MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA 1A VARA FEDERAL EM JAÚ – 17A SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO: Procedimento Administrativo n.º 1.34.022.000129/2008-1 O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, por meio de seu Procurador que alfim subscreve, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, com fulcro nos artigos 127, 129, inc. III, da Constituição Federal, artigos 1º, inciso IV, 3º e 5º, da Lei n.º 7.347/85 - Lei da Ação Civil Pública e artigo 6º, inciso VII, “a” e “d”, da Lei Complementar n.º 75/93, vem propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA com pedido de liminar, em face da em face da UNIÃO, pessoa jurídica de direito público interno, cuja Procuradoria-Seccional localiza-se na Rua Júlio de Mesquita Filho, n.º 10-31, C2, salas 201 e 206, bairro Jardim Panorama, Bauru/SP, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas. Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 1 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú I - DOS FATOS Os autos em epígrafe se originaram a partir de representação escrita apresentada na Procuradoria da República de Jaú/SP, subscrita pelos advogados Rubens Contador Neto, Carlos Rafael Pavanelli Batocchio e Gustavo Lima Cambaúva, noticiando violação às suas prerrogativas funcionais ante a negativa por parte de a Agência da Receita Federal em Jaú em autorizar a retirada de procedimentos administrativos fiscais, nos quais atuavam como advogados constituídos. Os causídicos indicaram a existência de diversos mandados de segurança , em que houve concessão de liminar reconhecendo que a retirada dos autos é prerrogativa profissional dos advogados garantida pelo art. 7º, da Lei nº 8.906/94 (Estatuto do Advogado); não obstante as decisões, afirmaram que a Receita Federal continuava a indeferir a retirada dos procedimentos em outros casos. 1 Oficiou-se à Agência da Receita Federal de Jaú/SP, solicitando que informasse a razão da negativa de carga dos autos de procedimentos administrativos fiscais a procuradores legalmente constituídos pelos contribuintes. Em resposta, a Agência de Jaú/SP informou que os processos fiscais relativos a tributos, contribuições federais, penalidades isoladas e declarações não podem ser retirados da repartição pelo sujeito passivo ou seu representante legal, por vedação expressa do art. 382, da Lei 9.250/1995, sendo facultado o fornecimento de cópia de suas peças mediante requerimento e o pagamento das despesas correspondentes, ou vista do processo na própria repartição. Com efeito, conforme já pronunciou-se este Parquet no bojo de autos de mandados de segurança sobre o tema, em suma, a possibilidade de retirada dos autos da repartição competente pelo causídico para a elaboração de defesa ou mesmo de recurso nada mais é do que um dos meios assegurados pela Constituição Federal (art. 5º, LV) para o exercício da ampla defesa e contraditório, sendo considerada prerrogativa funcional pelo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (art. 7º, inc. XV, da Lei 8.906/94). Ademais, há de se ter em mente, no tocante ao sigilo fiscal, que este não se 1 Mandados de Segurança autuados sob os nº 2008.61.17.000156-8, 2008.61.17.000257-3, 2008.61.17.000367-0. 2 Art. 38. Os processos fiscais relativos a tributos e contribuições federais e a penalidades isoladas e as declarações não poderão sair dos órgãos da Secretaria da Receita Federal, salvo quando se tratar de: I - encaminhamento de recursos à instância superior; II - restituições de autos aos órgãos de origem; III - encaminhamento de documentos para fins de processamento de dados. § 1º Nos casos a que se referem os incisos I e II deverá ficar cópia autenticada dos documentos essenciais na repartição. § 2º É facultado o fornecimento de cópia do processo ao sujeito passivo ou a seu mandatário. Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 2 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú estende às partes, nem aos seus procuradores, justamente, para possibilitar a ampla defesa em sua plenitude. Desta feita, busca-se com esta demanda civil pública, com pedido de antecipação de tutela, garantir aos advogados regularmente constituídos o exercício de uma prerrogativa legal, qual seja, a retirada de procedimentos administrativos fiscais dos autos da repartição fiscal, para o efetivo exercício dos direitos constitucionais de ampla defesa e contraditório de seus clientes. De fato, o simples fornecimento de cópias não basta e muitas vezes se torna dispendiosa, onerando o exercício da defesa, sendo certo que a norma aplicável, ao ver deste órgão ministerial, garante a retirada dos autos. Muito embora a negativa de retirada de autos possa ser a realidade nacional, a presente ação postula os direitos relativos aos procedimentos fiscais referentes aos contribuintes situados no âmbito de jurisdição da Justiça Federal de Jaú. II - DA LEGITIMIDADE ATIVA O vigente texto constitucional confere legitimidade ao Ministério Público para zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua garantia. A Constituição Federal também considera como função institucional do Parquet, a promoção da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos (artigos 127 e 129, II e III, C.F.): “Art. 127 - O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. (...)” “Art. 129 - São funções institucionais do Ministério Público: (...) II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia; III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 3 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; (...)” Em complemento à ordem do Texto Magno, vem estabelecido na norma infraconstitucional, na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, de 12 de fevereiro de 1993, que o Parquet é legitimado para defender todo e qualquer interesse difuso ou coletivo (art. 25, IV, “a”). Se não bastasse, a Lei nº 7.437, de 02 de junho de 1985, em seu artigo 5º, inciso I, também legitima o Ministério Público para a ação civil pública. Por sua vez, a Lei Complementar nº 75/93, que organiza o Ministério Público da União, prevê, em seu art. 6º, VII, 'a', 'b' e 'd', que compete a ele promover o inquérito civil e a ação civil pública para proteção de direitos constitucionais, do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos. Esta ação tem como fito garantir o acesso à informação necessário ao exercício profissional, direito coletivo dos advogados, bem como o contraditório e a ampla defesa dos contribuintes que estejam sendo objeto de procedimentos fiscais no âmbito da Receita Federal, direito individual homogêneo de relevância social, sendo clara, portanto, a legitimidade deste Parquet Federal, uma vez que se está em tela interesse de cunho coletivo. Como mencionado por José Afonso da Silva3 (apud Nobre, 1978, p. 6) “a relatividade de conceitos sobre o direito à informação exige uma referência aos regimes políticos, mas, sempre, com a convicção de que este direito não é um direito pessoal, nem simplesmente um direito profissional, mas um direito coletivo”. É adequado frisar que a presente ação não visa a tutela de matéria tributária relacionada ao direito e ao dever de a União tributar e ao correlato dever dos cidadãos recolherem tributos. Pelo contrário, a demanda visa tutelar não só os interesses coletivos acima mencionados, que não possuem qualquer cunho tributário, mas também assegurar a ordem jurídica e o interesse social no seu devido equilíbrio; zelar pelos direitos assegurados na Constituição e na Lei. III - DA LEGITIMIDADE PASSIVA 3 In Curso de Direito Constitucional Positivo, 30ª Edição 2008, Editora Malheiros. Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 4 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú A legitimidade passiva da União, no presente caso, decorre do fato de a Receita Federal não possuir personalidade jurídica e nem capacidade processual. A Receita Federal é um órgão e sem personalidade jurídica própria, vinculado ao Ministério da Fazenda e responsável pela direção superior da administração tributária da União, sendo que toda sua atividade, ex vi da teoria da imputação, é atribuída à pessoa jurídica correspondente. IV – DA COMPETÊNCIA FEDERAL Em princípio, a competência jurisdicional, sem dúvida, é da Justiça Federal, ratione personae, à vista do que dispõe o artigo 109, I, da Constituição. Em razão do lugar, a competência é da 17a Subseção Judiciária, vez que, na ação civil pública, a competência é funcional e no local do dano, consoante o art. 2º, da Lei n.