CÂMARA DOS DEPUTADOS DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL Versão para registro histórico Não passível de alteração COMISSÃO DE SEGURIDADE SOCIAL E FAMÍLIA EVENTO: Audiência Pública REUNIÃO Nº: 0174/14 DATA: 25/03/2014 LOCAL: Plenário 7 INÍCIO: 14h30min TÉRMINO: 17h32min PÁGINAS: 67 DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO RICARDO CAPONERO - Presidente do Conselho Técnico-Científico da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama — FEMAMA. JOSÉ LUIS ESTEVES FRANCISCO - Representante da Sociedade Brasileira de Mastologia. PATRICIA SAMPAIO CHUEIRI - Coordenadora-Geral de Atenção às Pessoas com Doenças Crônicas do Ministério da Saúde. MAREMA DE DEUS PATRÍCIO - Assessora Técnica do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde — CONASEMS. SUMÁRIO Debate sobre a aplicação da Portaria GM/MS nº 1.253, de 12 de novembro de 2013, no que diz respeito a procedimentos diagnósticos para investigação de câncer de mama. OBSERVAÇÕES Houve exibições de imagens. Há oradores não identificados em breves intervenções. Houve exibição de vídeo. Há falha na gravação. Há expressão ininteligível. CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 O SR. PRESIDENTE (Deputado Amauri Teixeira) - Declaro aberta a presente reunião de audiência pública da Comissão de Seguridade Social e Família. Informo aos Srs. Parlamentares que esta reunião está sendo transmitida ao vivo pela Internet, no site da Câmara. As imagens e o áudio estarão disponíveis para serem baixados na página desta Comissão logo após o encerramento dos trabalhos e que as fotos do evento serão disponibilizadas no Banco de Imagens da Agência Câmara, na página desta Casa. Informo ainda que as imagens da TV Câmara poderão ser solicitadas à Secretaria desta Comissão. Esta reunião de audiência pública foi convocada nos termos do Requerimento nº 494, de 2014, da Deputada Carmen Zanotto e do Deputado Eleuses Paiva, com apoio de Parlamentares da bancada feminina, para se discutir a aplicação da Portaria GM-MS nº 1.253, de 12 de novembro de 2013, no que diz respeito a procedimentos diagnósticos para investigação do câncer de mama. Esclareço que aprovamos esse e outro requerimento de forma excepcional. Nós ainda não aprovamos nenhum outro requerimento. Pela relevância do tema, em função da singularidade e da simbologia do mês que estamos vivendo, o mês de março, estamos inaugurando nossas audiências públicas discutindo matéria extremamente importante para as mulheres. Foi algo excepcional que nós fizemos para assegurar o pedido da Deputada Carmen Zanotto, que, na verdade, é a autora do requerimento — o Deputado Eleuses o subscreveu. Ela nos solicitou que fosse incluso nesta pauta extraordinariamente, e nós o incluímos. Convido para compor a Mesa o Sr. Ricardo Caponero, Presidente do Conselho Técnico-Científico da FEMAMA — Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama; o Sr. José Luis Esteves Francisco, representante da Sociedade Brasileira de Mastologia; a Sra. Patricia Sampaio Chueiri, Coordenadora-Geral de Atenção às Pessoas com Doenças Crônicas do Ministério da Saúde; e a Sra. Marema Patrício, Assessora Técnica do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde — CONASEMS. 1 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Existe aqui um equilíbrio: dois homens e duas mulheres. Há paridade pelo menos para discutir câncer de mama. (Riso.) E há paridade parlamentar também: um homem e uma mulher. Falará primeiro o Presidente do Conselho Técnico-Científico da FEMAMA, Ricardo Caponero, mas, antes, vou apresentar as regras do jogo. Comunico aos senhores membros da Mesa nesta Comissão que cada convidado terá o prazo de 15 minutos para fazer sua exposição, prorrogável a juízo desta Presidência, não podendo ele ser aparteado. Os Deputados inscritos para interpelar os convidados poderão fazê-lo estritamente sobre o assunto da exposição, pelo prazo de 3 minutos, tendo o interpelado igual tempo para responder, facultadas a réplica e a tréplica pelo mesmo prazo, não sendo permitido ao orador interpelar quaisquer dos presentes. Passo à palavra ao Sr. Ricardo Caponero, Presidente do Conselho TécnicoCientífico da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama — FEMAMA, que dispõe de 15 minutos para fazer sua exposição. O SR. RICARDO CAPONERO - Boa tarde a todos. Obrigado pela presença. Eu acho muito significativo que esta audiência esteja se realizando neste plenário, Sala Deputado Professor Pinotti. O Prof. José Aristodemo Pinotti foi uma das pessoas que mais brigou pela saúde da mulher. Então, este é um fato muito significativo. Venho representar a FEMAMA, que é uma instituição filantrópica sem fins lucrativos. Estou aqui para representar uma instituição que fala para representantes do Brasil todo. Encontramos milhares de mulheres engajadas nessa causa. Falamos então na voz dos pacientes e dos usuários desse sistema. (Segue-se exibição de imagens.) O câncer de mama, sem dúvida alguma, é uma doença importante no nosso meio. Segundo as estimativas do Instituto Nacional do Câncer, situado no Estado do Rio de Janeiro, haverá 57 mil casos novos de câncer de mama no Brasil este ano, o que representa 20,8% dos casos de câncer em nosso País. Então, não tenham dúvida de que é uma doença de alta incidência e de alta prevalência em nosso meio. Existe uma variabilidade muito grande de Estado para Estado. O Brasil é um país bastante heterogêneo. No total, nacionalmente, são 50,5 casos por 100 mil 2 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 mulheres, mas, nos casos do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo, são até maiores essas taxas. Há, portanto, uma regionalização importante da doença, do câncer de mama. A Lei nº 11.664, promulgada em 2008, dá às mulheres o direito de realizar exames mamográficos a partir dos 40 anos de idade. Então, o que estamos discutindo aqui já foi legislado. Existe uma lei a esse respeito, dando às mulheres, a todas as mulheres, o direito de realizar mamografia a partir dos 40 anos de idade. Recentemente começaram a surgir mais algumas portarias, questionando essa faixa etária. Este é o motivo desta audiência pública: tentar derrubar essas portarias que restringem o uso até os 59 anos de idade. Essa restrição é o que está acontecendo na prática. Em muitos Municípios, está se restringindo pela metade a realização das mamografias. Sabemos, na prática, que as mulheres mais jovens são as mais mobilizáveis para fazer mamografia. As mais idosas sofrem muito o estigma do câncer, têm muito preconceito contra o câncer. É muito mais difícil mobilizar as mulheres mais idosas para fazerem mamografia do que as mulheres mais jovens, que são mais facilmente influenciáveis para cuidar de sua saúde e realizar suas mamografias de rotina. Temos já um grupo de Parlamentares que apoia essa causa, tentando derrubar essa portaria. O mais importante é saber por que estamos brigando para que se consiga a mamografia antes dos 40 anos de idade. Estudos americanos mostram a vantagem de se fazer mamografia. Quando não há o rastreamento de câncer de mama por mamografia, 52% dos casos acabam sendo diagnosticados quando a doença está em fase avançada. Então, não há dúvida de que não dá para esperar que se apalpe um nódulo de mama no exame clínico a fim de que isso seja significativo para se poder atender a mulher. A grande chance de cura, hoje, ocorre nos casos de lesões pequenas. Sabemos, quanto ao câncer de mama, que a sobrevida depois de 5 anos depende do tamanho do nódulo. Existe uma regra geral que mostra que se perde 1% de chance de sobrevida de 5 anos a cada milímetro que o tumor cresce. A mamografia consegue achar lesões impalpáveis e assintomáticas da mama. Essa é a grande vantagem. Não existe outro método que a substitua. Mesmo a ultrassonografia de mama, que complementa a mamografia, não faz diagnóstico de 3 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 microlesões isoladas. Então, o padrão mundial ainda é a mamografia para exame de rastreamento. Sem a mamografia, acabamos achando só os casos em forma muito avançada. Nem dá para selecionar essas pacientes. De acordo com esses dados da América do Norte, não se pode considerar isto: pacientes com histórico familiar e pacientes sem histórico familiar. A presença de câncer é igual nos dois grupos. Ou seja, não dá para restringir, fazer mamografia só em quem tem histórico, porque grande parte das pacientes cujo resultado de exames foi positivo não tinha histórico familiar. Uma paciente pode ser a primeira da família a ter câncer de mama. Este talvez seja o eslaide mais importante para esta reunião. Este é um dado conseguido em Goiânia, pelo Prof. Ruffo, que é um grande pesquisador brasileiro de câncer de mama. Ele relacionou idade e câncer de mama. Foi feito um diagnóstico. Menos de 40 anos de idade, 15,2% dos casos. Dos 41 aos 50 anos de idade — é a faixa a respeito da qual estamos debatendo —, 27,3% dos casos. Quase 30% dos casos aconteceram nesta faixa, dos 41 aos 50 anos de idade, em Goiânia. Mais de 50 anos de idade, 57,5%. Então, se formos fazer a mamografia só em mulheres com mais de 50 anos de idade, 60% dessa população vai ser atendida, e 40% vão ficar a descoberto. Nesses 40%, a doença tem maior significado, são mulheres mais jovens, que ainda têm filho para criar, estão casadas, têm uma vida inteira pela frente, ou seja, o impacto social, no caso dessas mulheres mais jovens, é muito maior. Talvez não seja importante achar câncer de mama numa senhora de 90 anos de idade. Nem fazemos mamografia mais nessa idade. Mas, numa senhora de 40 anos de idade, que ainda está formando sua família, está criando sua família, o impacto é muito maior. Sabemos que não é apenas um caso a mais. O impacto aos 40 anos de idade é muito maior que o impacto aos 70 anos de idade. Podemos diagnosticar menos casos em proporção — são só 27,3%, contra 57% —, mas o impacto social desses casos talvez seja até maior do que nas pacientes mais idosas, já que têm família constituída. Não podemos perder esses 40% de pacientes que estamos deixando de fora, ao permitirmos que a mulher faça o exame somente a partir dos 50 anos de idade. 4 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Estes são, mais ou menos, os mesmos dados. A média foi de 53 anos de idade. Se essa é a média de idade, uma parte grande de pacientes está abaixo dessa faixa etária. Com 40 anos ou menos, 15%. Entre 40 e 50 anos de idade, 27,8%. Não é uma porcentagem desprezível, em relação aos casos que acontecem nessa faixa etária. O Grupo Brasileiro de Estudos do Câncer de Mama — GBECAM, integrado por médicos oncologistas que estudam esse tipo de câncer, fez alguns levantamentos populacionais. Temos dados registrados em 2000 e 2006, um total de quase 5 mil pacientes, e isso mostra uma diferença muito grande no cenário brasileiro quando se considera o setor público, o setor privado e o setor filantrópico. Vamos ficar aqui só entre o público e o privado. Vejam que, no setor privado, que não restringe a idade no que diz respeito à mamografia — hoje, nenhum seguro de saúde suplementar restringe a idade no caso de mamografia —, o diagnóstico em fase avançada, no grupo 3, ficou em 12,7%, e, no estágio clínico 4, com doença metastática, em 3,5%. (Não identificado) - Presidente Amauri, os dados que estão sendo apresentados são muito importantes. É muito rico o que o expositor está falando, mas ele está correndo demais. O senhor poderia falar um pouco mais devagar? O SR. RICARDO CAPONERO - Posso. Vou falar mais devagar então. O SR. PRESIDENTE (Deputado Amauri Teixeira) - Deixaremos sempre os expositores muito à vontade. Ele dispõe do prazo de 15 minutos. O SR. RICARDO CAPONERO - Vou falar mais devagar. Essa realidade mostra que, num serviço que não restringe a idade no caso de mamografia, o diagnóstico acontece em fase muito mais precoce. Estágio clínico 1, 34% — aqui, no caso de estágio avançado, são 47,5%. Estágio clínico 3, 12,7%. Diagnóstico de metástase, 3,5%. Já no setor público, a taxa de diagnóstico precoce é muito menor, 13,8%. Estágio clínico 3, já com linfonodos comprometidos, 30,9% das mulheres. Doença metastática, 6%. Isso, além de ter impacto pessoal para a mulher, tem, sem dúvida, impacto no âmbito financeiro, porque sabemos que essas pacientes precisam de cirurgia mais 5 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 extensa. Quando há linfonodos comprometidos, é preciso fazer dissecção axilar; muitas vezes elas precisam de reconstrução mamária com prótese, que é garantida por lei; precisam de fisioterapia para tratar o linfedema secundário; precisam, com muito mais frequência, de quimioterapia; a taxa de recidiva é muito maior. No caso da doença avançada e recidivada, ela vai precisar de muito mais quimioterapia e muito mais tratamento, às vezes sem finalidade curativa para essas pacientes. Então, diagnóstico precoce não é luxo. E ele é economicamente mais viável porque é muito mais barato tratar o estágio precoce do câncer de mama do que o estágio avançado. Essa diferença de diagnóstico atribuímos à falta de rastreamento. Não há outro motivo. Isso aqui não é dado de sobrevida. Isso aqui é dado de instituição, só de diagnóstico. Se formos considerar a sobrevida, no setor privado, veremos que também é maior, porque ali há mais tratamentos do que os que o serviço público garante. Esses dados mostram a diferença que faz para essas pacientes o rastreamento precoce. Não temos dúvida de que, se considerarmos que 30% das pacientes estão fora da cobertura mamográfica, esse dado tende a piorar, não é? O impacto disso na prática é que, se comparamos então a reconstrução entre o setor público e o privado, vemos que no setor público a taxa de preservação da mama é só de 36,6%, enquanto metade das pacientes consegue preservar a mama no serviço privado. Ou seja, talvez precisem de uma cirurgia menos extensa, só da pesquisa do linfonodo sentinela, e não da dissecção, sem precisarem fazer a reconstrução com prótese e com menos necessidade de quimioterapia e menos necessidade de radioterapia. Então, a fase em que a gente detecta a doença faz uma grande diferença, tem um grande impacto no tratamento dessas pacientes. E esses estudos sugerem que quanto mais cedo a gente fizer o diagnóstico, quanto mais precocemente começar o rastreamento maior é o impacto, a chance de cura dessas pacientes no resultado final. Essa é outra portaria. Eu queria só passar agora um vídeo com um depoimento de uma paciente que fez um diagnóstico precoce do câncer de mama. (Exibição de vídeo.) 6 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Bom, assim concluo minha apresentação. Muito obrigado. (Palmas.) O SR. PRESIDENTE (Deputado Amauri Teixeira) - Bem, nós vamos continuar com os expositores, passando a palavra agora, Deputada, ao palestrante José Luis Esteves Francisco, representante da Sociedade Brasileira de Mastologia, mas antes eu quero passar a Presidência a uma das requerentes desta sessão, que está sendo realizada a requerimento da Deputada Carmen Zanotto, subscrito pelo Deputado Eleuses Paiva e também por toda a bancada feminina da Câmara, não só desta Comissão. Então, passo-lhe a Presidência não só por ser requerente, mas porque estamos no mês de março. Amanhã apreciaremos uma pauta em que as matérias terão mulheres ou como autoras ou como relatoras. Nós neste mês estamos fazendo, simbolicamente, nesta Comissão a apreciação de projetos que dizem respeito centralmente às mulheres. Então, passo a Presidência para a Deputada Carmen Zanotto, do PPS de Santa Catarina. A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, nosso Presidente da Comissão Deputado Amauri, que gentilmente acatou... O SR. DEPUTADO ELEUSES PAIVA - Deputado Amauri, não quero dizer mais nada, mas nos sentimos, digamos assim muito mais leves agora, sob a Presidência da Deputada Carmen. A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - ...o nosso requerimento extrapauta para que hoje nós pudéssemos estar aqui, junto com o Deputado Eleuses e a bancada feminina. E vários homens também, da Comissão de Seguridade Social e Família, subscreveram esse requerimento, em função da magnitude e da urgência do tema, que a gente quer tratar o mais rapidamente possível, após a reunião com o Ministro da Saúde. Então, nós vamos agora ouvir o nosso segundo orador, que é o Dr. José Luis Esteves Francisco, representante da Sociedade Brasileira de Mastologia, para a sua apresentação. O SR. JOSÉ LUIS ESTEVES FRANCISCO - Obrigado pelo convite. Eu sou representante do Dr. Ruffo, que é o Presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia atualmente, e eu sou Presidente da Comissão de Imagem da Sociedade Brasileira de Mastologia e faço parte da Comissão Nacional de Mamografia, em que 7 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 estão envolvidos o Colégio Brasileiro de Radiologia e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. É uma honra estar aqui em uma sala de que o patrono é o Dr. Pinotti, que foi um inspirador para todos os mastologistas do Brasil, uma grande figura médica. Ele revolucionou a mastologia no Brasil e no mundo. Deu uma grande contribuição. (Segue-se exibição de imagens.) Vou falar um pouquinho da incidência de câncer de mama no mundo. A gente sabe que o câncer de mama nos países desenvolvidos é muito diferente do câncer de mama nos países em desenvolvimento. Por exemplo, nos Estados Unidos, a partir do ano 2000 houve um decréscimo do número de casos de câncer de mama, isso por conta de duas coisas: da melhora do diagnóstico e também por causa de um estudo que apontou que as mulheres usavam muito hormônio na pós-menopausa e isso aumentava um pouquinho a chance de terem câncer de mama. Então, houve um suave decréscimo, e a mortalidade vem diminuindo também graças aos exames que levam a um diagnóstico mais precoce; porém, entre a população negra nos Estados Unidos, que é mais ou menos como a nossa no Brasil, continua aumentando a incidência. No Brasil um estudo que cobre o período de 1980 a 2010 demonstrou o aumento da incidência do câncer de mama, principalmente em relação aos outros cânceres. Então, nós temos de agir logo para tentar diminuir a mortalidade. A mortalidade do câncer de mama no Brasil vem crescendo dia a dia. Apesar de todos os esforços que vimos fazendo para melhorar os tratamentos cirúrgicos, quimioterápicos, radioterápicos, não estamos obtendo êxito em diminuir a mortalidade. Por quê? Porque a prevenção falha, e falha muito. O rastreamento do câncer de mama pelo INCA, do Ministério da Saúde, hoje é orientado a ser feito nas mulheres entre 50 e 69 anos de forma bianual. A Sociedade Brasileira de Mastologia, o Colégio Brasileiro de Radiologia e a FEBRASGO recomendam realizar-se esse rastreamento entre os 40 e 69 