Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos

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Semiologia do Sistema
Visual dos Animais
Domésticos
ALEXANDRE LIMA DE ANDRADE
"NlJM GRÃO DE AREIA ENXERGAR O MUNDO E, NUMA FLOR SILVESTRE, TODO O CÉU."
(Willian Blake)
INTRODUÇÃO
Em oftalmologia veterinária, apesar de o clínico geral possuir conhecimentos de anatomia e fisiologia oculares, para se realizar um exame
completo do olho, acredita-se que haja necessidade de um treinamento
técnico específico para que se alcance um exame oftalmológico de
qualidade, principalmente no que se refere ao manuseio de equipamentos específicos que são necessários.
Das estruturas que compõem o aparelho da visão, não há como
discriminar a importância de uma estrutura em detrimento das demais.
Todas, em sua função, colaboram para a boa visão. O tempo, a evolução
e os avanços médicos têm demonstrado que cada componente desse
sistema participa efetivamente do mecanismo de formação da imagem
colocando, assim, o organismo em contato com o meio externo.
Será abordado de forma direta e prática como proceder para o exame
do olho das espécies domésticas.
690
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
CONCEITOS GERAIS SOBRE
ANATOMIA
E FISIOLOGIA OCULAR
Órbita
A forma do crânio influencia a formação da
órbita dos animais domésticos, já que é formada
pelos ossos frontal, lacrimal, esferóide, zigomático,
palatino e maxilar. Deve-se considerar que, no
cão, os processos ósseos formadores da órbita dos
ossos frontal, zigomático e temporal não se fundem; portanto, o que completa a parede orbitaria
lateral é um forte ligamento orbitado fibroso. O
mesmo ocorre no crânio dos felinos. A depressão
orbitaria continua para dentro da fossa temporal.
O osso frontal forma o teto e a parede dorsomedial da órbita, assim como a margem dorsal e
central da órbita. A margem central do osso lacrimal é perfurada pela fossa vasolacrimal, que acomoda a parte caudal do dueto nasolacrimal.
Anexos Oculares
Pálpebras e Conjuntiva
hs pálpebras, nos animais domésticos, são em
número de três, constituindo em: superior, inferior e terceira pálpebra. A superior e a inferior
convergem e se unem, formando os ângulos medial e lateral. O espaço entre elas é denominado
de rima da pálpebra (com tamanho variável, dependendo se abertas ou fechadas). A face exterior
está coberta de pêlos; a interior é revestida pela
conjuntiva, uma camada de túnica mucosa sublinhada por faseia. A conjuntiva segue em direção
ao bulbo ocular, inserindo-se a ele, próximo à junção cornoescleral ou límbica, formando, assim, a
conjuntiva bulbar. As reflexões conjuntivais são
chamadas de fórnice. A união da pele com a conjuntiva ocorre na borda palpebral.
O epitélio da conjuntiva do cão contém células caliciformes e nódulos linfáticos. A pálpebra
possui glândulas que secretam fluidos seroso e
sebáceo. A nutrição arterial da conjuntiva é feita
pelas seguintes artérias: vasos periféricos das pálpebras, vasos marginais das pálpebras e artéria ciliar
anterior.
As glândulas palpebrais abrem-se próximas à
base dos cílios. As glândulas társicas estão sob a
mucosa da conjuntiva, próximo à margem da pál-
pebra. Situam-se paralelas umas às outras, podendo
haver 40 glândulas em cada pálpebra.
Os animais domésticos possuem cílios apenas
nas pálpebras superiores. O pêlo da face externa
aponta, normalmente, para fora da abertura palpebral. Os cílios possuem função sensorial para que
se efetue o efeito de proteção das pálpebras. A
secreção das glândulas társicas, além das células caliciformes, contribuem para a retirada de lipídeos e
fixação de mucopolissacarídeos do filme pré-corneal.
A terceira pálpebra está localizada no ângulo
medial da fissura das pálpebras. A borda livre da
terceira pálpebra está normalmente exposta e possui
uma face convexa (palpebral ou externa) e côncava (interna ou bulbar).
A glândula da terceira pálpebra é bem superficial. Ela se abre por meio de diversos duetos,
dentro do saco conjuntival. Possui uma cobertura
gordurosa e pode ser confundida com tecido linfóide, na face bulbar da terceira pálpebra. Esse
tecido está mais próximo à margem livre da pálpebra. A mucosa da terceira pálpebra pode conter
células caliciformes intercaladas com células epiteliais de sua superfície. Essa mucosa cobre uma
placa de cartilagem hialina, com formato de "T"
invertido. Nos gatos, a conjuntiva que cobre a
superfície palpebral da terceira pálpebra é áspera,
devido a pequenas papilas dispensadas sobre sua
superfície. A conjuntiva que cobre a face bulbar
da terceira pálpebra possui nódulos linfóides maiores
quando comparados aos encontrados na conjuntiva palpebral.
A terceira pálpebra, no gato, pode cobrir metade
da superfície da córnea, quando o bulbo do olho
está retraído no sentido do ápice da órbita. Na
maioria dos animais, a terceira pálpebra é movimentada graças a uma musculatura vestigial.
Sendo assim, a terceira pálpebra é formada por:
a) cartilagem em forma de T; b) glândula da terceira pálpebra; c) cobertura conjuntival (faces bulbar
e palpebral); e d) folículos linfóides superficiais
na face bulbar.
Para a movimentação das pálpebras, estão
envolvidos diversos músculos superficiais e um músculo levantador mais profundo. Os músculos superficiais são o músculo orbicular do bulbo, levantador do ângulo do bulbo medial e frontal. O
músculo orbicular do bulbo circunda completamente a rima da pálpebra e é bem desenvolvido. O
músculo retrator do ângulo do bulbo surge de uma
parte do músculo frontal; cruza as fibras do músculo orbicular antes de se entrelaçar com suas fibras dispostas concentricamente.
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
Os músculos superficiais são inervados pelo
ramo auriculopalpebral do sétimo nervo craniano
(facial). O suprimento de nervos sensoriais é feito por ramos da parte oftálmica do quinto nervo
cranial. O suprimento sanguíneo surge das artérias molar e temporal.
O músculo levantador da pálpebra superior é
um músculo delgado que surge na parte caudal da
órbita, entre o músculo reto dorsal e o músculo
oblíquo dorsal. E inervado pelo nervo oculomotor.
A conjuntiva da pálpebra é suprida pelas artérias palpebral e ciliar anterior.
A glândula nictitante está associada à cartilagem da terceira pálpebra, produzindo uma secreção seromucóide, que funciona como um lubrificante ocular semelhante à secreção da glândula
lacrimal. Possui formato triangular e não é muito
volumosa no gato.
Como funções, as pálpebras servem para: a)
proteção, devido à sensibilidade ciliar; b) secreções das glândulas társicas c células caliciformes;
c) proteção física contra trauma, evaporação de
lágrima e distribuição da lâmina pré-corneal pelos
movimentos; d) drenagem de lágrima para o dueto nasolacrimal.
Aparelho Lacrimal
É constituído pela glândula lacrimal e seus duetos, o lago lacrimal, o saco lacrimal e o dueto nasolacrimal. A glândula lacrimal é lobulada e possui coloração vermelho-clara ou rósea; é achatada, possui sua
localização entre o bulbo ocular, o ligamento orbitário e o processo zigomático do osso frontal; está dentro
da periórbita, mas pode ser separada dos músculos
retos pela delgada camada superficial da faseia orbitaria. Possui localização dorsolateral ao bulbo ocular.
Existem de três a cinco dúctulos excretores. Os
dúctulos esvaziam-se dentro do fórnice superior. A
glândula nictitante é considerada uma glândula lacrimal acessória. A secreção dessas glândulas flui sobre
a córnea até o ângulo medial do olho para se acumular no lago lacrimal.
Os pontos lacrimais são as aberturas dos canais lacrimais. Elas se situam próximas à margem
bulbar da pálpebra e podem ser de formato oval.
Os canais lacrimais correm dentro das pálpebras
convergindo para o saco lacrimal, dentro do qual
abrem-se, individualmente. O saco lacrimal é a
terminação caudal do dueto nasolacrimal, situando-se em uma fossa do osso lacrimal. No cão, o
dueto nasolacrimal possui três partes: caudal, com
forma de arco, média e livre. O dueto nasolacrimal pode se estender rostralmente até a narina
691
externa e desembocar dentro da cavidade nasal,
por uma falha no dueto, no lado oposto ao plano
mediano, no mesmo animal (Fig. 14.1).
No gato, a glândula lacrimal é pequena, encontrada entre duas camadas de periórbita. Ela se
esvazia dentro do fórnice da pálpebra superior por
meio de diversos duetos. O suprimento sanguíneo
é bem desenvolvido. A glândula é tubuloacinosa e
sua secreção é seromucosa.
Filme Pré-corneal
O filme pré-corneal, também conhecido como
lágrima, é uma camada de proteção essencial às conjuntivas palpebrais e à superfície ocular. Ele é secretado pelas glândulas lacrimal principal (porção aquosa
da lágrima), da terceira pálpebra (porção aquosa da
lágrima) e társicas (porção lipídica da lágrima), além
das células caliciformes da conjuntiva (porção mucóide
da lágrima). As suas funções são: 1. manter uma superfície corneana opticamente uniforme; 2. remover debris e corpos estranhos da córnea e do saco
conjuntival; 3. fornecer um meio de transferência do
oxigénio atmosférico, células inflamatórias e anticorpos
para a córnea; 4. ação antimicrobiana.
A inervação da glândula lacrimal e o controle
de sua secreção são realizados por fibras da divisão oftálmica do nervo trigêmeo, facial e ganglionar pterigopalatino, além de fibras simpáticas do
plexo carotídeo, que chegam à glândula lacrimal.
Periórbita e Faseias Orbitarias
A periórbita é a camada externa de faseia que
circunda o conteúdo da órbita. Na faseia da órbita
do cão há uma camada distinta que circunda os
ventres dos músculos extra-oculares. A faseia do
Figura 14.1 - Representação esquemática do sistema lacrimal do cão. a = ponto lacrimal; b = glândula lacrimal
principal; c = saco lacrimal; d = dueto nasolacrimal; e =
ponto nasal.
692
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
v^uílQro 14.
— ricrici O o o s i c .