º 7.347/85. Releva ressaltar que a presente ação não se restringe à retirada de autos de procedimentos indeferida apenas pela Agência da Receita Federal de Jaú, mas sim a todos aqueles processos fiscais relativos a contribuintes, pessoas física ou jurídica, com domicílio fiscal no âmbito da Subseção Judiciária de Jaú. Deveras, de nada adiantaria provimento que garantisse a retirada dos autos, para a efetivação de defesa, apenas em face da Agência de Jaú, vez que eles podem e comumente são remetidos a órgãos situados no território de outras subseções ou mesmo seções judiciárias. E o direito de defesa é um direito a ser exercido de forma indivisível. V - DO DIREITO V.1. Do direito à informação: Ab initio, convém salientar que a Constituição Federal de 1988 assegurou em seu art. 5º, incs. XIV e XXXIII, bem como no art. 220, o acesso e a liberdade de informação, in verbis: Art. 5º. inc. XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional; inc. XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 5 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; Art. 220 - A manifestação de pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. O direito de informação, direito de primeira geração, envolve, em sentido lato, o direito de transmitir, receber e buscar informações, e sua previsão constitucional visa justamente impedir a imposição de óbices indevidos por parte do Poder Público ao curso das informações. Trata-se, portanto, de limitação ao poder estatal que, inclusive, em caso de violação pode ser resguardado através da garantia do direito de petição que assegura a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimentos de situações de interesse pessoal (art. 5º, inc. XXXIII). Ou, então, na hipótese de envolver informação relativa ao próprio indivíduo interessado, constante de banco de dados ou cadastros públicos ou de caráter público, pode ser tutelado através do habeas data (inc. LXXII do art. 5º) que também possibilita a correção dos dados em caso de equívoco. O artigo 220, da Constituição Federal, por sua vez, buscou proteger de restrições o meio pelo qual a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação será difundido. Como se vê, a Constituição preocupou-se em fazer constar por diversas vezes de seu texto o direito à informação, bem como criou instrumentos para garantia de sua obtenção, o que se justifica ante a importância que possui na sociedade atual que, diferente de outrora, não admite, ou ao menos não deveria, conviver com a censura na imprensa, com a existência de atos administrativos secretos, dentre outras condutas que geram incerteza e temor na população e que inviabilizam o exercício de direitos e garantias fundamentais. Na linha de proteção ao direito à informação, destaca-se o art. 7º, incs. XIV e XV, do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994), os quais asseguram ao advogado regularmente constituído o direito ao acesso aos autos de procedimentos judiciais ou administrativos, em Juízo ou na repartição competente, ou mesmo a carga (retirada) dos autos, para que possa examiná-los, extrair cópias ou tomar apontamentos, in verbis: Art. 7º. São direitos do advogado: XIV - examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 6 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos; XV - ter vista dos processos judiciais ou administrativos de qualquer natureza, em cartório ou na repartição competente, ou retirá-los pelos prazos legais; (grifo nosso) O Estatuto da Advocacia foi editado em 1994 para regulamentar o sentido e o alcance da indispensabilidade do advogado na administração da justiça estabelecido no artigo 133, da Constituição Federal: Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei. Buscando regulamentar e assegurar a efetiva participação do advogado na administração da Justiça, o Estatuto da Advocacia criou, dentre outras, a referida prerrogativa profissional de acesso pelo advogado dos autos que digam respeito ao seu cliente, providência indispensável ao pleno exercício da sua atividade. Trata-se, a bem da verdade, de garantia da parte assistida e não do profissional. A estipulação de qualquer medida que condicione, crie embaraço ou impeça o acesso do advogado ao autos configura nítida ilegalidade, porquanto o advogado, consoante previsão constitucional, é essencial à administração da Justiça e deve ter as suas prerrogativas respeitadas. Ressalte-se, ademais, que a carga de autos de processos judiciais por parte de advogados constituídos, ainda que sigilosos, é autorizada e realizada diariamente nos Fóruns e Tribunais do País, atendendo-se as cautelas de praxe. Ora, se os procedimentos judiciais podem ser retirados do recinto do Fórum pelo advogado, mediante carga, nada justifica tratamento diverso por tratar-se de procedimento administrativo. Ao contrário, quem pode o mais pode o menos, ao ver deste Parquet. Além disso, já há decisões no sentido de reconhecer o direito à vista e à carga de procedimentos administrativos pelos advogados das partes, inclusive, no âmbito do Instituto Nacional de Seguro Social: “PROCESSUAL CIVIL. ADVOGADO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. VISTA DOS AUTOS FORA DA REPARTIÇÃO. Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 7 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú É direito do advogado do contribuinte ter vista do processo administrativo fora da repartição pública”. (TRF 4ª – Proc. nº 200070050002791, UF: PR, QUARTA TURMA, 18/04/2002 Documento: TRF400084547) PROCESSUAL CIVIL. ADVOGADO. DIREITO DE RETIRAR AUTOS. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. LEI Nº 8.906/94. 1. O direito de vista dos autos fora do Cartório pelo advogado devidamente constituído, encontra-se devidamente fundamentado na Lei nº 8.906/94, independentemente de processo judicial ou administrativo. 2. Recurso provido. (STJ – ROMS – 11085; Processo: 199900712110; Órgão Julgador: 5ª Turma; Relator: Edson Vidigal. DJ: 02/04/2001. p. 312). “O advogado constituído da parte tem o direito de vista dos autos fora do cartório, ainda que se trate de processo em segredo de justiça. A única exigência legal é que apresente o instrumento de mandato” (RT 636/90). Interessante transcrever, ainda, trecho da decisão proferida nos autos do Mandado de Segurança nº 2006.61.00.022533-5 - 12ª Vara Cível de São Paulo, da lavra da Exma. Magistrada Federal Isadora Sagalla Afanasieff, que autorizou uma advogada a ter acesso ao processo administrativo que tramitava contra seu cliente no INSS: “(...) O direito à vista e à carga de processos administrativos no qual se figura como parte encontra respaldo na garantia constitucional da ampla defesa e do contraditório, nos termos do art. 5º, incisos XXXIV, “b” e LV, e, ainda, no princípio da publicidade, a que se vincula toda a Administração Pública. Por sua vez, o Estatuto da OAB, em seu artigo 7°, inciso XV, garante ao Advogado a vista de processos administrativos de qualquer natureza, na repartição competente ou a sua retirada pelos prazos legais. Por outro lado, o livre acesso ao processo administrativo a à sua retirada, desde que o advogado disponha do competente instrumento de procuração, não pode esbarrar em óbices administrativos, tal como, o agendamento de datas longínquas (...). Ante o exposto, CONCEDO A SEGURANÇA para que a autoridade impetrada efetue a carga dos autos do Processo Administrativo nº 140.764.765-0 à Impetrante, independentemente de agendamento de datas, observadas as regras de representação processual aplicáveis. (...)” Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 8 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú Como se vê, não somente o direito de vista é assegurado ao advogado, mas também o de efetiva retirada dos autos mediante carga. E não poderia ser diferente vez que, como já mencionado, em certos casos, somente com tal providência, é possível a devida análise da documentação e demais elementos constantes dos autos. O direito à retirada dos autos judiciais do cartório é previsto, inclusive, no Código de Processo Civil que dispõe, em seu art. 1954, que o advogado deve restituir os autos no prazo legal, sob pena de ser riscado o que nele houver escrito e desentranhadas as alegações e documentos apresentados. Obviamente que há informações que podem e devem ser restringidas em caso de interesse público, se houver fundado interesse na fase de investigação, mesmo ao advogado. Não há, via de regra, direitos absolutos. Todavia, a presente ação não se refere a tais casos, mas sim se limita àqueles em que há prazo em curso para a apresentação de defesa ou mesmo de recursos, ou seja, já ultrapassada a fase investigativa inicial. De fato, com esta não se pretende autorizar a retirada do procedimento da repartição de forma indiscriminada, mas sim somente quando não se constatar prejuízo no andamento dos atos, ou seja, quando houver prazo em aberto para a apresentação de defesa. Sendo assim, impõe-se a concessão da liminar, para que seja permitida aos patronos do impetrante regularmente constituídos a retirada dos autos em carga. Poder-se-ia cogitar de uma possível ocorrência de eventual adversidade durante o período de retirada dos autos que pudesse causar-lhes algum tipo de prejuízo material e dificultasse sua reconstituição, a justificar a negativa de carga do procedimento administrativo. No entanto, isso poderia também ocorrer em relação aos autos judiciais e nem por isso é obstada sua retirada da secretaria ou cartório. Insta salientar que, atualmente, os processos ou procedimentos são passíveis de fácil reconstituição, uma vez que suas principais peças estão contidas em arquivos eletrônicos ou mesmo digitalizadas e as partes interessadas, na maioria das vezes, possuem cópia de suas petições com comprovante de protocolo. De qualquer forma, a retenção abusiva ou o extravio de autos recebidos com vista ou em confiança pelo advogado já é prevista como infração disciplinar pelo art. 34, inc. XXII do Estatuto do Advogado. 