o recém - nascido de mãe portadora do vírus hiv e a

Propaganda
CEFAC
CENTRO DE ESPECIALIZAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA CLÍNICA
MOTRICIDADE ORAL - FONOAUDIOLOGIA HOSPITALAR
O RECÉM - NASCIDO DE MÃE PORTADORA DO
VÍRUS HIV E A FONOAUDIOLOGIA HOSPITALAR
PAULA KIMOTUKI
SÃO PAULO
1998
CEFAC
CENTRO DE ESPECIALIZAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA CLÍNICA
MOTRICIDADE ORAL - FONOAUDIOLOGIA HOSPITALAR
O RECÉM - NASCIDO DE MÃE PORTADORA DO
VÍRUS HIV E A FONOAUDIOLOGIA HOSPITALAR
monografia de conclusão do curso de Especialização
em Motricidade Oral - Fonoaudiologia Hospitalar
Orientadora: Mirian Goldenberg
PAULA KIMOTUKI
SÃO PAULO
1998
RESUMO
Neste final de século, uma das enfermidades mais temidas e pesquisadas é, sem
dúvida alguma, a AIDS. Atualmente, em todo o mundo, incluindo o Brasil, a sua
disseminação tem sido rápida, atingindo indiscriminadamente homens, mulheres e
crianças. Em nosso país, existem mais de 652 casos notificados de crianças até
13 anos de idade infectadas pelo vírus HIV, sendo que este número tende a
aumentar.
Portanto,
frente a este fato,
o presente estudo tem como objetivo realizar um
levantamento bibliográfico a respeito das alterações freqüentemente observadas no
R. N. de mãe portadora do vírus HIV.
Desta maneira
obtivemos informações importantes para que o fonoaudiólogo
possa atuar com mais consciência e oferecer, dentro de nossa área de atuação,
uma qualidade de vida cada vez melhor para tais pacientes.
ABSTRACT
In the final of this century, one of the diseases more fearful and studied is, beyond
doubt, AIDS. Actually, all around the world, included Brazil, its dissimination has been
quick, reaching indiscriminate men, women and children. In our country, it has been
notificated more than 652 cases of children until 13 years old infected with HIV , and
this number spread to increase.
So, at the head of this fact, the present study aim to realize a bibliographic survey
about the disturbance frequently observed in newborns from soropositive mothers.
Thus, we acquired important informations to the speech therapist can act with more
conscience and offer, in our area of actuation, a quality of life every time better to this
patients.
Dedico esta pesquisa aos meus pais que,
com todo apreço e amor, ajudaram e continuam ajudando-me
a crescer como ser humano.
AGRADECIMENTO
Agradeço a todos aqueles que fizeram parte da conclusão de mais um objetivo em
minha profissão!
Para Patri, Pé e Dé, pelo apoio e carinho recebidos durante estes anos. Para
minhas amigas de “guerra”, agradeço pelo companheirismo e apoio. Ao meu Tê, o
meu obrigado de coração pela paciência, compreensão e apoio.
“Quanto mais conhecimeto houver inerente numa coisa,
tanto maior o amor.”
Paracelso
SUMÁRIO
1.INTRODUÇÃO....................................................................................................1
2. SÍNDROME DA IMUNODEFICIÊNCIA ADQUIRIDA ( AIDS ou SIDA).............3
3.DISCUSSÃO TEÓRICA .....................................................................................8
4.CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................................17
5. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ......................................................................21
1. INTRODUÇÃO
Uma das mais importantes e pesquisadas doenças dos últimos anos é sem
dúvida alguma a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida ( AIDS ou SIDA).
A disseminação desta doença desde a sua descoberta tem sido rápida,
atingindo nos dias atuais indiscriminadamente homens e mulheres, homo e heterossexuais.
Segundo o Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde ( 1996/97), em 1980
havia apenas um caso de AIDS registrado oficialmente no Brasil, que era do sexo
masculino.
Atualmente, dos 20.119 casos notificados, 5.667 são do sexo feminino,
verificando-se a proporção de uma mulher para cada três homens.
Como podemos observar, a cada ano cresce o número de mulheres infectadas e,
conseqüentemente, aumenta-se a incidência da transmissão para as crianças por elas
geradas. Em nosso país, há registrado 652 casos de crianças até 13 anos de idade, cuja
transmissão do vírus ocorreu entre mãe-bebê ( Boletim Epidemiológico,1996/97).
Muito tem sido pesquisado a respeito da transmissão, manifestação e,
principalmente, cura da doença. Apesar disto, no âmbito fonoaudiológico, em especial com
relação aos recém -nascidos ( R.N.), seu desenvolvimento e a AIDS, pouco sabemos e não
encontramos estudos brasileiros publicados.