anos anualmente. Com isso a gente tem o quê? Uma população maior, e um intervalo menor, não é? A gente sabe que as células do câncer se duplicam a cada 4, 5, 6 meses. Se a paciente tem um tumor de quatro milímetros que é visto no exame 8 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 atual, quando for visto daqui a 2 anos ele já vai ter dois centímetros ou mais. Então, é muito tempo entre uma mamografia e outra. Há vários estudos, iniciados principalmente na Suécia, lá atrás, em 1963 — olhem como estamos atrasados! —, sobre os rastreamentos. Como é que é isso? As mulheres recebiam cartas em suas casas marcando a sua mamografia: “A senhora fulana de tal deve comparecer ao hospital tal para fazer mamografia no dia tal, a tal hora. Está aqui o seu passe de ônibus, o seu atestado de saúde para levar ao seu serviço, e se não comparecer o seu imposto de renda aumenta.” Certo? Então, as suecas tinham um comprometimento social com a sua saúde. Por quê? Um câncer de mama avançado, como o Dr. Ricardo disse, custa muito caro para o Estado. Sempre há convênio, ou alguma coisa, mas na maioria dos casos a conta acaba no SUS. Mesmo com convênio, ainda acaba no SUS. Então, há vários trabalhos apontando que com o início aos 40 anos há um grande ganho em percentual de diminuição da mortalidade. No Brasil, em 1980 nós tínhamos essa pirâmide social de idade, certo? Em 2010 engordou a pirâmide. Nós temos um maior número de mulheres nessa faixa etária dos 40 aos 69 anos. Então, é uma população muito grande que está sob ameaça do câncer de mama. Entre a população mais carente, principalmente comparando a Região Norte com a Região Sul, ainda há uma alta taxa de mortalidade nessa faixa etária, como o Dr. Caponero também disse. Esse é o estudo a que o Dr. Caponero se referiu: o Dr. Ruffo, que é um cientista, um dos poucos cientistas no Brasil que estuda a mama, mostrou que em Goiânia, que é uma cidade heterogênea, que recebe gente do Brasil inteiro, entre a população entre 40 e 49 anos, nessa faixa etária estão 26% a 27% das mulheres com câncer de mama, e 38% têm menos de 50 anos. Então, essas mulheres estão aí para serem mamografadas, essas mulheres estão aí para descobrir o câncer antes que ele apareça de forma clínica, que seja palpável, ou que se retraia a mama, ou que se elimine sangue pela mama, certo? Então, essas mulheres têm de fazer um diagnóstico pré-câncer ou inicial, em que se oferece a ela a oportunidade de fazer uma cirurgia menos agressiva, e muitas vezes não é preciso fazer a quimioterapia, muitas vezes não é preciso fazer a radioterapia, muitas vezes não é preciso esvaziar a axila, procedimento que leva a transtornos tanto estéticos como 9 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 motores e sensitivos, não é? O linfedema é um estigma da mulher que teve câncer de mama e teve a sua axila esvaziada; 30% dessas mulheres vão desenvolver linfedema. Todo o mundo, quando vê uma paciente com linfedema, sabe o que ela teve, e muitas mulheres não se sentem muito bem com isso, certo? O SR. DEPUTADO ELEUSES PAIVA - Professor José Luis... O SR. JOSÉ LUIS ESTEVES FRANCISCO - Pois não. O SR. DEPUTADO ELEUSES PAIVA - ...desculpe-me interrompê-lo, e eu até não poderia fazê-lo, mas eu tenho intimidade com o tema, por trabalhar no mesmo serviço que V.Sa. O SR. JOSÉ LUIS ESTEVES FRANCISCO - Eu tenho essa honra. O SR. DEPUTADO ELEUSES PAIVA - Nós temos, não é? Na oportunidade, queria que V.Sa. explicasse, até porque há leigos aqui, o que é estádio zero, estádio I, estádio II, até para eles entenderem o que é o estádio. Talvez as pessoas aqui não entendam o que é o estadiamento, e até a referência, em considerando o estadiamento, para se ter uma ideia de sobrevida via estadiamento, e de qualidade de vida. O SR. JOSÉ LUIS ESTEVES FRANCISCO - O.K., muito bem lembrado, Dr. Paiva. Estadiamento é o estado em que a paciente se encontra, o tamanho do tumor, onde ele está, na mama ou no corpo todo da mulher. Nós temos o tumor in situ, que é o tumor que está dentro do canal do leite, certo? Sendo esse, quando retirado, a chance de ela morrer da doença é praticamente zero. É um tratamento simples, que leva à cura da doença. No estádio clínico I os tumores têm menos de dois centímetros, e a sobrevida, em 5 anos, é de 90% a 95%. Quer dizer, das mulheres que têm esse tipo de estadiamento, a grande maioria, de 90% a 95% — alguns trabalhos apontam 98% — dessas mulheres estarão vivas depois de 5 anos; depois de 10 anos, 90% mais ou menos. Então, a chance de a paciente morrer é muito menor. É nessa fase que a gente quer atuar, na fase em que não se consegue palpar esse nódulo. No estádio II a paciente tem um tumor de dois centímetros a cinco centímetros; a sobrevida dela varia de 70% a 75%. No estádio clínico III o tumor tem mais do que cinco centímetros; então, a sobrevida vai abaixando. O estádio clínico IV é quando ela já tem a doença dispersa pelo organismo, e aí o tratamento é 10 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 paliativo. Nós vamos tratá-la, tratá-la, tratá-la, mas infelizmente a grande maioria acaba falecendo da doença. É mais ou menos isso o estadiamento, e no Brasil a maioria das mulheres está entre o estádio II e o estádio III. Se verificarmos na Itália e nos Estados Unidos, a grande maioria está no estádio I, em que a cirurgia é conservadora, em que se pode fazer uma oncoplastia, isso tem muito mais chance de ocorrer. Vamos passar rapidamente à frente. Essas sociedades — a Sociedade Brasileira de Mastologia, a FEBRASGO, o CBR e o INCA — têm uma comissão que se chama de Comissão Nacional de Mamografia. A gente se reúne mensalmente e avalia os serviços de mamografia vendo a qualidade dos serviços, não é? Temos um Programa Nacional de Qualidade em Mamografia, por portaria do Ministério da Saúde, em que todos os serviços do Brasil em 3 anos deverão encaminhar seus exames para passar por esse crivo de qualidade. Há um pessoal do INCA que trabalha com a gente, que inclui um físico, e esse grupo, preocupado com as mulheres do Brasil, fez um artigo científico, publicado em revista, intitulado Recomendações do Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem, da Sociedade Brasileira de Mastologia e da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, para rastreamento do câncer de mama por métodos de imagem. É um documento bastante conhecido, e recomenda para as mulheres com menos de 40 anos apenas o exame clínico; a mamografia nessa faixa etária não se recomenda, apenas o exame clínico, e se a paciente necessitar, se aparecer algum sintoma, aí, sim, faz-se a mamografia e o ultrassom. O ultrassom não se recomenda para rastreamento. O ultrassom em nenhuma das fases é o exame ideal para rastreamento. O único exame que diminui a mortalidade por câncer de mama é a mamografia. E recomenda-se para as mulheres entre 40 anos e 69 anos — é pelo que a gente briga — a mamografia, para todas as mulheres, com periodicidade anual. O ultrassom também se recomenda, não como rastreamento, mas como complemento da mamografia. A ressonância magnética é um exame também muito utilizado, mas é para casos especiais; tem que ser indicada, de forma individualizada, para mulheres com alto risco de desenvolver câncer de mama, como, por exemplo, aquelas que têm parentes com câncer de mama, parentes de primeiro grau, mãe e irmã, ou duas irmãs. 11 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Quanto às mulheres acima de 70 anos, nessa faixa nós não temos muitos trabalhos científicos, mas o que se recomenda é que entre aquelas mulheres com uma expectativa de vida de mais de 7 anos, entre aquelas que têm pouca morbidade, que é uma faixa etária em que está aumentando a população, a nossa população está vivendo cada vez mais, isso vai ter de ser repensado, porque as mulheres estão vivendo mais, e com uma qualidade de vida muito boa. Os tratamentos médicos, os cuidados com a saúde estão levando a isso. Provavelmente essas mulheres também deverão fazer mamografia anual. Para os senhores terem uma ideia, a cobertura mamográfica pelo SUS, entre as mulheres de 50 a 69 anos, é bienal, em alguns Estados; isso é só uma amostra, que é o que recomenda o Ministério da Saúde. Olhem a cobertura que temos. Isso quer dizer, da população que poderia fazer o exame, por exemplo, no Paraná, 541 mil mulheres, só o fizeram 159 mil mulheres, certo? Em São Paulo, nessa faixa etária nós teríamos 2.230.000 mulheres; exames realizados: 544 mil; 24% das mulheres foram fazer a mamografia. Em Goiás, de 264 mil, 31 mil, 12%, muito baixo. Pernambuco: 13,8%, muito baixo. Alguma coisa está falhando. O exame é oferecido, tem vaga para todo o mundo; por que é que não fazem? Falha de quem? Da sociedade, dos médicos, do Governo, não é? Esse engajamento precisa ser maior ainda. Esse tabu de que a mamografia dói, de que incomoda — “Ah, vai achar alguma coisa” —, não pode existir mais. Nós estamos em 2014; esses tabus têm de acabar, não é? A paciente tem acesso à mamografia. Quantas mulheres do mundo querem ter acesso à mamografia e não têm? E o exame está disponível, dá para fazer mais, dá para fazer acima dos 40. Não precisa ser só acima dos 50. Nós temos mamógrafos disponíveis. Temos de otimizar os mamógrafos para fazer mamografia a partir dos 40 anos. Há espaço, certo? Melhorando as condições desses mamógrafos, e os pagamentos, que são... Que não cobrem o exame. Isso não incentiva os médicos a fazê-lo, porque eles têm prejuízo. No nosso hospital, lá em Rio Preto, nós fizemos a conta na ponta do lápis. Dá prejuízo. Mamografia, mesmo paga, nessa faixa etária, que é extrateto, dá prejuízo. A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Dr. José Luis, queira concluir, por favor. 12 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 O SR. JOSÉ LUIS ESTEVES FRANCISCO - É isso. Quando iniciar? Então, dos 40 aos 49 anos é a faixa etária em que a gente tem de começar. Muito obrigado pela atenção. Agradeço-lhes de novo. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Muito obrigada. Antes de dar continuidade aos trabalhos, eu passo a palavra ao nosso Presidente, que tem convidados para apresentar à Plenária. Obrigada. O SR. PRESIDENTE (Deputado Amauri Teixeira) - Eu quero pedir desculpas por interromper, mas nós temos aqui representantes da Embaixada de Moçambique que nos estão visitando, e um dos objetivos da visita é observar o funcionamento do nosso Parlamento. Então, fiz questão de trazê-los aqui, e não só atendê-los na minha sala. Então, trago aqui a delegação de Parlamentares de Moçambique, inclusive o Presidente do Gabinete Parlamentar de Prevenção e Combate ao HIV e à AIDS da Assembleia da República de Moçambique. Gostaria de convidar para se fazer presente aqui na Mesa Romualdo Johnam, da Embaixada de Moçambique, por favor; o Deputado Caifadine Paulo, Relator do Gabinete; a Deputada Beatriz Gama, membro do Gabinete; e o Sr. Manuel Chifunga, assessor. E gostaria que a Deputada Carmen Zanotto os presenteasse com uma pequena lembrança do Parlamento brasileiro. Os senhores estão neste momento, aqui, em uma audiência pública em que convidados nossos expõem sobre o rastreamento do câncer de mama, e depois faremos o debate com os Parlamentares e os convidados presentes. Então, entregues os presentes, eu devolvo a Presidência. (Palmas.) Desejo boas-vindas aos irmãos moçambicanos. É particularmente interessante esta integração com povos que têm identidade grande conosco, povos de origem de língua portuguesa. Devolvo a Presidência à Deputada Carmen Zanotto, e peço desculpas mais uma vez por ter interrompido a reunião. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, Deputado Amauri. Também quero, na pessoa da Deputada Beatriz, cumprimentar toda a delegação. Quero agradecer ao Dr. José Luis, especialmente por ter cumprido o tempo e ter trazido a nós mais alguns dados. 13 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 De imediato eu passo a palavra à Sra. Patricia Sampaio, que é Coordenadora-Geral de Atenção às Pessoas com Doenças Crônicas do Ministério da Saúde e que dispõe também de 15 minutos. A SRA. PATRICIA SAMPAIO CHUEIRI - Olá, boa tarde a todos e a todas. Gostaria de agradecer, principalmente à Deputada, a oportunidade de a gente explicar, então, todas as novas portarias que saíram, e trazer todo o embasamento técnico-científico que orientou a decisão do Ministério da Saúde. (Segue-se exibição de imagens.) Então, vou falar rapidamente — porque os colegas já falaram muito — do contexto atual do câncer de mama no Brasil, do conceito de rastreamento, da questão do rastreamento do câncer de mama especificamente e das ações do Ministério, se der tempo de falar nos 15 minutos. Então, como os colegas já comentaram, o câncer é a segunda causa de morte no País, e mesmo com as ações, diferentemente das doenças cardiovasculares, de que desde a década de 1990 a gente vem tendo uma queda importante da mortalidade, o câncer teve uma queda muito pequena só agora, na última década, desde o ano 2000. Então, o câncer é um desafio e vai continuar sendo, já que a gente tem um envelhecimento importante da população. Esses são os dados mais novos em relação ao câncer de mama: a nossa estimativa para 2014 de casos novos de câncer de mama aumentou; então, estaremos com 57 mil casos novos, é a estimativa, e 12.705, 15% dos óbitos de câncer, são relacionados ao câncer de mama. A gente lembra que o Ministério vem trabalhando, então, não mais com pontos de atenção isolados, mas com redes de atenção à saúde, e todos os pontos de atenção têm papéis muito definidos em relação ao cuidado da pessoa com câncer, em relação à prevenção e ao diagnóstico; então, isso vai desde a atenção básica até a atenção especializada, ambulatorial. A parte de oncologia, então, está na rede de atenção às pessoas com doenças crônicas, toda a área de oncologia. Hoje a gente tem no Brasil 279 serviços especializados em oncologia, hospitais que fazem cirurgia, radio e quimioterapia, que estão distribuídos dessa forma nas regiões do País. Então, é uma distribuição que ainda não está uniforme, e acho que um dos desafios do Ministério da Saúde é 14 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 a gente tentar deixar isso de forma a mais uniforme possível para que toda a população tenha acesso. Então, acho que a primeira questão que é importante é: a gente precisa entender o que é o rastreamento. Eu acho que é a primeira porque há muita confusão em relação a isso. Ora, rastreamento é diferente de diagnóstico, certo? O rastreamento se faz em população assintomática, sem fator de risco, e é uma política pública populacional. Não é individual. Então, a política individual é caso a caso, para quem está na minha frente; eu estou falando de uma política pública populacional, para toda a população, para se obter impacto nos indicadores de saúde do Brasil, para cair a mortalidade. Então, eu acho que essa é a primeira questão que a gente precisa olhar. E não basta fazer o rastreamento. Para um programa de rastreamento ser efetivo, depois do rastreamento tem-se de garantir que todo o mundo cujo exame deu positivo no rastreamento — que não quer dizer positivo para câncer; deu positivo no rastreamento — faça a biópsia, o exame anatomopatológico, os exames seguintes, para confirmar o câncer. Então, se não existe isso, se só se faz mamografia, com o rastreamento não vai cair a mortalidade da mulher; nós só vamos colocá-la numa outra fila, que é a fila de espera do exame. Precisamos que essas questões sejam muito claras. A outra questão é que temos de garantir o tratamento. Não adianta fazer o diagnóstico. Somos obrigados, é eticamente inaceitável fazer o rastreamento e não tratar essa pessoa depois. Então, são essas as questões éticas relacionadas ao rastreamento, e o objetivo dele é fazer cair a mortalidade. A gente só pode instituir programas de rastreamento organizado em qualquer área de saúde desde que a gente tenha evidências científicas claras de que ele vai trazer benefício para a população. Sempre há um equilíbrio entre risco e benefício, e eu vou falar um pouquinho dos riscos e dos benefícios em relação ao rastreamento. Então, uma coisa é o rastreamento, outra coisa é o diagnóstico. Uma pessoa que tem sinal, tem sintoma, não importando a idade, uma pessoa está na sua frente, isso é caso de uma decisão individual. Aí não estamos falando de uma política pública, que é populacional. Então, a gente tem alguns critérios que estão desde 1968 definidos, em relação ao que é que um programa de rastreamento tem de ter. 15 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Primeiro, a doença tem de ser um importante problema de saúde pública, e o câncer de mama é importante na saúde pública brasileira, ninguém está negando isso. A história natural da doença ou o problema clínico tem de ser bem conhecido. Então, temos de saber a história natural desde o diagnóstico, como é que se vai fazer o tratamento, qual é a mortalidade, qual é a qualidade de vida, temos de saber toda a história natural da doença para saber onde fazer a intervenção certa para ter impacto na mortalidade. Essa história, no caso do câncer de mama, não é a mais conhecida; a gente tem outros tipos de câncer e outros tipos de doença de que essa história natural é mais conhecida, mas o câncer de mama é bem conhecido. Outra coisa de que precisamos é ter o estágio pré-clínico, assintomático, bem definido, porque, como eu já disse, o rastreamento é para pacientes que são assintomáticos, sem nenhum sinal ou sintoma de doença. O benefício da detecção e do tratamento precoce com o rastreamento tem de ser maior do que se a condição fosse diagnosticada a partir de uma queixa, não do rastreamento, e aí há uma questão em relação à faixa etária de 40 a 50 anos: a gente tem poucas evidências científicas — elas não são boas nessa faixa etária — de que com o tratamento a gente vai obter queda da mortalidade dessas pacientes, diferentemente das evidências científicas na faixa etária de 50 a 69 anos. Então, os estudos são muito diferentes, e é isso que tem de ficar claro. Então, é um dos critérios que a gente não cumpre. Os exames que detectam a condição clínica no estágio assintomático — no caso que a gente está discutindo aqui, é a mamografia — têm de ser exames aceitáveis, disponíveis e confiáveis. Também é uma questão que, para abaixo dos 50 anos, talvez a mamografia... Só o futuro vai dizer isso para a gente. Como a mama ainda não foi substituída por tecido de gordura, porque isso acontece na fase do climatério, a mamografia não necessariamente vai ser o melhor exame para a gente fazer o rastreamento. Então, muitas vezes a gente não consegue fazer o diagnóstico porque nessa faixa etária ainda não houve substituição de tecido gorduroso. O custo do rastreamento e do tratamento da