nº 19 - IRI-USP

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Instituto de Relações Internacionais No 21 / 2013
DEBATES GA CINT
O informativo sobre os debates no âmbito do Gacint
Grupo de Análise da Conjuntura Internacional
Índia: do não alinhamento ao multilateralismo
O
Grupo de Análise de
Conjuntura Internacional
(Gacint)
iniciou
o
segundo semestre de 2013 com a
palestra “India and its role in world
politics”, ministrada pelo jornalista e
cientista político indiano Shobhan
Saxena. Os comentários foram
de Maria Antonieta Del Tedesco
Lins, professora de Economia
Política Internacional do Instituto
de Relações Internacionais da
Universidade de São Paulo (IRI/
USP). O debate foi mediado pelo
Coordenador Geral do GACINT,
Ricardo Sennes.
Shobhan Saxena, Ricardo Sennes e Maria Antonieta Del Tedesco Lins
A palestra tratou da inserção internacional da Índia
e, em especial, a mudança de posicionamento da
política externa do país do não alinhamento para o
multilateralismo.
Quebrando mitos
Terra de elefantes, de tigres e de encantadores
de serpentes. Por anos, essa foi uma percepção
comum sobre a Índia. Segundo o cientista político,
a colonização britânica teve papel fundamental na
construção desse imaginário.
Para explicar, Shobhan Saxena recorreu à história da
Índia para quebrar o mito de que o país se resumia
àquelas ideias.
O território que atualmente constitui Bharat Ganrajya
(nome do país em hindu) começou a ser povoado há
cerca de 5 mil anos. Foi lá que, por volta de 2.500
a.C., o mundo viu nascer a primeira civilização
urbana, a civilização Harappa ou do Vale do Indo. Já
nessa época, havia planejamento de cidades, sistema
de águas e banheiros.
A história da Índia passa por muitos episódios de
conquistas, invasões, mas também por momentos de
prosperidade econômica e cultural. Saxena mencionou,
por exemplo, a era de Ouro da Índia, em torno de 275
a.C. , em que a região controlava cerce de 30% do PIB
global. Prosperidade também durante a Idade Média
durante o Império Mogol.
O grande turning point da história da Índia se deu
com o período de colonização. Embora os portugueses
tenham sido os primeiros a desembarcar no território,
foram os ingleses que efetivamente conduziram o
processo de colonização. Para Saxena, a Índia, “de
centro de comércio global, arte e cultura, tornou-se fonte
de matéria-prima, mão de obra barata, e mercado voltado
para fora”, relatou.
A agricultura foi moldada de acordo com os interesses
metropolitanos. Se antes a produção agrícola local se
valia de diversos tipos de cultivos há séculos, depois
da colonização da Coroa Britânica a agricultura foi
reduzida a poucos produtos, como tabaco, cana de
açúcar, café, chá e ópio. As plantações eram destinadas
para exportação, por meio da Companhia das Índias
Orientais. O resultado foi a ruína da economia indiana.
O palestrante apresentou dados relativos à época da
Debates Gacint - O informativo digital sobre os debates no âmbito do Gacint
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Celulares chegam à cifra de 900 milhões: 4,5 vezes a
população brasileira.
Morada de povoações milenares, a Índia detém
hoje a segunda maior população mundial, perdendo
apenas para a vizinha China. Trata-se de 1,2 bilhão de
pessoas, distribuídas em 3,5 mil km², território duas
vezes e meia menor do que o Brasil.
E a tendência é de que o crescimento populacional
continue acelerado. Segundo o palestrante, a Índia
não demorará a ultrapassar a China, que há décadas
faz uso de política de planejamento familiar.
Shobhan Saxena
descolonização, em 1947. De acordo Saxena, naquele
momento, a Índia contribuía com 4% de PIB mundial,
apenas 16% da população era letrada, a expectativa
de vida não passava dos 32 anos e o crescimento
econômico era de -1%. Com a independência, o
crescimento econômico subiu para taxas positivas,
apesar de ter permanecido baixo por décadas. É o
que ficou conhecido como taxa de crescimento hindu,
termo que se refere pejorativamente às baixas taxas de
crescimento do país.
Nos últimos 20 anos, contudo, a realidade mudou, e a
atual pujança econômica da Índia transformou-a de
terra de elefantes, tigres e encantadores de serpentes
em polo de desenvolvimento e de tecnologia da
informação.