O motivo deste trabalho surgiu mediante questões pessoais sobre as possíveis
intervenções do fonoaudiólogo no R.N. de mãe portadora do HIV, ou seja, questões como:
“posso orientar a mãe a amamentar seu filho?”, “será que estes bebês geralmente nascem
1
prematuros, será que o vírus provoca alterações que se relacionam com nossa área?”, “o
fonoaudiólogo tem o que intervir no pré-natal destas mães e no berçário? Como?”.
Portanto, o presente estudo tem o objetivo de realizar um levantamento
bibliográfico, a fim de informar o fonoaudiólogo a respeito das alterações mais comuns
presentes no R.N. de mãe portadora do vírus HIV tipo1 ( HIV-1) e levantar dados importantes
de gestação e de desenvolvimento , ambos de interesse e importância para a
fonoaudiologia hospitalar, solucionando as referidas dúvidas.
Por ser a AIDS um assunto atual e que podemos nos defrontar durante a
rotina hospitalar, acredito ser imprescindível estarmos bem informados a respeito, podendo
melhor atender tais pacientes e também eliminar o preconceito ainda existente com relação
aos portadores do vírus em nosso meio de atuação.
2. SÍNDROME DA IMUNODEFICIÊNCIA ADQUIRIDA (AIDS ou SIDA).
2
Para intervir eficientemente é imprescindível que tenhamos o máximo de
conhecimento possível a respeito do assunto a ser lidado. Por isto, irei inicialmente falar a
respeito do que é a AIDS, de seu agente causador e de seus meios de transmissão, em
especial, entre mãe-bebê.
A AIDS corresponde ao conjunto de enfermidades provocadas pela infecção do
vírus da imunodeficiência humana ( HIV).
O HIV invade e destrói os linfócitos auxiliares T ou CD4 , células sangüíneas mais
importantes na defesa do organismo, debilitando assim o sistema imunológico do indivíduo.
A quantidade destas células no sangue serve também para medir a evolução da infecção
pelo vírus, portanto quanto mais avançada a infecção, menor é o número de CD4.
Existem dois tipos de HIV, o tipo 1 e o tipo 2, sendo que ambos causam a AIDS e
são transmitidos da mesma forma. O HIV tipo 1 é o responsável pela maioria dos casos de
AIDS em todo o mundo, o tipo 2 foi detectado em vários países da costa oeste da África e
outras regiões e apresenta um período de incubação mais prolongado
( Organização
Panamericana da Saúde, 1993). O presente estudo irá referir-se ao vírus HIV tipo 1 por ser
o mais pesquisado até hoje.
De um modo geral, sabe-se que em 50% dos indivíduos infectados, o período
médio de incubação do HIV é de dez anos ( Organização Panamericana da Saúde, 1993),
sendo que alguns pesquisadores verificam que outros indivíduos permanecem infectados
pelo vírus durante 20 anos sem apresentar doenças sérias
( Dossiê Panos, 1993).
O HIV pode ser transmitido apenas através do contato com o sangue, sêmen e,
possivelmente, secreções vaginais dos indivíduos contaminados. Além disto, é necessário
que estas secreções entrem em contato com a circulação sangüínea de outra pessoa,
3
através de lesões de pele ou em mucosas
1989; Dossiê Panos, 1993).
( Vasconcelos & Gewandsznajder,
Conseqüentemente, ele pode ser transmitido através da
relação sexual sem uso de preservativo, do sangue contaminado - em transfusões, produtos
derivados do sangue ou pela reutilização de agulhas, seringas ou de outros instrumentos de
uso subcutâneo - ou da mãe soropositiva para seu bebê durante a gestação ( através do
cordão umbilical), durante o parto ( pelas secreções vaginais e sangue do cordão umbilical)
ou após o nascimento ( pelo aleitamento materno).
É importante salientar que o vírus não é transmitido através de apertos de mãos,
abraços, beijos na boca, carícias, tosse, espirros, picadas de mosquitos ou outros insetos,
alimentando outra pessoa, usando o mesmo vaso sanitário, roupas, toalhas, copos, talheres
ou qualquer outro objeto ( Vasconcelos & Gewandsznajder, 1989; Organização
Panamericana da Saúde, 1993; Dossiê Panos, 1993).
Verifica-se que cerca de 25% a 50% de todas as mães transmitem o vírus para
seus filhos ( Blanche et al, 1989; Dossiê Panos, 1993; Abrams, 1995).
