o direito à inclusão familiar e social do portador de hiv - proex

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O DIREITO À INCLUSÃO FAMILIAR E SOCIAL DO PORTADOR DE HIV
Aurora Dias Ramalho
PUC Minas Unidade São Gabriel
Rua Bonaparte, 642 Fundos, Bairro Padre Eustáquio, Belo Horizonte – MG
2512-6556
[email protected]
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo tratará sobre a questão da inclusão familiar e social
do portador do vírus HIV.
Partindo-se da análise da abordagem clínica e psíquica da realidade do
soropositivo, enfocar-se á a reação do soropositivo, bem como das pessoas
que com ele convivam, ao diagnóstico, ao tratamento e aos meios encontrados
pelo Estado para garantir-lhes certa tutela jurídica.
O ponto central a ser desenvolvido relaciona-se com a função exercida
pelo Direito no processo de inclusão familiar e social do portador do vírus HIV,
num questionamento indireto sobre a efetividade da tutela jurídica prestada que
não possui a devida veiculação e provoca questionamentos quanto à
fragilidade de alguns dispositivos.
Sabe-se que a função dos grupos de apoio é auxiliar o soropositivo
tanto no processo de compreensão e posicionamento quanto aos efeitos da
contaminação como na maneira como o portador exteriorizará de maneira
positiva, à medida que internalize sua nova realidade. Porém os grupos de
apoio nem sempre contam com a estrutura necessária para que a cidadania do
portador do vírus do HIV seja abordada em todo o seu âmbito, como a
orientação jurídica especializada, por exemplo.
A tutela jurídica, como determina a Constituição da República, não
tutela apenas o direito objetivo dos cidadãos brasileiros, as garantias
individuais como a liberdade de ir e vir, a dignidade, a inviolabilidade da vida
particular, a vida sexual e afetiva também são protegidos pelo ordenamento
pátrio.
Em relação ao soropositivo, sua inclusão familiar e social ainda é tema
pouco explorado, merecendo atenção o que está prescrito sobre o seu direito a
não divulgar sua condição sem que seja absolutamente necessário, como nos
casos de doação de sangue, esperma e órgãos.
2 O VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA - HIV
A AIDS causou polêmica e terror quando os cientistas a anunciaram
como uma doença infectocontagiosa fatal. Pouco se conhecia sobre o vírus
HIV e sua relação com a chamada fase terminal do paciente.
2.1 Hiv – o anjo apocalíptico implacável
O medo da morte é um problema antigo da humanidade, que apesar
dos avanços científicos e da liberdade religiosa detém-se estarrecida diante de
qualquer prognóstico ou diagnóstico que lhe indique que o “ceifador” se
aproxima lenta ou rapidamente.
O HIV é visto como um dos “anjos apocalípticos”, causador da doença
AIDS que levará, necessariamente, seu portador a um estágio terminal terrível,
que não lhe provocará apenas as dores físicas, mas o transformará
exteriormente em um “monstro”, cobrindo-o com um estigma que “saltará aos
olhos” de qualquer pessoa.
O Exame de Hiv pode trazer alívio ou desespero. Sabe-se que ainda
hoje a maioria das pessoas se recusa a submeter-se ao referido exame
alegando “preferir não saber se estão ou não contaminadas pelo mal do
século”.
Quando um médico solicita a um paciente, seja por prevenção, seja
para confirmar algum sintoma apresentado, o Exame de Hiv, é acionado o
alarme do medo dentro daquele que tem diante de si um pedido que poderá
modificar sua vida para sempre.
É exatamente o “para sempre” que detonará o lento processo da morte
psicológica do portador do vírus HIV. A angústia gerada pela espera de um
positivo ou um negativo - que se prolongará por uma semana tempo
geralmente solicitado pelo laboratório para a divulgação do resultado -, leva
aquele que a ele se submeteu a um suplício silencioso.