História Clínica:
Local de Exame:
Data:
Médico Veterinário:
OLHO ESQUERDO
OLHO DIREITO
•
l
•
Reflexos:
l Direto
PH Consensual
0
Microbiologia
l
l Citológico
•
Teste da Lágrima de Schirmer 1 :
|
| mm/minuto
•
Teste da Lágrima de Schirmer 2:
l
l Direto
f l Consensual
l
l Microbiologia
l
•
Teste da Lágrima de Schirmer 1:
|
•
Tonometria de Indentação:
l
l PIO - Schiõtz: _ mmHg (Peso:
•
Tonometria de Aplanação:
l
l P IO - T on o- p en : _ m m H g
•
Teste da Lágrima de Schirmer 2:
l mm/minuto
•
l
Tonometria de Indentação:
l PIO - Schiõtz: ____mmHg (Peso:
•
l
l Citológico
| mm/minuto
l
1 l mm/minuto
Reflexos:
)
Tonometria de Aplanação:
l PIO -Tono-pen: ____ mmHg
Pálpebra
Pálpebra
Terceira Pálpebra
Terceira Pálpebra
Aparelho Lacrimal
Aparelho Lacrimal
Teste de floculação da lágrima:
Teste de floculação da lágrima:
Tempo de ruptura do filme lacrimal:
Tempo de ruptura do filme lacrimal:
Teste de canulação do dueto nasolacrimal:
Teste de canulação do dueto nasolacrimal:
Teste de patência do dueto nasolacrimal (Teste de Jones):
Teste de patência do dueto nasolacrimal (Teste de Jones):
Conjuntiva
Conjuntiva
Teste de Rosa Bengala:
Teste de Rosa Bengala:
Córnea
Córnea
Continua
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
693
Quadro 14.1 - (Conf.) Ficha oftalmológica.
•Teste de Fluoresceína:
Teste de Fluoresceína:
Câmara Anterior e Ângulo de Drenagem
Câmara Anterior e Ângulo de Drenagem
Gonioscopia:
Conioscopia:
íris e Espaço Pupilar
íris e Espaço Pupilar
Lente
Lente
Vítreo e Fundo de Olho (retina)
Vítreo e Fundo de Olho (retina)
Procedimentos Especiais
Procedimentos Especiais
l
IERG
l
l Ecografia Ocular
l Ecografia Ocular
Achados:
Achados:
TRATAMENTO (S)
DIAGNÓSTICO (S)
bulbo passa do bulbo para o nervo óptico, onde
continua como a camada externa de faseia que
circunda o nervo óptico.
Músculos c/o Bulbo Ocular
Os músculos extra-oculares estão expostos
após a abertura da periórbita. São eles: reto superior, reto inferior, reto lateral, reto ventral, oblíquo superior, oblíquo inferior e retrator do bulbo
ocular, que não está presente no homem.
Os quatro músculos retos inserem-se na esclera, posteriormente ao limbo do globo ocular. Os
músculos reto medial, lateral e dorsal possuem
origens na periferia do forame óptico. O músculo
oblíquo ventral tem origem próxima à sutura entre os ossos lacrimal e maxilar. O músculo retrator
do bulbo é constituído por 4 feixes musculares
distintos que possuem suas origens próximas à
margem medial da fissura orbitaria.
Globo Ocular
O globo ocular é constituído por três túnicas
observadas em todos os vertebrados: a camada ex-
694
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
terna chamada fibrosa (córnea e esclera), a camada
média ou túnica vascular (íris, corpo ciliar e coróide)
e a camada interna ou túnica nervosa (retina).
O bulbo ocular fornece uma visão monocular
ou binocular, dependendo da espécie.
Túnica Fibrosa
A córnea é uma estrutura anesférica e transparente que, juntamente com a esclera, compõe
a túnica fibrosa do olho. A região de transição entre
essas duas estruturas chama-se limbo esclerocorneal,
que é um pouco mais largo nas porções inferior e
superior. Naturalmente não pigmentada e avascular,
desempenha as funções de manutenção da forma
do olho, além da convergência dos raios luminosos nela incidentes (Dyce e cols., 1990). Apresenta
importantes propriedades ópticas, graças a seu
formato, índice refrativo e transparência, funcionando como uma lente convergente, responsável
por 70% do poder dióptrico do olho do homem e
por 80% do poder total de refração nas espécies
domésticas, comparativamente às demais estruturas especializadas nessa função. Confere, também, estrutura e proteção ao olho, graças a sua alta
resistência mecânica.
No cão e em outras espécies animais, a córnea
é formada por quatro camadas distinguíveis, da mais
externa para a mais interna: epitélio, estroma, lâmina
limitante posterior (membrana de Descemet) e endotélio.
A camada de Bowman, descrita no homem, não foi
encontrada nas espécies domésticas (Shively e
Epling, 1970). Na Figura 14.2, são demonstradas,
microscopicamente, essas camadas.
Kesclera é uma estrutura opaca na qual sua parede
fibrosa é de espessura variável. As áreas mais espessas estão na região do corpo ciliar e ao redor da
área cribiforme, na qual o nervo óptico penetra na
esclera. Os músculos extra-oculares inserem-se na
esclera anterior, onde ela é mais espessa. O músculo retrator do bulbo ocular tem sua inserção em uma
região bem delgada da esclera.
A esclera é constituída por fibras colágenas e
elásticas, possuindo uma coloração branca, apresentando-se inervada e irrigada pelos vasos ciliares.
Os vasos ciliares posteriores perfuram a esclera,
próximo ao disco óptico. Os vasos ciliares anteriores passam pela esclera, posteriormente ao limbo
(limite entre a córnea e a esclera). A esclera pode
aparecer escura em determinadas áreas, devido
aos vasos da coróide que estão subjacentes a ela;
podem estar mais próximos à superfície do bulbo
ocular, onde essa camada é delgada. Quando ocorre
uma ligeira pigmentação da esclera, isso é observado especialmente nos lados medial e lateral. Os
nervos ciliares passam pela esclera na região da
substância própria.
Túnica Vascular
A túnica vascular ou trato uveal localiza-se
entre a camada fibrosa e a retina e é constituída
pela íris, corpo ciliar e coróide. A íris e o corpo
ciliar fazem parte da úvea anterior, ao passo que
a coróide faz parte da úvea posterior.
A coróide reveste a esclera a partir do nervo
óptico até quase o limbo. Contém uma rede compacta de vasos sanguíneos embutida em tecido
conjuntivo, intensamente pigmentado. Essa rede
capilar é suprida pelas artérias ciliares posterio res e drenada pelas veias vorticosas. O tapetum
lucidum é uma das camadas da coróide e se caracteriza por uma camada fibrosa ou celular. Sua
superfície refletora de luz ou "espelho ocular"
orienta a luz incidida sobre a retina no sentido
das células fotorreceptoras contribuindo para uma
visão adaptada ao escuro (visão escotópica). A
forma, tamanho, cor e distribuição do tapetum
•a
Figura 14.2 -Aspecto microscópico da córnea do cão: a =
epitélio; b = estroma; c = lâmina limitante posterior (membrana de Descemet); d = endot élio.
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
lucidum varia entre as espécies. Ele é responsável pelo "brilho dos olhos", observado durante
o exame de fundo de olho, ou à noite, em condições de iluminação reduzida.
O corpo altar (continuação anterior da coróide)
c um anel em relevo, com arestas (conhecidas como
processos ciliares) emitidas em direção à lente. Entre
o corpo ciliar e a esclera, localiza-se o músculo ciliar
liso que atua na acomodação visual que, por sua vez,
é pobre nos animais, quando comparada à observada no homem. Os processos ciliares são em número
de 70 a 80, nos cães e 100, em bovinos e equinos.
Quando há contração ou relaxamento do músculo
ciliar, que está preso a essas estruturas, ocorre o que
é denominado acomodação visual, definida pela
capacidade do olho em focalizar objetos próximos
ou distantes, mudando o formato da lente (cristalino). O corpo ciliar do cão não possui grupos distintos de fibras musculares resultando, assim, em
uma capacidade limitada de acomodação.
No gato, o corpo ciliar só pode produzir acomodação limitada pela modificação do formato da
lente. Essa espécie possui um grande número de
fibras meridionais em seu músculo ciliar, porém
com reduzido número de fibras radiais e circulares. Assim, a contração do músculo ciliar promove: o relaxamento das zônulas da lente, com mudança no formato da lente e acomodação da visão,
bem como a drenagem do humor aquoso.
A íris é a extensão do revestimento da coróide para o compartimento anterior. As suas
margens livres da íris, que têm orientação radial,
definem o espaço pupilar ou pupila. O tamanho
da pupila e a quantidade de luz que atinge a retina são regulados pelos músculos esfincterianos
e dilatores lisos da íris. Ela possui a função de
controlar a passagem da luz pelo espaço pupilar.
A íris é constituída por um estroma esponjoso
formado por tecido conjuntivo frouxo, vasos sanguíneos, cromatóforos e músculo liso. A presença
ou ausência de melanina na íris determina a coloração da mesma. Quando azul, possui o estroma
essencialmente desprovido de melanina. Â medida que o número de células portadoras de melanina no estroma se eleva, a coloração da íris alterase do azul ao marrom. Equinos e bovinos possuem,
ainda, os grânulos iridais que estão presentes ao
longo da borda pupilar. Esses grânulos são uma
extensão proliferativa e bem vascularizada do estroma
irídico e do epitélio pigmentar. Essas estruturas de
aspecto cístico variam em tamanho, entre os
ungulados, sendo mais evidente nos equinos, ao longo
da borda dorsal da pupila.
695
Túnica Nervosa
Também conhecida como refina, a túnica nervosa é responsável pela recepção e tradução do
estímulo luminoso e a transmissão desses sinais
pelo nervo óptico, na forma de impulsos nervosos,
para o córtex visual.
A retina se inicia onde o nervo óptico penetra
na coróide, com o formato de um cálice côncavo,
revestindo a coróide e terminando na borda pupilar.
Apenas dois terços, aproximadamente, da retina
podem ser atingidos pela luz que penetra no olho
através do espaço pupilar. Com isso, apenas essa
porção da retina possui células receptoras.
Ela possui dez camadas de tecidos nervosos,
sendo a principal formada por células fotorreceptoras. Essas células são denominadas de cones e
bastonetes. Os bastonetes estão relacionados à visão
em preto e branco, ao passo que os cones, pela
visão em cores. Os bastonetes estão distribuídos
por toda a retina e são em menor número que os
cones, que apresentam uma distribuição predominante na área central retiniana. Essa porção
central é responsável pela visão sob intensa iluminação e pela visão aguda. A porção restante da
retina é rica em bastonetes que são responsáveis
pela adaptação da visão ao escuro.
Arteríolas e vênulas emergem do disco óptico
e se fundem de várias formas para nutrir e drenar
a retina. As arteríolas são ramos da artéria central
da retina que chega ao disco do nervo óptico em
seu centro. A distribuição dos vasos retinianos varia
entre as espécies domésticas. A maioria dos animais domésticos (grandes e pequenos ruminantes, suínos e carnívoros) e primatas possui um padrão
vascular denominado holangiótico, caracterizado
pela distribuição dos vasos retinianos principais, a
partir da papila óptica. Os equinos possuem um
padrão parangiótico, que se caracteriza pela presença de poucos vasos sanguíneos restritos à área
da papila óptica.
O cão possui um fundo de olho em que os vasos
sanguíneos são uma continuação direta das artérias principais ou uma rede ciliorretiniana. Normalmente, há duas ordens ou tamanhos de veias
e uma ordem de artérias visíveis, quando o fundo
do olho for examinado por meio de oftalmoscopia.
As veias do fundo do olho são menos tortuosas que
as artérias. Tanto a ordem primária de veias como
a secundária são maiores que as artérias, sendo a
circulação venosa de um vermelho mais escuro que
a arterial. As veias estão dispostas ao redor do disco
óptico, de tal modo que pode haver um vaso dor-
696
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
sal, ventral, ventronasal e ventrotemporal. As veias
fúndicas primárias formam um círculo, um semicírculo ou um "Y" invertido dentro do disco.