Segundo o MMWR ( 1987), a maioria dos pesquisadores acreditam que os
anticorpos contra o HIV, transferidos passivamente através da mãe ao bebê, possam
algumas vezes persistir por mais de 15 meses no sangue da criança. Para o Dossiê Panos (
1993), todos os bebês nascem com os anticorpos que suas mães produziram, além de
produzir os seus próprios. Após 18 meses, eles vão perdendo tais anticorpos, sendo
possível detectar com segurança se a criança foi contaminada ou não. Segundo Blanche e
col ( 1989) cerca de aproximadamente um terço dos R.N. de mães soropositivas
apresentarão evidências da infecção pelo HIV-1 aos 18 meses de idade.
Comprovar se a transmissão do vírus ocorreu durante a gestação, no momento
do parto ou após o mesmo é algo difícil porque não há testes diagnósticos definitivos para
4
detectar a presença do HIV ao nascimento ( Katz & Wilfert,1989; Dossiê Panos, 1993;
Abrams et al, 1995).
Após o nascimento do bebê de mãe soropositiva, pode-se classificar, segundo o
CDC ( Centers for Disease Control), o nível em que se encontra a infecção do mesmo. O
CDC é uma entidade responsável pelas notificações de casos de AIDS nos Estados Unidos
da América e criou um sistema de classificação para a infecção do HIV baseado no
diagnóstico (soropositivo ou não) e na presença de determinados sintomas. Tal
sistema
de classificação é seguido em vários países, incluindo o Brasil. Este sistema é utilizado
pela área médica, sendo que irei referir-me a ele somente como mais um dado informativo
ao fonoaudiólogo. De maneira geral e suscinta, temos ( MMWR, 1987):
Classe P-0 : Infecção indeterminada, ou seja, inclui crianças expostas no período peri-natal
e crianças com mais de 15 meses de idade que não podem ser classificadas como tendo
sido definitivamente infectada ( não soroconverteu), mas que possui anticorpos para o HIV,
indicando contato com a mãe, que foi infectada.
Classe P-1 : Infecção assintomática, baseia-se na presença ou ausência de anormalidades
imunológicas, mediante testes como aqueles que revelam a quantidade de imunoglobulinas
e CD4. Subdivide-se em subclasse A, B ou C;
5
Classe P-2 : Infecção sintomática, correspondem àqueles pacientes que possuem o vírus e
que apresentam sinais e sintomas de infecção. Possui também subclasses que se baseiam
nos tipos de sinais e sintomas presente na criança: subclasse A, B,C,D,E e F.
Na maioria das crianças, a progressão da enfermidade é rápida, pois elas não
desenvolveram
suas
próprias
defesas
orgânicas,
principalmente,
quando
outras
enfermidades precedem a infecção pelo HIV ou coexistem com ela, ou, então, quando o HIV
surge conjuntamente a um quadro já manifesto de desnutrição
( Organização
Panamericana da Saúde, 1993). Para Blanche e colaboradores
( 1989) e Peckham &
Gibb ( 1995), a infecção pelo HIV é geralmente considerada mais severa em crianças do
que em adultos, particularmente devido a alta incidência de encefalopatia. Segundo
Peckham & Gibb ( 1995), cerca de um quarto das crianças infectadas, a infecção pelo HIV
progride rapidamente para a AIDS ou leva a óbito no primeiro ano de vida. Nas demais, a
doença desenvolve-se paulatinamente, podendo haver uma expectativa de sobrevida.
Estima-se que aproximadamente 50% das crianças infectadas morrem antes dos
2 anos de idade e cerca de 80% antes de completar os 5 anos
(Organização
Panamericana da Saúde, 1993). Crianças com infecções oportunistas, desordens
neurológicas e linfoma têm menores chances de sobrevivência
Gibb, 1995).
6
( Peckham &
3. DISCUSSÃO TEÓRICA
A preocupação com o impacto da AIDS sobre as mulheres a cada dia torna-se
maior nos países em desenvolvimento, onde o vírus é transmitido principalmente através das
relações heterossexuais. Gradualmente, aumenta o número de mulheres soropositivas e,
com isto, cresce também o número de crianças contaminadas.
7
Desta maneira, percebe-se que o perfil dos pacientes portadores do vírus vem
sendo alterado ao longo destes anos.
Segundo vários autores ( Goedert et al, 1989; Dossiê Panos, 1993; Abrams et al,
1995; Pinotti, 1996), os recém-nascidos de mães portadoras do HIV-1 apresentam altas
possibilidades de serem infectados pelo vírus e, posteriormente, desenvolver a AIDS.
Sabe-se que o vírus pode ser transmitido da mãe para o bebê durante a
gestação, no momento do parto ou após o mesmo.