Aconselham os médicos a não abertura dos exames laboratoriais pelos
próprios pacientes. Poucas pessoas conseguem se controlar e seguir essa
recomendação, abrindo por si mesmas os envelopes que contêm a temida ou a
desejada resposta sobre a continuação de sua vida.
É difícil para um ser humano que tenha se submetido ao Exame de Hiv,
não rasgar o envelope ali mesmo, diante do laboratório, após minutos de
angustiante dúvida.
É necessário saber que sinal será dado pelo “César” que decidirá,
apontando o polegar para cima ou para baixo, se a vida, que naquele momento
tornou-se o melhor curso a ser trilhado por alguém, seguirá seu curso; ou se
será interrompida “a qualquer segundo” pelo “anjo da morte implacável”
disfarçado sob a forma de um vírus.
O HIV é um vírus retroviral cujo código genético é formado por Ácido
Ribonucleico, RNA. Para se desenvolver o HIV torna-se parasita de uma célula
do Sistema Imunológico, responsável pela defesa do organismo humano,
utilizando-se do Ácido Dexosirribonucleico (DNA) de outras células para sua
reprodução.
O DNA é, por sua vez, o código genético da maioria dos seres vivos e
possui todas as informações necessárias para que o HIV não seja atacado
como inimigo pelo Sistema Imunológico humano.
O HIV não é AIDS. O portador do vírus HIV não é aidético.
A pessoa contaminada pelo vírus HIV é denominada soropositiva ou
portadora assintomática, significa dizer que o vírus encontra-se em estado
latente em seu organismo, não tendo ainda evoluído para a doença que
provoca: AIDS, no Brasil, SIDA, Síndrome da Imunodeficiência Adquirida.
A evolução da doença será determinada pela carga viral, ou seja, pela
quantidade em que se reproduziu o vírus no organismo da pessoa contaminada
e a função dos coquetéis e medicamentos atuais é exatamente conter a
reprodução do vírus de maneira que não comprometa de imediato as funções
vitais humanas.
A carga viral é avaliada através do exame específico e a partir dos
dados obtidos o infectologista, especialista da medicina indicado para as
doenças infectocontagiosas, determinará a combinação de medicamentos
antirretrovirais mais indicados para conter a reprodução do vírus de acordo sua
evolução.
Atualmente existem 19 antirretrovirais específicos para o HIV e se
dividem em quatro classes de inibidores. Os médicos combinam os elementos
de cada classe, no mínimo de duas classes, de acordo a carga viral e demais
exames solicitados ao paciente.
A dedicação constante de cientistas e médicos tornou possível ao
portador do HIV uma expectativa de vida cada vez mais crescente, hoje
equiparada à mesma projeção que é feita para as pessoas não contaminadas.
Como todo medicamento, os antirretrovirais possuem efeitos colaterais
e como em toda forma de alteração súbita de realidade, deve o soropositivo
aliar a medicina à psicoterapia e aos hábitos alimentares e físicos saudáveis.
3 DIREITO E MEDICINA – A TUTELA JURÍDICA DO SOROPOSITIVO
O
ordenamento
jurídico
pátrio
deve
obedecer
aos
preceitos
constitucionais, caso contrário, a lei que não for recepcionada pelos princípios
basilares do Direito Constitucional é nula, não podendo servir para tutelar
qualquer direito, seja objetivo ou subjetivo.
Determina o artigo 196 da Magna Carta que todos os cidadãos
brasileiros têm direito à saúde e que esse direito é dever do Estado.
Segundo a Organização Mundial de Saúde, o termo saúde é um estado
completo de bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de
doenças.
Aliando-se o preceito constitucional com o conceito oferecido para o
termo saúde, deduzimos que a saúde é pública, ou seja, é responsabilidade do
Estado garantir que todos tenham acesso a esse estado completo de bemestar, que engloba o homem em sua dimensão objetiva, prática, externa e sua
dimensão subjetiva, interna, abstrata.