A papila óptica (disco) pode ser redonda, oval,
triangular e até quadrangular. A coloração varia
do cinza ao cor-de-rosa e pode estar alterada pelo
grau de plenitude das anastomoses venosas dentro do disco.
O epitélio pigmentar da retina é a sua camada
mais externa, sendo pigmentada (coloração homogénea marrom) apenas no pólo inferior da retina.
A função desse epitélio pigmentar é essencial para
a integridade e funcionabilidade da retina.
A retina é a membrana metabolicamente mais
ativa do corpo, indicada pelo alto consumo de
oxigénio. Interrupção em qualquer vaso coroidal
ou retiniano resulta em rápida isquemia com grave e irreversível perda de função.
Câmaras do Olho
A câmara anterior do bulbo ocular está circundada anteriormente pela córnea e posteriormente pela íris. Ela se comunica pela pupila com
a câmara posterior. Esta se reserva a um pequeno espaço anular, de seção transversal triangular, limitado anteriormente pela íris, posteriormente pela parte periférica da lente (cápsula
anterior da lente) e seus ligamentos e externamente pelos processos ciliares. As câmaras estão ocupadas pelo humor aquoso, um fluido
límpido que consiste de aproximadamente 98%
de água, pequena quantidade de cloreto de sódio e traços de albumina e substâncias extrativas.
Ele é produzido pelo corpo ciliar por meio de
um processo de ultrafiltração sanguínea, sendo
essencialmente drenado através dos espaços da
zônula ciliar para dentro do plexo venoso da
esclera. A câmara vítrea do bulbo está situada
entre a lente e a retina e contém o humor vítreo. O humor vítreo é um gel complexo composto por 99% de água, fibras colágenas, hialócitos
e mucopolissacarídeos.
As fibras colágenas estão presentes em concentrações crescentes da base e ao redor do disco
óptico. A inserção dessas fibras na cápsula posterior da lente da face vítrea anterior é significante
em cães.
Os mucopolissacarídeos contêm alta proporção de ácido hialurônico, fato relacionado às fibras
colágenas e hialócitos. O ácido hialurônico dá
viscoelasticidade ao humor vítreo.
Meios de Refração
Os meios de refração dos olhos são: córnea,
câmara anterior, lente e vítreo. A lente é uma estrutura biconvexa composta de células e seus
processos. As células crescem de tal modo que a
lente é formada por lâminas concêntricas de fibras lenticulares. Existem quatro estruturas distintas na lente: as cápsulas anterior e posterior da
lente, córtex e núcleo da lente.
A lente é transparente, avascular e está presa
pelo seu equador por meio das zônulas da lente
(ligamentos suspensórios), que são fibras colágenas atadas ao corpo ciliar. Alterações na tensão
dessas fibras mudam a curvatura das superfícies
da lente, resultando em acomodação visual, já
descrita anteriormente.
A face interna da cápsula anterior possui um
epitélio composto por células epiteliais cubóides
e epiteliais colunares. Esse epitélio é importante
no transporte de cátions pela cápsula da lente. As
células da lente produzem a substância do córtex
e as arranja em sucessivas camadas presas umas
às outras pelo cemento.
Devido ao fato de ser avascular, o seu metabolismo é precário e depende de um constante
fornecimento de nutrientes pelo humor aquoso.
Qualquer distúrbio na composição do mesmo
afeta o metabolismo da lente, podendo levar a
opacificações das suas estruturas, caracterizando o que se denomina de catarata. As Figuras
14.3 e 14.4 mostram esquematicamente as estruturas descritas.
Irrigação Sanguínea e
Inervação do Olho
Nos animais domésticos, a irrigação do olho é
feita pela artéria oftálmica interna rudimentar. A
principal irrigação nos mamíferos domésticos é dada
pela artéria oftálmica externa, um ramo derivado
da artéria maxilar que passa ventralmente à órbita
para irrigar estruturas mais rostrais da face. Essas
artérias podem ser divididas em três grupos: 1. ramo
da artéria oftálmica externa (que irriga o bulbo ocular,
túnica vascular e retina); 2. vasos que irrigam os
músculos extra-ocularcs; 3. vasos que deixam a órbita
para irrigar os anexos oculares.
A inervação do olho é feita por seis nervos
cranianos: nervo óptico (II par), nervo oculomotor (III par), nervo troclear (IV par), nervo trigê-
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
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697
A pupila possui inervação simpática e parassimpática ipsilateral, o que resulta em dilatação e
constrição pupilar, respectivamente (ver capítulo
sobre Sistema Nervoso).
EXAME CLÍNICO OFTÁLMICO
DOS ANIMAIS DOMÉSTICOS
Figura 14.3 -Aspecto externo do olho do cão. Legenda: a =
pálpebra superior; b = pálpebra inferior; c = canto medial;
d = canto lateral; e = terceira pálpebra.
Figura 14.4 - Estruturas oculares em corte sagital. Legenda: a = córnea; b = esclera; c = câmara anterior; d = espaço pupilar; e = íris; f = corpo ciliar; g = fibras zonulares;
h = lente; i = câmara vítrea; j = coróide; k = retina; l =
disco óptico; m = nervo óptico.
meo (V par), nervo abducente (VI par) e nervo
facial (VII par). A maioria entra no cone orbitário,
mas alguns atingem diretamente as estruturas
acessórias. A via visual inclui o nervo óptico, o
quiasma óptico, núcleos geniculados laterais, as
radiações ópticas e o lobo occipital do córtex cerebral. Setenta e cinco por cento das fibras do nervo
óptico cruzam o quiasma óptico em cães e 65%,
nos gatos. Sendo assim, a maior parte da sensação visual tem uma representação contralateral
no córtex cerebral.
Serão descritos a seguir alguns aspectos comparativos do exame clínico dos olhos, órbita e anexos
oculares das espécies domésticas. O exame clínico
oftálmico é uma extensão do exame físico e não deve,
portanto, ser realizado isoladamente, pois há muitas manifestações oculares decorrentes de doenças
sistémicas, principalmente as relacionadas à túnica vascular do olho. Em geral, as doenças sistémicas que afetam globo ocular e anexos causam sinais
bilaterais, enquanto os sinais unilaterais resultam,
provavelmente, de doenças locais.
O clínico deve sempre detalhar a anamnese,
realizai o exame físico completo, bem como indicar exames laboratoriais complementares e, por fim,
investigar cautelosamente os sinais clínicos oculares apresentados.
O exame oftálmico deve ser realizado de
maneira sistemática, ou seja, com a avaliação das
estruturas extra-oculares, seguida da avaliação das estruturas mais externas para as mais internas do bulbo
ocular. Para tanto, há necessidade da utilização de
alguns equipamentos, principalmente aqueles que
promovem magnificação da imagem.
Equipamentos Necessários para
Realização do Exame Oftálmico
Muitas vezes, há uma certa relutância em se
realizar o exame oftálmico, pensando-se que são
necessários equipamentos de última geração e de
elevado custo. Obviamente, tê-los à disposição para
realização de um exame detalhado e preciso do
olho constitui-se em um fato importante. Talvez
isso desencoraje os clínicos gerais a possuírem apreço
à Oftalmologia Veterinária.
Basicamente, são necessários para a realização de um exame oftálmico completo: uma sala
escura, fonte de luz artificial e uma lupa com pala,
alguns instrumentos específicos, colírios para promover a dilatação pupilar e colírios à base de corantes vitais. O Quadro 14.2 relaciona os principais equipamentos e materiais necessários para o
exame oftálmico.
698
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
Quadro 14.2 - Principais equipamentos e materiais necessários para realização de um exame
oftálmico completo em animais domésticos.
Lupa com pala.
Fonte de luz artificial (lanterna).
Transiluminador.
Oftalmoscópio direto.
Oftalmoscópio indireto.
Lente de 20 dioptrias.
Lâmpada de fenda.
Tonômetro de indentação (Tonômetro de Schiõtz).
Tonômetro de aplanação (Tono-pen(s).
Lente para gonioscopia.
Tiras de papel de Schirmer.
Colírio à base de corante vital de fluoresceína.
Colírio à base de corante vital de Rosa Bengala.
Colírio anestésico.
Colírios cicloplégicos (midriáticos).
Espátulas ou escovas de colheita para citologia.
Swabs estéreis.
Figura 14.5 - Exame oftálmico com lupa com pala e fonte
de luz (do próprio Oftalmoscópio direto).
Fonte de Luz Artificial (Lanterna)
Uma simples lanterna à pilha é bastante útil
para iluminar as estruturas extra e intra-ocular a
serem examinadas, embora lentes de aumento com
luz própria sejam melhores. Nesses casos, há no
mercado lentes nas quais pode ser acoplado um
filtro azul para facilitar a observação das lesões que
se coram pela fluoresceína (úlceras de córnea, por
exemplo).
te (Fig. 14.5). Instrumentos ópticos mais sofisticados que combinam magnificação e iluminação
(lupas com fontes de luz de fibra óptica, lâmpada
de fenda e microscópio cirúrgico) estão disponíveis no mercado; no entanto, em muitas situações,
o custo elevado dos mesmos não justifica a sua aquisição. Obviamente, eles apresentam resolução superior e são, muitas vezes, essenciais ao diagnóstico e tratamento de algumas afecções oftálmicas.
Magnificação dos Campos a
Serem Examinados (Lupas)
Transiluminador
A magnificação do campo a ser examinado (estruturas extra e intra-oculares) é essencial para o
exame acurado e diagnóstico. No mercado, há muitos instrumentos capazes de promover o aumento
das estruturas oculares a serem examinadas. A utilização de lentes de aumento comuns do mercado
deve ser considerada, mas as lupas com pala com
o aumento de duas até quatro vezes são superiores, além de facilitarem a manipulação do pacien-
Esse equipamento pode ser útil quando aplicado sobre a esclera, próximo ao limbo, para iluminar estruturas da câmara posterior. A luz passa pela esclera e contorna o corpo ciliar, podendo ser observadas estruturas opacas como tumores
no corpo ciliar e íris, corpos estranhos ou exsudatos no interior do olho (Fig. 14.6). Nesse
exame, há a obrigatoriedade de ser realizado em
sala escura.
Figura 14.6 - Representação esquemática do posicionamento do transiluminador na esclera.
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
699
Oftalmoscópio
Os oftalmoscópios são instrumentos que contem uma fonte luminosa e uma série de lentes e
espelhos. O objetivo da utilização desses instrumentos é visualizar as estruturas localizadas no
segmento posterior do globo ocular. Existem vários modelos de oftalmoscópios, mas apenas dois
métodos de oftalmoscopia: o direto e o indireto
(monocular e binocular). Quando comparados, cada
método apresenta algumas vantagens e algumas
limitações. De modo geral, a oftalmoscopia direta
continua, ainda, sendo o método mais utilizado no
Brasil, embora a oftalmoscopia indireta constituase em um método superior.