O HIV foi detectado em fetos com 15 semanas de gestação, possivelmente
transmitido através da placenta ( Blanche e col, 1989).
Durante o parto, a transmissão
pode ocorrer através do sangue do cordão umbilical ou das secreções vaginais da mãe
(
Dossiê Panos, 1993; Pinotti, 1996).
Um dos meios de transmissão pós-natal muito controverso é o aleitamento
materno, embora muitas pesquisas tenham sido realizadas.
Dunn e colaboradores ( 1992) realizaram um levantamento teórico a respeito da
incidência da transmissão do HIV-1 de mães, que foram contaminadas através de
transfusões sangüíneas após o parto, para seus bebês pelo aleitamento materno. Verificouse que o risco de transmissão foi de aproximadamente 29%. É importante ressaltar que no
período em que estas mães amamentavam seus filhos, as taxas de vírus em circulação no
sangue das mesmas eram altas ( estágio agudo de infecção).
Segundo Peckham & Gibb ( 1995), o risco de transmissão através do leite
materno está entre 7 a 22 %.
O European Collaborative Study ( 1992) considera que a transmissão do HIV-1
para o R.N. está associada também ao estado clínico e imunológico da mãe, sendo que o
risco de infecção é maior ainda quando estas crianças são amamentadas e quando nascem
antes de 34 semanas de gestação. Relatam também que as crianças infectadas no período
8
pré-natal podem ter menos chances de terem sido contaminadas pelo aleitamento materno
devido a aquisição de anticorpos da mãe via placenta e por suas mães serem menos
sintomáticas e, provavelmente, menos infectadas.
Em contrapartida, muitos autores apesar de considerarem o risco de transmissão
do vírus através do aleitamento materno, acreditam que seja importante a amamentação
para tais crianças ( Organização Panamericana da Saúde, 1993). Outros não consideram a
amamentação como um risco para o bebê ( Baumslag, 1987; Jelliffe & Jelliffe, 1992; Dossiê
Panos, 1993).
A Organização Mundial da Saúde ( OMS) recomenda a amamentação pela mãe
biológica, independentemente de seu grau de infecção, nos países em que o uso de
alternativas seguras e efetivas não seja possível. Em muitos países, as mães soropositivas
são aconselhadas a substituir o aleitamento pela mamadeira. Esta conduta pode ser
prejudicial, principalmente nos países em desenvolvimento, devido a ocorrência de doenças
causadas por água contaminada, mamadeiras não esterelizadas e subnutrição ( Dossiê
Panos, 1993).
O estatuto da OMS/UNICEF preconiza a amamentação a todas as mães,
incluindo as portadoras do HIV, nos países em que as doenças infecciosas e a má nutrição
são as principais causas da mortalidade infantil.
O aleitamento materno protege a criança contra a mortalidade por doenças
infecciosas ( Dunn et al, 1992), além de propiciar um desenvolvimento mais adequado do
sistema estomatognático e afetivo-emocional do bebê. Crianças que são alimentadas com
mamadeira apresentam indíces de mortalidade duas vezes superiores do que as
amamentadas, nos países em desenvolvimento. ( Dossiê Panos, 1993).
9
Em nosso país, onde a AIDS atinge todas as camadas sociais, principalmente
as menos favorecidas, devemos saber priorizar e considerar com muito cuidado as
vantagens e desvantagens das formas de alimentação para o R.N. de mãe soropositiva.
Um outro fator que parece interferir na transmissão do vírus para o bebê é a
prematuridade ( menos de 37 semanas de gestação).
A associação entre transmissão perinatal do HIV e prematuridade ocorre devido
a vários fatores: bebês prematuros podem ter maior risco de infecção do HIV devido a alta
permeabilidade da pele e a imaturidade do sistema imunológico (Abrams et al, 1995).
Goedert e colaboradores ( 1989) sugerem que bebês infectados têm maior
probabilidade de nascerem prematuramente, antes das 38 semanas de gestação,
sugerindo que seja por infecção intra-útero do HIV-1. Referem também que a prematuridade
por si só aumenta o risco de infecção durante o parto ou logo após o nascimento.
Em um estudo recentemente realizado na Índia por Kumar e colaboradores
(
1997), verificou-se que a gestação aumenta a mortalidade das mães aidéticas ( com
infecção sintomática e baixa taxa de CD4) e a do bebê, quando comparada ao tempo
médio de vida das mulheres aidéticas e não grávidas. Alguns destes recém-nascidos
faleceram como resultado direto da prematuridade e da AIDS.