A expressão saúde pública foi utilizada pela primeira vez por CharlesEdward Amory Winslow1, em 1920, que a definiu como:
A arte e a ciência de prevenir a doença, prolongar a vida, promover a
saúde e a eficiência física e mental mediante o esforço organizado da
comunidade. Abrangendo o saneamento do meio, o controle das
infecções, a educação dos indivíduos nos princípios de higiene
pessoal, a organização de serviços médicos e de enfermagem para o
diagnóstico precoce e pronto tratamento das doenças e o
desenvolvimento de uma estrutura social que assegure a cada
indivíduo na sociedade um padrão de vida adequado à manutenção
da saúde. (WINSLOW, 1920)
Em relação aos soropositivos, a primeira organização sobre os Direitos
ocorreu em 1998, quando Organizações Não-Governamentais se reuniram em
Porto Alegre e criaram a Declaração dos Direitos Fundamentais da Pessoa
Portadora do Vírus da AIDS, que em seu artigo II prevê que todo portador terá
direito à assistência e ao tratamento dados sem qualquer restrição, garantindo
sua melhor qualidade de vida.
O referido artigo está em conformidade aos preceitos constitucionais do
direito à saúde pública, que é fornecida a todos os cidadãos brasileiros sem
qualquer restrição, ou seja, independe sua condição econômica, étnica,
religiosa ou social para que o tratamento seja concedido gratuitamente, através
do Sistema Único de Saúde.
A Declaração prevê ainda o direito de ir e vir, a dignidade humana, a
proibição à discriminação, o sigilo do exame, a não divulgação deste sem o
consentimento do portador, a não exigência do exame para os casos não
1
Citação retirada do Texto Saúde Pública. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Saúde_pública.
defesos em lei, não restrição da cidadania com a garantia da continuação da
vida afetiva, sexual, social, profissional e civil dos soropositivos.
Em junho de 2001, a Organização das Nações Unidas, em Sessão
Especial, em caráter de urgência, criou a Declaração de Compromisso Sobre
HIV/AIDS das Nações Unidas, com o objetivo de:
rever e examinar o problema do HIV/AIDS, em todos os seus
aspectos, assim como, assegurar um compromisso global no sentido
de melhorar a coordenação e a intensificação dos esforços para fazer
frente à epidemia, de maneira objetiva, nos níveis nacional, regional e
internacional. (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 2001)
O referido documento reforça o caráter público dos cuidados ao
portador do HIV, estabelece as diretrizes a serem adotadas quanto às
informações,
preservativos
e
medicamentos
gratuitos,
a
serem
disponibilizados, sem qualquer discriminação, aos portadores.
Não há uma legislação específica para o portador do HIV, sua
realidade está inserida nos diversos diplomas legais do ordenamento que
tratam sobre a Previdência Social e o Trabalho bem como nas Normas Gerais
do
Sistema
Ùnico
de
Saúde,
cabendo
aos
estados
e
municípios
regulamentarem sobre o assunto dentro de suas atribuições quanto às políticas
de prevenção, criação de grupos de apoio e campanhas de combate ao
HIV/AIDS.
Muita polêmica gera as referidas campanhas, principalmente por serem
desenvolvidas com o objetivo de combater o HIV/AIDS.
Assim como gera polêmica o direito a não ter divulgação da condição
de portador sem autorização deste.
O Brasil não é conhecido pela liberalidade do seu povo, embora no
cenário internacional seja retratado como o país do Carnaval, onde suas
mulheres andam nuas ou semi-nuas pelas ruas, como sugerem as imagens
que transmitem essa festa popular e tradicional. Ao contrário, por suas raízes
culturais e sua formação original, o brasileiro é conservador, pouco afeito a
mudanças repentinas em sua rotina e não possui, em sua maioria, educação
básica que lhe assegure a devida alfabetização e instrução.
Embora a Lei de Introdução ao Código Civil determine que a ninguém é
dada a permissão de não cumprir a lei por alegar desconhecê-la, verifica-se
que poucos brasileiros conhecem seus direitos, pois seus deveres lhes são
repassados dias e noite pelos meios de comunicação.