É importante lembrar que a oftalmoscopia,
tanto direta como indireta, deve ser realizada em
uma sala de exame semi-escura ou escura e os
olhos do paciente devem permanecer em midríase
induzida por drogas, para que as áreas mais periféricas da retina possam ser mais bem visualizadas. O fármaco recomendado para provocar
cicloplegia, em mamíferos, é a tropicamida nas
concentrações de 0,5% ou 1%, instilada sobre a
superfície do olho. Possui ação simpatomimética
de curta duração, provocando midríase durante
duas ou três horas.
Figura 14.8 - Melhores dioptrias do
Figura 14.7 - (A e B) Oftalmoscopia direta em cão.
oftalmoscópio direto para exame das estruturas oculares.
-3
+20
Oftalmoscópio Direto
O oftalmoscópio direto não é utilizado apenas para exame da retina, mas também para o
exame de estruturas do segmento anterior do
olho. Isso é possível graças ao sistema de lentes
que o equipamento possui que são reguláveis durante o exame permitindo um ajuste da profundidade do foco dentro do olho. O aparelho deve
ser colocado a 2cm do olho a ser examinado (Fig.
14.7). A Figura 14.8 mostra as dioptrias ideais
que devem ser ajustadas durante o exame para
melhor avaliação das estruturas oculares. As
mesmas podem variar dependendo do examinador, principalmente naqueles que apresentam
alterações de refração como miopia, hipermetropia, entre outros.
Oftalmoscópio Indireto
Nessa técnica, uma lente convexa de 10 a 30
dioptrias é colocada entre o olho a ser examinado
e o olho do observador clínico (ver Ficha Oftalmológica). Uma imagem real invertida é formada
entre a lente e o olho do observador. A magnificação da imagem do fundo de olho irá depender
do comprimento focal da lente (Fig. 14.9). A lente mais utilizada nesse exame é a de 20 dioptrias,
que fornece uma magnificação do campo de quatro a cinco vezes.
Tonômetros
A tonometria implica na avaliação da Pressão
Intra-ocular (PIO). A PIO resulta na tensão na
córnea e esclera. Vários métodos são aplicados para
estimá-la.
A PIO pode ser avaliada por palpação digital
(Fig. 14.10), ou seja, através de palpação do globo
ocular com os dedos polegares do examinador
700
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
Figura 14.9 - (A) Oftalmoscopia indireta monocular; (B) oftalmoscopia
indireta binocular.
Figura 14.10 -Avaliação da PIO por palpação digital. (A) avaliação da PIO de um dos
olhos; (B) comparação
das PIO entre os olhos.
colocados sobre as pálpebras superiores durante
o exame físico. No entanto, esta avaliação é pouco precisa, tornando-se inadequada para o exame
oftálmico de rotina. Deve ser utilizada quando não
se possuem os equipamentos disponíveis para
avaliação da PIO e depende da experiência clínica do examinador. Para clínicos experientes, consegue-se avaliar se a PIO está aumentada ou diminuída, o que pode auxiliar no raciocínio clínico.
Existem dois métodos básicos que são úteis na
avaliação da PIO: a tonometria de indentação e a
tonometria de aplanação.
Tonômetro de Indentação
Nesse tipo de tonometria, utiliza-se um equipamento chamado Tonômetro de Schiõtz (Fig.
14.11), o qual é colocado sobre a córnea, previamente dessensibilizada com colírio anestésico. O
princípio do exame com esse equipamento é facilmente compreendido se for feita uma analogia
do olho como um balão cheio de água. A extremidade metálica do equipamento é colocada sobre o
balão sem aplicação de força, deixando apenas que
o botão metálico encoste sobre a superfície do balão.
Sendo assim, o equipamento indenta a superfície
do balão a uma certa distância, marcando um valor que deve ser corrigido por uma tabela de conversão em mmHg.
Tonômetro de Aplanação
Existem vários tipos de tonômetros de aplanação para mensurar a PIO, incluindo o tonômetro de Maklakoff, Draeger, Perkins, Goldmann
e Mackay-Marg. Esses tonômetros são bem mais
precisos que o tonômetro de Schiõtz. O Tonopen®(Fig. 14.12) é mais utilizado por oftalmolo-
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
701
Contenção dos Animais para
Realização do Exame Oftálmico
Figura 14.11 -Tonômetro de Schiõtz para tonometria de
indentação.
Muitos cães e gatos podem ser examinados
apenas com uma boa contenção física, além do
uso de focinheiras ou mordaças. No entanto, ocasionalmente, os pacientes que não cooperam com
o exame devem ser, ao menos, tranquilizados com
associação de cetamina/diazepam ou com
fenotiazínicos (acepromazina, levomepromazina).
Quando a acepromazina é utilizada, observa-se
protrusão da terceira pálpebra sobre a superfície
ocular, além do efeito miótico do fármaco, o que
interfere no exame das estruturas intra-oculares e
na realização de determinados procedimentos
diagnósticos. Se for necessária a contenção farmacológica, antes da administração de qualquer substância, deve-se proceder a dilatação pupilar com
uso de cicloplégicos como a solução tópica de tropicamida 1% c/ou atropina 1%. Em alguns casos,
haverá a necessidade do uso de agentes anestésicos
gerais que promovam anestesia geral de ultracurta
Figura 14.12 - Tono-pen® para tonometria de aplanação
(foto gentilmente cedida por J. L. Laus).
gistas veterinários. Trata-se de um dispositivo com formato de caneta com um sensor na
extremidade que é capaz de mensurar precisamente a PIO por aplanação do olho, ou seja,
mensura a PIO com base na definição de pressão e força por unidade de área (P =//área). Se
a área é conhecida e a força mensurada, podese calcular a pressão.
Lâmpada de Fenda
O biomicroscópio ou lâmpada de fenda (Fig.
14.13) é um instrumento para o exame do olho com
magnifícação e iluminação da imagem que pode ser
superior a 40 vezes. Ela fornece riqueza de detalhes das estruturas extra e intra-ocular que as lupas
comuns não conseguem fornecer. É especialmente
útil ao exame da pálpebras, terceira pálpebra, conjuntiva, córnea, íris e lente, ou seja, o segmento
anterior do olho. Pode também fornecer a largura
do ângulo de drenagem e a profundidade da câmara
anterior. As modificações ópticas, o vítreo e a retina
também podem ser examinados. Existem dois tipos de lâmpada de fenda, um com estativa fixa e
outra portátil. Essa última é mais útil para o uso em
medicina veterinária.
Kyiliíi
FELIXE
Figura 14.13 - Lâmpada defenda (foto gentilmente cedida
por J. L. Laus).
702
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
duração, a exemplo do tiopental sódico. Nesse caso
será necessária a mobilização dos olhos para o exame,
uma vez que permanecem ventrofletidos sob efeito
desses fármacos.
Deve-se também conhecer os efeitos dos agentes
anestésicos sobre a Pressão Intra-ocular (PIO) e
secreção lacrimal, pois se pode ter influência sobre
os valores da mensuração da PIO e Teste da Lágrima de Schirmer, respectivamente. A anestesia do
nervo auriculopalpebral raramente é utilizada em
cães. Recentemente, onde há necessidade de promover a acinesia do globo ocular e analgesia, podese proceder ao bloqueio do ramo oftálmico do nervo trigêmeo associado ao bloqueio do nervo supraorbitário. Detalhes sobre a contenção química de
pequenos e grandes animais podem ser observados
nos capítulos de contenção física e química de
pequenos e grandes animais.
Em grandes animais, na maioria das vezes, a
contenção da cabeça com freio ou cabresto é suficiente. Se o cavalo for agitado ou movimentar
continuamente a cabeça, um cachimbo de contenção e sedação serão necessários. Em equinos,
as intervenções repetidas no olho, manipulações,
administrações de medicamentos e colheita de
amostras tornam-se mais difíceis à medida que
o número de intervenções aumenta. Sendo assim,
o uso de sedação associada à contenção física é
necessário (ver capítulo sobre Contenção Química em Grandes Animais). Adicionalmente à sedação e contenção física, muitas vezes são necessários anestesia tópica e bloqueio de condução, especialmente quando há lesão dolorosa, além
de facilitar a abertura das pálpebras. Embora o
globo ocular, conjuntiva e a maior parte das pálpebras adjacentes e pele possam ser anestesiados pelo bloqueio do nervo oftálmico, a anestesia tópica com cloridrato de proximetacaína 0,5%
é o método preferido para a anestesia da córnea
e conjuntiva (Fig. 14.14). O mesmo se presta para
exame dessas estruturas em pequenos animais.
Quando a abertura das pálpebras estiver impossibilitada, indica-se o bloqueio do nervo auriculopalpebral (Fig. 14.15) para obtenção de acinesia
palpebral.
sidade ou, de preferência, uma sala completamente escura. Isso nem sempre é possível, principalmente para os grandes animais. Nesse caso,
deve-se dar preferência em realizá-lo em baias,
que em um ambiente ao ar livre. A sala escura,
além de deixar o animal mais tranquilo, evita o
reflexo de objetos da sala sobre a córnea, o que
pode, muitas vezes, ser interpretado como uma
lesão corneal, por exemplo.
Figura 14.14 - Anestesia tópica da superfície ocular em
cão. A instilação do fármaco deve ser feita sobre conjuntiva do canto temporal superior.
Ambiente para Realização do
Exame Oftálmico
O ambiente para realização do exame oftálmico deve ser tranquilo e com controle da lumino-
Figura 14.15 - Bloqueio do nervo auriculopalpebral em
equino.
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
703
Quadro 14.3 - Perguntas que devem ser direcionadas ao proprietário na busca de informações a respeito
do(s) problema(s) ocular(es) apresentado(s).
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
Há baixa na acuidade visual? Há piora noturna ou diurna?
Qual a duração dos sinais clínicos?
Houve melhora ou piora do quadro desde o aparecimento da doença?
Histórico de doenças oculares anteriores.
A condição é uni ou bilateral?
Houve evolução rápida ou progressiva?
Presença ou não de secreção ocular. Tipo da secreção.
Histórico de trauma ocular.
Há histórico familiar da doença ocular?
Houve tentativa de tratamento tópico ou sistémico? Quais fármacos foram utilizados? Houve melhora ou piora do
quadro com o tratamento?
• Houve ocorrência de sinais clínicos sistémicos que aventem a possibilidade de curso de uma doença sistémica?
• Presença de distúrbios locomotores que aventem a possibilidade de curso de uma doença sistémica nervosa.
• Dados sobre alimentação, vacinação e vermifugação.
Histórico Clínico
Raça
E adquirindo as informações do proprietário
que se começa a criar uma linha lógica de raciocínio para, assim, instituir-se um diagnóstico e tratamento confiáveis, garantindo a cura da doença e
satisfação do proprietário. Nem sempre essas informações são precisas e confiáveis, principalmente
quando se trata de animais de companhia que
recebem pouca atenção dos seus donos ou para
grandes animais com os quais não há convivência
diária, a não ser para aqueles que possuem elevado valor zootécnico. Muitas vezes, os proprietários não sabem informar sobre a sequência de aparecimento dos sinais sistémicos e oculares, muito
menos quanto ao tempo de evolução. Como leigos, sabem relatar a respeito da presença ou não
de secreção ocular, olho vermelho, dor à manipulação do olho, alterações de coloração, alterações
do tamanho e do diâmetro do bulbo ocular ou pupila.