Além disto, os dados de Abrams e col ( 1995) indicam que entre os R.N.
infectados há uma alta incidência de prematuridade e prematuridade extrema - menos de
34 semanas de gestação - detectando-se também menor tempo de sobrevivência. O índice
de mortalidade dos neonatos está intimamente associado à sua idade gestacional, quanto
mais prematuro, maior a mortalidade. Este estudo revelou
a existência de diferenças
clinicamente detectáveis ao nascimento entre R.N. infectados pelo HIV e os não infectados,
10
como: prematuridade, retardo no crescimento intrauterino, baixo peso e estatura pequena
para a idade gestacional. Foi observado que os bebês nascidos de mães com AIDS
apresentam maior risco de infecção do que aqueles nascidos de mães soropositivas com
AIDS ainda não diagnosticada.
Contrapondo as pesquisas anteriores, Bulterys e colaboradores ( 1994) afirmam
que o estágio da infecção materna pelo HIV não interfere significativamente na mortalidade
peri-natal e neonatal, nem na prematuridade. Tal pesquisa também revelou que os R.N. de
mães soropositivas apresentam menor peso ao nascimento, como conseqüência principal
do retardo no crescimento intra-uterino, quando comparados aos bebês de mães
soronegativas.
Os sintomas e sinais relacionados ao HIV estão raramente presentes ao
nascimento, porém se desenvolvem após os meses ou anos subsequentes
(
European Colaborative Study, 1991)
Verifica-se que os neonatos de mães soropositivas e viciadas em drogas são
geralmente pequenos e apresentam menor peso do que os demais ( Blanche et al, 1989;
Bulterys et al, 1994).
Em alguns estudos, como o de Abrams e col (1995) e de Peckham & Gibb
(1995), mães soropositivas que realizaram durante a gestação tratamento com a droga
AZT- zidovudine- tiveram menor índice de transmissão para seus bebês.
Sabemos que os R.N. prematuros, os de baixo peso e os pequenos para a idade
gestacional necessitam de cuidados especiais em UTI neonatal e beneficiam-se com a
intervenção fonoaudiológica ( Hanel, 1995) pois, devido a imaturidade global, podem
apresentar dificuldades quanto à sucção, deglutição, respiração e são considerados de
11
risco para apresentar problemas cognitivos e auditivos ( Azevedo, M. F., 1991).
Para Miura e col ( 1991), uma das
principais medidas preventivas neonatais no hospital, geralmente, é o isolamento do R.N.
de risco para o HIV dos demais. O uso de avental e de luvas é recomendado para os
profissionais atuantes, sendo que o uso de máscara é recomendado somente nos casos em
que o R.N. tiver uma infecção transmitida por via aérea e que não estiver em incubadora
No levantamento bibliográfico, não foram encontrados, em pesquisas
publicadas, dados estatisticamente significantes quanto à ocorrência de mal-formações
congênitas, mas foi verificado que a presença de fissura lábio-palatina estava associada a
mães soropositivas viciadas em drogas, sugerindo que tal manifestação independe da
presença do HIV ( Blanche et al, 1989; Bulterys, 1994).
altamente neurotrópico, comprometendo com maior
estágios subseqüentes de
infecção, e, com menor,
de soroconversão ( Amato Neto & col, 1996).
mais afetado do que o periférico
Sabe-se que o vírus HIV é
freqüência o sistema nervoso nos
no estágio de infecção primária ou
Geralmente, o sistema nervoso central é
( Katz & Wilfert, 1989)
e
observa-se que as lesões
neurológicas são uma causa comum da mortalidade nas crianças infectadas pelo HIV
(
Blanch et al, 1989). Geralmente, as manifestaçõe desenvolvem-se entre 6 e 12 meses de
idade e incluem sinais do trato piramidal (Peckham & Gibb, 1995).
Os sintomas neurológicos podem ser progressivos ou não-progressivos. Na
encefalopatia progressiva, há regressão no desenvolvimento, deterioração progressiva da
função motora e impedimento do crescimento cerebral, sendo freqüente a presença de
microcefalia adquirida ou redução do perímetro cefálico. Além disto, foram relatados casos
de disfagia, marcha atáxica, fraqueza, espasticidade e perda das funções da linguagem.
12
Em crianças maiores, verifica-se quadriparesia em graus
variados de severidade e
paralisia pseudo-bulbar que incluem disfagia, disartria e hiperreflexia perioral.
Na não-progressiva, há evidente atraso no desenvolvimento, envolvendo déficites
motores não-progressivos e microcefalia. Estas alterações são as mesmas nas que podem
ocorrer em bebês prematuros, com exposição intra-uterina a tóxicos e a agentes
infecciosos, fatores genéticos e que tiveram trauma crânio-encefálico (Schmitt et al, 1991;
Pressman, 1991; Pressman, 1994).