condição clínica tem de ser razoável, compatível com o orçamento. Só que a gente não tem dúvida: se se faz o 16 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 diagnóstico precoce, se se detecta no estadiamento anterior, com certeza o custo vai ser reduzido. E o rastreamento tem de ser um processo contínuo e sistemático. É um direito, então, da paciente. Então, eu gosto muito dessas imagens, porque eu acho que a explicação visual às vezes é mais fácil de entender do que quando se fala sobre isso com muitas palavras. Então, aqui a gente tem um processo conhecido. Vamos pensar que a doença começou aqui. Não tinha nenhum sinal ou sintoma. Passaram-se 4 anos, houve algum sintoma, e a gente teve o diagnóstico e uma apresentação clínica, palpou o nódulo. Então, houve 3 anos de tratamento, mas infelizmente a paciente faleceu, depois de 3 anos do diagnóstico. Numa população rastreada, assintomática, a gente teve o início da doença, 2 anos depois — ali se passaram 4, até o diagnóstico — fez-se o rastreamento e obteve-se o diagnóstico; só que a paciente, com todo o tratamento, faleceu no mesmo momento que faleceu quem obteve o diagnóstico clínico em 4 anos. E essa aqui é uma terceira opção: a gente tem o início; em 2 anos, como ali, faz-se o diagnóstico pelo rastreamento; e o diagnóstico pelo rastreamento consegue fazer com que se tenha uma sobrevida maior. Então, a paciente viveu mais de 5 anos. A morte dela foi mais à frente. Então, é isso que a gente precisa fazer. Para o câncer de mama entre 50 a 69 anos isso aqui está bem definido. Se se faz o diagnóstico 2 anos antes, com certeza, como mostram os estudos, tem-se uma sobrevida maior. Para o câncer de mama que, na grande maioria antes dos 50 anos, é um câncer do tipo mais agressivo, o tempo para a morte, independentemente do rastreamento e do diagnóstico, é o mesmo. Então, eticamente, o que se pode fazer com essa mulher? Ela vai viver 3 anos sabendo do diagnóstico e chegar à morte nesse momento. Então, ela vai ter 2 anos de vida a mais sabendo da doença, e não vai haver nenhum impacto com a morte dela. Então, nos estudos hoje a gente não tem evidência suficiente para sustentar o rastreamento antes dos 50 anos. E isso não acontece só no serviço público, e não é só no Brasil, como eu vou mostrar aqui. Então, o objetivo do rastreamento do câncer de mama é a detecção da doença na sua fase pré-clínica, com menor número de casos de falsos positivos. E quando eu incluo a faixa etária de 40 a 50 anos eu aumento o número de falsos positivos. Isso pode acarretar uma série de complicações para a paciente e para a 17 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 gestão do sistema de saúde. O Ministério tem essa diretriz. Ela não é nova. É uma diretriz desde 2004. Então, não há uma mudança de diretriz de rastreamento, de 50 a 69 anos. E as mulheres que tiverem risco aumentado devem ter acesso ao diagnóstico precoce, e não pelo rastreamento populacional; têm de ter acesso ao diagnóstico precoce por ter acesso fácil ao sistema de saúde e a qualquer momento que precisar de uma consulta obter essa consulta. É diferente do rastreamento populacional, em que se faz o exame sem nenhum pedido médico. É muito diferente. Então, isso aqui eu acho que é sempre bom a gente lembrar, e isso não é uma questão só do Brasil; é uma questão da OMS, do Reino Unido, da Inglaterra, da França, da Alemanha e de outros países, que não recomendam a política pública de rastreamento mamográfico antes dos 50 anos, uma vez que há limitada evidência científica da redução da mortalidade e há mais riscos e danos do que benefícios para essas mulheres mais jovens. Uma das razões disso, como eu disse, é a menor sensibilidade à mamografia na pré-menopausa. Aqui estão todas as evidências. Então, esse aqui é um quadro muito importante. Aqui a gente mostra países que têm sistemas públicos universais, como o sistema brasileiro — Austrália, Canadá, Dinamarca, Noruega, França, Itália, Reino Unido —, que têm programas de rastreamento organizado, uns desde muito antes que o Brasil, outros mais recentemente, como a Itália; a faixa etária de todos eles se inicia aos 50 anos. Temos alguma divergência com a França e com o Reino Unido em relação à faixa etária final do rastreamento. Então, todos esses países fazem o mesmo que o Brasil faz. O intervalo, exceto na Inglaterra e no Reio Unido, é de 2 anos. Na Inglaterra o intervalo passou, em 2011, se não me engano, a ser trienal, justamente porque o impacto de se fazer a mamografia antes não reduz a mortalidade. E aqui a cobertura. Eu gostei muito dos dados do Prof. Luis porque realmente a nossa cobertura hoje é baixa, justamente porque os exames são feitos fora da faixa etária. Eu vou trazer. Se nós fizéssemos todas as mamografias que ofertamos hoje na faixa etária de 50 a 69 anos, teríamos uma cobertura de mais de 80% do 18 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 programa. Só que eles são feitos em outras faixas etárias. Por isso é que não temos queda de mortalidade. Então, eu acho que precisamos olhar as coisas de forma mais longitudinal. E o Canadá se assemelha ao Brasil, que está na média de 25% a 30%, pois há uma variação por Estado. E todos eles têm programa de qualidade, o nosso também tem, que é o PNQM, como já foi citado pelo professor. Riscos e benefícios do rastreamento. O primeiro princípio que aprendemos no curso de Medicina é sobre não causar dano ao paciente. Primum non nocere é a primeira frase do juramento de Hipócrates que fazemos. Então, eu não posso ofertar uma política pública que traz um risco nessa faixa etária maior que o benefício. Precisamos ter isso em mente quando pensamos desde o atendimento individual, desde a política pública até o federal populacional. Então, o risco de resultados falso-positivos nessa faixa etária anterior a 50 anos é muito maior, é muito grande. O sobrediagnóstico e até o sobretratamento em mulheres com idade inferior a 50 anos que têm maior chance de ter tumor in situ acima dessa idade, as quais não evoluíam e são tratadas, e uma exposição à radiação numa faixa etária em que a mama está sofrendo alteração, de 40 a 49 anos, desnecessária, porque eu não vou conseguir diminuir a mortalidade dessas mulheres. O benefício, como já sabemos, é o impacto na mortalidade. Todos os estudos que temos tratam da faixa etária de 50 a 69 anos. Uma coisa é eu dizer de incidência, de número de casos, mas o rastreamento não olha só a incidência, ele tem que olhar o número de casos, o tratamento e o resultado quanto à queda de mortalidade. Os dados que vimos hoje, trazidos até agora, são dados só de incidência. Então, para haver queda de mortalidade nessa população de 50 a 69 anos é preciso atingir uma cobertura mínima ou maior que 70% da população. E hoje, no Brasil, não estamos conseguindo fazer isso. Estamos fazendo 30%, porque a maioria das mamografias é feita fora da faixa etária onde eu tenho evidência suficiente para reduzir a mortalidade. Se conseguirmos queda de mortalidade, pode variar de 15% a 23%. A mamografia bilateral de rastreamento do câncer de mama é, assim, indicada nessa faixa etária por esse exame, que apresenta maior benefício de queda na mortalidade e maior chance de sobrevida das mulheres. Eu destaquei uma das 19 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 minhas referências em relação à mamografia, de 2013, porque ela é muito recente e é da instituição Cochrane, que só faz revisão sistemática, uma instituição de peso, não só para a adoção de políticas públicas, mas também para a tomada de decisão. É, como eu disse, uma revisão recente, do ano passado, que confirma o que o Ministério da Saúde vem fazendo. E, só para mostrar para os senhores, no Brasil, para atingir a cobertura de 70% da população feminina que hoje usa o SUS, seriam necessárias em torno de 4 milhões e 100 mil mamografias anuais para rastreamento. Hoje estamos fazendo mais: 4 milhões e 600 mil. Só que apenas 50% dessas mamografias, que equivalem a 2 milhões e 295 mil, são realizadas na faixa etária correta. Então, estamos perdendo a chance de fazer mamografia em quem já sabemos que, se tratarmos antes, terá uma sobrevida maior. E estamos fazendo essas mamografias em faixas etárias incorretas. Então, foi diante desse contexto que repensamos a política pública do País. E fica mais fácil ver no gráfico. Aqui está o total de mamografias. Aqui está somada também a mamografia de diagnóstico. E aqui é o número de mamografias que estamos fazendo na faixa etária. E fazer mamografia em faixa etária em que as evidências não são boas é algo que está acontecendo desde 2010. Isso também não é novidade. Diante desse contexto, não está havendo queda de mortalidade. E, diante de um contexto em que temos oferta suficiente de mamografias e de mamógrafos, mas as mamografias não são feitas na faixa etária esperada, em novembro foi baixada a Portaria nº 1.253, que muda só a forma de financiamento da mamografia, de forma alguma a restringe. Nós só vamos financiar extrateto a mamografia feita entre 50 e 69 anos, para ver se induzimos os gestores e a prática clínica a fazer o exame na faixa etária de rastreamento, em que temos evidência suficiente. E houve uma confusão feita pelos meios de comunicação, porque nós temos dois tipos de procedimentos no SUS, que eu mostro aqui: a mamografia e a mamografia bilateral. Esse procedimento, até fevereiro, tinha o nome de “unilateral”, mas essa foi uma coisa que me deixou muito preocupada e chateada, porque ele era unilateral, mas podia ser feito duas vezes na mesma mulher. Porque, quando houvesse, por exemplo, outro problema que não fosse câncer e não houvesse necessidade de se 20 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 fazer o exame em duas mamas, ele poderia ser feito em uma mama. A crítica ao sistema sempre foi a de que deveria ser feita nas duas mamas, mas se podia usar o unilateral para as duas mamas. Infelizmente, alguns meios de comunicação pegaram esse nome, não olharam a definição do procedimento e fizeram essa confusão. Inclusive, o Colégio Brasileiro de Radiologia mandou isso para todos os associados dizendo que nós pagávamos o exame de uma única mama. É uma inverdade. Mas é muito complicado falar isso para a sociedade. Então, para dirimir de vez essa questão, retiramos a expressão “unilateral” do procedimento e deixamos apenas “mamografia”. No outro procedimento ficou a expressão “mamografia bilateral”, porque o rastreamento tem que ser feito, obviamente, nas duas mamas, e uma mamografia de diagnóstico pode ser feita em uma, dependendo da (falha na gravação) e pós-diagnóstico, pois pode ser um câncer ou outra coisa, ou pode ser feito o exame nas duas. Então, hoje nós temos os dois. E eu gostaria que as pessoas lessem, porque nós nunca mudamos a descrição do procedimento, só tiramos a expressão “unilateral” daqui. Portanto, não há restrição de idade para realização de mamografia, sendo que o exame pode ser realizado para fins de rastreamento e é orientado para a faixa etária de 50 a 69 anos. Se por algum motivo, por algum antecedente familiar, por algum aumento de risco a mulher precisar fazer rastreamento antes da faixa etária, o sistema permite. Só a forma de pagamento é que é diferente. No eslaide anterior eu deixei bem claro que, como o pagamento dessas mamografias vai para o teto, o Ministério já disse que vai rever os tetos dos Estados e Municípios onde houver necessidade, onde precisar pôr dinheiro para pagar as mamografias feitas fora dessa faixa etária. Eu acho que era isso. Eu ia entrar em outras ações, mas acho que só vou falar de três coisas rapidamente, porque não adianta fazermos rastreamento e não olharmos a qualidade da mamografia. Então, o Ministério da Saúde tem o Programa Nacional de Qualidade em Mamografia. Desde 2013 ele está funcionando. Esperamos que em 3 anos todos os serviços de mamografia tenham passado por esse programa. 21 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Nós criamos serviços de referência para diagnóstico de câncer de mama, porque não basta fazer mamografia, às vezes é preciso fazer punção, é preciso fazer biópsia, é preciso fazer ultrassom. Estamos incentivando os serviços que, além de mamografia, façam os outros itens necessários para um diagnóstico de câncer de mama, a terem um acréscimo de 60% em todos esses procedimentos. Portanto, é um incentivo de 60% acima da tabela do SUS. E há um incentivo para serviços ou locais que necessitem realizar mamografia móvel. São locais de difícil acesso. Para esses casos há as carretas. O valor dessa mamografia tem remuneração quase 50% maior que o da mamografia, que é de 45 reais no SUS. E gostaria de lembrar que existem vários serviços privados que têm a mesma orientação do Ministério da Saúde quanto à faixa etária de 50 a 69 anos. Cito o exemplo da UNIMED de Belo Horizonte, que hoje já paga diferentemente quando o profissional pede a mamografia na faixa etária indicada. Então, não é uma questão de serviço público, não é questão de queda da qualidade do serviço público. Isso é feito em qualquer país que quer qualidade e que quer diminuir a mortalidade causada por câncer de mama. Eu acho que era isso. Eu vou deixar o meu e-mail para contato: [email protected]. E este é o contato da minha equipe, que direciona dependendo do tema: [email protected]. Obrigada. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, Dra. Patricia, que representa, nesta audiência, o Ministério da Saúde e a equipe do Ministro. Passo a palavra de imediato à Sra. Marema Patrício, Assessora Técnica do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde. Depois abriremos espaço para perguntas. A SRA. MAREMA DE DEUS PATRÍCIO - Boa tarde a todos. Agradecemos pelo convite feito ao CONASEMS para participar deste importante debate. Eu não trouxe apresentação. O CONASEMS trabalha especificamente com a questão da gestão. Sob o ponto de vista da gestão, a portaria traz possibilidades claras de organização dos 22 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 fluxos. E o CONASEMS tem buscado essa organização em vista da questão da assistência, da acessibilidade e da garantia da integralidade da atenção para todos. Eu trouxe aqui o apoio do CONASEMS, mesmo porque o CONASEMS, institucionalmente, participa das discussões tripartites. Essas portarias foram intensamente discutidas com grandes parcerias técnicas e científicas. A nossa busca pelos nossos indicadores, pela melhoria e garantia da redução da mortalidade vêm como meta em todas as pactuações dos Municípios. E quero dizer, endossando a fala da Dra. Patricia, que, quando trabalhamos com política pública, essa questão da portaria não pode ser vista como um caso isolado. Nós buscamos uma questão que é da população, que diz respeito à acessibilidade, à garantia da saúde para todos. Dentro desse processo, temos a garantia de financiamento do Ministério e de outras organizações de serviços, como esse serviço do diagnóstico do câncer de mama, habilitação específica do Serviço de Referência para Diagnostico de Câncer de Mama — SDM. Foi e está sendo importante para os gestores essa possibilidade de a mulher fazer todos os tipos de exames no mesmo local; a mamografia móvel, que ampliou o acesso; e o financiamento dos equipamentos e compra para toda a rede, em todo o País. Eu comentei aqui com a Deputada que temos uma dificuldade: a falta de equipamento. Mas agora — não é, Patricia? — a compra e a distribuição dos equipamentos estão sendo garantidas para todas as regiões do País. Se olharmos os números muito friamente, veremos que nós temos um “privilégio” — entre aspas — de acesso nas Regiões Sul, Sudeste e talvez CentroOeste, e que nas Regiões Norte e Nordeste nós temos vazios assistenciais importantes e sérios de acesso. E agora também vem deslanchando a questão da educação permanente para a qualificação de profissionais para a realização de mamografia em todos os lugares, desde o técnico de radiologia aos profissionais da área. Tudo isso mostra que o gestor está atento. É na ponta que as questões acontecem. Se trabalharmos com foco na redução da mortalidade, com as diretrizes mais embasadas, com certeza avançaremos no acesso e na assistência. Quero dizer que de maneira alguma essa portaria restringe o atendimento. Nós temos formas de financiamento. O Fundo de Ações Estratégicas e 23 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Compensação — FAEC agora vai financiar a priorização dada pela Portaria, mas os recursos do limite financeiro da média e alta complexidade ambulatorial e hospitalar dos Municípios garantirão as demais faixas etárias. Isso vai ter que entrar na regulação. E os pedidos indiscriminados, os números de exames que nós temos de falso-positivo etc. garantem ao gestor a tranquilidade de que a restrição não existe. Bom, estou à disposição de todos. O trabalho do CONASEMS é apoiar as Secretarias Municipais de Saúde. Estou às ordens. Muito obrigada. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Deputado Eleuses Paiva, nós já vamos passar às perguntas. O SR. DEPUTADO ELEUSES PAIVA - É que eu queria aproveitar para falar enquanto a oradora estava com a palavra. V.Sa. tem alguma experiência específica em mastologia ou oncologia? A SRA. MAREMA DE DEUS PATRÍCIO - Não, senhor. O SR. DEPUTADO ELEUSES PAIVA - Está bom. Obrigado. A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - A Sra. Marema Patrício é Assessora Técnica do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde, que significa o conjunto dos Secretários Municipais de Saúde. Eu quero registrar a presença dos Parlamentares que aqui se encontram ou que aqui estiveram: Deputado Alexandre Roso; Deputado Amauri Teixeira, que abriu os trabalhos na condição de Presidente; Deputado Eleuses Paiva, que está aqui conosco; Deputado Geraldo Resende; Deputado José Linhares. A Deputada Rosane Ferreira também passou por aqui e está presente a Deputada Mara Gabrilli. Agora vamos abrir os debates. Eu vou me permitir, como autora do requerimento, começar a fazer as perguntas. Em seguida passarei a palavra ao Deputado Eleuses Paiva, coautor do requerimento, e aos demais colegas. Primeiro eu preciso declarar que sou enfermeira de formação, fui Secretária Municipal da Saúde do meu Município de Lages por 7 anos e fui Secretária Adjunta e Secretária de Estado da área. Trabalhei na Secretaria Estadual de Saúde de Santa Catarina por mais 3 anos e 3 meses. 24 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 A minha fala à imprensa, na Casa e nos documentos escritos vão muito ao encontro do que foi dito aqui. Mas eu preciso expressar a minha preocupação. Por quê? Porque eu sou autora de um dos projetos de decreto legislativo que sustam essa portaria. Não posso admitir, principalmente agora que estou em outro momento, sou Parlamentar, que uma portaria fira uma lei. A Lei nº 11.664, de 29 de abril de 2008, diz com clareza no seu art. 2º: “O Sistema Único de Saúde — SUS, por meio dos seus serviços, próprios, conveniados ou contratados, deve assegurar:............................................................ III – a realização de exame mamográfico a todas as mulheres a partir dos 40 (quarenta) anos de idade;” Aqui só não está escrita a palavra “rastreamento”, mas, quando diz “deve assegurar”, está dizendo que deve garantir a cada uma de nós, mulheres acima de 40 anos, a realização do exame. A portaria ministerial não proibiu, é verdade, mas quando ela muda o sistema de financiamento, tira do FAEC, que é uma forma de pagamento extrateto, e diz que vai pagar extrateto somente a partir de 50 anos, ela faz um corte e diz que a prioridade para realização das mamografias de rastreamento passa a ser a partir dos 50 anos. As mulheres com menos de 50 anos de idade não estão impedidas de fazer o exame, porque nós podemos ter uma jovem de 18 anos, de 25 anos, de 28 anos, de 30 anos com prescrição médica, com histórico clínico que recomenda a realização do exame. E eu nunca vi uma prescrição médica de mamografia não ser autorizada em função da faixa etária. Onde é que está a nossa preocupação, que acho bastante procedente? Por isso eu disse que sou ex-Secretária Municipal da Saúde. O conjunto de Municípios no País hoje, de 15% está investindo 21% da receita em saúde em média. O conjunto dos Estados, de 12% está investindo 14%. Quando eu digo que essa população deixa de ser prioritária, eu estou trazendo esse procedimento para a média e alta complexidade. E eu não conheço, no meu Estado de Santa Catarina, Municípios que estejam com folga na média e alta complexidade porque, quando sobra em um lugar, estoura em outro. O que vai acontecer? Aqui está a nossa grande preocupação: nós vamos priorizar a faixa etária acima dos 50 anos, mas nós 25 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 não vamos ter mais Municípios fazendo campanha de orientação para as mulheres fazerem mamografia de rotina ou o rastreamento a partir dos 40 anos, porque nós sabemos que os recursos vão estourar. O que nos disse o Ministro na última reunião, quando decidimos pela realização desta audiência pública? Que vai haver um encontro de contas da média e alta complexidade. E daí a pergunta que vou fazer à Dra. Marema e à Dra. Patricia. Eu acompanhei muito o encontro de contas na terapia renal substitutiva, por exemplo. A cada 3 meses junta-se o que cada clínica fez, faz-se uma planilha, que é enviada ao Ministério. Ali está dito: clínicas A, B e C no Estado estouraram o teto. No caso das clínicas D, F, G e H sobrou teto. É preciso remanejar os tetos financeiros. Eu acho que nós vamos entrar por um caminho perigoso e complexo. Eu não consegui ver, neste momento, indicação cientifica consistente. E aí a minha pergunta vai para o Dr. Luis César, que nos colocou a questão do grupo técnico, do qual o INCA faz parte. A minha pergunta é muito clara, e eu preciso saber a resposta com todas as letras: o INCA recomenda mamografia de manutenção a partir dos 40 anos? O senhor conhece algum estudo do INCA que diz não ser mais preciso fazer a mamografia? Porque eu tive a impressão, quando vi uma apresentação com alguns recortes seus, de que estava sendo mantida. Por que nós estamos preocupados? Primeiro, porque uma lei é maior do que uma portaria. E eu vou mais longe — disse isto ao Ministro e por isso eu digo aqui — : se o Executivo não tem mais recomendação de realização do exame a partir dos 40 anos, tem que mandar um projeto de lei para o Congresso alterando a lei em vigor, e não nós Parlamentares. Porque a nós não cabe — não cabe mesmo! — não tendo nenhuma portaria proibindo. Mas, a partir do momento em que se muda a forma de pagamento, pode-se, sim, estar restringindo o acesso ao procedimento. A Assessoria Técnica do PPS fez um levantamento para nós. O problema das mamografias é mais grave. E eu posso dizer que eu sou uma mulher um pouco mais feliz do que as mulheres de outras regiões do meu País. Nós temos levantado aqui o número de procedimentos de mamografias por rastreamento realizadas — só no SUS, até pela dificuldade de obtenção de dados. Na Região Norte, segundo dados de 2012, a cobertura foi de 5,16%; no Nordeste, de 9,78% — deste código de que nós estamos falando, código 26 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 020403018-8. Nós temos mamografias para homens, mas a indicação ainda é pequena. O Sudeste tem 11% de cobertura. Isso se refere a pessoas de 40 anos ou mais: 40, 49, 59 anos, porque em 2012 ainda havia a FAEC. O Sul e o Sudeste são os que têm maior cobertura. A Região Centro-Oeste também tem cobertura reduzida. Mas o que significa isso? Nós temos uma grande caminhada. Sabemos que o SUS vem crescendo, mas não estamos conseguindo garantir à população o que está na Constituição: saúde como direito de todos e dever do Estado, mediante políticas públicas. E nós sabemos que aqui estão associadas falta de equipamentos instalados e falta de profissionais. Onde há equipamento, precisamos da garantia do controle de qualidade, que é importantíssima. Nenhum de nós aqui discorda que é preciso ter os mamógrafos calibrados, que é preciso ter profissionais que saibam fazer a mamografia, que é preciso ter profissionais que leiam com clareza e correção a mamografia. Mas eu preciso fazer essas perguntas, porque há uma lei em vigor. E a lei, fruto do nosso PDC que sustando a portaria, é maior. E, repito, a minha preocupação está exatamente em, quando eu digo que vai para a média e alta complexidade, estar dizendo que é dentro daquela caixinha, daqueles recursos financeiros, que terão de ser disputados com outros. E nós estamos deixando essa população de 40 anos, 50 anos na definição dos seus gestores. Nós sabemos que o cobertor do SUS ainda é curto. Então, ele vai ter que administrar dentro do seu teto, até buscar refazer o teto. Nós sabemos que há um conjunto grande de Municípios. A aí a reponsabilidade não é do Ministério da Saúde, porque nós também conhecemos o orçamento do Ministério. Nós precisamos de mais recursos para a saúde, sim, para fazer frente ao que nos propusemos quando da elaboração da Constituição. Eram essas as minhas perguntas. E eu gostaria que o representante da FEMAMA, com relação às minhas observações, dissesse qual é a sensação da FEMAMA, que representa uma instituição de defesa dos usuários. Como tem sido a reação da população no que se refere a essa preocupação? Nós estamos aqui com gestor federal, gestor municipal, especialistas, legisladores e usuários. 27 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Concedo a palavra ao Deputado Eleuses Paiva para fazer as suas considerações. Logo após, serão respondidas essas perguntas e depois farão suas perguntas os dois colegas inscritos. Com a palavra o Deputado Eleuses Paiva. O SR. DEPUTADO ELEUSES PAIVA - Deputada Carmen Zanotto, quero cumprimentar V.Exa., até porque é uma Deputada que vem trabalhando muito no tema da saúde e tem experiência prévia com o setor. Quero cumprimentar o Dr. José Luis, com quem trabalhei praticamente na mesma equipe, na mesma instituição universitária; a Dra. Marema Patrício; e o Dr. Ricardo Caponero. Deputada Carmen Zanotto, eu estava aqui conversando com um colega médico, não como Deputado. É impressionante, deixa-me revoltado o absurdo que esse Sr. Padilha fez com a saúde deste País! É um absurdo! Eu conheço todos os pontos que foram alterados na saúde deste País na gestão desse Ministro. Desde o momento em que concluí meu curso, há 37 anos, poucos Ministros tiveram a incompetência desse ex-Ministro da Saúde Alexandre Padilha: desestruturou toda a rede! É uma coisa fantástica! O que ele fez na atenção básica com esse Programa Mais Médicos já prova o que estou afirmando. E agora começa a haver transparência em relação ao que está acontecendo no País. Mas eu quero dizer que fiquei mais assombrado ao ouvir as explanações dos presentes. Entendo a representante do Ministério, mas, Dra. Patrício, no mínimo o Ministério deve ter a prudência, a responsabilidade de, antes de tomar uma atitude dessas, ouvir pelo menos a academia, ouvir os outros profissionais que trabalham no setor. Antes de vir para cá, eu fiz questão de ir à Universidade de São Paulo falar com o setor responsável pela área de mama, de ginecologia obstetrícia, para ouvir a sua opinião. Eles são radicalmente contrários a essa postura do Ministério da Saúde. Fui à Escola Paulista de Medicina e ouvi exatamente a mesma coisa. Então, quando não temos humildade e nos julgamos detentores da verdade e do conhecimento, saem portarias como essa. V.Sa. teve uma explanação brilhante e esses são os dados. Quem trabalha com epidemiologia, como V.Sa., de vez em quando tem dados que talvez quem atende na clínica não tem, ficando impossibilitado de trabalhar com essa visão de V.Sa., que citou três riscos de se fazer o exame de mamografia. Segunda-feira eu 28 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 estava atendendo. Estou falando isso porque eu ainda trabalho na área e, muito por acaso, trabalho nesse setor, trabalho com paciente oncológico. Por isso eu estava querendo saber se V.Sa., Dra. Marema, tem experiência nessa área, porque cita três riscos de se fazer o exame de mamografia. O primeiro risco é o do falso-positivo. Vamos analisar o que acontece se houver um falso-positivo, senão vai ficar a ideia equivocada de que se o paciente tiver um falso-positivo na mamografia vai sofrer uma cirurgia, uma mastectomia ou algo desse tipo. Não é verdade! Nós temos procedimentos simples, baratos. Podemos fazer um exame teleguiado, fazer uma biópsia da área e resolver esse problema. Então, eu não vejo o falso-positivo neste momento como um grande problema. Tratar ou não in situ? Eu vou até me negar a responder. Pela proposta que eu ouvi aqui, houve a tentativa de se vender a ideia do não se tratar o tumor in situ de mama. Eu não vou nem discutir. Eu me nego a discutir isso aqui. Quem está falando isso deve ter alguma evidência. Está sendo gravado. Não vou nem perder tempo discutindo esse assunto. Segundo, a exposição à radiação. Na mamografia benfeita, com aparelho calibrado, com aparelho moderno, a exposição é mínima. Nós comparamos a exposição que há numa mamografia, a exposição dos aparelhos modernos com os exames radiológicos antigos — por exemplo, um raio-x de tórax. Nós não vimos muita diferença. Está-se tentando passar para a opinião pública uma ideia equivocada de exposição à radiação. Se fosse assim, o Ministério também teria que proibir o raio-x de tórax, porque nós estamos trabalhando quase no mesmo limite, Deputada Carmen Zanotto. Isso é importante! Eu não vejo dados — não existem — nem por parte da REM nem da radio, porque a quantidade de exposição e de absorção do organismo é muito diferente, muito inferior a uma urografia excretora e enormemente inferior a um tratamento gastrointestinal. Terceiro: segundo o bom senso, normalmente, quem vai atrás de uma especialidade médica? De quem é esse comportamento? Quem faz parte das diretorias científicas dessas especialidades? Vamos pegar como exemplo a FEBRASGO — Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. 29 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Quem faz parte da diretoria? Durante anos a fio, normalmente são os professores das grandes universidades brasileiras. Qual é o posicionamento da FEBRASGO, Dr. José Luis? É contrário. Vamos pegar os profissionais que trabalham no setor de imagem, que vivem esse dia a dia, como os do Colégio Brasileiro de Radiologia. Qual o comportamento dos profissionais que trabalham nas grandes universidades brasileiras? Também é exatamente o contrário. Vamos falar dos profissionais que trabalham na área de mama, dos mastologistas. O que eles pensam disso? Eu vou dar um exemplo para V.Exa., Deputada Carmen Zanotto. Eu atendi, na segunda-feira, uma paciente de 48 anos — ela falou que queria até vir aqui —, no ambulatório do SUS, estágio provavelmente II, quem sabe IV, com um tumor grande. Nós temos uma instituição pública em São Paulo, mas recebemos pacientes praticamente do Brasil inteiro, até porque o grande problema do SUS persiste, Deputada Carmen Zanotto: acesso. Algumas pessoas que trabalham no Ministério esquecem-se disso. É muito bonito quando mostram algo ali e dizem: “Olha, é fantástico!” É para quem não está trabalhando na ponta e atendendo pacientes como médico. Para quem está sentado aqui em Brasília na poltroninha, no arcondicionado, é fantástico. Quero ver para quem está na linha de frente, atendendo. Agora, é diferente quando você pega uma paciente de 48 anos, que vem do Norte do País, que nunca tinha feito uma mamografia, e vê que ela está em estágio avançado, provavelmente com o diagnóstico selado. Seja qual for a literatura mostrada, ainda são os pacientes estágio 0 e estágio I — por isso eu pedi ao Prof. José Luis que se manifestasse — que têm a maior sobrevida em 5 anos. A literatura não mudou, ainda continua sendo assim. Agora, o que falta é o Ministério raciocinar e saber qual é a dificuldade de quem trabalha no setor. A dificuldade do Ministério deveria ser montar um rolo compressor para ir buscar essa mulher onde ela estiver e levá-la para fazer o exame. E sabe por que não faz isso, Deputada Carmen Zanotto? Não é porque eles estão mudando a faixa etária que vai melhorar; é porque depois do diagnóstico do câncer, Deputada Carmen Zanotto — V.Exa. brigou aqui na Casa para discutir um dos maiores absurdos colocados em lei —, depois de 1 ano, pelo menos, ou de meses, essa paciente tem direito a tratamento. Isso é um absurdo! Isso é uma imoralidade! Vivemos num País em que se faz o diagnóstico e não há tratamento. Isso acontece para quem trabalha aqui. (Palmas.) É essa imoralidade 30 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 que esse Ministério está acobertando, Dra. Patricia. É um absurdo o que vocês estão fazendo! Vocês estão levando milhares de pessoas à morte pela irresponsabilidade eleitoreira do ex-Ministro Alexandre Padilha, que não tem humildade para ouvir as pessoas que entendem, as pessoas sérias que trabalham na saúde e não são de partido A, B ou C. Ao contrário, elas estão querendo ajudar as pessoas. Se elas fossem ouvidas, não sairiam essas barbaridades a que nós estamos assistindo. E é isto que acontece: quando se atende um paciente que se está perdendo, fala-se em fenômenos estatísticos. É verdade, os fenômenos estatísticos são verdadeiros. Se nós formos trabalhar com a faixa etária de 50 a 69 anos, eu não tenho dúvida de que aí está o grande fenômeno estatístico. É verdade. Isso está claro na literatura. Não precisa nos mostrar, isso está claro. Quem atende está vendo isso. O problema, Dra. Patricia, é que tem gente entre 40 e 50 anos que, quando o tumor é diagnosticado precocemente, dependendo da linhagem do tumor, a pessoa vai sobreviver, não vai morrer; vai ter boa qualidade de vida. É para essas pessoas que vocês estão virando as costas. (Palmas.) Eu gostaria de saber se virariam as costas se fosse parente de algum de vocês. “Não, trata. Olha, está lá nos 4%, está selada a vida.” Essa é a irresponsabilidade ao tratar com a vida humana. É um absurdo médico bacharel. É um absurdo o que eu vejo neste País: bacharéis, médico bacharel que nunca pôs a mão em paciente, que não vive o dia a dia como nós. Nós, que vivemos o dia a dia, estamos vendo o que estamos perdendo, coisa que podíamos alterar. Eu recebi aqui um depoimento e quero mostrar, porque se pensa que o que acontece, Deputada Zanotto, é extremamente diferente. Por isso eu digo que tem que olhar quem está na ponta. Chamem as pessoas que estão trabalhando no setor. Tenham a humildade de ouvir essas pessoas. Eu recebi este depoimento e a pessoa está presente aqui. Diz o seguinte: “Trabalho em unidades móveis nos Estados de Pernambuco e Paraíba que atendem 60 Municípios aproximadamente”. A pessoa passou para mim e, se eu quiser, ela se manifesta, mas não é possível manifestação da plateia. “Após a portaria, tivemos uma redução de 50% dos atendimentos. Hoje os Municípios não querem mais fazer exame bilateral na faixa etária de 45 anos”, diz ela. Essa é a realidade que acontece no Brasil. Agora, virar as costas para essa realidade? E já tem um projeto de lei delimitando. Eu não acredito! 31 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Retroceder é algo, no mínimo, sobre o que esta Casa tem que se posicionar. Ainda bem, Deputada Carmen Zanotto, que a senhora teve a brilhante ideia, que terá não só o meu apoio, mas o apoio, acredito, de todos os Parlamentares desta Casa, de cassarmos essa portaria, até porque isso não tem a ver com partido de base nem partido de oposição. Eu não estou aqui falando como base, eu não estou aqui falando como oposição. Eu estou falando como médico e estou falando como cidadão. Obrigado, Deputada Carmem Zanotto. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, Deputado Eleuses. Eu passo a uma rodada de respostas da Mesa. Em seguida, ouviremos os Deputados Geraldo e Alexandre, que também já pediram a palavra. Começamos, então, pela Dra. Patricia. A SRA. PATRICIA SAMPAIO CHUEIRI - Vou começar com alguns esclarecimentos em relação à fala da Deputada Carmem. Primeira questão: a MAC não vai ser por encontro de contas. Nós vamos aumentar o teto MAC de todos os Estados e Municípios de acordo com a série histórica de produção de mamografia. Então, não vamos ter problema com essa questão de recurso. Agora, o Fundo de Ações Estratégicas e de Compensação — FAEC tem que ser usado com diagnóstico. Eu trouxe, e o Dr. Luis confirmou, um dado: hoje a gente tem uma cobertura de 25% a 30% da população alvo entre 50 e 69 anos. Acho que é preciso chegar a uma cobertura de 70% dessa população. Para começar a ter queda de mortalidade nessa faixa etária precisamos usar o Fundo de Ações Estratégicas para induzir que a maior parte das mamografias seja feita nessa faixa etária. Então, essa é a intenção de fato. As evidências estão aqui, eu trouxe uma nota técnica informativa com todas as evidências, a última publicação da Cochrane. Nós conversamos com a academia, ninguém tomou essa decisão sozinho, de uma hora para outra. Então aqui tem tudo. Eu posso distribuir depois, eu trouxe algumas. Só para relembrar: como o Deputado trouxe a questão de partido, eu não estou falando de partido. Eu atendi por 10 anos em São Paulo. Então, atendi 32 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 pacientes. Estou há três anos e meio aqui em Brasília, então não é que eu nunca tive contato com paciente. Logo depois que a gente fez a portaria, em novembro, no início deste ano, a Secretaria Estadual de São Paulo, que hoje é comandada por um partido diferente do partido que está no Ministério da Saúde — eu não estou falando na questão de partido — tomou uma decisão que só reforçou a política do Ministério da Saúde de que no Estado de São Paulo as mulheres na faixa etária de 50 a 69 anos, no dia do aniversário, já fariam a mamografia. Então, aqui é uma questão técnica em relação à área de rastreamento, como política pública de rastreamento populacional. Não é uma questão específica do Governo Federal, São Paulo se adiantou nesse sentido. Não sei se tinha outras questões. Algumas já foram colocadas e não vejo por que especificar. A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - A questão da divergência entre a lei e a portaria. A SRA. PATRICIA SAMPAIO CHUEIRI - A partir de uma evidência científica, Deputada, que é o que está colocado aqui, eu acho que a gente vai ter que fazer um movimento de mandar então do Executivo para o Legislativo um projeto de lei para revisar a Lei nº 11.664, que é uma lei de 2008. Essa revisão que eu trouxe da Cochrane é de 2013. Então, o que a gente tem são outras evidências em relação à faixa etária e, hoje, apesar de se ofertar um número de mamografias até superior à necessidade na faixa etária de 50 a 69 anos, elas não são feitas, e não se tem queda. Há anos está havendo aumento de mortalidade no câncer de mama porque estamos focando a política pública de rastreamento na faixa etária errada, por uma série de motivos. A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada. Com a palavra o Dr. José Luis, por favor. O SR. JOSÉ LUIS ESTEVES FRANCISCO - Obrigado. Em relação a essa Comissão, temos dois elementos do INCA, que dela fazem parte, um técnico, que avalia as mamografias do ponto de vista físico em relação à quantidade de irradiação que essa paciente está recebendo, por exemplo; e outro, uma colega que trabalha realmente dando laudo no INCA. Pessoalmente, ela não 33 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 concorda muito com isso, mas defende a posição tomada por um colegiado do INCA. (Segue-se exibição de imagens.) Acho que o pessoal não entendeu algumas coisas. O que é MAC? Média e Alta Complexidade. É um dinheiro que o Ministério coloca nas cidades, na região, e esse dinheiro vai cobrir ou financiar os procedimentos, as internações em relação à média e alta complexidade. Se você tem a mamografia lá dos 40 aos 50 anos e você me fala que nessa turma não funciona muito bem, eu vou fazer o quê, como gestor, se eu estou precisando em outro lugar? Eu vou tirar a oportunidade de essa mulher fazer e vou colocar em outro lugar, como já está sendo feito em vários Municípios. Por exemplo, num grande Município, que é Curitiba. O gestor entende como ele quiser. O Secretário de Saúde do Município entende como quiser. Ele pode colocar o dinheiro da MAC onde ele quiser. Então, pode, realmente, excluir pacientes que fazem inclusive o acompanhamento do câncer de mama na outra mama fora da MAC. A proposta que deveria ser feita não deveria mudar a portaria para colocar isso. Deveria ser colocado dos 40 em diante no FAEC. Todo (ininteligível) extrateto. Sobrediagnóstico é o seguinte: você tem uma lesão, suspeita daquela lesão, faz uma biópsia e vê um carcinoma muito inicial, quase nenhum câncer. Você não sabe, não está escrito em lugar nenhum, nenhum exame te dá se essa lesão vai progredir ou não. Eu queria saber onde está escrito na ciência de hoje que lesão que vai progredir para câncer e vai matar essa paciente e que lesão não vai. Eu desafio qualquer pessoa do mundo a me falar qual é a lesão que não vai virar câncer. Esse é o sobrediagnóstico. Eu não sei, ninguém sabe. Então, essa paciente tem que ser tratada também. Eu vou correr o risco de não tratar? “Eu acho que era sobrediagnóstico”. Eu acho? E se não for? A responsabilidade é minha, como médico, e da paciente, que vai perder a vida. Alguém de vocês não quereria, sob uma suspeita mamográfica ou ultrassonográfica, não fazer uma biópsia? Colocar uma agulha, com anestesia local, cujo procedimento dura 10 minutos e a paciente vai embora para casa sem nenhum ponto dado, sem nenhum antibiótico tomado, e no outro dia ela está trabalhando? 34 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Quem vai dormir com a suspeita de câncer de mama? Quem? Se eu fosse mulher, eu não queria. No primeiro pingo de sangue que sair na minha urina eu vou ao urologista. Vou ao urologista antes para ver se eu tenho câncer de próstata. Quem é que vai dormir com isso? O médico diz que tem uma mancha na sua mamografia. Alguém dorme sossegado? Não. Então, tem que esclarecer. Esse é outro ponto que demora para ser esclarecido: a paciente faz a mamografia e leva 3, 4 meses para marcar sua consulta, mais 3, 4 meses para fazer sua biópsia, mais 1, 2 meses para a biópsia ficar pronta, mais 1 mês para retornar ao médico, mais 2 meses, que são 60 dias, para começar o tratamento. Se uma pessoa tem um linfoma, ela pode morrer em 20 dias, 10 dias. É necessário um tratamento urgente, não é, Deputado? Então, são coisas que precisamos repensar. Eu acho que o extrateto deveria ser para todos os exames preventivos, tudo que existe em termos de prevenção, não só a mamografia. A colonoscopia e o papanicolau, por exemplo, deveriam ser contemplados pelo extrateto. Você economiza tratando uma lesão de diagnóstico precoce, mas você não consegue diminuir a incidência, você diminui a mortalidade. Todos os estudos que mostrei apontaram para uma diminuição da mortalidade: 15% de diminuição da mortalidade entre as mulheres de 40 a 50 anos. Isso é muito. Um estudo canadense, que quis derrubar a mamografia, diminuiu em 8% a mortalidade. É muito, não é pouco. Vejam o gasto de uma paciente com uma lesão grande de mau prognóstico: uma ampola de Herceptin custa 8 mil reais. Pelo menos 12 dessas são administradas na paciente. Uma radioterapia quanto não custa? Então, nós temos que evitar isso aí, pessoal. Eu acho que o caminho é cobrir cada vez mais pessoas e não menos. Se você aumenta a população, você tem cobertura. Eu não coloquei um dado ali, porque eu achei que tinha muita coisa e não deu tempo de mostrar tudo. Fonte: DATASUS, 2008. Cobertura: o azul é a possibilidade de mamografias; o verde é o realizado. Olhem o tanto de mamografias que podemos fazer. Então, eu acho que tem espaço. A questão é monetária, não é científica. É essa a opinião da Sociedade Brasileira de Mastologia. Obrigado. 35 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada. Eu vou só pedir um favor aos outros dois expositores. É que tem três Deputados inscritos e alguns deles precisam sair. Então, passarei rapidamente às perguntas, e nós responderemos em bloco. Então, eu passo a palavra ao Deputado Alexandre Roso, e, na sequência, aos Deputados Geraldo Resende e Mara Gabrilli. O SR. DEPUTADO ELEUSES PAIVA - Solicito apenas 2 segundos para fazer uso da palavra. Eu só gostaria de mostrar um dado interessante. Nós falamos em fenômeno estatístico e esquecemos que atrás desse fenômeno nós temos seres humanos. A Câmara poderia mostrar todo esse pessoal, todas essas mulheres que estão aqui. Todas elas, sem exceção, tiveram câncer de mama antes dos 50 anos de idade e estão vivas, estão sendo tratadas, porque, graças a Deus, alguém teve um outro tipo de atitude anteriormente. Então, esse é o exemplo de que existe vida atrás dos fenômenos estatísticos. Se as pessoas entendessem que há vida atrás dos fenômenos estatísticos, talvez nós não tivéssemos essas pessoas aqui com a gente. Era só isso que eu gostaria de deixar, antes de V.Exa. se manifestar. (Palmas.) O SR. DEPUTADO ALEXANDRE ROSO - Obrigado, Deputado Eleuses. Em um primeiro momento, eu quero manifestar meu respeito à Deputada Carmen Zanotto, em especial, que é uma Deputada que sempre trabalha muito essas questões referentes à saúde pública, talvez pela formação, um pouco pelo próprio trabalho como Secretária. Eu também fui Secretário de Saúde e sei o que passamos dentro dessa atividade. Eu não tive oportunidade de ouvir todos da Mesa, mas peguei a fala da Dra. Patricia. Nós não estamos falando de pouca coisa aqui. Nós estamos falando da doença que mais mata as nossas mulheres. Então, só por isso, eu acho que esse é um assunto muito sério, que temos que tratar com seriedade. Eu não tenho a fluência do Deputado Eleuses, eu não consigo, às vezes, ser tão preciso, e não queria ser interpretado como alguém que está fazendo uma acusação ou como alguém que está falando mal de outras pessoas. Mas eu tive a 36 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 nítida impressão, Dra. Patricia, de que o Ministério age a partir do “Ministério do Dinheiro”. O método que vocês utilizaram para colocar algo discutível... E a senhora concordou em que tudo que está sendo dito é discutível. Inclusive, a senhora fez referência à imprensa, dizendo que a imprensa fez uma confusão. Em minha opinião, a confusão começou a partir dessa portaria. E a senhora, sem querer, concordou com isso, porque admitiu que o Governo vai ter que rever a lei, e é o Governo que tem que mandar a lei para cá para ser mudada, porque o próprio Governo fez uma portaria contrária à lei. Então, eu quero dizer que temos de admitir que existem divergências técnicas em relação a tudo o que senhora falou. Concordo com o que a senhora disse aqui, do ponto de vista técnico. Agora, nós temos que, além disso, pensar que não estamos tratando de números. Nós estamos tratando de pessoas. E vale como ensinamento que nós não podemos aceitar uma portaria malfeita, admitida aqui nesta Mesa, que vai contra a Lei Maior. A lei é maior do que a portaria. Então, tem uma coisa errada nesse processo. O método que está sendo executado aqui pelo Ministério é completamente desumano. A impressão que nós temos aqui é que o Ministério quer reduzir os gastos com os exames. E, aí, nós usamos aqui números e números e números para provar que eu estou certo. Antes disso, doutora, nós temos um tempo, um tempo que eu chamo de educação. É sempre melhor quando nós fazemos as transformações em nossa sociedade a partir da educação e não a partir de uma lei. É por isso que os Estados Unidos detestam tantas leis. O povo americanos tem uma certa ojeriza à lei, porque a lei é sempre traumática e tem um custo muito alto para a população e também para o Governo. Eu quero dizer isso porque a senhora citou aqui o sistema dos Estados Unidos — que foi modificado há alguns anos —, mas ele é completamente diferente do método que vocês estão utilizando aqui. O método é completamente diferente. Não é por portaria, não é por lei e não funciona dessa forma. Aqui neste País nós temos um grupo de profissionais e de pacientes que há anos trabalham dessa forma. E eu, como médico, fico incentivando as pacientes 37 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 com 40 anos, dizendo para elas: “Olha, a senhora tem 40 anos. A senhora já fez a sua mamografia?” E elas: “Não, doutor. O que é isso?” E, aí, você passa todos esses anos ensinando para as pacientes como é que deveria ser. Aqui, todas essas mulheres têm uma palavra interessante, e ninguém aqui falou contra isso. Diagnóstico precoce não vai naquela estatística de morte, como a senhora falou. Diagnóstico precoce aumenta a possibilidade de cura da doença, porque nós temos que admitir que existe cura. Senão, quando falarmos em câncer, nós estaremos falando em morte para os pacientes. E isso não é verdade. O que é verdade é que quanto mais precocemente eu faço o diagnóstico, mais chance tenho. E, aí, as coisas não fecham nem na minha cabeça, que sou médico. Trabalho com oncologistas, sou cirurgião do aparelho digestivo, da área oncológica. E meus colegas cada vez mais dizem assim para mim: “Olha, em minhas estatísticas, eu tenho atendido mulheres cada vez mais cedo.” E isso está começando a educar a nossa população, porque, muitas vezes, a mulher com 38 anos chega para o médico e diz: “Doutor, eu quero fazer a minha mamografia já”. Isso ocorre porque temos exemplos e exemplos. Eu sei que isso é muito do “eu acho”, daquilo que acompanho, mas do ponto de vista da epidemiologia, isso é ponderável, mas não é absoluto. Eu só quero que a senhora entenda a cabeça das nossas mulheres, que foram educadas por toda uma população médica e pelas pessoas da saúde: as enfermeiras e todo o povo da saúde. E, de repente, de uma hora para outra, uma portaria diz: “Não. Não é mais com 40 anos que se faz o rastreamento. É a partir dos 50”. Esse método está errado, esse método está errado. E eu quero confrontar isso porque muito do que foi dito aqui — até mesmo em sua fala — não fecha dentro da minha cabeça. “Mas como é que vem uma portaria que restringe o exame, se eu aprendi que tudo isso...” Então, tem tempo e isso precisa ser discutido, até porque nós temos divergências do ponto de vista técnico, como foi admitido aqui. É só procurar manifestações das entidades que são especialistas nisso e que tratam disso. Ponto. Segundo, eu queria ponderar que não dá para comparar, mesmo quando a senhora cita sistemas de saúde semelhantes ao brasileiro, como aqueles lá. Em 38 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 todos aqueles sistemas que a senhora mencionou, em todos eles, a participação de recurso público na saúde das pessoas corresponde a 80%, e não a 47%, como é aqui no Brasil. Então, não dá para comparar um sistema que investe na saúde das pessoas com um sistema que não investe. E quero até dizer que eu não ouvi nenhuma vez o Deputado Eleuses Paiva falar em partido político. Ele citou o nome do Ministro, sem citar partido político. Então, não é essa a questão que nós queremos discutir. Nós queremos discutir como isso foi feito. E me parece claro que ficou aqui admitido por quase todos que foi errado, porque é uma portaria que vai contra uma lei, que está acima. Então, nós temos que rediscutir isso. Parece-me, também, que não houve uma discussão com toda a classe científica, e, mais ainda, nós não conversamos com os pacientes. (Palmas.) Talvez isso ocorra porque nós estamos muito distantes dos pacientes. É isso o que vem acontecendo. Há muito tempo, em um hospital lá no meu Estado, aconteceu algo semelhante com o que vocês estão fazendo agora. Em um serviço de urologia do hospital, que tinha uma chefia — e era uma população pequena, apenas aqueles que estavam dentro da referência —, o chefe da urologia disse que, para tratar a hiperplasia benigna da próstata, que é o aumento da próstata, havia uma teoria lá que recomendava a massagem prostática, massagem prostática, isso nas décadas de 50 e 60. E o chefe do serviço montou lá todo um processo, porque se pensava: “Hiperplasia, neoplasia na frente. Então, vamos tratar hiperplasia através da massagem da próstata.” Então, instituíram um ambulatório de próstata no hospital. Como era um hospital que atendia pacientes de mais idade, instituíram um ambulatório de próstata e contrataram, na época, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem, e os treinaram para fazer a massagem. Os homens mais idosos iam lá e faziam a massagem da próstata 10 minutos por dia. O tempo foi passando, e aquele serviço continuou, continuou, até que veio a troca do serviço, e o chefe do serviço falou: “O que é isso? Isso não tem nenhum tipo de relação com o cientificismo de hoje. Isso está errado”. No dia seguinte, através de um documento, resolveu: “Está fechado o ambulatório da massagem prostática.” Teve greve no hospital, teve passeata de paciente, porque, de uma hora para a outra, alguém veio lá com um documento e 39 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 disse assim: “A partir de hoje, vocês não fazem mais mamografia a partir dos 40, fazem a partir do...” E o que é mais grave nesse caso... Eu fiz essa comparação, porque nós, quando lidamos com pacientes, temos que ter jeito, e o melhor método para tratar dos pacientes é tratá-los com educação. É com educação, com respeito por eles e ensinando para eles aquilo que foi dito por nós todos o tempo todo. Eu aprendi isso na universidade. Com 40 anos, tem que pedir. Eu passei boa parte do meu tempo de médico ensinando para as mulheres que, quando tiverem 40 anos, têm que fazer mamografia. Como é que vem um papel, de uma hora para a outra, e diz que não? E eu fiquei mais chateado porque a impressão que tenho aqui ao ouvir a sua fala é que essa decisão foi tomada simplesmente por uma questão orçamentária. A senhora usou uma frase: “Vão dar aumento para o outro setor para pagar depois.” Até darem o aumento, as Prefeituras não aguentarão mais colocar o que estão colocando dentro da saúde. E quem é que vai sofrer nessa ponta? E, se tirar do FAEC, se tiver a possibilidade de tirar da MAC e de botar em outro lugar, é porque o cobertor é curto. E, no fundo, por trás disso tudo, está o baixo investimento do Governo Federal na saúde das pessoas, é isso que está acontecendo. Só que eu não quero sair desta audiência pública com essa impressão, de que o Governo fez uma portaria simplesmente para diminuir o custo com um exame que ele acha desnecessário. Diagnóstico precoce salva vida e vai continuar salvando sempre. (Palmas.) Disso eu tenho certeza. Obrigado. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, Deputado. Com a palavra o Deputado Geraldo Resende. O SR. DEPUTADO GERALDO RESENDE - A minha primeira intervenção é para elogiar aqui a iniciativa da Deputada Carmen Zanotto. A Deputada Carmen Zanotto é uma das mais belas surpresas que nós temos na Casa, pela sua devoção, pelo seu conhecimento e, acima de tudo, pelo seu envolvimento com a questão da saúde. Infelizmente, parece-me que essa deve ser uma das últimas audiências que ela vai comandar, na medida em que ela vai nos deixar agora, no final do mês. Certamente nós vamos perder uma referência aqui das boas combatentes pelo bem da saúde pública do Brasil. 