Terra de múltiplos dígitos
Se a Índia não é mais conhecida como terra de elefantes,
é possível afirmar, contudo, ser necessário memória
elefantina para ater todos os dados econômicodemográficos relativos à maior democracia do
mundo. São números tão elevados que desafiam até
a imaginação.
São 23 línguas nacionais, 500 dialetos principais
e outros 20 mil dialetos falados por, no mínimo, 1
milhão de pessoas. Há 800 canais de TV, um milhão e
meio de oficiais militares e 330 milhões de divindades.
Primeira em população mundial no futuro próximo,
perspectiva de crescimento, também, na seara
econômica. Exibindo dados da Goldman-Sachs,
Saxena afirmou que, até 2025, a Índia alcançará a
posição de 3ª maior economia do mundo e que, até
2040, será a segunda. Atualmente, a república ocupa o
posto de décima economia mundial.
Forte dinamismo econômico marcou a Índia
na última década. Segundo Goldman-Sachs, o
crescimento real do Produto Interno Bruto (PIB) foi
de aproximadamente 8% por ano. Além disso, houve
investimentos e consumo crescentes. Não é à toa que
a Índia é, na atualidade, o terceiro país em termos de
poder de compra, o que se traduz, em números, no
valor de US$4,5 trilhões.
Multilateralismo indiano
Núcleo duro da política externa indiana desde a
independência, em 1947, o não alinhamento passou a
dar lugar ao multilateralismo nas últimas décadas. No
entanto, não é possível entender ambos os modos de
inserção internacional sem serem levadas em conta as
demandas internas do país.
O período em que o país deixou de ser colônia inglesa
era de início de Guerra Fria. A bipolarização mundial
já se fazia sentir, e o país, liderado pelo estadista
Jawaharlal Nehru, tinha de se posicionar. A Índia
de Nehru preferiu a neutralidade perante os dois
blocos; preferiu o não alinhamento. Segundo Saxena,
a preferência se deu por razões econômicas, uma vez
que Nehru não deseja gastar o orçamento restrito do
país recém independente em assuntos de defesa.
Debates Gacint - O informativo digital sobre os debates no âmbito do Gacint
Apesar do não alinhamento, Saxena ressaltou a
aproximação da Índia à União Soviética anos depois.
Para ele, tratou-se de uma grande quebra na linha da
política externa desenhada pelo governo de Nehru.
Um exemplo dessa relação mais próxima foi o
tratado de amizade entre URSS e Índia como voto
de segurança a esta contra a China, em 1971. Outro
exemplo é o apoio político dado pela Índia a Moscou
após a invasão do Afeganistão, em 1979.
O fim da Guerra Fria levou a Índia a buscar uma
nova tática de inserção internacional. Além do
término do conflito bipolar, a economia indiana
passou por intensa crise econômica. Foi então que
teve início uma nova política econômica, promovida
pelo Ministro das Finanças Manmohan Singh. Essa
política promoveu uma profunda reforma no sistema
econômico indiano: desde a independência, em 1947,
o país começava a abrir o mercado e a se inserir no
processo de globalização econômico-financeira.
Ou seja, conforme argumentou o palestrante, foi a
demanda doméstica de superação da crise que levou
o país a trilhar o caminho rumo ao multilateralismo.
Com a reforma de Singh, a Índia passou a imprimir
maior dinamismo em suas relações comerciais com
outros países. Exportações foram fortalecidas e
corporações multinacionais, como o grupo Tata, se
expandiram. O multilateralismo começava a se delinear
a partir de uma mudança de política doméstica.
Do isolamento dos anos 1950, atualmente a Índia
tem relações significativas com diversos países. No
que tange aos investimentos, Estados Unidos (EUA),
União Europeia e China figuram como principais
atores. No campo do comércio, novamente EUA e
China, mas também países da região do Golfo e da
América Latina são significativos para a Índia.
O multilateralismo levou o país a uma situação
diferente daquela anterior à reforma. Se, antes de
1991, a agricultura representava 70% do Produto
Interno Bruto (PIB) do país, hoje o setor de serviços
é a principal fonte do PIB.
Mas não foi apenas o setor econômico-financeiro que
se transformou. A inserção política da Índia no cenário
internacional também se modificou. Atualmente,
além da Organização das Nações Unidas, a maior
democracia do mundo atua em alguns arranjos
multilaterais de países emergentes como BRICS,
IBAS e BASIC.