De modo geral, o procedimento terapêutico destas crianças é o mesmo que das
outras com problemas de comunicação. Obviamente, nas encefalopatias progressivas, as
alterações de comunicação e disfagia progridem, fazendo-se necessário que os
profissionais tenham conhecimentos sobre o tratamento tais crianças ( Pressman, 1991).
Em um trabalho realizado por esta pesquisadora ( 1991), verificou-se que das 96
crianças portadoras do vírus, 26( 27%) apresentavam déficites articulatórios, das quais
variavam de leve-moderado a severo. Nestes últimos, foi introduzido o uso de linguagem de
sinais e/ou de comunicação aumentativa. Observaram também que a incidência de atraso
de linguagem era alto e que vários fatores contribuíram para tal alteração como: fatores prénatais ( uso de drogas e álcool durante a gestação, prematuridade ou baixo peso ao
nascimento), fatores médicos
(failure to thrive, diarréia crônica, fatores metabólicos e
nutricionais, múltiplas infecções incluindo otites recorrentes e hipoxia crônica relacionada a
desordem pulmonar crônica) e fatores psicológicos ( doenças crônicas, repetidas
hospitalizações, problemas familiares).
Notou-se também que um sinal precoce de encefalopatia progressiva é a
diminuição do score em testes de expressão de vocabulário e um aumento no uso de
13
gestos. Com a evolução da encefalopatia, os pacientes começaram a perder a linguagem
receptiva e passaram a utilizar poucas palavras e a formar frases curtas ( apesar disto, a
linguagem receptiva manteve-se superior à expressiva). A articulação também foi
prejudicada, caracterizando uma disartria, que não foi alterada com a intervenção
terapêutica.
A referida autora, ainda neste estudo, verificou que das 96 crianças, 20
(
20,8 %) apresentavam disfagia, cujos graus variaram de acordo com a condição geral do
paciente. Quando a odinofagia ocorria em conjunto com a candidíase oral ou esofágica, os
pacientes aceitavam melhor líquidos frios, purês ou pudins e recusavam suco e alimentos
cítricos.
Ë importante salientar que muitos outros fatores, além da presença do vírus HIV,
podem provocar alterações no sistema nervoso, como é o caso das infecções oportunistas (
por exemplo,, herpes, citomegalovírus e toxoplasmose).
Segundo Bernstein & Rubinstein (1986). assim como as anormalidades
neurológicas, o retardo no desenvolvimento psicomotor está freqüentemente presente.
Com relação à audição, Schmitt e colaboradores ( 1991) encontraram alterações
nos potenciais evocados auditivos de 13 crianças, das 29 pesquisadas, com idades de 1 a
7 anos e meio. Pressman ( 1992) verificou em seu estudo que 3 dos 96 sujeitos avaliados (
de 4 meses a 17 anos de idade) apresentaram perda auditiva neurossensorial, sendo que
este fato não foi relacionado à presença do HIV. Neste último estudo, não foram referidas
quais as idades das crianças com perda auditiva. Este dado nos é importante, pois
sabemos que a maturação das vias auditivas centrais deve ser levada em consideração ao
sugerirmos o diagnóstico de perda auditiva em crianças com menos de 1 ano de idade.
14
O uso de AZT constante, promove bons resultados, fazendo com que seja inibida
a reprodução do vírus, induzindo a melhora do sistema imunológico do paciente e,
conseqüentemente, promovendo bons resultados no quadro clínico do mesmo. Em alguns
estudos, como o de Abrams e col (1995) e de Peckham & Gibb (1995), mães soropositivas
que realizaram durante a gestação tratamento com a droga AZT- zidovudine- tiveram menor
índice de transmissão para seus bebês. Segundo Schmitt
( 1991), foi observado em seu
estudo que o uso de AZT diminui o comportamento autístico associado a perda das funções
de linguagem e do jogo presentes em uma das crianças.
Não foram encontradas publicações brasileiras, na área fonoaudiológica,
a
respeito do tema inicialmente proposto. Desta maneira, observamos que a pesquisa
fonoaudiológica hospitalar ainda está em desenvolvimento, sendo importante que estudos
sejam realizados, visando o melhor atendimento a essa população.
15
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o crescente avanço da fonoaudiologia, como ciência, vem expandindo-se a atuação
destes profissionais em diversos campos da saúde, dentre estes, a área hospitalar.
Desta maneira, cada vez mais sentimos em nossa atuação diária a necessidade de
termos informações, dados a respeito de inúmeras patologias, como é o caso da AIDS.