Poucos soropositivos sabem o que a lei lhes concede, quais os
benefícios ou privilégios lhes pertencem especificamente e quais os meios para
coibirem aqueles que lhes violem o famoso sigilo sobre sua condição.
Sua inclusão familiar e social seria assegurada pela proibição da
exposição do seu resultado positivo ou falso-positivo ou ainda falso-negativo
constante em seu Exame de Hiv.
O ordenamento trabalhista privado veda a exigência do exame
específico para detectar o HIV nos candidatos a emprego. Porém, o problema
surge quando, por questões de saúde, se vê o soropositivo obrigado a
comunicar seu afastamento ao empregador.
Dois fatores podem ocorrer: o afastamento sucessivo, por menos de quinze
dias, porém que reiteradamente provocará desconforto no ambiente de
trabalho e poderá provocar uma dispensa sem justa causa por iniciativa do
empregador, não satisfeito com tantas faltas; e o afastamento por mais de
quinze dias, conforme estabelece a CLT, quando o Instituto Nacional de
Seguridade Social - INSS - passará a remunerar-lhe, comunicando à empresa
estar o empregado sob sua responsabilidade.
Aos médicos particulares e aos peritos do INSS é exigida a
comunicação do Código Indicativo de Doenças – CID – que justificará o
atestado para afastamento do empregado.
Determinados códigos, sozinhos, não concederão o direito a afastamento
demasiadamente prolongado ao soropositivo que muitas vezes, entre uma
troca de medicamento e outra, necessita maiores cuidados alimentares, maior
repouso ou se veja com o quadro de diarréia crônica, típico sintoma dos
antirretrovirais. Não raras vezes, o médico se vê obrigado a informar o CID 10:
B20 – B24, que caracterizará doenças pela presença do HIV, geralmente são
doenças infecciosas e parasitárias resultantes da atuação do vírus.
Para ilustração, reproduz-se aqui o referido CID 10 – B20 e suas
subdivisões:
CID 10 - B20 Doença pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV),
resultando em doenças infecciosas e parasitáriasCID 10 B20.0 Doença
pelo
HIV
resultando
em
infecções
micobacterianasCID 10 - B20.1 Doença pelo HIV resultando em
outras infecções bacterianasCID 10 - B20.2 Doença pelo HIV
resultando em doença citomegálicaCID 10 - B20.3 Doença pelo HIV
resultando em outras infecções viraisCID 10 - B20.4 Doença pelo
HIV resultando em candidíaseCID 10 - B20.5 Doença pelo HIV
resultando em outras micosesCID 10 - B20.6 Doença pelo HIV
resultando em pneumonia por Pneumocystis jiroveciiCID 10 B20.7 Doença pelo HIV resultando em infecções múltiplasCID 10 B20.8 Doença pelo HIV resultando em outras doenças infecciosas e
parasitáriasCID 10 - B20.9 Doença pelo HIV resultando em doença
infecciosa ou parasitária não especificada
Outra doença comum aos soropositivos é a depressão, doença
subjetiva que cujos estágios diferenciados podem evoluir gradualmente para a
forma crônica, mas que necessariamente não caracterização o afastamento
prolongado do soropositivo, sendo necessário muitas vezes associá-la como
conseqüência da condição de soropositivo e não como doença isolada, que por
si só, justificaria o afastamento de determinado profissional.
A ligação entre a medicina, a ética médica e o Direito Previdenciário
culmina, na maioria das vezes, na exposição indesejada do soropositivo em
seu meio social.
No momento em que o CID é informado, o empregador toma ciência, seja por
curiosidade, principalmente se o afastamento é prolongado, seja por
preocupação com a ausência do empregado por quem tenha estima ou cuja
prestação de serviço seja de tal qualidade que uma ausência prolongada lhe
sugira uma súbita queda no lucro ou produtividade.