4 Art. 195 do Código de Processo Civil O advogado deve restituir os autos no prazo legal. Não o fazendo, mandará o juiz, de ofício, riscar o que neles houver escrito e desentranhar as alegações e documentos que apresentar. Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 9 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú No tocante ao sigilo inerente das informações contidas no procedimento administrativo fiscal, também não é causa justificadora da restrição do acesso aos autos pelo advogado do contribuinte, desde que devidamente constituído. Importante ressaltar que a presente ação não impugna o conteúdo do que dispõe o artigo 38, da Lei n.º 9.250/95, não havendo que se falar em inconstitucionalidade. O Estatuto da Ordem, a bem da verdade, é norma específica, relativa aos advogados, que traz uma exceção à norma fiscal, permitindo a retirada dos processos pelos causídicos. Portanto, a autoridade fiscal não vem aplicando a norma específica; de sua sorte, deve ser condenada a tanto. Relevante afirmar, por fim, que a simples vista e extração de cópias não substitui a carga, faculdade legal. De fato, em casos de grande quantidade de documentos, praticamente impossível ao advogado verificar, na própria repartição e em curto lapso de tempo, o que seria necessário para o exercício da defesa, sem falar que o gasto na extração de cópia de todo o procedimento fiscal, mormente quando há vários volumes, não se afigura justo, já que há prerrogativa legal para a retirada de autos, prevista no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil. V.2. Do direito à ampla defesa e ao contraditório: Desnecessário alongar-se quanto à grande importância dos princípios da ampla defesa e do contraditório no direito constitucional brasileiro. Estão eles previstos no inciso LV do art. 5º da Constituição Federal, in verbis: Art. 5º, inc. LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; Nas palavras de Alexandre de Moraes5, entende-se por ampla defesa o “asseguramento que é dado ao réu de condições que lhe possibilitem trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo omitir-se ou calar-se, se entender necessário”. Já o contraditório, o autor definiu como exteriorização da ampla defesa, impondo a concessão de direitos iguais para ambas as partes no tramitar do processo/procedimento. Como expresso, a informação prévia é imprescindível para o exercício da ampla defesa e do contraditório. Não há como se cogitar de ampla defesa sem ciência à parte dos termos da imputação que é feita em seu desfavor. 5 In Direito Constitucional, pág. 124, 12ª Edição, Editora Altas. Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 10 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú Ressalte-se que a Constituição fora expressa ao dispor que a observância da ampla defesa e do contraditório é exigida também em processos administrativos. Recentemente, discutiu-se no cenário jurídico brasileiro a possibilidade de acesso aos autos do inquérito policial pelo advogado, tendo o Egrégio Supremo Tribunal Federal acabado por editar a Súmula Vinculante nº 14, confirmando a orientação jurisprudencial previamente existente no sentido de ser admitido o acesso aos autos pelo causídico, ainda quando o conteúdo for sigiloso, in verbis: Súmula Vinculante nº 14: É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa. Da leitura do texto da Súmula, verifica-se que o acesso aos autos pelo advogado restringe-se aos elementos de prova já documentados, não abrangendo as diligências em andamento, visando, com isso, não prejudicar a efetividade da atividade investigatória. A Suprema Corte, com a referida decisão, privilegiou o direito à ampla defesa em face de eventual sigilo dos autos do inquérito policial, reconhecendo que o investigado é titular de direitos e garantias asseguradas pelo sistema normativo plenamente oponíveis ao Poder