Nigéria Desde o início das negociações dos Acordos de Arusha, o governo nigeriano demonstrava grande preocupação em relação à rivalidade entre hutus e tutsis. Alertando diversas vezes as Nações Unidas que a preocupação principal deveria ser a prevenção de novos massacres e não somente o estabelecimento dos acordos de cessar-fogo. Para os países africanos o estabelecimento da paz foi colocado como principal questão em suas agendas. A delegação nigeriana expôs sua insatisfação em relação à posição de diversos Estados, principalmente em relação às nações desenvolvidas, que no momento em que Ruanda e sua população necessitavam de ajuda, muito pouco foi feito. E como a maioria das nações, presentes na sessão especial, repudiaram os assassinatos de civis, de peacekeepers e de autoridades do governo ruandês. Sudão, Costa do Marfim, Camarões, Gabão e Quênia. Estes cincos Estados africanos detinham o mesmo posicionamento em relação ao conflito de Ruanda, se propuseram a auxiliar nos acordos de paz e alertaram para a iminência de um massacre aos tutsis. Ressaltaram a necessidade de ações humanitárias, repudiando as ações do desrespeito aos direitos humanos dentro do território; também demonstraram grande preocupação em relação ao crescente número de ruandeses exilados. Ruanda Autoridades ruandesas acusaram a comunidade internacional de ter ignorado a tragédia, que se desenrolava no país, e os pedidos de socorro para deter o massacre. As forças de paz resgataram os estrangeiros brancos e abandonaram os ruandeses à própria sorte. 6 QUESTÕES RELEVANTES NAS DISCUSSÕES DA SIB-ONU 1. O foco desta comissão é discutir as violações dos direitos humanos que ocorreram no massacre étnico de Ruanda; desta forma o conceito de direitos humanos deve ser estudado. 2. Debater a questão do genocídio, e se o que ocorreu em Ruanda pode ser considerado como tal, baseado nas informações da época (Maio de 1994); sendo assim o conceito de genocídio deve ser analisado juntamente com a questão histórica de Ruanda. 3 · Analisar medidas para o auxílio à resolução do conflito; avaliando também as medidas necessárias para a ajuda humanitária. Estudar o conceito de ajuda humanitária e sua aplicação dentro da situação em Ruanda no ano de 1994. 4· Avaliar o papel da UNAMIR no auxilio para a promoção dos direitos humanos e as ações humanitárias. 5· Outra questão que deve ser levantada nas discussões é o grande contingente de refugiados e deslocados ruandeses; e quais são as consequências para os Estados que estavam concedendo refúgio. BIBLIOGRAFIA Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: http://www.onubrasil. org.br/documentos_direitoshumanos.php. Acesso em 10 de Janeiro de 2009. Massacre em Ruanda. Disponível em: http://cramersantaluzia.blogspot.com.br/2012/02/massacre-em-ruanda-uma-das.html. Acesso em 06 maio 2014. Anistia Internacional. Disponível em: http://www.brasilescola.com/geografia/anistiainternacional.htm. Acesso em 06 maio 2014. Massacre em Ruanda. Disponível em: http://www.jblog.com.br/hojenahistoria.php?itemid=26795. Acesso em 06 maio 2014. Entenda os fatos que levaram ao genocídio em Ruanda. 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