O relato de cegueira é relacionado ao fato de o
animal estar batendo em obstáculos (principalmente pequenos animais).
Com isso, é importante estabelecer uma sequência lógica de perguntas. O Quadro 14.2 relaciona a sequência de perguntas básicas que devem ser feitas aos proprietários.
Muitas raças de animais domésticos podem ser
predispostas a determinadas doenças oculares hereditárias. Exemplos típicos são: coloboma do nervo óptico em animais da raça charolês; síndrome úveodermatológica em cães da raça akita; síndrome da
ectasia escleral em cães da raça collie, entre outras.
Sinais indicadores ou Reveladores
de Doenças Oculares
Raça, idade e o sexo do animal podem ser úteis
para determinar o diagnóstico e o prognóstico de
muitas doenças oculares.
Idade
A idade do animal é sempre um dado relevante no diagnóstico de uma doença ocular. Exemplos clássicos são: catarata congénita em vacas da
raça Jersey; degeneração dos fotorreceptores da
retina em cães da raça poodle miniatura.
Sexo
Doenças oculares ligadas ao sexo também são
descritas na literatura, a exemplo da atrofia progressiva retiniana ligada ao cromossomo X em cães
da raça husky siberiano.
EXAME SISTEMÁTICO DO OLHO
Como mencionado anteriormente, o exame oftálmico deve ser realizado de forma sistemática na
busca das alterações mencionadas pelos proprietários. Sempre deve ser realizado o exame dos dois
olhos. Quando a doença for unilateral, deve-se iniciar
o exame pelo olho contra-lateral, supostamente
normal. Salienta-se também a importância da realização do exame físico geral prévio.
É importante que o proprietário ou ao menos uma pessoa de convívio do animal esteja pré-
704
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
sente na sala de exame, para que não seja aumentado o estresse durante a manipulação e, principalmente, instalem-se alterações oculares que
podem interferir na interpretação do exame
(exemplo: animais muito estressados fazem dilatação pupilar temporária pela descarga de
adrenalina).
Inicialmente, deve-se avaliar a rcação do animal no ambiente desconhecido de exame. Se houver
histórico de cegueira, o mesmo deve ser estimulado a andar pela sala de exame observando-se se
há colisão com obstáculos que podem ser colocados à sua frente (Fig. 14.16). Isso deve ser realizado com a sala de exame iluminada e completamente escura. Esse teste fica um pouco limitado
para equinos, pequenos e grandes ruminantes.
Nesse caso, se a sala tiver um bom espaço, os animais
relutam em deambular, permanecendo parados e,
muitas vezes, agitados.
Inicialmente, deve-sc observar a região periocular na busca de anormalidades grosseiras
como assimetria facial, aumentos de volumes periorbitais (Fig. 14.17) e desvio do eixo visual (estrabismos). Deve-se observar, ainda, a presença
de: secreção ocular (tipos de secreção) (Fig. 14.18),
olho vermelho, alopecia periocular e corrimentos nasais. Salienta-se que na presença de secreções oculares pode-se proceder à colheita de
material através de swab estéril para isolamento
e identificação de agentes bacterianos, virais ou
fúngicos (Fig. 14.19). Pode-se, ainda, obter
material da superfície ocular com auxílio de
Figura 14.16 - Representação esquemática do teste para
cegueira em cão frente a obstáculos.
Figura 14.17 - Avaliação da região periocular. Nota-se
assimetria periocular causada por aumento de volume
orbitário inferior em cão.
Figura 14.18 -Avaliação da presença de secreção. Nota-se
secreção ocular mucopurulenta em olhos com ceratoconjuntivite seca em cão (foto gentilmente cedida por J. L. Laus).
espátulas (Espátula de Kimura) ou escovas ginecológicas para investigação citopatológica (Fig.
14.20A). O material obtido deve ser aplicado por
rolamento sobre uma lâmina de vidro limpa (Fig.
14.20B) para, posteriormente, ser corado por
Giemsa ou panótico rápido. Outras colorações
podem ser utilizadas.
Após essa inspeção cuidadosa deve-se, quando possível, verificar se o olho do animal retorna
à posição ao centro da fissura palpebral, após movimentos de elevação, depressão e lateralidade (para
direita e esquerda) da cabeça. Em seguida, iniciase o exame sistemático do olho, avaliando-se, inicialmente, os anexos oculares, túnica fibrosa, túnica vascular e, por fim, a túnica nervosa.
Os dados obtidos no exame devem ser anotados em uma ficha clínica oftalmológica (ver Ficha
Oftalmológica).
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
705
B
Figura 14.19 - Colheita de material para isolamento e antibiograma de agentes da superfície ocular em cão. (A) Limpeza prévia com auxílio de algodão embebido em água.
(B) Colheita de material com swab estéril no saco conjuntival inferior. Deve-se realizar movimentos rotatórios sem
o contato com as pálpebras.
Figura 14.20- (A) Colheita de material da superfície ocular de cão para exame citopatológico, com auxílio de escova
ginecológica; (B) aplicação do material obtido sobre a lâmina
de vidro por rolamento.
EXAME NEUROFTALMOLÓGICO
Reflexo de Ameaça Visual
Esse exame avalia a integridade neuroanatômica
do sistema visual. As manobras realizadas nessa
avaliação são:
Nesse reflexo, a face palmar da mão do examinador é dirigida ao olho do paciente e observase a atitude do animal frente a esse ato (Figs. 14.21
e 14.22). Em animais sem alteração da acuidade
visual, é normal que eles desviem a cabeça da mão
do examinador, bem como é observado o ato de
piscar. O olho contralateral deve ser coberto com
a outra mão. A ausência desse reflexo é observada
em animais cegos e pode ser um achado normal
em neonatos. Deve-se tomar cuidado de não se
tocar as pálpebras nem os cílios e, ainda, de não
exercer um movimento brusco de modo a promover o deslocamento de ar sobre a superfície ocular, pois isso produzirá uma ação em resposta a um
estímulo táctil, ao invés de uma resposta a um
estímulo visual.
Reflexo de ameaça visual falso-negativo pode
ser observado em animais dóceis. Nesse caso, devese testar a via visual pelo teste da "bolinha de
algodão". Uma bolinha de algodão é solta de uma
1. Reflexo de ameaça visual - deve ser realizado
em ambos os olhos.
2. Reflexo pupilar direto e consensual.
3. Reflexo palpebral.
4. Reflexo corneal.
5. Reflexo vestibular.
Esses reflexos avaliam a integridade dos pares
de nervos cranianos com a visão (nervos óptico, oculomotor, troclear, trigêmeo, abducente, facial e vestibular) e inervação simpática e parassimpática ocular.
Deve-se salientar que o teste de tais reflexos deve
ser realizado antes da administração de tranquilizantes, sedativos, anestésicos tópicos, substâncias
midriáticas e bloqueio anestésico loco-regional.
Detalhes desses testes devem ser pesquisados no
capítulo sobre Semiologia do Sistema Nervoso.
706
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
altura acima da cabeça do animal e espera-se que
o animal acompanhe a queda da mesma (Fig. 14.23).
O mesmo cuidado de ocluir a visão do olho contralateral deve ser tomado.
Reflexo Pupilar Direto e
Consensual
O reflexo pupilar é realizado com auxílio de
uma fonte de luz artificial (lanterna), a fim de
se observar a constrição pupilar. O reflexo direto é realizado incidindo-se a luz diretamente no
olho a ser testado. O reflexo consensual consis-
Figura 14.21 - (A e B) Reflexo de ameaça visual em cão.
9
Figura 14.22 - Reflexo de ameaça visual em equino.
Figura 14.23 - (A e B) Teste da via visual com "bolinha de
algodão".
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
te em incidir a luz em um dos olhos, observando-se, no entanto, se há constrição pupilar do
olho contralateral.
No reflexo pupilar direto avalia-se: 1. a integridade da camada fotorreceptora da retina; 2.
integridade do nervo óptico ipsilateral, como uma
via aferente; 3. a via parassimpática do nervo oculomotor ipsilateral, como uma via eferente; e 4. a
funcionalidade do músculo constritor da íris ipsilateral.
No reflexo pupilar consensual avalia-se: 1. a
integridade da camada fotorreceptora da retina;
2. integridade do nervo óptico ipsilateral, como
uma via aferente; 3. a via parassimpática contralateral do nervo oculomotor, como uma via eferente; e 4. a funcionalidade do músculo constritor da
íris contralateral. Ambos os reflexos frequentemente
estão presentes em animais cegos. Isso ocorre
quando a cegueira é resultante de uma lesão central (encefálica). Também ocorre em casos de doenças retinianas e do nervo óptico quando há preservação de poucos fotorreceptores e axônios do nervo óptico, pois esses reflexos requerem somente
um número limitado dessas estruturas funcionais
quando comparado ao grande número necessário
para o fenómeno da visão. A Figura 14.24 resume
as vias neurológicas envolvidas nos reflexos
pupilares à luz.
Reflexos Palpebral e Corneal
Esses testes são realizados tocando-se delicadamente a córnea ou as pálpebras superior e
inferior, respectivamente (Figs. 14.25 e 14.26).
A resposta é a mesma em cada um dos casos, embora vias diferentes sejam testadas. É importante salientar que esse"s reflexos não indicam, necessariamente, que o animal possua visão. Eles
são primariamente reflexos protetores destinados a produzir o fechamento das pálpebras e movimentos da cabeça, de maneira rápida, a fim de
prevenir lesões. Sendo assim, a Tabela III resume
as respostas oculares frente à realização desses
reflexos.
Reflexo Vestibular
Esse reflexo é realizado movimentando-se a
cabeça do animal de um lado para o outro, observando se os olhos deslocam-se, acompanhando o
movimento da cabeça (Fig. 14.27). Deve-se ob-
707
servar ainda se há movimentos verticais dos olhos.
Ele avalia a funcionabilidade dos nervos oculomotor e abducente, o sistema vestibular e músculos
extra-oculares. O nervo oculomotor inerva os
músculos retos ventral, medial e dorsal e o nervo
abducente inerva o músculo reto lateral.
EXAME SEQUENCIAL DAS
ESTRUTURAS EXTRA-OCULARES
E INTRA-OCULARES
Alguns testes diagnósticos em oftalmologia requerem o uso de alguns equipamentos, bem como o
uso de fármacos e corantes vitais para avaliação
de determinadas estruturas. Portanto, alguns testes
podem ter seus resultados alterados, face à administração de algumas substâncias, como é o caso
do teste da lágrima de Schirmer (TLS). Sendo
assim, indica-se sua realização antes do início do
exame sistemático que será proposto a seguir, no
qual o uso de alguns fármacos e corantes para os
testes será necessário.
Teste da Lágrima de Schirmer
Esse é um teste semiquantitativo que avalia a
produção de lágrima (em milímetros) produzida pelo
olho durante um minuto. Para tanto, é usada uma
tira de papel de filtro encontrado comercialmente
para uso específico nesse exame (Figs. 14.28 e 14.29).