40 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Mas também me causou surpresa. Eu sou médico ginecologista e obstetra. Estou afastado das atividades para o exercício do mandato parlamentar, porque é inconcebível ser Parlamentar e, ao mesmo tempo, médico ginecologista e obstetra lá na minha cidade, no Mato Grosso do Sul. Mas eu tenho envolvimento, desde os bancos escolares, na defesa da saúde pública e na defesa da saúde da mulher. E quero até fazer um convite: no dia 4 de abril, agora, nós vamos inaugurar a melhor Clínica da Mulher do Mato Grosso do Sul, e talvez do Centro-Oeste. Nós vamos, através da intervenção deste Deputado, com recursos do Ministério da Saúde, que são recursos do povo brasileiro, ter uma belíssima clínica, que vai ter dois mamógrafos. Em vez de um só, teremos dois mamógrafos. Um é fruto do nosso trabalho aqui, e o outro é fruto do trabalho junto ao Governo do Estado. E tem todos os equipamentos para ser uma referência no atendimento dos serviços especializados na saúde da mulher. Mas eu gostaria de dizer que, durante toda a minha vida enquanto médico ginecologista, eu aprendi — e aprendi na Universidade Federal do Ceará e também na USP de Ribeirão Preto, onde eu fiz minha especialização — que temos que trabalhar com a perspectiva de fazer aquilo que disseram os colegas que me antecederam, alguns até bastante fleumáticos, com a verve que os caracteriza, e outros mais ponderados como eu. Aprendi que nós deveríamos indicar o diagnóstico precoce, trabalhar para que as mulheres possam, a partir dos 40 anos, fazer a prevenção do câncer de mama. E quão belo foi esse trabalho! Foi um trabalho que a gente já fez em vários locais. Aqui nós participamos do Outubro Rosa. Cada um de nós, homens, fomos abordados pelas mulheres — há um coletivo aqui das dirigentes das mulheres — para virmos de cor-de-rosa, com uma peça da roupa cor-de-rosa. Nós fizemos um trabalho em que foram iluminados todos os prédios públicos no País. E o que o Outubro Rosa indicava, minha gente? Prevenção do câncer de mama, rastreamento, para se dizer claramente da mamografia dos 40 anos. E, de uma hora para a outra, uma portaria veio e disse: “Não é bem assim”. Eu estou com o material aqui; recebi o material, vou ler, até para ver onde ele está se baseando para dizer que hoje não é mais a partir dos 40 anos, mas a partir 41 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 dos 50 anos. E aquilo que os colegas abordam me parece que foi a motivação maior que levou a essa portaria. Nós trabalhamos aqui, não é, Deputada Carmen Zanotto, para fazer valer a lei que dispõe que, a partir dos 40 anos, toda mulher tem direito à mamografia. Nós trabalhamos para que, a partir do diagnóstico de um câncer, cada indivíduo brasileiro, cada cidadã ou cidadão brasileiro, tenha que ter, no prazo de 60 dias, o início do seu tratamento. E, além disso, há várias leis, e muitas delas vão passar por esta Comissão de Seguridade Social e Família, que abordam esse tema. Agora, espanta-nos, e essa preocupação atingiu a todos nós, e atingiu, principalmente, as mulheres do Brasil todo. Na minha cidade, no meu Estado, assim como na cidade de cada um aqui, foi um cotidiano: “Deputado, veja essa portaria. Agora nós vamos ter dificuldade de fazer a mamografia. Nós vamos ter direito de fazer só a mamografia unilateral? A bilateral também está proibida?” E nós estamos aqui neste debate agora. Certamente, nós não vamos ter um encaminhamento para poder rever essa portaria, porque tem remédio. Um deles é o decreto legislativo, que a Deputada está propondo, outros Deputados também estão propondo. Uma portaria é menor do que uma lei. Nós precisamos fazer com que esse debate prospere, para ver onde está a substância que fez com que houvesse essa portaria. Conheço a Dra. Patricia. Nós temos feito trabalhos e ela tem contribuído para que possamos organizar o serviço de oncologia no meu Estado. Conheço a Dra. Patricia, da Mesa, e tenho tido várias interlocuções no Ministério da Saúde. Eu tenho absoluta certeza de que, se houver o debate e se o aprofundarmos, junto com o INCRA também, que é uma referência, nós poderemos remediar isso, para que não tenhamos esse tipo de situação que, como eu estou entendendo, é uma espécie de descontrole daquilo para o qual nós estávamos caminhando até agora. Nós temos que dar um breque e apontar outra direção: aquela que já estávamos construindo há muito tempo. De tal sorte que eu entendo que, nesse debate inicial, porque isso pode ser um debate inicial, vamos ter tempo suficiente para poder ver o que é melhor para as mulheres brasileiras. Eu vim para cá agora e fui ao gabinete de um Deputado, visitá-lo. Ele está se recuperando de um câncer. Na hora em que entrei, perguntei à secretária do 42 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Deputado, que está com apenas quarenta e poucos anos 42 e foi diagnosticada e está de licença para tratamento de câncer, como ela descobriu a doença. Ela disse que foi fazer uma mamografia de rotina, porque ela estava orientada a fazer com 42 anos. Imagine quantas mulheres brasileiras, e aqui há uma representação delas, poderiam evitar o câncer de mama se a gente conseguisse reverter essa situação. E eu faço aqui um apelo: a minha postura é de continuar o trabalho que nós já estávamos fazendo e conseguir reverter essa portaria, porque eu não vejo benefício nenhum para as mulheres do Brasil. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, Deputado. Eu passo a palavra à Deputada Mara Gabrilli e, na sequência, à Deputada Erika. Quero também registrar a presença da Deputada Flávia Morais, que também foi uma das autoras, como eu, do projeto de lei dos 60 dias. A SRA. DEPUTADA MARA GABRILLI - Queria cumprimentar a Mesa e V.Exa., Deputada Carmen, que, com certeza, onde toca suas mãos deixa a sua marca. Eu me coloco sempre à disposição, por você ter vivido vários papéis diferentes, por ter um grande discernimento e senso de justiça. Então, parabenizo-a pelo PDC, que eu acho que foi muito oportuno. Queria agradecer muito à Dra. Patricia, que me enviou uma mensagem depois de ler um artigo que escrevi, na revista TPM, sobre o tema, e dizer, Dra. Patricia, que o que eu tenho notado, ultimamente, não só nessa portaria, mas em outras portarias do Ministério da Saúde, é que, às vezes, existem não só redações equivocadas, que trazem confusão, e essa confusão talvez tenha se gerado na mídia, mas é fruto da redação da portaria... Então, sugiro que a gente continue trabalhando dessa forma, fazendo audiências, para aprimorar essas portarias que podem trazer grande dano à população. Outras questões dizem respeito a uma diferença conceitual mesmo. Eu me solidarizo os Deputados Geraldo Resende, Eleuses Paiva e Alexandre Roso em suas falas. E digo que, realmente, na sua fala, a senhora pouco falou de vida. Tudo bem que há uma faixa em que a mortalidade é muito mais incidente. Mas queremos que nossas mulheres vivam com qualidade de vida, e não só pensar naquelas que 43 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 eventualmente morreriam. Temos que salvar vidas e dar qualidade de vida. Eu entendo que o SUS trabalha uma atenção integral e universal, então, não seria o caso de restringir, mas o caso de multiplicar. É assim que eu enxergo o que essa portaria está causando: ela é uma restrição e, com certeza, existem seres humanos, existem mulheres por trás dos gráficos — e aqui temos várias delas — que têm direito de viver com qualidade de vida. Hoje, a Gil, minha assistente, veio toda contente no carro falando assim: “Prescreveram-me uma mamografia”. Aí, o que acontece? Ela se depara com uma portaria dessa, que, realmente, é uma deseducação. Imaginem quanto tempo um médico passa ensinando sobre a necessidade de uma mamografia! Ela vai dizer assim: “Por que eu vou lá perder meu tempo e ficar esmagada numa máquina se não há essa necessidade? Para que eu vou usar minha folga para fazer isso se não há necessidade?” Então, realmente, essa é uma portaria que deseduca. Eu queria complementar com uma questão muito grave: a mulher com deficiência que não tem acesso a mamógrafos. Isso acontece no Brasil inteiro. Acho que São Paulo, um Estado que geralmente tem mais tecnologias, mais recursos, talvez tenha dois mamógrafos adaptados. Então, além de tudo, a mulher com deficiência não consegue fazer uma mamografia. Lá, a gente tem o Hospital Municipal Maternidade-Escola de Vila Nova Cachoeirinha, que tem mamógrafo adaptado. Então, isso deveria ser uma determinação do Ministério e estar dentro da portaria. (Palmas.) Como faz uma mulher cadeirante? A Gil veio toda feliz falar hoje de manhã de tanto que eu falo dessa questão da mamografia, por conta da falta de mamógrafos adaptados. Então, eu queria, e acredito que a Deputada Carmen não vá retirar o PDC, que a gente aprimorasse essa redação e que, nesse aprimoramento, colocasse essa questão dos mamógrafos adaptados, porque essas mulheres existem. São 46 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência. A gente pode imaginar que metade seja mulher. Então, a gente tem que incluir isso na portaria, Deputada Carmen. Muito obrigada. A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Muito obrigada, Deputada Mara. 44 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Eu passo a palavra, na sequência, à Deputada Erika Kokay. Antes, quero agradecer todos os pronunciamentos aos colegas Deputados que estão aqui. Nós temos ainda mais um colega, o Deputado Cesar Colnago, que está inscrito. Depois passaremos a palavra aos oradores. A SRA. DEPUTADA ERIKA KOKAY - Deputada Carmen Zanotto, eu me somo às demais intervenções no sentido de louvar a sua permanência nesta Casa e, ao mesmo tempo, dizer da importância do trabalho que V.Exa. tem desenvolvido, durante todos estes anos em que tivemos a oportunidade de conviver em vários momentos, em vários espaços, inclusive na bancada feminina. Eu acho que as mulheres deste País se orgulham muito de tê-la aqui, e esperamos que, a partir do próximo ano, o País possa agradecer ao Estado de Santa Catarina o seu retorno a esta Casa. É o que nós esperamos, agradecendo, sem nenhuma dúvida, ao povo de Santa Catarina, a oportunidade que tivemos de conviver com V.Exa. O que eu gostaria de dizer acerca disso é sobre a oportunidade desta audiência pública pautada por V.Exa. numa reunião em que a bancada feminina esteve com o Ministro da Saúde, na semana do Dia Internacional da Mulher, na qual pontuamos uma série de aspectos relevantes para as mulheres neste País e que dizem respeito a essa lógica de intervenção absolutamente correta, penso eu, do Ministério da Saúde, que aponta com a transversalidade. O Ministério da Saúde tem transbordado nas suas políticas e tem, efetivamente, desenvolvido políticas de relacionamento com outras políticas públicas. Por isso, o Ministério da Saúde se encontra também nas escolas, nas ruas, em várias localidades deste País, dialogando com o conjunto das políticas públicas. Nesse sentido é que, naquela reunião, foi acertado que haveria esta audiência pública que, penso, é um espaço absolutamente importante, porque não há que se trabalhar com qualquer política pública sem que sejam chamados e escutados os beneficiários diretos dessa política. Penso que essa portaria teria que ter sido tecida com o conjunto de entidades, particularmente com a Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama — FEMAMA, mas com outras entidades de mulheres. A FEMAMA desenvolve uma luta de mulheres muito guerreiras, mulheres que mostram para outras mulheres que é possível enfrentar uma doença como o câncer, 45 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 resgatar a vida, expressá-la e deixá-la, como a FEMAMA a deixou aqui, nesta Casa, inaugurando o Outubro Rosa, em fotografias, para que todas e todos possam ver a luta dessas mulheres guerreiras que se encontram aqui hoje e que estão compondo a Mesa, mas é preciso aprofundar ainda mais essa discussão. Permitam-me dizer, pelo que posso depreender desta audiência e das explicações que aqui foram dadas, também exaradas pelo próprio Ministro da Saúde, que há uma avaliação epidemiológica, há um perfil epidemiológico traçado pelo Ministério. Eu não consigo ver — corrijam-me se eu estiver equivocada — uma restrição a que se faça a mamografia com uma faixa etária abaixo de 50 anos, analisando estritamente a portaria. Analisando estritamente a portaria, nós vamos ver que há o acesso à mamografia unilateral com o mesmo custo para o Ministério, penso eu. Ou seja, a mamografia unilateral custa 22,50 reais e pode ser feita duas vezes. A mamografia bilateral custa 45 reais para o Ministério. Ou seja, não há um problema de custo. Tentar reduzir essa discussão a uma lógica cruel, em que o Ministério estaria apenas olhando as planilhas de custo, reduzindo o ser humano a planilhas de custo, parece-me equivocado, porque não há diferenciação entre o repasse e o custo que o Ministério tem com ambas as mamografias. Uma delas é absolutamente disponibilizada para qualquer faixa etária. Penso que há aqui muito mais uma mudança de financiamento. E é óbvio que isso tem impactos, inclusive para os Municípios. Ao ter impacto para os Municípios, pode haver uma restrição no fornecimento desses serviços, o que não significa que o Ministério está ferindo a lei. A lei assegura o direito, e o Ministério da Saúde não está tirando esse direito; está mudando a forma de financiamento, que faz com que os Municípios tenham de arcar com esses serviços a partir de determinada faixa etária. Então, eu penso que as reclamações acerca do não cumprimento da lei deveriam ser voltadas para os próprios Municípios e não para o Ministério da Saúde, porque dispende o mesmo valor. Dizer também que o Ministério da Saúde não tem políticas para controle e prevenção do câncer é ignorar que o investimento do Governo Federal para a realização de exames, diagnóstico e tratamento em oncologia cresceu 26% em 3 anos, atingindo um total de 2,4 bilhões em 2012. Dizer isso é também não 46 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 considerar que, nos últimos 3 anos, houve um aumento de 25% na quantidade de mamografias realizadas pelo SUS em todas as idades e acréscimo de 30% na realização desses exames na faixa prioritária. É preciso que nós nos atenhamos aos números para que não façamos uma discussão sem foco. E digo isso porque penso que é preciso fazer uma discussão absolutamente profunda com as entidades e que deveria ajustar essa portaria, já que ela provocou tanta inseguranças e insatisfação nas mulheres que sofrem a dor de serem acometidas pelo câncer. Portanto, acho que essa discussão é importante, mas nós temos que nos pautar e estar absolutamente atentas aos fatos e não criarmos cortinas de fumaça ou provocarmos uma eleitoralização dessa discussão. Tenho a absoluta certeza de que não é intenção da Deputada Carmen e nem das entidades que aqui estão. Por isso faço essas considerações, inclusive as considerações de que vários países no mundo trabalham com a faixa etária de 50% para a mamografia de rastreamento, que se difere da mamografia de diagnóstico, a unilateral, e que está disponibilizada para todas as faixas etárias. Então, voltando aos fatos e me detendo neles, concluo com o encaminhamento que acho necessário. Primeiro, não há ausência de financiamento do Ministério da Saúde. Segundo, não há restrição a mamografias em qualquer faixa etária pelo Ministério da Saúde. Terceiro, houve um aumento substancial no tratamento oncológico pelo Ministério da Saúde no financiamento. Quarto, houve um aumento substancial nas mamografias disponibilizadas através do SUS. Por fim, há um perfil epidemiológico que pautou a construção dessa portaria, seguido por diversos países onde não há qualquer tipo de restrição à política de prevenção e, portanto, à política de tratamento às mulheres acometidas pelo câncer de mama. Feitas essas considerações, para nos pautarmos na verdade e evitarmos qualquer tipo de utilização indevida de uma discussão absolutamente irrelevante, sugiro que, primeiro, a portaria seja revista, não pelo quadro que traz e não porque fere a lei. Não fere a lei. Tanto é que não foram concedidas as liminares solicitadas, porque não se entendeu que feria a lei. Mas que o Ministério reveja e retome o procedimento de assegurar as mamografias para as outras faixas etárias, porque esta portaria tem provocado, pelas leituras que dela têm sido feitas, uma série de 47 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 inseguranças e insatisfações em entidades e em segmentos da população, particularmente nas mulheres que convivem de uma forma ou de outra com o câncer de mama. Por isso eu sugiro fazermos uma profunda discussão, que o Ministério da Saúde chame as entidades para uma discussão, faça uma revisão dessa portaria, revogando-a pela incompreensão absolutamente desnecessária que gerou, provocando um clima de insegurança, o que faz com que tenhamos o abalo de uma política pública que, repito, tem sido crescente, do ponto de vista do cuidado que o Ministério da Saúde tem desenvolvido para as mulheres e para a prevenção do tratamento de câncer. Penso, apenas para deixar absolutamente claro, que entidades como a FEMAMA e outras instituições devem fazer com que se avance, com que o Ministério reveja as suas próprias atitudes quando são incompreendidas, e são incompreendidas porque teve algum tipo de problema na sua efetivação. Por isso, a necessidade de se rever e de se discutir amplamente. Que nós tenhamos como princípio que nada possa ser feito sem escutar as pessoas que se mobilizam e fazem das suas vidas trincheiras, espaços para defender mulheres, como essas entidades que se concentram na FEMAMA. Era o que tinha a dizer. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, Deputada Erika. Na sequência, passo a palavra ao Deputado Cesar Colnago, que está conosco desde o início dos trabalhos da tarde de hoje. Em seguida, falará a Deputada Flávia. O SR. DEPUTADO CESAR COLNAGO - Primeiro, Deputada Carmen, eu queria dar-lhe os parabéns pela audiência. Eu tive que me ausentar — eu até expliquei a V.Exa. — para atender uma pessoa que está com câncer e sofrendo um processo muito injusto. Eu tinha um compromisso com o Ministro e tive que sair. Eu fiquei muito intrigado, porque já trabalhei em hospital de câncer, com a apresentação — não assisti à da Marema, que deve ter falado também — e também muito curioso, além da preocupação com o problema do câncer e com o intelectual, porque há coisas aqui diferentes, há coisas aqui contraditórias. Acho que a portaria 48 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 deve ser revista não só porque está desgastando eleitoralmente, não. O SUS é claríssimo na lei. Claro! Vou reler aqui, até para a Deputada Kokay ouvir, o que diz a Lei nº 11.664: assegurar “a realização de exame mamográfico a todas as mulheres a partir de 40 anos de idade”. E isso se faz com financiamento desse setor, que paga quanto? Quarenta e cinco reais. Eu fiquei aqui pensando, porque a apresentação da Dra. Patricia, do ponto de vista intelectual, foi muito bem exposta. Eu queria conhecer mais, eu queria aprofundar mais, eu não estou mais na área. Acho que está todo mundo aqui com honestidade intelectual. Acho que ninguém está aqui porque quer fazer mais mamografia para ganhar dinheiro, porque seriam ridículos 45 reais! Daí a minha pergunta à Patricia, que aqui representa o Governo. A Lei nº 11.664 é de 2008. Quem mudou? Houve nota do Governo e das entidades discordando do argumento dessa portaria. A lei não é tão antiga; a lei não é da década de 70, nem da década de 80. A lei é de agora, do Governo que aí está, pelo menos uma continuidade do Governo Lula com o da Presidente Dilma. O que mudou no Ministério para sair do padrão estabelecido por essa legislação? Você pode dizer: “O Município pode realizar, se quiser”. Não está proibindo, mas está restringindo. Quando se fala prioritariamente, está-se restringindo. Também é o segundo câncer mais frequente no mundo. Pelo que eu vi ali, o primeiro no Brasil. Você tem relatos de uma frequência de mais ou menos 25% — pode não estar nessa faixa etária. Primeira pergunta: quem mudou? Porque é do próprio PT, que está no Governo há 12 anos. A origem da lei pode até não ter sido do Executivo, mas foi sancionada pelo Presidente Lula. Agora, se não for de origem dele... Porque eu não conheço a história da lei. Segunda pergunta: tendo em vista o fato de haver notas contrárias e alguma restrição, qual o prejuízo de nós estendermos um pouquinho mais a faixa etária? Quando um médico entra para operar um câncer, ele vai ser o mais amplo possível dentro da racionalidade necessária. E eu, como médico, vou ser o mais amplo para dar mais segurança. E aí eu vou tirar daquilo que tem 25% de frequência? 