Estatal. Analogicamente, tal entendimento também pode ser aplicado no caso de procedimentos administrativos fiscais e até mesmo com maior razão, pois, o objeto do procedimento fiscal é a constituição do crédito tributário, fase posterior à da investigação. E para a elaboração da defesa do contribuinte nos autos necessário o acesso pelo advogado do conteúdo do procedimento administrativo fiscal, não havendo de se cogitar de eventual sigilo, vez que as informações dizem respeito à própria pessoa do contribuinte, o qual tem direito subjetivo ao acesso. Não obstante o disposto no art. 38, da Lei 9.250/95, sustentado pela Agência da Receita Federal do Brasil em Jaú/SP para justificar a impossibilidade de retirada dos processos fiscais da repartição, ressalte-se que há lei específica no presente caso (Estatuto da OAB) e que sua interpretação deve ser feita em consonância com os princípios constitucionais acima referidos, estendendo-se a possibilidade de retirada de autos da repartição pelo advogado regularmente constituído pelo contribuinte, quando em curso prazo para elaboração de defesa. Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 11 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú Deveras, há casos em que a falta de possibilidade de retirada dos autos pode implicar em dano à ampla defesa e ao contraditório, o que desborda da Constituição, não sendo suficiente a mera vista ou a extração de cópias em repartição. VI – DA MEDIDA DE URGÊNCIA A Lei n.º 7.347/85 admite, em seu art. 12, a concessão de “mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo”. Com a permissão do art. 19, da LACP, aplica-se à ação civil pública, subsidiariamente, o Código de Processo Civil. Despicienda, portanto, a discussão acerca da natureza do provimento de urgência ora requerido, se meramente cautelar ou antecipatório, uma vez que tanto um quanto o outro são aplicáveis à Ação Civil Pública. A “fumus boni iuris” das alegações resulta da própria narrativa até aqui expendida, tratando-se de matéria unicamente de direito. De fato, é o Estatuto da Ordem e a inteligência da Constituição que garantem a carga de processos fiscais. O “periculum in mora” decorre da demora inerente aos provimentos de natureza judicial, não sendo justo aos advogados continuarem sendo privados de uma prerrogativa profissional ou funcional, ou seja, do direito ao acesso aos processos fiscais, fora da repartição, no caso de curso de prazo de defesa ou recurso. É certo que a presente ação irá também promover a desnecessidade de propositura de ações individuais buscando a tutela desse direito, o que se traduz em verdadeira celeridade processual. Daí a necessidade de concessão da liminar. VII – DOS PEDIDOS E REQUERIMENTOS O Ministério Público Federal pede e requer: a) a juntada dos autos do P.A. n.º 1.34.022.000129/2008-1; b) a intimação, com urgência, da ré, para os fins do art. 2º, da Lei n.º 8.437/92; Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 12 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Procuradoria da República no Município de Jaú c) A CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR, para que a União, por meio do órgão competente, seja condenada a conceder a carga ou retirada de autos de processos fiscais da repartição, relativos a tributos e contribuições federais e a penalidades isoladas e às declarações, quando requerida por advogado constituído nos termos previstos em lei pelo contribuinte, naqueles casos em que haja prazo legal ou normativo em curso para a apresentação de defesa ou outro tipo de recurso e pelo prazo destes. Requer que referida medida abranja os processos fiscais dos contribuintes domiciliados no âmbito da Subseção de Jaú, independentemente da instância administrativa em que se encontrem; Requer a cominação de multa diária no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pelo descumprimento, a ser revertida para o Fundo de que trata o art. 13, da Lei n.º 7.347/85; d) a citação da ré, na pessoa de sua Procuradoria-Seccional; e) ao final, seja julgado procedente o pedido, nos mesmos termos do item c. Protesta, ademais, pela produção de todos os meios de prova em direito admitidos, relembrando-se que a matéria é apenas de direito. Dá-se à causa o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Termos em que, pede deferimento. Jaú (SP), 1º de julho de 2009 MARCOS SALATI Procurador da República Av. Zezinho Magalhães, nº 1094, Jd. Estádio, CEP 17203-380, Jaú/SP Fone: 3626-7812 e 3626-7823 13