O papel é o Whatman na 40. Existem dois tipos de
TLS (números l e 2). No TLS l, avalia-se a quantidade de lágrima produzida em um minuto sem
dessensibilização da superfície ocular, no qual a
presença do papel sobre ela também estimula a liberação de lágrima (avalia a produção contínua de
lágrima). No TLS 2, a sensação corneal é abolida
por meio da administração tópica de colírio anestésico que bloqueia a secreção reflexa da glândula
lacrimal principal e da terceira pálpebra, avaliando-se, assim, os valores basais de lágrima produzida. Os valores normais nas espécies domésticas encontram-se listados na Tabela 14.2.
É importante salientar que os dados apresentados são os encontrados na literatura internacional. É conhecido que fatores como altitude, tipo
de clima, entre outros fatores ambientais, podem
influenciar esses valores. Portanto, é necessário
obter valores nacionais desse teste para as diferentes espécies. Nesse sentido, encontram-se na
708
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
Estímulo
Estímulo
Diminuição da luz
Aumento da luz
Colículos rostrais direitos
Nervo óptico direito
l
Córtex visual esquerdo Região
pré-tectal esquerda
Estimulação bilateral do núcleo
parassimpático dos nervos oculomotores
Estimulação bilateral dos músculos dos
esfíncteres pupilares através dos
gânglios ciliares
Constrição pupilar bilateral
J
Quiasma óptico
(90% de decussação)
Estimulação bilateral dos
colículos
rostrais e tratos tectoespinhais
l
l
Transmissão caudal paraT1-3 com
estimulação dos neurônios pré-gangliônicos
Transmissão rostral no tronco vagossimpático
para os gânglios cervicais craniais
l "
l
Estimulação das fibras pós-gangliônicas
e ativação da pupila
l
J
Dilatação pupilar bilateral
^B »^ ,
B
/
\
Figura 14.24 -Vias neurológicas envolvidas nos reflexos pupilares à luz. (A) Vias envolvidas nas respostas constritoras
ao aumento de luz; (B) resposta dilatadora decorrente à diminuição da luz.
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
709
Tabela 14.1 - Respostas oculares e vias testadas
diante dos reflexos corneal e
palpebral.
Reflexo
íl
Palpebral Corneal
Estímulo
Via aferente
Via eferente
Efetores
Efeito
iv
Tocar a pálpebra
Tocar a córnea
Nervo oftálmico
(pálpebra inferior)
Nervo maxilar
(pálpebra inferior)
Nervo oftálmico
Nervo facial
Nervo facial
Músculos da
pálpebra
Músculos da
pálpebra
Piscar
Piscar
,!.,:-.-.,,
Figura 14.25 - (A e B) Reflexo palpebral em c ão.
Figura 14.26 - Reflexo corneal em cão.
Figura 14.27 - (A e B) Reflexo vestibular em cão.
literatura nacional alguns dados relativos aos valores normais em cães (TLS l = 13,3 ± 5,lmm/
min) (Andrade e cols., 2001).
Como alternativa mais económica para
realização do TLS, está descrito o TLS modificado, onde se utiliza o papel de filtro comum
recortado nas dimensões de 0,5 x 5cm para rea-
lização do teste. Os valores normais desse teste
são: 18 ± 6,3mm/minuto (Andrade e cols.,
2001)*. Outros trabalhos nacionais obtiveram
valores similares a esses.
* Valor referência de uma cidade do noroeste paulista.
710
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
TESTES EMPREGADOS
PARA AVALIAÇÃO DA
SUPERFÍCIE OCULAR
Quando há suspeita de doenças da superfície ocular, alguns testes podem ser empregados. Os mesmos devem, também, ser realizados antes da utilização de fármacos e corantes vitais.
Teste de Floculação da Lágrima
Figura 14.28 - Teste da lágrima de Schirmer com papel
milimetrado em cão.
Consiste em avaliar a integridade funcional
do filme lacrimal observando-se o padrão de distribuição de mucina sobre a superfície ocular. Para
tanto, deve-se colher uma pequena quantidade
de lágrima com o auxílio de um tubo de microhematócrito. O material deve ser distribuído sobre a superfície de lâmina de vidro limpa, seco à
temperatura ambiente. A leitura deve ser realizada em microscópio de luz polarizada. Em animais
normais, são observadas estruturas que se arranjam em um padrão semelhante a folhas de samambaia. Falhas nesse padrão de distribuição indicam
deficiência de mucina e consequente falha na
integridade funcional do filme lacrimal. Observa-se nas Figuras 14.30 e 14.31, a colheita da lágrima e o padrão de distribuição normal de mucina
em cão, respectivamente.
Figura 14.29 -Teste da lágrima de Schirmer modificado
(com papel de filtro) em equino.
Tabela 14.2 - Valores normais do TLS 1 e TLS 2
nas espécies domésticas em mm/minuto.
Espécie
TLS 1
TLS 2
Valores anormais
Canina
19,8 ±5, 3
11, 6 ±6,1
Felina
16,9 + 5,7
<5
Equina
> 15
< 10
Bovina
> 15
< 10
Teste de Canulação e
Lavagem do Dueto Lacrimal
Esse teste é empregado para avaliação da
patência do dueto nasolacrimal, bem como para
<5
Fonte: SLATTER, D. Fundamentais ofVeterinary Ophthalmology, 1990.
O teste é realizado colocando-se a tira de
papel no saco conjuntival inferior com uma dobra de 0,5cm. Essa dobra, nos papéis comerciais,
já vem delimitada. Deve-se, em seguida, contar l minuto e, por fim, realizar a leitura em
régua milimetrada. Estão disponíveis no mercado papéis que já contêm a escala milimetrada
e marcação por corante, dispensando-se a leitura em régua.
Figura 14.30-Colheita de lágrima com auxílio de tubo de
micro-hematócrito para o teste de floculação da lágrima
em cão.
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
Figura 14.31 - "Aspecto de samambaia" considerado padrão normal no teste de floculação da lágrima em cão
(observação ao microscópio de luz polarizada).
o diagnóstico de alterações ou imperfurações dos
pontos lacrimais (Fig. 14.32). Está indicado em
casos de epífora ou descarga ocular mucopurulenta crónicas, associadas ao retardo ou ausência
da passagem da fluoresceína do olho até a abertura do dueto nasolacrimal, nas narinas (teste de
Jones). Em cães, gatos e bovinos, a injeção do
fluido é realizada por via normógrada, ou seja, pelos
pontos lacrimais, dada a dificuldade em se identificar a abertura distai do dueto nasolacrimal. Os
pequenos animais são extremamente resistentes
à realização do exame requerendo, assim, anestesia geral. Em grandes animais, a pigmentação
da conjuntiva pode dificultar a identificação dos
pontos lacrimais. Em equinos, o método empre-
711
gado para avaliação da patência do dueto é a via
retrógrada, ou seja, através da canulação do orifício distai do dueto nasolacrimal. Para realização do teste, apenas contenção física utilizandose equipamentos como cachimbo de contenção
e cabresto são suficientes. Se houver necessidade, o exame pode ser realizado sob contenção farmacológica.
A solução fisiológica estéril é utilizada para injeção no dueto nasolacrimal (cerca de l a 2mL). A
resistência à passagem (ou falha na passagem) da
solução indica imperfuração dos pontos lacrimais ou
presença de debris inflamatórios no dueto. Nesse
caso, eles podem ser coletados e enviados para realização de exame citológico e de cultura.
Teste de Rosa Bengala
O corante vital Rosa Bengala (dicloro-tetra-iodo
fluoresceína) é utilizado para avaliação e diagnóstico de distúrbios da superfície ocular causados principalmente por deficiência lacrimal, como é caso
da ceratoconjuntivite seca. É utilizado, ainda, no
diagnóstico e no prognóstico de deficiência de mucina
na lágrima e anormalidades epiteliais corneais superficiais (ceratite punctata em cães e ceratite
dendrítica causada pelo herpesvírus felino Tipo l
em gatos).
Comercialmente, existem duas apresentações:
sob a forma de colírio (solução a 1%) ou em bastão
(lmg/bastão). Após instilação no olho, o mesmo deve
ser examinado de preferência em lâmpada de fenda. No entanto, equipamentos de menos resolução
podem ser empregados no exame.
Teste da Pluoresceína
Figura 14.32 - Representação esquemática da lavagem do
dueto nasolacrimal em cão.
A fluoresceína (fluoresceína sódica) é corante
tóxico, solúvel em água, utilizado na forma de colírio
a 2% e em tiras de papel (bastões) impregnadas.
Ela serve ao diagnóstico das úlceras de córnea,
avaliando-se a extensão da lesão na córnea e também em pequenos defeitos epiteliais que não são
visíveis ao exame da córnea. Por ser um corante
hidrossolúvel, ele se dissolve na porção aquosa da
lágrima e, havendo quebra das junções intercelulares epiteliais (defeitos) com exposição do estroma
corneal, o mesmo se impregna nessa camada que
possui afinidade aquosa, pela presença de proteoglicanos na sua matriz extracelular. A fluoresceína
é facilmente detectada, utilizando-sc um filtro azul-
712
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
cobalto presente na haste iluminadora da lâmpada
de fenda. Em caso de não se ter esse equipamento,
pode-se utilizar o mesmo filtro presente em alguns
oftalmoscópios diretos e indiretos. Em úlceras de
grande extensão e profundas, apenas uma luz artificial em sala escura permite a observação da úlcera
de coloração esverdeada. Deve-se dar preferência
ao uso do corante em bastão ao invés do colírio, pois
a solução de fluoresceína constitui-se em excelente meio de cultura para bactérias como a Pseudomonas aeruginosa.
Esse teste permite, ainda, mais três avaliações:
1. tempo de ruptura ou rompimento do filme lacrimal; 2. teste de patência do dueto nasolacrimal
ou teste de Jones e 3. teste de Seidel.
O teste do tempo de ruptura do filme lacrimal (TRFL) é medido após a instilação da fluoresceína, impedindo que o paciente feche as pálpebras e, assim, registra-se o tempo, em segundos,
até que a primeira área seca apareça. O teste deve
ser realizado utilizando-se o filtro azul-cobalto
presente na haste iluminadora da lâmpada de
fenda. O tempo normal de TRFL em cães é de
20 ± 5 segundos. O movimento ocular pode interferir com esse resultado, sendo indicada a
anestesia dissociativa com cetamina e xilazina para
minimizar esses movimentos. Um tempo superior ao descrito indica deficiência da camada de
mucina do filme pré-corneal.
O teste de Jones (TJ) consiste na avaliação
da integridade do aparelho lacrimal após a instilação da fluoresceína sódica sobre o olho, registrando-se o tempo de passagem da mesma pelo aparelho lacrimal até seu aparecimento nas narinas. O
tempo normal para cães, gatos e equinos é de 5
minutos (Fig. 14.33). A quantidade de fluoresceína,
o tempo de produção de lágrima e o comprimento
do dueto nasolacrimal podem influenciar nesse tem-
po. Sendo assim, tempos acima de 5 minutos podem indicar obstrução parcial ou completa do
dueto. Resultados falsos-negativos podem ser observados em cães braquicefálicos, pois nessas raças o orifício distai do dueto desemboca caudalmente dentro da nasofaringe. O exame da porção
caudal da língua e faringe com a luz azul pode
confirmar a presença do corante nessa região, indicando patência do dueto.