Através do levantamento bibliográfico, pôde-se obter inúmeros dados a respeito da
transmissão do vírus HIV da mãe para o bebê, das possíveis manifestações clínicas
deste R.N., como a prematuridade, baixo peso, comprometimento neurológico, malformações faciais, disfagia, alterações de linguagem e de cognição durante o
desenvolvimento destas crianças. Entretanto, durante o levantamento sentiu-se a
necessidade de dados práticos em relação à atuação com tal população.
Assim sendo, tentou-se entrar em contato com fonoaudiólogos, que atuassem com R.N’s
de mães portadoras do vírus HIV, através de serviços de atendimento e associações de
apoio ao portador do vírus, Centros de Referência DST/AIDS e
profissionais
relacionados à área. Através deste último, encontrou-se uma fonoaudióloga atuante em
um hospital público, que nos forneceu dados interessantes com relação à sua experiência
com tal população. Em seu local de trabalho, tais bebês permanecem em berçário de
risco, sem serem isolados, até que as doses de AZT sejam completadas, o que ocorre
em aproximadamente 6 semanas, ou até que estejam em condições satisfatórias de alta.
As mães são aconselhadas a não amamentarem devido ao risco de contaminação,
16
sendo orientadas então a oferecerem os alimentos através da mamadeira. Orienta-se
também quanto à importância do contato afetivo com o bebê durante a alimantação. O
uso de paramentos especiais não é obrigatório, usa-se luvas para manipulação intra-oral
dos bebês. Não foi percebida relação entre o HIV e problemas associados como
deformidades faciais e deficiência auditiva, porém a prematuridade geralmente está
presente.
Obviamente, estes dados não são regra geral, sendo que outros serviços hospitalares
possuem suas próprias condutas com relação a estes pacientes, assim como cada
fonoaudiólogo os têm.
Considerando-se as informações teórico-práticas e os níveis de intervenção
fonoaudiológica, conclui-se que podemos atuar em termos de orientação, desde a
gestação das mães soropositivas com AIDS ou não, até na reabilitação de suas crianças.
Como referiu Pressman ( 1992), a intervenção fonoaudiológica é a mesma que
realizamos com as demais crianças com alterações de linguagem e/ou quanto ao
sistema estomatognático, buscando objetivos e procedendo terapeuticamente frente às
manifestações presentes.
Durante a gestação das mães soropositivas, podemos atuar realizando um trabalho de
orientação, prevenindo futuras alterações, como é feito com as demais. Ou seja, orientar
com relação ao posicionamento correto durante a alimentação ( natural ou artificial), a
importância do toque e do contato durante este momento prazeroso, referirmos sobre a
possibilidade de transmissão do vírus através do leite materno, fornecendo também
alternativas e outros meios de se oferecer a alimentação.
Alguns hospitais de referência da capital de São Paulo aconselham o não aleitamento
natural, uma vez que as chances de contaminação, mesmo que pequenas existem. Desta
17
maneira, a troca de informações entre os profissionais da equipe hospitalar deve ocorrer
a fim de evitar transtornos e riscos ao paciente.
Durante a atuação em berçário e UTI neonatal, o uso de paramentos ao manusearmos os
bebês de risco para o HIV é importante. Nestes locais podemos intervir precocemente,
promovendo condições para a evolução do quadro clínico deste neonato durante sua
internação. Portanto, atuaremos em seu desenvolvimento global, adequaremos as
funções do sistema estomatognático
( como sucção e deglutição) e a coordenação
entre sucção, deglutição e respiração caso estejam alteradas, e detectaremos através de
avaliações audiológicas se há presença ou não de déficites auditivos.
Como verificamos através dos dados obtidos nas publicações pesquisadas,
durante o crescimento e desenvolvimento destes bebês, podem surgir alterações
neurológicas, disfagia, problemas respiratórios, infecções, como otites de repetição,
alterações de linguagem e de fala, sendo importante acompanharmos periodicamente estas
crianças. Desta maneira, teremos condicões de oferecer-lhes, com o nosso atendimento,
melhor qualidade de vida durante seu desenvolvimento e, até mesmo quem sabe, maior
expectativa de vida.
É interessante referir que muitas vezes atendemos crianças com seqüelas
neurológicas das quais nem sequer imaginamos que as suas dificuldades possam ser
advindas do vírus HIV. Por isto, ao pesquisarmos a etiologia destas manifestações,
inicialmente, em anamnese, é importante verificarmos se há algum dado o qual indique que
esta criança possui risco de ter o vírus ( mãe soropositiva, usuária de drogas, promíscua,
criança que recebeu transfusão de sangue). Assim poderemos ter uma noção quanto ao
prognóstico do caso, direcionando o processo terapêutico, nossos objetivos e o que esperar
frente a evolução ou não do quadro.