49 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Terceira pergunta: qual a economia efetiva disso? O Governo gastou 2 bilhões em publicidade. E há um dado estarrecedor que eu não conhecia — e eu não estou na área, há anos. Pelo que estou entendendo, nós temos mamógrafos suficientes instalados no Brasil para fazer mamografia em todas as mulheres dessa faixa etária — e é o que está na lei. Mas, incrível, temos que, no Paraná, são 29%; em São Paulo, quase 25%; Goiás, 12%; Pernambuco, 14%. E não vi uma ação de massa do Governo nessa publicidade, tanto do Banco do Brasil, da Caixa Econômica ou da PETROBRAS, dizendo às mulheres que há mamógrafos disponíveis e que façam o exame, que é fundamental para a vida delas. Senão, depois, vão ter que fazer uma cirurgia com maior extensão, o que, muitas vezes, deixa graves sequelas, causando até preconceito e sua exclusão da sociedade. Pois não vi uma propaganda assim nesses 12 anos! Eu não tinha esses dados brasileiros. São dados do Ministério, dados de diagnósticos de câncer. E, para fazer quimioterapia ou radioterapia neste País, leva-se de 80 a 110 dias, quando o câncer já está diagnosticado! Podem buscar; são dados oficiais. Não digo que esteja piorando. Não está piorando, porque já foi muito pior. Mas eu não posso admitir, como médico, a perda de uma vida. Eu queria outro debate, mesmo porque eu tive que sair. O que V.Sa. apresentou tem dados científicos racionais. Não falou aqui irresponsavelmente. Não foi isso que eu percebi. Mas há diferenças de metodologia, ou de visão, ou de enquadramento do problema para quem está no setor público e para quem está no setor privado. Mas há notas. Não é possível — e aí eu falo com muito respeito a todas as pessoas do Ministério — que tantas entidades coloquem uma nota, como se isso não tivesse um peso no conhecimento científico, na experiência clínica e na abordagem do dia a dia das pacientes que procuram esses serviços, para o pessoal da oncologia, para o pessoal da associação de mastologia, para o pessoal da radioterapia, para todos os profissionais que trabalham nessa área. Ou seja, notas foram colocadas. Eu acho que esse tema deve ser bem enfrentado. Talvez tenha até havido interpretação errada de alguma situação ou de outra, mas a impressão que eu tenho, para encerrar — e aí não é contra o Ministério da Saúde nem contra a Dra. Patricia —, lembro que o Governo ficou 4 anos discutindo o Código Mineral, nos deu medida de 50 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 urgência, e que o tirou depois por insistência da base; não foi nem da Oposição. É isso: fica 4 anos estudando e, depois, nos dá 120 dias para discutir e aprovar o projeto. A MP dos Portos veio por medida provisória; e a lei anterior, de 1983, ficou 2 anos em debate no Congresso. Pois na medida provisória dos portos nós tivemos um limite de 5 dias para fazer emendas e mais um tempinho de tramitação. Quer dizer, as coisas chegam aqui muito prontas. Por que não se discute com quem está no dia a dia fazendo as coisas? Ou tentem, pelo menos. Estou falando de coisas diferentes, mas quando se quer fazer alguma reforma, alguma alteração que tem base científica, é fundamental discutir com quem está operando no setor, com quem trabalha e executa, para que isso seja entendido, porque senão tem reações. Eu fiz também uma proposta mais radical do que a sua para se acabar com essa portaria. E, a princípio, a justificativa que eu vejo é de que as pessoas deixarão de ter um benefício e serão condenadas, muitas vezes precocemente, à morte. Eu estou equivocado? Eu posso estar, porque não sou dono da verdade. Mas, se é uma lei, por que não veio tramitando como uma lei alterando a lei anterior e não por uma portaria? Porque, no fundo, ela altera o que está escrito na lei, que é um direito de todas as brasileiras. Eu queria dizer que não me senti suficientemente esclarecido, até um pouco pela minha ausência, reconheço. Mas quero parabenizar os três que ouvi, e por esta forma democrática de estarmos aqui discutindo. Mas acho que deveríamos, Carmen, conversar e discutir mais, porque, a princípio, sou radicalmente contra a portaria. Falo aqui com muita isenção, Patricia, porque na questão do tabaco sou da oposição. Eu fiquei com a ANVISA — Agência Nacional de Vigilância Sanitária e briguei com quase a CCJ inteira, porque eles ficam argumentando coisas que cientificamente não têm nada a ver. Eu sempre falei para as indústrias: “Querem conversar comigo? Então coloquem na mesa as...” Não é preciso pegar os trabalhos da USP; eu pego os trabalhos que as empresas têm sobre o tabaco e os malefícios que ele faz a toda a sociedade humana. O grande problema é que no Brasil, há 30 anos, uma em cada três pessoas fumava; hoje, em cada sete uma apenas fuma. E, aí, querem aumentar o mercado para aumentar o índice da doença, usando de artifícios para dizer que a 51 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 ANVISA legislou?! A ANVISA não legislou; ela seguiu agindo conforme as normas das agências criadas por Fernando Henrique Cardoso. Então ela estava cumprindo a sua função. Estou na dúvida, apesar de ter apresentado... Acho que a gente tem que continuar o debate porque ele é o nosso melhor orientador, a nossa melhor bússola. Entendo que a gente tem que continuar a debater porque a lei está sendo ferida, gerando prejuízos para as mulheres brasileiras. Eu entendo isso, e por isso propus a reversão dessa lei. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada. Eu passo de imediato a palavra a minha colega, Deputada Flávia Morais, uma das autoras do projeto de lei que estabelece prazo para o início do tratamento de câncer de mama. Também está aqui conosco — ele não é da Comissão, mas nos acompanha desde o primeiro momento — o Deputado Mário Heringer, que depois vai fazer uso da palavra. A SRA. DEPUTADA FLÁVIA MORAIS - Deputada Carmen, eu queria inicialmente parabenizá-la pela iniciativa e dizer que o seu trabalho tem sido muito relevante, principalmente no que diz respeito à defesa da saúde. V.Exa., que já foi Secretária de Governo em seu Estado, tem acompanhado cada tema com muito cuidado, e, com certeza, nos tem ajudado a avançar em vários temas, principalmente no enfrentamento ao câncer. Queria cumprimentar toda a Mesa, em nome da Patricia. Represento aqui o Ministério da Saúde e vejo com bons olhos a presença do Ministério aqui. Eu acho que essa questão pode, sim, ser resolvida, e a gente vê uma boa vontade muito grande por parte do Ministério. Queria cumprimentar a representação de várias mulheres que aqui vieram apoiar esta audiência pública, entendendo, como nós, que essa portaria é prejudicial às mulheres que contam com esse benefício do Sistema Único de Saúde para garantir a prevenção contra essa doença, que chega silenciosa, não avisa. Hoje, pelos avanços que temos na Medicina, sabemos que é uma doença que tem cura, se houver um diagnóstico a tempo. Todos nós sabemos da importância desses exames preventivos, e não entendemos o porquê dessa portaria. 52 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 Quero cumprimentar todos os Deputados COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 que estiveram aqui se manifestando. Tenho certeza de que nesta Casa, com 513 Deputados, a grande maioria apoia a manifestação que esta audiência pública apresenta ao contestar essa portaria. A gente vê na portaria um instrumento que facilita, em alguns momentos, a gestão pública, que sofre com os entraves da burocracia. Mas, ao mesmo tempo, nós nos preocupamos com a utilização desse instrumento em casos como esse, e como o que foi utilizado também na Lei dos 60 Dias, sobre a qual também houve o entendimento de que não deveria ter havido portaria, a qual já deve ter sido revogada também. Nós queremos chamar a atenção do Ministério da Saúde e dizer que queremos participar mais, apoiar mais, ajudar, para que a gente possa ter leis aprovadas, consolidadas e que possam realmente garantir direitos efetivos à população brasileira. Sobre a Lei dos 60 Dias. Quero mencionar essa lei porque a gente percebe uma sensibilidade muito grande por parte do Governo, por parte da Presidente Dilma, que já teve câncer. Quando apresentei o projeto que falava do prazo de 60 dias, nós sabemos, e a Deputada Carmen acompanhou conosco, a resistência que tivemos da consultoria. Muitos nos disseram que esse projeto jamais seria aprovado. Hoje, nós sabemos que foi aprovado na Câmara e no Senado e que foi sancionado pela Presidente, numa demonstração de que o próprio Governo está criando metas para ele mesmo, está criando prazos para ele mesmo, porque tem esta mesma preocupação. Então a gente vê que essa portaria pode ter sido um equívoco. Então, a gente quer aqui pedir a oportunidade de rever isso, recolocando a possibilidade de as nossas mulheres estarem fazendo esse exame a partir dos 40 anos. Ao dizer que elas continuam tendo o direito... Mas o fato é que é a Prefeitura que vai pagar, e isto é jogar a responsabilidade para o ente federado, o Município, que hoje vem sendo muito penalizado, em vários momentos, com muitas responsabilidades; e nós sabemos que, na divisão do bolo, grande parte dos recursos fica concentrado no Governo Federal. Então queremos pedir, mais uma vez, a sensibilidade deste 53 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Governo para com esta causa, que nós consideramos, dentre tantas que temos na área da saúde, de prioridade absoluta! Hoje, nós temos um trabalho que nós acompanhamos, uma unidade móvel que realiza exames de ultrassonografia, onde fazemos ultrassom da mama. Temos acompanhado esse trabalho no meu Estado, e vemos que pessoas estão cada vez mais conscientes, e que mulheres estão cada vez mais buscando esse diagnóstico. Acho que houve um momento em que o País fez uma campanha para convencer as nossas mulheres. E, hoje, os nossos homens também. Porque eles precisam fazer esse diagnóstico no momento correto. E, agora, ocorre uma descaracterização de tudo aquilo que foi colocado para a nossa população através de uma portaria que chega de repente, sem muita explicação. Acho que a gente precisa discutir mais isso. E, se houver uma mudança, que ela seja trazida gradualmente, e com muita explicação, com muito embasamento, para que a gente possa não ter a ansiedade que vemos hoje nas mulheres brasileiras. Em todo lugar por onde vou, quando se coloca essa portaria, todas ficam indignadas. Eu tenho certeza de que isso é falta de comunicação, é falta de falar da importância da realização desse exame no prazo correto. Então, mais uma vez, Deputada Carmen, obrigada pela oportunidade. Parabéns pela iniciativa! A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, Deputada Flávia Morais, a senhora que também subscreveu este requerimento como bancada feminina. Eu passo rapidamente a palavra ao Deputado Mário Heringer. E, depois, passaremos às considerações dos nossos expositores. O SR. DEPUTADO MÁRIO HERINGER - Deputada Carmen, vou ser breve. Só para referência, e com relação a sua apresentação, no que diz respeito a mim, eu não estou nesta Comissão porque estou na mesma situação em que a senhora está. Na semana que vem, a gente está indo embora daqui; e, como é Comissão nova, eu não fiz opção por ficar... Estou aqui desde 2003, e participei desta Comissão de Seguridade Social e Família muitas vezes. Como eu cheguei atrasado e não assisti às apresentações, eu me guardei para entender o que estava acontecendo incialmente, para ter um comportamento pelo menos compatível com a 54 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 audiência, porque, realmente, chegar aqui e dar palpite por dar palpite é um negócio complicado. Não tive a oportunidade, Dra. Patricia, de ouvi-la. Mas estou ouvindo as pessoas aqui. O que me incomoda muito há algum tempo, na Medicina e, principalmente, na Medicina pública, é que nós estamos de uma maneira quase que marginal, meio de subterfúgio, tirando a visibilidade dos problemas da nossa Medicina pública. Nós criamos as filas virtuais, nós colocamos as pessoas para esperar em casa. E, esperando em casa, ninguém vê a mazela na rua. Então, essa questão de mudança de foco, de direcionamento, talvez, até do ponto de vista técnico, esteja perfeita. Mas nós não podemos, de maneira alguma, prescindir da visibilidade dessas pessoas. Essas pessoas escondidas servirão para uma fila virtual que não atende à sociedade brasileira. Eu posso dizer, com toda a tranquilidade, porque eu conheço o assunto há alguns anos, eu milito na área, sou médico há trinta e poucos anos, que essa história que a doença cardíaca agora tem fila, que o cara fica morrendo enfartado em casa... Ninguém o vê morrer na fila, não o vê morrer na rua. Não há fila na porta do Instituto Nacional do Câncer. Existe uma fila, mas essa fila é no computador! E eu tenho muito medo de que, quando a gente estabelecer com essa portaria a questão da priorização, essa priorização se transforme também numa fila. Primeiro, a fila de 50 a 60, depois em outra fila. Então, você vai pegar a turma que está lá na frente?! Tudo bem. Eu acho que tem que expandir. Eu aprendi que em Medicina... Pelo menos, posso garantir que eu acho que este conceito não mudou: que a profilaxia é melhor do que o tratamento. E, se nós pudermos ampliar a profilaxia, eu garanto que tudo vai ser melhor. Sou ortopedista; não sou ginecologista, não sou mastologista. Mas eu vivo nisso, e, em alguns momentos, sou administrador hospitalar, e a gente sabe que na frente, primeiro, está a gente; depois é que está o contexto. A gente não nega isso. E hoje, particularmente, essa portaria... Eu acho que ela é um desserviço, porque tira uma educação que durante muitos anos foi feita para que as pessoas entendessem que precisavam fazer o autoexame, que precisavam fazer mamografia. O problema, hoje, é que vivemos, entre nós, homens, 55 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 dizendo: vai lá, e faça o toque. E os caras não querem fazer. Alegam que já se substituiu o toque pelo exame. Mas não substitui. Então, nós precisamos ser mais rígidos e mais fortes com essa cultura da profilaxia, e não podemos perder toda essa cultura, todo esse trabalho que foi feito, sobre a conscientização dessas mulheres, das mulheres do Brasil todo, de que têm que fazer a mamografia, mesmo que ela dê falso-negativo ou falso-positivo. Porque ela oferece uma oportunidade, mesmo que percentualmente não seja muito alta, de não termos a pior das mazelas, que é a morte de uma pessoa que a gente podia cuidar. Então, eu acho que o Governo... Quem assinou essa portaria aqui é um amigo meu, é o Helvécio Miranda Magalhães, de Minas Gerais. Eu gosto dele. Eu não tenho restrições a fazer ao Helvécio, mas isso aqui foi um desserviço. Não vou discutir tecnicamente, mas isso aqui fere uma cultura de profilaxia que durante muitos anos a sociedade brasileira vem fazendo em cima de determinadas doenças. Então, eu espero de coração que isso seja revisto, que as mulheres e também os homens, em outras situações, possam ter a oportunidade de não virem a ter o problema. Era isso que eu queria deixar como mensagem. Carmen, parabéns pela atitude! Parabéns a todas vocês que estão aqui lutando pelos seus direitos, que são as lesadas por essa doença, e também pelos direitos das outras. Contem com o nosso apoio, se a gente voltar a estar aqui no mandato que vem. Está certo, Carmem? Um abraço! A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, Deputado. Eu quero só fazer alguns registros. Um é que o nosso Presidente da Frente Parlamentar, Deputado Ruy Carneiro, não pôde estar aqui conosco, mas que ele está acompanhando os trabalhos e os encaminhamentos dos vários PDCs. Registro também que nós vamos ter que trabalhar com evidências científicas. E lembro que nós tivemos aqui uma apresentação de Goiânia que mostra que 27,3% dessas mulheres com diagnóstico estão na faixa etária dos 40 a 50 anos. E eu também recebo um registro de que, de todas essas mulheres que estão aqui conosco, apenas duas tiveram diagnóstico depois dos 50 anos. 56 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Pela fala dos colegas, e eu queria fazer esse apelo à Dra. Patricia, à Sra. Marema, que representa o CONASEMS, até pela fala da própria Deputada Erika, a portaria gerou uma insegurança e uma inquietude. Talvez neste momento o melhor caminho seja a gente continuar discutindo o PDC. Mas eu venho do SUS, e o SUS constrói consensos. Talvez o melhor caminho fosse a gente retirar essa portaria agora, até para que se construa mais um instrumento que pudesse deixar isso mais claro para a sociedade. Mas aí vai caber ao Governo tomar a decisão final, já que o nosso PDC já está com regime de urgência, por parte do Colégio de Líderes, e a gente entende que esta audiência pública e os demais debates que virão à Casa... Por isso, a importância dela e de subsidiarmos esses encaminhamentos. Como a Dra. Marema não falou no primeiro momento, eu, primeiro, lhe passo a palavra por até 3 minutos, com um pouquinho de tolerância, se for necessário. A senhora faz uso da palavra, e, na sequência, fala o Dr. Ricardo. Depois, eu passo para a Dra. Patricia e para o Dr. José Luis. A SRA. MAREMA DE DEUS PATRÍCIO - Obrigada, Deputada Carmen. Quero cumprimentar a todos e agradecer a oportunidade de o CONASEMS pode se manifestar Quero dizer que o CONASEMS trabalha com a ansiedade dos mais de 5.700 Municípios deste País, na tentativa de organizar o sistema na ponta, com todas as dificuldades e diversidades que o nosso País tem e com as nossas precariedades, desde a formação dos nossos profissionais. Hoje há um debate, graças a Deus, levado país afora, para que a gente possa garantir essa qualidade para o