E, finalmente, o teste de Seidel (TS) é usado
para detectar a saída de humor aquoso pela perfuração corneal, úlceras profundas de córnea e locais de sutura. O examinador aplica a fluoresceína
utilizando gotas ou tiras de papel impregnadas com
o corante no local em que se suspeita haver o
vazamento e procura por um fluido claro que conflua em direção ao corante laranja.
Outros corantes podem ser utilizados para
investigação de alterações da superfície ocular. A
Tabela 14.3 mostra alguns outros corantes empregados em oftalmologia veterinária.
Figura 14.33 - Narina de cão impregnada com fluoresceína após realização do teste de Jones, indicando patência
do dueto nasolacrimal.
Tabela 14.3 - Corantes empregados em Oftalmologia Veterinária, seus efeitos e indicações diagnosticas.
Corante
Efeito
Indicação diagnostica
Fluoresceína
Rosa Bengala
Azul de Alcian
Azul de Tripan
Azul de Metileno
Cora o estroma corneal indicando
quebra de espaços intercelulares do
epitélio
Cora mucina e células em degeneração
Cora muco
Cora muco e células da superfície
mortas e em degeneração
Cora células da superfície mortas e
degeneradas
Fonte: GEtATT, K. Veterinary Ophthalmology, 2000.
Úlcera de córnea, teste de Jones, teste do
tempo de ruptura do filme lacrimal e
teste de Seidel
Conjuntivite e ceratoconjuntivite seca
Conjuntivite e ceratoconjuntivite seca
Conjuntivite e ceratoconjuntivite seca
Conjuntivite e ceratoconjuntivite seca
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
Tonometria
A tonometria é uma estimação da PIO, essencial nos testes diagnósticos para todos os exames
oftalmológicos. Como descrito anteriormente, a
córnea deve ser anestesiada com l a 2 gotas de
colírio anestésico (cloridrato de proximetacaína
0,5%) e o tonômetro (de indentação ou aplanação)
é posicionado sobre a região axial (central) da córnea,
enquanto as pálpebras são contidas pelos dedos
do examinador. Deve-se estar atento para: 1. restringir movimentos da cabeça; 2. posicionamento
adequado do tonômetro; 3. anestesia tópica da córnea; e 4. em grandes animais, podem ser necessários sedação e bloqueio do nervo auriculopalpebral. Deve-se evitar a prévia pressão digital do globo
por meio das pálpebras, pois isso pode elevar a PIO.
A tomada de PIO com o Tonômetro de Schiõtz
deve ser obtida três vezes consecutivas, indicando-se, assim, o cálculo da média dos valores obtidos. O peso do equipamento que normalmente é
utilizado é de 5,5 gramas. É importante que, durante esse exame, a córnea do paciente seja mantida paralela à mesa de atendimento (em pequenos
animais) ou ao piso (em grandes animais). O exame é mais difícil em animais menos cooperativos.
As vantagens do uso do Tono-pen® estão no
fato de fornecer uma PIO mais precisa, não serem
necessárias as três mensurações como para o
tonômetro de Schiõtz e, ainda, não necessitar que
a cabeça do animal fique na posição vertical. Erros
induzidos por diferentes tamanhos e curvaturas
de cófnea são de menor importância; a probe (na
extremidade do equipamento) é protegida por uma
capa elástica descartável, o que impede a transferência de infecção. A desvantagem está no custo
do equipamento.
Os valores normais da PIO estão apresentados na Tabela 14.4.
Pressões intra-oculares acima de SOmmHg confirmam o diagnóstico de glaucoma, assim como PIO
abaixo de 15mmHg é um dado sugestivo de uveíte.
71 3
Tabela 14.4 -Valores normais da PIO nas diferentes
espécies.
Valor (mmHg)
Referência
Espécie
Canina
Felina
Bovina
Equina
2 0 - 2 5 14 Magrane (1971) Severin (1976)
-28
1 6 - Startup (1969) Heywood
3 0 1 0 - 3 1 (1971) Laus e cols. (1995)
12,2 -24,4 Severin (1976) Bill (1966)
Severin (1976) W oelfel (1964)
14 - 26
17.4 - 19,2 Severin (1976) Cohen & Reinke
14 -22 (1970)
16.4 - 5 , 5
14-22 McCIure e cols. (1976)
16.5 - 32,5 Fonte: GELATT, K. Fundamentais
ofVeterinary Ophthalmology, 1990 -
28.6 - 4 , 8 modificado por ANDRADE, A.L.
Entrópio: inversão das
pálpebras (Fig. 14.34) (normalmente
acompanhado de epífora, secreção ocular,
blefarospasmo (Fig. 14.35), descoloração da
pele periocular, dermatite secundária e
alopecia).
Ectrópio: eversão das pálpebras (normalmente acompanhado de secreção ocular, eritema conjuntival e malformação da pálpebra
inferior).
Epífora: lacrimenjamento decorrente de uma
drenagem da lágrima deficiente ou por aumento
da secreção lacrimal.
Alterações do cílios: distiquíase, triquíase e
cílio ectópico (acompanhadas de epífora, blefarospasmo, dor, úlcera de córnea e eritema
conjuntival).
ALTERAÇÕES QUE DEVEM SER
INVESTIGADAS NO EXAME
OFTÁLMICO
Pálpebras e Margens Palpebrais
Com auxílio da lupa com pala e fonte de luz artificial ou lâmpada de fenda, deve-se investigar se há:
Figura 14.34 - Entrópio (inversão da pálpebra) em cão da
raça Sharpey (foto gentilmente cedida por J. L. Laus).
714
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
Figura 14.35 - Cão apresentando blefarospasmo. Nota-se
que as pálpebras estão fechadas.
Figura 14.36 - Eversão da terceira pálpebra para o exame,
com auxílio de pinça.
Ptose palpebral: pálpebra caída. Ausência
de reflexo palpebral. Assimetria entre as
fissuras palpebrais. Blefarite: inflamação
palpebral (acompanhada normalmente por
secreção ocular, edema de pálpebra,
alopecia, discromia e eritema).
Blefarospasmo: contração espasmódica das
pálpebras decorrente da contração do músculo orbicular, sendo um importante indicador
de dor ocular local ou intra-ocular ou por estimulação do nervo palpebral.
Neoformações (benignas ou malignas).
• Neoformações benignas ou malignas que cur
sam com epífora, secreção ocular, irregulari
dade da margem da terceira pálpebra, úlcera
de córnea, dependendo da localização e le
sões erosivas.
• Na face interna: conjuntivite folicular.
• Corpos estranhos aderidos à terceira pálpebra.
Terceira Pálpebra
Conjuntiva
Investigar:
• Eritema conjuntiva! (Fig. 14.38): o ingurgita
mento dos vasos superficiais é comum de ser
observado em animais agitados. Deve-se, por-
Para a sua avaliação, a pálpebra deve ser extruída
por pressão do globo ocular pela pressão da pálpebra inferior. Para o exame da face interna há necessidade de dessensibilização com instilação de
colírio anestésico (Fig. 14.36) e auxílio de uma pinça
delicada com dente ou fixação com um fórceps de
Graefe. Investigar:
• Protrusão da terceira pálpebra: pode ocorrer
por presença de corpos estranhos na superfí
cie ocular, ulceração corneal, desidratação (por
enoftalmia decorrente à desidratação da gor
dura retrobulbar); anoftalmia, microftalmia e
síndrome de Horner.
• Inversão ou eversão da cartilagem da terceira
pálpebra.
• Hipertrofia ou prolapso da glândula da terceira
pálpebra (Fig. 14.37).
Figura 14.37 - Cão apresentando hipertrofia da glândula
da terceira pálpebra.
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
Figura 14.38 - Congestão dos vasos conjuntivais de cão
observadas nas conjuntivites (foto gentilmente cedida por
J. L. Laus).
tanto, investigar se o entema é constante ou
intermitente.
Quemose: edema conjuntival. Ela é uma manifestação comum em doenças infecciosas, inflamatórias e neoplásicas da conjuntiva e pálpebras.
Secreção ocular: os tipos de secreção que devem
ser investigados são mucóide, mucopurulenta, purulenta, serosa, seromucosa e secreções
desidratadas aderidas às margens das pálpebras. Em algumas raças (setter irlandês,
pinscher) é normal a observação de secreção
mucóide com coloração acinzentada uma vez
que esses animais possuem um fórnice conjuntival inferior profundo. Espessamento da
conjuntiva devido a inflamações crónicas.
Hemorragias subconjuntivais decorrentes de
traumas ou hipertensão. Neoformações
benignas ou malignas (Fig. 14.39). Galázio ou
hordéolo observado na margem da conjuntiva
palpebral.
715
Figura 14.39 - Neoformação conjuntival maligna hemorrágica (carcinoma escamocelular) em equino. Observamse, ainda, leucoma corneal e vascularização profunda a
partir do limbo superior.
Figura 14.40 - Nébula corneal em cão (foto gentilmente
cedida por J. L. Laus).
Córnea
A córnea normal é avascular, não pigmentada,
transparente e brilhante. Três principais alterações
da córnea podem ocorrer: perda da transparência,
vascularização corneal e alterações de contorno da
superfície corneal.
f^perda da transparência pode ocorrer por:
1. Desorganização das fibras colágenas estromais
em cicatrizes corneais. Podem ser de três tipos:
nébula(Fig. 14.40), mácula (Fig. 14.41)eleucoma
(Fig. 14.42). (Nébula = pequena opacidade
Figura 14.41 - Mácula corneal em cão. Observa-se, ainda, vascularização superficial corneal (foto gentilmente
cedida por J. L. Laus).
716
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
Ceratoconus, ceratoglobo e córnea plana.
Aumento do diâmetro da córnea. Depressões
no estroma da córnea, com aspecto semelhante
a uma casca de laranja, com teste de
fluoresceína negativo. Ulcera de córnea
caracterizada por defeito epitclial e perda
de porções variáveis do estroma (teste de
fluoresceína positivo). Dermóide ocular.
Ceratopatia bolhosa. Pannus oftálmico.
Esclera
Alterações que devem ser investigadas:
Figura 14.42 - Leucoma corneal em cão decorrente à úlcera profunda de córnea (foto gentilmente cedida por J. L. Laus).
2.
3.
4.
5.
corneal; Mácula = moderada opacidade corneal;
Leucoma = opacidade corneal total).
Edema corneal: ocorre por afluxo de água para
o estroma corneal e desarranjo das fibras
colágenas.
Pigmentação.
Infiltrados de cristais de colesterol, lipídico
e partículas virais no estroma corneal.
Infiltrado celular.
Vascularização córnea!pode ser de dois tipos:
superficial e profunda. A superficial possui um padrão
arborizado, ao passo que a profunda apresenta-se
mais limitada à periferia da córnea (próxima ao
limbo), onde os vasos apresentam-se paralelos, semelhante a uma escova (vermelho intenso).