Mesmo que a legislação preveja sanção para a discriminação ao soropositivo,
poucos portadores se sentem confortáveis quando retornam ao trabalho após a
divulgação do CID correspondente às doenças por HIV. Ainda que não seja
verdade, ainda que o empregador ou o responsável pelo Departamento de
Recursos Humanos não tenha pesquisado o referido Código, ou se o tenha
feito, não o tenha divulgado aos colegas de trabalho do portador; este, ao
retornar se sentirá alvo das conversas que cessam ou se tornam inaudíveis em
sua presença ou dos olhares furtivos ou piedosos que captar.
Não raro o pedido voluntário de demissão ou uma reação que enseje a
dispensa por iniciativa do empregador. Muitas vezes o soropositivo prefere ter
o seu vínculo de emprego interrompido para “começar de novo” em outra
empresa que conviver diariamente com a dúvida sobre a impressão ou
pensamento dos superiores ou colegas a seu respeito.
O quadro se repete sempre que um afastamento por motivo de saúde seja
necessário.
Como o vírus ainda não se tornou doença em evolução, o soropositivo
não demonstra estar contaminado e o velho – e inapropriado – slogan: Quem
vê cara não vê AIDS, torna-se uma verdade. A maioria dos soropositivos não
sofrerá com a AIDS, ou seja, o vírus não evoluirá até a fase terminal da
doença, cujos sintomas são visíveis.
Embora a lipodistrofia, outro efeito comum dos antirretrovirais, que
consiste no acúmulo de gorduras em determinadas partes do corpo e redução
da massa muscular em outros, principalmente na face, pareça, ao soropositivo
um imenso outdoor em neon que denuncia sua realidade; poucas pessoas
percebem que aquele acúmulo de barriga ou que o rosto afinado seja efeito de
um medicamento.
A lipodistrofia é uma das causas da depressão do soropositivo, que
observa gradualmente as alterações físicas sofridas ao longo do tratamento e
enfrenta as perguntas indiscretas ou comentários grosseiros das pessoas que
fazem parte do seu círculo de convivência. Muitas vezes, um soropositivo
abandona um emprego que lhe é agradável por não desejar enfrentar todos os
dias as constantes inferências sobre o seu aspecto físico.
O Estado garante aos soropositivos os tratamentos estéticos que
minimizem a lipodistrofia, porém é de conhecimento público a realidade do
Sistema Único de Saúde do país, que não consegue atender à demanda de
doenças simples da comunidade e longe está de oferecer o número de
tratamentos demandados pelos soropositivos.
Todos os aspectos da vida humana estão intrinsecamente interligados.
Qualquer problema profissional interfere na vida familiar do ser humano, pois o
trabalho é a fonte de manutenção de sua vida.
A condição de um membro soropositivo causa, por si só, um choque
nas relações familiares e sociais, normalmente não se conversa sobre o HIV
como se conversa sobre uma gravidez indesejada, por exemplo. A princípio
esta provoca um impacto negativo, mas à medida que se pensa no assunto,
associa-se o bebê que chega como “vida nova”, como perpetuação da família.
O resultado positivo para o HIV, ao contrário, sugere que alguém esteja
propenso a “deixar mais cedo” o seio familiar. Não ignorando o fato de que a
forma de contágio, provoca desconforto, principalmente se o meio de
transmissão foi o sexo, ou se a família desconhecia a condição de usuário de
drogas injetáveis do soropositivo.
Em ambos os casos, o constrangimento familiar será duplo: exposição
de sua intimidade ou de seus hábitos como usuário de drogas associado ao
fato de ser portador do vírus HIV.
Na maioria das famílias o soropositivo caminha solitário em seu
tratamento, poucos familiares ou amigos freqüentam os grupos de apoio ou
incentivam-no a fazê-lo, recolhem-se em suas dúvidas e silenciosas
ponderações, evitando terminantemente conversas que tenham como tema a
realidade enfrentada tanto pela pessoa contaminada pelo vírus como pela
família que se vê obrigada a compreender que um dos seus membros esteja
com algo fatal em seu organismo, podendo inclusive, mesmo que
acidentalmente – embora os soropositivos sejam devidamente orientados
quanto às prevenções a serem tomadas no meio doméstico -, contaminar outro
membro.