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Fator “China” e securitização
A China é, talvez, a principal peça do tabuleiro
estratégico indiano. Dividindo com a Índia uma
fronteira de mais de três mil quilômetros, os dois
países têm uma relação pautada por desconfiança,
tensão e fortes laços econômico-financeiros.
A importância da China para a Índia é inegável. O
país não é apenas um dos principais atores em termos
de investimentos e o principal parceiro comercial
da Índia, em um fluxo que supera US$ 75 bilhões;
é, também, um dos principais fornecedores de água e
alimentos para a segunda maior população do mundo.
No entanto, as relações políticas ainda são, nas palavras
de Saxena, “complicadas”. Para o cientista político, o
principal problema entre os vizinhos é uma disputa
na região de fronteira. Elencou, também, que ambos
os países desejam desempenhar o mesmo papel na
Ásia: o papel de superpotência. No mais, a China
tem relação próxima – econômica e militar – com o
Paquistão.
No passado, China e Índia já se envolveram em conflito
armado. Embora mantivessem acordo de amizade
desde 1954 – o acordo de Panchsheel, que significa
“5 virtudes” em sânscrito –, a China comunista abriu
fogo contra a Índia em 1962 na região da fronteira
do Himalaia. De acordo com Saxena, um dos motivos
para o conflito sino-indiano foi a aproximação da
Índia à União Soviética. Saxena ressaltou que a Índia,
perdedora do conflito sino-indiano na década de 1960,
deseja evitar um novo conflito com o país vizinho.
Os investimentos em segurança, porém, são vultosos.
Se, à época da independência, em 1947, o país não
deseja alocar recursos para a área de segurança, o
mesmo não acontece na atualidade. A Índia é um poder
militar crescente. Detentor de armas nucleares, o país
gasta, anualmente, US$150 bilhões na modernização
das forças armadas. O setor de defesa é abastecido em
sua maior parte pela Rússia, responsável por 75% do
material bélico comprado. Além disso, a Índia possui
mísseis balísticos de tecnologia própria chamados
“AGNI”. A geração 5 desse míssil tem alcance até
a Europa. Já a geração 6, em fase desenvolvimento,
deverá alcançar a América.
Debates Gacint - O informativo digital sobre os debates no âmbito do Gacint
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Em primeiro lugar, enfatizou que ambos os países
são emergentes, buscam assento permanente no
Conselho de Segurança da ONU e detêm grandes
populações, em regime democrático, e com
economias bem desenvolvidas.
Ressaltou, também, a semelhança no processo
de abertura das economias brasileira e indiana
na década de 1990. Ela comentou que tanto um
como outro demonstraram preocupações de
cunho doméstico como primeiro passo para a
liberalização econômica. Nesse sentido, aspectos
microeconômicos, estabilização e necessidades
políticas antecederam a abertura de ambas as
economias, segundo a economista.
Maria Antonieta Del Tedesco Lins
Comentários
Os comentários da economista e professora do
Instituto de Relações Internacionais da USP, Maria
Antonieta Tedesco Del Lins, se concentraram nas
semelhanças entre Brasil e Índia.
IRI
Diretora
Maria Hermínia Tavares de
Almeida
Pesquisadora sobre processos financeiros na Índia,
Maria Antonieta Tedesco Del Lins pontuou, no
entanto, que a maior democracia do mundo ainda
se mantém mais fechada e cautelosa que o Brasil na
abertura de sua economia para o mundo. Segundo
a economista, há receios principalmente no que diz
respeito à abertura para investimentos estrangeiros.
Gacint
Debates Gacint
Vice-coordenador
Bruno Reis
Mariana Bernussi
Patrícia Tambourgi
Coordenador Geral
Ricardo Sennes
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ADRIANA SCHOR
ADRIANO HENRIQUE REBELO BIAVA
AFFONSO CELSO DE OURO PRETO
AFFONSO DE ALENCASTRO MASSOT
ALBERTO PFEIFER
ALEXANDRE BARBOSA
ALEXANDRE RATSUO UEHARA
ANGELO DE OLIVEIRA SEGRILLO
ANTONIO CARLOS PEREIRA
ANTONIO CORRÊA DE LACERDA
ANTONIO RUY DE ALMEIDA SILVA
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CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
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