18
Manter-nos informados a respeito desta patologia é primordial para que nosso
trabalho seja eficiente e satisfatório.
Este trabalho teve o objetivo de informar o fonoaudiólogo a respeito do que é o
vírus HIV, a AIDS, seus meios de transmissão entre mãe-bebê, suas manifestações e suas
possíveis seqüelas em crianças. Acredito que muitas dúvidas ainda surgirão e, por isto, o
melhor meio de saná-las será pesquisarmos mais a respeito e, concomitantemente,
atuarmos junto a estes pacientes “especiais”.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
19
1. ABRAMS, E. J.; MATHESON, P. B.; THOMAS, P. A.; et al - Neonatal predictors
of infection status and early death among 332 infants at risk of HIV-1
infection monitored prospectively from birth. Pediatrics, 96: 451- 58, 1995
2. AZEVEDO,M. F. - Avaliação e acompanhamento de neonatos de risco. Acta
Who, 10(3): 107-16,1991.
3. BAUMSLAG, N. - Breastfeeding and HIV infection. The Lancet, ii:401, 1987.
4. BERNSTEIN, L.; RUBINSTEIN, A. - Acquired immunodeficiency syndrome in
infants and children. Progress in allergy, 37: 194,1986.
5. BLANCHE, S.; ROUZIOUX, C.; MOSCATO, M.G.; et al. - A prospective study of
infants born to women seropositive for human immunodeficiency virus type1.
N Engl J Med., 320: 1637-42, 1989.
6. BOLETIM EPIDEMIOLÓGICO AIDS. Ano X. n° 03 - Semana
Epidemiológica. Brasília.Ministério da Saúde. 1997.
7. BULTERYS, M.; CHAO, A.; MUNYEMANA, S.; et al. - Maternal human
immunodeficiency virus 1 infection and intrauterine growth: a prospective
cohort study in Butare,Rwanda. Pediatr Infect Dis J., 13(2): 94-100, 1994.
8. CENTERS FOR DISEASE CONTROL - Classification system for human
20
immunodeficiency virus infection in children under 13 years of age.
Morbid Mortal Weekly Rep., 36: 225-36, 1987.
9. DOSSIÊ PANOS. A tripla ameaça, mulheres e AIDS. Rio de Janeiro. Abia e
SOS corpo. 1993.
10. DUNN, D. T.; NEWELL, M.L.; ADES, A.E.; PECKHAM, C. S. - Risk of human
immunodeficiency virus type 1 transmission through breastfeeding.
The Lancet., 585-88,1992.
11.EUROPEAN COLLABORATIVE STUDY - Risk factors for mother-to-child
transmission of HIV-1. The Lancet, 339: 1007-12,1992.
12.GOEDERT, J.J.; MENDEZ, H.; DRUMMOND, J.E.; et al. - Mother-to-infant
transmission of human immunodeficiency virus type 1: association with
prematurity or low ANTI-gr 120. The Lancet , 8676: 1351- 54,1989.
13. HAGEL, A.A. - Intervenção precoce em bebês In: MARCHESAN, I. Q.;
BOLAFFI, C;GOMES, I. C. D.; ZORZI. J. L.. Tópicos em Fonoaudiologia.
S.P. Lovise. 1995. 497p.
14. JELLIFFE, D.B.; JELLIFFE, E.F.P. - Postnatal transmission of HIV infection.
N Engl J Med., 326: 642- 43, 1992.
21
15. KATZ, S.L.; WILFERT, C.M. - Human immunodeficiency virus infection of
newborns. N Engl J Med., 320: 1687-89,1989.
16. KUMAR, R. M.; UDUMAN, S. A. ; KHURRANA, A. K.. - Impact of pregnancy
on maternal AIDS. Journal of reproductive medicine, 42( 7): 429-34,
1997.
17. ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD & ORGANIZACIÓN
MUNDIAL DE LA SALUD. SIDA, la epidemia de los tiempos
modernos. Washington, D.C., Programa de Publicações ( OPS). 1993.
18. PECKHAM, C. & GIBB, D. - Mother-to-child transmission of the human
immunodeficiency virus. N Engl J Med, 333: 5 , 298 - 303 , 1995.
19. PINNOTTI, J. A. - Saúde da mulher. São Paulo. 1996.45p.
20. VASCONCELOS, J. L.; GEWANDSZNAJDER, F.. - Programas de saúde.
São Paulo, Ática,.1989. 99p.
22
Download