As alterações de contorno que devem ser investigadas são:
Figura 14.43 - Ulcera superficial de córnea corada pela
fluoresceína. Observa-se, ainda, protrusão da terceira
pálpebra.
Ectasia escleral: adelgaçamento escleral, onde
se observa o trato uveal pigmentado com
coloração azulada e resultando em uma assimetria escleral. É indicativo de doença escleral primária ou neoformação uveal em crescimento (Fig. 14.44). Ectasia total está frequentemente associada à buftalmia ou ao glaucoma não controlado.
Neoformações benignas localizadas na conjuntiva bulbar.
Ruptura escleral: normalmente indica trauma recente. Muitas rupturas ocorrem na porção equatorial do bulbo ocular, embora as rupturas próximas ao limbo sejam mais frequentes em equinos. Com essa lesão, pode haver
protrusão da lente, vítreo e, especialmente,
da íris. Eritema e inflamação.
Figura 14.44 - Ectasia escleral decorrente de melanoma do
corpo ciliar em cão (foto gentilmente cedida por J. L. Laus).
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
717
• Pigmentação da esclera: coloração azulada ou
marrom escuro pode indicar melanose e neoplasias; coloração amarelada pode indicar
reabsorção de hemorragia subconjuntival.
Sistema Lacrimal
Deve ser investigado através do teste da lágrima
de Schirmer, teste de floculação da lágrima, teste
de canulação e lavagem do ponto lacrimal e teste de
Jones. Suas indicações foram descritas anteriormente.
São alterações que podem ser encontradas:
epífora, ponto lacrimal imperfurado ou agenesia
do ponto lacrimal, dacriocistite (inflamação do
dueto nasolacrimal que irá apresentar-se obstruído), abscesso e dermatite purulenta próxima ao
canto nasal c lagoftalmia (inabilidade de fechar
as pálpebras, complctamente). Isso pode ser observado em cães braquicefálicos resultando em perda de filme pré-corneal, por evaporação.
Câmara Anterior
Figura 14.45 - Hifema em olho de cão (foto gentilmente
cedida por J. L. Laus).
Sinéquia posterior: aderência da íris à cápsula
anterior do cristalino decorrente de uveítes.
Alterações de ângulo de drenagem: ângulo
iridocorneal fechado ou aberto. Deve ser avaliado por gonioscopia quando houver aumento da PIO e suspeita de glaucoma primário.
Podem ser encontradas as seguintes alterações:
• Alterações na profundidade da câmara anterior
(profunda = em casos de luxação ou subluxação
posterior da lente), microfacia (lente pequena),
glaucoma crónico com atrofia de íris; rasa = lu
xação anterior da lente, tumores uveais, íris bombé
e glaucoma de ângulo fechado, uveíte anterior
crónica, sinéquia anterior (aderência da íris com
o endotélio da córnea) e corpos estranhos.
• Hipópio: presença de material purulento,
normalmente rico em neutrófilos, linfócitos,
macrófagos e células plasmáticas, na câmara
anterior que, por gravidade, acumula-se na
porção ventral da câmara.
• Hifema: presença de sangue na câmara ante
rior (Fig. 14.45); pode estar associado à fibrina
e ao hipópio.
• Fibrina na câmara anterior.
• Corpos estranhos, principalmente se houver
perfuração da córnea ou esclera.
• Flare que se refere à turbidez do humor aquo
so causado pela presença de proteína, célu
las, pigmentos e cristais nos processos infla
matórios do trato uveal (uveítes).
• Presença de precipitados ceráticos aderidos ao
endotélio da córnea observados nas uveítes,
principalmente aquelas decorrentes de toxoplasmose e peritonite infecciosa felina.
íris e Espaço Pupilar
Condições congénitas envolvendo essas estruturas
podem ser observadas. No entanto, algumas possuem
pouco significado visual e outras condições que resultam em alterações da visão (de significado visual).
Policoria, coloboma, cistos da íris, heterocromia de íris,
corectopia, dentre outras não resultam em alterações
da visão. Mas, o encontro de persistência da membrana pupilar, midríase, miose, anisocoria, iridodenese
e ausência de reflexo pupilar direto e consensual,
sinéquia posterior total 360° (íris bombé] (Fig. 14.46),
constituem nas alterações de significado visual.
Deve-se investigar, ainda, as seguintes alterações: atrofia de íris, eritema, rubeosis tridis (neovascularização da íris) e leucocoria.
Lente
Alterações do tamanho da lente: afacia, microfacia, esferofacia, lenticonus e lentiglobo. Alterações na posição da lente: luxação (anterior e posterior) e subluxação (anterior e posterior).
Podem ainda ser encontradas alterações na
transparência da lente. Quando há opacificação da
lente, denomina-se catarata (Fig. 14.47).
718
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
Vítreo
Anormalidades congénitas: persistência da artéria hialóide e seus remanescentes, persistência
do vítreo primário, exsudato inflamatório, hemorragia vítrea e bandas de tração de tecido fibrosos,
usualmente adendas à retina.
Retina e Nervo Óptico
Figura 14.46-íris bombéem cão (foto gentilmente cedida
por J. L. Laus).
Figura 14.47 - Catarata madura em cão.
A observação da retina por meio de oftalmoscopia na identificação das alterações requer
grande experiência e treinamento por parte do
clínico. Deve-se, portanto, investigar alterações
na coloração da retina e na aparência geral, incluindo o nervo óptico. Quanto à coloração, podese observar aumento na refletividade da área
tapetai, pigmentação sobre a área tapetai, perda de pigmento ou pigmentação da área nãotapetal, exsudatos retinianos e hemorragias sobre, dentro e abaixo da retina. Deve-se, ainda,
investigar a presença de descolamento de retina (parcial ou completo) (Fig. 14.48) e atenuação dos vasos retinais.
Quanto ao nervo óptico, devem ser investigadas lesões escavativas como: colobomas e escavação da cabeça do nervo óptico. Deve-se, ainda, procurar alterações vasculares como hemorragias, ingurgitamento ou proliferação capilar sobre
o nervo óptico, em casos de alterações inflamatórias.
Investiga-se, ainda, sobre a ocorrência de papiledema (edema da papila óptica) e atrofia do nervo
óptico.
Figura 14.48 - Descolamento completo de retina visível
sem o auxílio de oftalmoscopia. Observa-se midríase.
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
É importante salientar que a abordagem do
segmento posterior do olho (vítreo, retina e nervo
óptico), bem como da lente, só é possível se forem
instilados fármacos midriáticos, de maneira a promoverem a dilatação pupilar e permitirem a visualização das estruturas. Os oftalmoscópios direto e
indireto permitem um melhor detalhamento das
alterações descritas.
719
EXAMES ESPECIALIZADOS
Outras técnicas diagnosticas especializadas podem
ser empregadas no exame oftalmológico como: a
gonioscopia, a eletrorretinografia, dacriocistografia
(radiografia contrastada do sistema lacrimal) e a
angiografia fluoresceínica.
Quadro 14.4 - Sequência para o exame oftálmico.
ANAMNESE
CONTENÇÃO DO ANIMAL
EXAME FÍSICO GERAL
EXAME OFTÁLMICO
(Ambiente Claro)
Inspeção do aspecto externo do olho
TESTE DA LÁGRIMA DE SCHIRMER
Reflexo Fotomotor da Pupila (Direto e Consensual)
Biomicroscopia do Segmento Anterior do Olho (pálpebras,
conjuntiva, córnea, câmara anterior, íris e pupila e cristalino)
Presença de secreções?
Anestesia Tópica
Colheita de Material
(citologia e cultura e antibiograma)
TONOMETRIA
Continua
720
Semiologia Veterinária: A Arte do Diagnóstico
Quadro 14.4 - (Cont.) Sequência para o exame oftálmico.
EXAME OFTÁLMICO
(Ambiente Escuro)
GONIOSCOPIA COM BIOMICROSCOPIA (se necessário)
Instilação do corante de fluoresceína
COROU? --------- +- ÚLCERA DE CÓRNEA
Instilar Tropicamide (Sob suspeita de glaucoma na
tonometria e alterações visíveis a pupila não deve ser dilatada)
EXAME DA LENTE
(Biomicroscopia com pupila dilatada)
EXAME DO FUNDO DE OLHO
(Oftalmoscopias direta e indireta com pupila dilatada)
ABORDAGEM DO PACIENTE DIRECIONADA AOS SINAIS OBSERVADOS
INDICAÇÃO DE EXAMES COMPLEMENTARES ESPECIALIZADOS
REVISÃO DOS DADOS
DIAGNOSTICO ---------- *•
TRATAMENTO
Semiologia do Sistema Visual dos Animais Domésticos
Gonioscopia
A gonioscopia consiste no exame do ângulo
de filtração. Ela é recomendada quando há suspeita de glaucoma ou quando massas neoplásicas
ou inflamatórias estão presentes no limbo, base da
íris ou corpo ciliar. Em bovinos, equinos e pequenos ruminantes, apenas uma pequena porção lateral e medial do ângulo de filtração é diretamente
visível. As lentes de gonioscopia são necessárias
quando se deseja um exame completo do ângulo
iridocorneal (de filtração) em todas as espécies
domésticas, exceto no gato, em que essa estrutura
é visível por meio do exame direto.
A lente de gonioscopia é colocada sobre a córnea
previamente dessensibilizada com colírio anestésico e, por meio dela, é possível visualizar o ângulo de drenagem com seus ligamentos pectinados.
721
de material de neoformações intra-oculares, destinado a exame citopatológico. Obviamente, deve
ser realizado por especialista com prévia experiência e que saiba reconhecer os riscos inerentes ao
procedimento.
Eletrorretinografia
A atividade elétrica gerada por várias porções
da retina após estímulo luminoso dos fotorreceptores pode ser avaliada pela eletrorretinografia (ERG)
e por potenciais oscilatórios. Essas técnicas, quando
empregadas, podem auxiliar os cirurgiões oftálmicos a priorizar a remoção da lente opacificada.
O Quadro 14.4 apresenta um esquema prático
e de rotina de como proceder ao exame oftálmico.
BIBLIOGRAFIA
Ecografia Ocular (Uitra-sonografia)
A ecografia ocular está indicada, principalmente, quando há opacificação dos meios transparentes, principalmente da córnea, onde a visualização das estruturas intra-oculares não pode ser examinada (Fig. 14.49). Esse exame sempre sugere
as alterações nas estruturas intra-oculares, sendo, portanto, um meio diagnóstico complementar do exame oftálmico. Ele está indicado, por
exemplo, na confirmação diagnostica de catarata
madura ou massas na câmara anterior e vítrea, descolamento de retina, entre outras alterações.
Permite, ainda, guiar a colheita, por agulha fina,
6 cm HR
?sm s
FAR F8
D + : 1. B0 cm «
EHH 0
Figura 14.49 - Imagem ecográfica ocular de cão obtida
com transdutor de 7,5MHz multissetorial com almofada
acoplada. Observa-se imagem hiperecóica circular sugestiva de neoformação em corpo ciliar.
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