O Estado através de campanhas, busca educar a população sobre o
HIV/AIDS, tanto quanto à forma de contágio e prevenção como quanto ao fato
de ser o soropositivo ou portador uma pessoa que, como todo ser humano,
merece carinho, afeto, vida sexual saudável, trabalho, respeito, cuidados e
liberdade.
Tais campanhas nem sempre atingem seu objetivo, ao invés de
protegerem o portador ou o soropositivo, fazem com que estes sejam
associados a uma doença para a qual não há vacina e que causa a morte,
embora seja informado que HIV/AIDS não matem. Passam a combater então o
soropositivo ou o portador, como melhor maneira de prevenir-se do contágio.
Os grupos de apoio, por sua vez, são em sua maioria Organizações
Não-Governamentais e dependem de ajuda financeira da comunidade civil para
realizarem a maioria de suas atividades.
Organizações como o Grupo Vhiver e o GAPA, são, efetivamente, o
melhor lugar para acolher os soropositivos, possuem equipe multidisciplinar
que orienta, educa, apóia e oferece um espaço dialógico onde o tema
HIV/AIDS não é tratado como tabu. Ao contrário, nos grupos de apoio o
soropositivo convive entre os seus pares podendo dividir com estes suas
angústias, dúvidas, medos, decepções e vitórias.
4 CONCLUSÃO
É de fundamental importância a participação da comunidade civil,
principalmente dos meios acadêmicos no processo desenvolvido e no serviço
prestado pelos grupos de apoio, cada um dentro de sua especialidade, cada
um dentro de suas possibilidades, contribuindo para que a informação,
principalmente as questões ligadas à cidadania, cheguem ao soropositivo
assintomático ou sintomático.
Nenhuma lei será eficaz sem que a sociedade a recepcione. Para
recepcioná-la é necessário o devido conhecimento, as devidas ponderações,
os constantes diálogos com aqueles a quem ela tutela.
Nenhuma sociedade será inclusiva se a responsabilidade sobre a
inclusão tornar-se exclusiva deste ou daquele segmento social.
A discussão sobre a HIV/AIDS no meio acadêmico não atingiu a
dimensão devida. É necessário que a legislação que tutela os direitos dos
soropositivos seja discutida de maneira séria, de forma multidisciplinar e que a
academia promova a inclusão social dos portadores do vírus do HIV
oferecendo espaço para que os alunos e professores dialoguem abertamente
com os grupos de apoio e os soropositivos.
A legislação não prevê a proteção subjetiva ao soropositivo
assintomático, embora preveja o direito ao sigilo, este é facilmente quebrado
pelas próprias contingências oferecidas pelo vírus ao portador.
Não há diálogo entre a comunidade acadêmica e os soropositivos, nem
se verifica, principalmente no Direito, a devida abordagem a um fenômeno
social que não atinge apenas os adolescentes, englobando também adultos e
crescendo sua incidência entre os idosos, após o surgimento dos estimulantes
sexuais.
Continua o tabu em relação ao assunto, enquanto isso os soropositivos
tateiam em busca de ajuda, as leis continuam ineficazes, as famílias
permanecem isoladas em seus dramas pessoais e a sociedade não evolui em
direção à efetivação dos princípios e garantias constitucionais.
Não haverá combate ao HIV/AIDS enquanto as informações não chegarem
como deveriam chegar, de maneira clara e precisa.
As leis são criadas sem a participação do meio acadêmico, é verdade. Mas o
meio acadêmico dever traduzir as leis para a sociedade e, quando as leis
deixarem de ser ininteligíveis, a sociedade inclusiva será realmente inclusiva,
pois todos os cidadãos conhecerão não apenas o texto legal, mas os
fundamentos basilares da verdadeira sociedade: a solidariedade, o respeito, a
fraternidade e principalmente, o diálogo.
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