cidadão, que está na busca de melhoria da sua saúde, até sobre a condição da questão do financiamento, pelo que a gente luta há muitos anos, desde que o SUS existe. Falo dos processos do financiamento, vindos desde a Constituição Federal, que, depois, não foram implantados, da CPMF, que foi cortada, e de outros avanços, com que fomos quebrando paradigmas ou ganhando outros, como o Saúde Mais 10, por que nós mobilizamos o País e sobre o qual já há várias ações e mobilizações, inclusive junto a esta Casa. Então, tudo isso está na mesa e na agenda dos gestores. Quero dizer que não dá para fazer saúde para todos, considerando a urgência de cada um. Não dá! A gente tem que fazer saúde na completude da cidadania e do direito que 57 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 conquistamos em 1988, na questão da nossa Constituição Federal e das nossas diretrizes legais, que proporcionaram, inovadoramente no mundo, uma participação popular no conjunto das discussões sobre as diretrizes e a fiscalização das ações. Esse é um compromisso e um dever, até acima ou paralelo ao nosso direito de ter saúde. Eu quero dizer que não há restrição. O CONASEMS apoiou essa portaria na sua discussão e na sua divulgação. Nós vivemos num país onde nós temos uma saúde muito mercantilizada, capitalizada mesmo. Então, a gente precisa ter cuidado na hora em que a gente discute o que é melhor e o que não é, usando inclusive a ansiedade ou a dificuldade que o cidadão tem na ponta de ter a sua saúde. Quero dizer que, nessa questão, ela vai organizar os fluxos. Não é verdade que o Município vai arcar, porque o CONASEMS jamais aprovaria num GT ou em suas discussões alguma questão que onerasse financeiramente os Municípios mais do que já estão onerados, com relação à saúde. Mesmo porque, se o FAEC vai pagar para as de acima de 50 anos, como está priorizado, isso tem questões de evidências técnicas, que não vou entrar, porque não é minha área — sou uma administradora. Nós temos o que extrapolar na questão do MAC. Nós temos a possibilidade de renegociação com o Ministério da Saúde. Isso está aberto. Os Municípios têm, infelizmente, mas eu posso depois encaminhar para a Deputada, o levantamento que nós temos do MAC e as sobras; porque não se consegue gastar com várias questões, o que eu também acho que poderia ser discutido de outra forma, como a ausência. Vai o equipamento, mas não há o profissional. Então, não se gasta nem se consome. Nós temos mil exemplos de portarias; por exemplo, a das cirurgias eletivas. Às vezes, os Estados e Municípios não cumprem porque ou não têm condição por causa da estrutura de realização ou em detrimento da rede privada ou de portaria. Eu não vou discutir essa questão de financiamento, que é muito ampla. Enfim, achei proveitoso. Vejo possibilidades de a gente ampliar e melhorar esta discussão no sentido de qualificar as nossas possibilidades de atuação na gestão e no cuidado com a nossa cidadania e com o nosso direito de ter a saúde da melhor forma possível. O CONASEMS se coloca à disposição para participar de 58 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 qualquer procedimento ou de nova discussão, e contribuir com o que for melhor para os nossos cidadãos e acatar isso. Muito obrigada. A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, Sra. Marema, pelas suas considerações. Passo a palavra ao Dr. Ricardo, que aqui representa a Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama — FEMAMA e, consequentemente, representa todas as organizações da sociedade, uma vez que não poderíamos ter todos à Mesa, todas as entidades que defendem a política nacional de câncer. O SR. RICARDO CAPONERO - Em primeiro lugar, quero agradecer à Deputada Carmen Zanotto a oportunidade de estar aqui nesta Mesa. Agradeço a todos os Parlamentares que passaram por aqui e contribuíram com seus depoimentos. Quero dizer também que sou fã da Patricia. Muitas vezes, estamos em lados contrários, mas acho que a Patricia é uma pessoa extremamente bem-intencionada. A gente sabe que não é só ela quem faz o Governo. Eu a conheço de alguns encontros. Ela é muito bem-intencionada e muito bem-fundamentada nas suas argumentações. Mas não há dúvida de que talvez a redação dessa portaria de fato restrinja o acesso. Se não restringisse, não estaríamos aqui discutindo toda esta polêmica hoje. Independentemente da leitura do texto, na prática, a gente já percebeu a restrição. Já foi dado um depoimento sobre as unidades móveis. Existe mesmo uma restrição. Estou labutando nesta causa há mais ou menos 25 anos, desde que me formei em oncologia. Trabalho com câncer de mama, e sou da época em que faltava mamógrafo. A Patricia teve a sorte de não pegar essa época em que a gente discutia a falta de mamógrafos no Brasil. Hoje temos mamógrafos suficientes ou até mesmo em número mais do que suficiente. A Patricia mostrou esses dados, e mostrou que a gente realiza o número de mamografias a que nos propomos. Ainda há uma folga. Nós poderíamos até fazer um pouco mais de mamografias. Estamos cumprindo as cotas de mamografia sem a cobertura adequada na faixa em que a gente precisa, ou seja, para o público de 50 a 59 anos de idade, talvez não porque 59 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 não tenha aparelho de mamografia para essas pacientes, mas porque as pacientes mais idosas são mais difíceis de ser mobilizadas. Aí vem a vantagem da Lei nº 11.664, que deu acesso a pacientes a partir de 40 anos de idade. Se a gente tem a cobertura total das mamografias, mas só tem 30% da faixa adequada, pacientes fora da faixa, entre 40 e 50 anos de idade, são as que mais estão fazendo mamografia. Ou seja, essas são as mais motivadas a fazer. E essa paciente, quando estiver dentro da faixa, vai continuar motivada. A gente não pode perder esta motivação. Foi citado o Estado de São Paulo, que não restringiu a mamografia antes dos 50 anos, mas que a favoreceu, quando afirmou que as mulheres poderiam fazê-la sem pedido médico. No mês do aniversário, elas podem fazer sua mamografia, sem precisar do pedido médico. Isso também gera uma preocupação. A nossa preocupação, no Estado de São Paulo, é sobre isto: para quem essa mulher vai mostrar a mamografia, se nenhum médico a pediu? A gente entra na consideração de que não há dúvida de que o diagnóstico precoce traz benefício de sobrevida. O estadiamento clínico do câncer, como foi discutido, Estádios Clínicos I, II e III, com impacto no prognóstico, independe de faixa etária. Não é porque a paciente é jovem que tanto faz se ela for diagnosticada no Estádio Clínico I, II ou III. O Estádio Clínico III é o pior, mesmo na faixa etária mais precoce. Então, não há nenhuma dúvida de que o diagnóstico precoce salva muito mais vidas do que o tratamento. A gente também viu que mamografia não é prevenção de câncer. Vejam o que fez o Ministério com vacina HPV. Demorou 8 anos para se conseguir a aprovação da vacina HPV, que este mês começou no Brasil todo. Isso é para diminuir a incidência de câncer. A mamografia não diminui a incidência. Muito pelo contrário: quando se começou a fazer mamografia, duplicou o número de casos de câncer. Chegou a se questionar se a mamografia não estava causando casos de câncer. Temos um representante da radiologia que vai falar sobre isso. Questionou-se se a mamografia estava causando a doença que ela deveria estar diagnosticando. Na verdade, sabe-se hoje que isso não é verdade. A mamografia só achava os casos, mesmo os das que antes morriam sem diagnóstico. A mamografia contribui de forma importante, mas ela não reduz a incidência de câncer, o que é uma oportunidade perdida naqueles casos câncer ductal in situ, que, teoricamente, não é um erro diagnóstico, não é um sobrediagnóstico. Essas pacientes não são 60 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 falsos-positivos; elas teriam indicação de fazer quimioprevenção por guidelines, por diretrizes muito bem estabelecidas internacionalmente. Mas as pacientes não têm acesso. O Governo não faz quimioprevenção. Não tem tal recurso profilático. Hoje, a gente sabe que tabacofeno, anostrozol, letrozol, exemestano, enfim, todas essas substâncias podem prevenir o câncer de mama. Mas a gente não tem nenhum código no SUS para fazer a prevenção de câncer de mama. Talvez não seja prioridade, talvez não se tenha dinheiro para isso. Mas o problema é sempre a falta de dinheiro, e não porque não exista benefício científico para que isso aconteça. Então, hoje, as pacientes que têm câncer ductal in situ perdem a chance de fazer quimioprevenção. Então, elas ficam como sendo falso-positivo, enquanto, na verdade, elas teriam necessidade de um outro tratamento. Se reduz ou não a mortalidade fazer o diagnóstico precoce dos pacientes entre 40 e 50 anos de idade, esse é um outro problema. A gente aprovou recentemente a Lei dos 60 Dias. Parece até um absurdo que uma paciente com uma biópsia positiva para câncer tenha de esperar até 60 dias para oficialmente ter câncer. Uma paciente da rede privada quer esperar um dia; ela quer operar seu câncer amanhã, e não daqui a 60 dias. Em 60 dias, a doença evolui, com certeza. Não tem nenhum câncer que não evolua em 60 dias. O quanto isso é significativo, não se sabe, porque a gente não tem como medir o impacto disso. O que a gente precisa no Brasil também, além do diagnóstico precoce, é fazer o tratamento adequado. A gente não tem dúvida de que muitos desses países que mostram resultados de proveito oferecem tratamento adequado para seus pacientes. Nós aqui no Brasil ainda temos muita deficiência terapêutica em conseguir a cirurgia a tempo, em conseguir uma radioterapia de qualidade. Outra do Ministério: disponibilizou 80 aparelhos a mais de radioterapia. Nem todos funcionam porque a gente não tem técnico para operar, a gente não tem físico, a gente não tem radioterapeuta. Então, o problema é muito maior. Não basta instalar radioterapia; há muito mais coisas para se resolver. Ninguém vai dizer que instalar 80 máquinas não adiantou nada porque as pacientes não fazem radioterapia. E não fazem porque estão faltando mais coisas ainda. Então, eu acho que, se a gente faz dianóstico mais precoce, faz mamografia mais cedo, a gente também precisa tratar essas pacientes. 61 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 A Patricia falou muito bem: essas pacientes têm um tumor mais grave, têm o pior prognóstico. Uma paciente de 70 anos de idade talvez possa receber cirurgia e taboxifeno, sem químio e sem rádio. Uma paciente jovem de 40 anos de idade sempre vai fazer quimioterapia. Muito provavelmente, vai precisar fazer quimioterapia e radioterapia juntas. Então, a gente precisa dar um tratamento para elas. Se a gente não der o tratamento, não adianta nada fazer diagnóstico precoce. Diagnóstico precoce sem tratamento é igual a mortalidade. Então, para a gente ter uma redução de mortalidade, a gente precisa ter diagnóstico precoce e tratamento adequado. (Não identificado) - Aí, morre-se até de forma mais rápida, porque fica-se sem tratamento e entra-se em stress. O SR. RICARDO CAPONERO - É verdade. Garantir diagnóstico precoce é a primeira ponta. Agora, não é porque não tem redução de mortalidade que a gente tem de abandonar o diagnóstico precoce. Ele é o primeiro passo para se conseguir o segundo; ou seja, uma vez diagnosticado, vamos tratar. É a mesma coisa. Acho que a gente precisa conseguir um conjunto de coisas para que tudo dê certo. Eu vejo as iniciativas do Governo com bom interesse. Acho que a Patricia deveria até ser Ministra. Eu gosto muito dela. Sou fã da Patricia! A gente está sempre de lados opostos, mas sou fã do trabalho dela, porque a FEMAMA tem participado. Foi convocada uma vez só, mas a gente tem pelo menos participado de algumas das discussões do Ministério. Talvez tenha sido um problema de redação, talvez um problema de interpretação, ou talvez seja algum problema técnico. De fato, restringe. Eu acho que vai contra uma lei que está bem estabelecida desde 2008. Acho que a gente não pode perder os benefícios que a lei trouxe e que levaram todas as mulheres a cumprirem a quota de exames, mesmo fora da faixa ideal. Então, eu acho que a lei trouxe um benefício evidente. As pacientes entenderam isso, e estão usando o seu direito a esse diagnóstico. E, talvez, por isso até — e a Patricia mostrou os dados — nos últimos anos começou a haver uma leve queda na mortalidade. Talvez seja impacto, sim. Talvez, a gente só tenha que ter um pouco mais de tempo e um pouco m ais de investimento no tratamento para mostrar que isso de fato é benéfico. 62 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Infelizmente, meu voo sai daqui a pouco e preciso abandonar vocês. Mas gostaria de agradecer muito a oportunidade de estar aqui e a participação dos Deputados da Casa. (Palmas.) A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, Dr. Ricardo, pela sua participação. Por favor, fique à vontade para não correr nenhum risco de perder o voo. Passo a palavra de imediato ao Dr. José Luis, que aqui representa a Sociedade Brasileira de Mastologia e, consequentemente, as entidades médicas. O SR. JOSÉ LUIS ESTEVES FRANCISCO - Obrigado. O debate foi muito bom. Em relação ao exposto pela Patricia, não há nada pessoal. Muito pelo contrário, em todos os momentos em que tive a oportunidade de estar com ela, ela sempre se mostrou muito competente. É, provavelmente, uma das pessoas mais competentes do Ministério. E o que ela coloca em termos estatísticos não é mentira; está escrito. Mas temos outros dados. E a nossa população, no Brasil, é diferente da população de outros países. Um estudo canadense recente, que saiu na mídia e na revista Veja, coloca que ele não se aplica às pacientes dos países em desenvolvimento, onde estamos incluídos, pois a realidade é outra. Esta população, em que 25% a 27% das mulheres de 40 a 50 anos têm câncer de mama, não ocorre nos Estados Unidos. Lá, o percentual é de, mais ou menos, 15% a 16%. Então, nossa realidade é diferente. É isso o que a gente procura levar ao conhecimento. Nós somos diferentes. A nossa população é diferente. Em termos de financiamento, nós não estamos aqui brigando para fazer mais mamografias porque assim vamos ganhar mais do SUS. Pelo contrário, a mamografia pelo SUS dá prejuízo. É lógico que ações do Ministério de aumentar o financiamento para quem faz todos os procedimentos ajuda muito, atrai a pessoa a esta causa. Em termos de mamografia causar câncer, isso já foi muito debatido, mas a radiação que hoje a mulher recebe, com os atuais aparelhos calibrados, é a mesma que uma pessoa recebe atravessando o Atlântico de avião. Em uma mamografia com 4 incidências, a dose de radiação é de 0,2 rads. Na radiografia de tórax simples, com 2 incidências, são 2 rads. Em um exame de urografia excretora, em que se faz uma escopia, a incidência é muito maior. Então, existe a possibilidade de uma paciente desenvolver um câncer radioinduzido? Sim, existe. Mas essa é uma taxa ínfima que é levada em conta nos 63 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 estudos de rastreamento. Todos mostram um benefício muito maior do que um risco. A gente não foca só na mortalidade; o ponto principal do rastreamento é a mortalidade. Porque, com uma cirurgia menos agressiva e com menos tratamentos, a mulher se olha no espelho e continua mulher por não ter tido a mama amputada, o que é social, sexual e psicologicamente muito importante. Se ela vai morrer do câncer de mama, essa é outra questão, logicamente, importante, pois a principal finalidade da Medicina é evitar a morte ou o sofrimento. É claro que cada um encara isso de um jeito. Há pessoas que encaram muito bem, enquanto outras não encaram tão bem. Isso leva a um sofrimento, e eu entendo sofrimento como doença. Então, esta é outra boa ação do diagnóstico precoce. Eu agradeço a oportunidade. A Sociedade Brasileira de Mastologia e a Comissão Nacional de Mamografia agradecem a oportunidade. Queremos colaborar com o Ministério da Saúde para que essas ações e discussões entre as entidades se tornem mais frequentes. Foi muito bom estar aqui com vocês. E muito obrigado pelo convite. A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Dr. José Luis, nós também o liberamos pois sabemos que o senhor tem voo, e a nossa assessoria está preocupada com o embarque dos senhores. Eu passo então, para as considerações finais, a palavra à Dra. Patricia Sampaio, Coordenadora-Geral de Atenção às Pessoas com Doenças Crônicas do Ministério da Saúde. A SRA. PATRICIA SAMPAIO CHUEIRI - Bom, vou ver aqui o que eu consigo resgatar. Primeiro eu queria agradecer, então, a fala de todos os Deputados: Deputado Alexandre Roso, Deputado Geraldo Resende, Deputada Erika Kokay, Deputada Mara Gabrilli, Deputado Cesar Colnago, Deputada Flávia Morais. Como alguns já saíram, eu vou tentar fazer um apanhado geral, pontuando algumas coisas. A primeira coisa que eu quero deixar claro é que o que levou o Ministério a baixar essa portaria não foi dinheiro, foi a questão técnica da alta mortalidade por câncer de mama, que pode ser reduzida se a mulher fizer a mamografia na faixa etária correta. Hoje a gente produz o número de mamografias necessárias para a faixa etária correta, só que 50% delas são feitas em outra faixa etária. Se a gente 64 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 conseguisse fazer isso neste primeiro momento, a gente já teria uma queda na mortalidade, e depois discutiria ampliação de faixa etária. A gente precisa pensar com alguma racionalidade as políticas públicas do País. Então, eu quero deixar bem claro que a questão não é financeira, é técnica. Outra questão que também não ficou clara, que eu achei que o José Luis não enfatizou — vocês podem procurar isso na página do Instituto Nacional do Câncer —, é que o INCA, junto como Ministério da Saúde, tem a mesma diretriz, de 50 a 69 anos, assim como outros países que têm sistemas universais como o nosso, a exemplo de Inglaterra e França. Em nenhum momento eu falei dos Estados Unidos, porque para mim eles não podem ser comparados com o Brasil, nem para o bem nem para o mal, porque o sistema de saúde deles é totalmente diferente do que a gente pratica aqui. É incomparável o nosso sistema com o sistema de saúde americano. O Deputado Alexandre Roso citou isso, então eu queria esclarecer. Quanto à orientação de priorizar a faixa etária para rastreamento, de 50 a 69 anos, ela vem desde 2004, não é uma coisa de novembro do ano passado, não é uma novidade. A mudança de novembro do ano passado se restringe à forma de financiamento, porque o financiamento hoje é a melhor forma de indução de política pública no País. Se eu estou vendo as mamografias serem feitas na faixa etária em que há menos evidências de queda de mortalidade e eu preciso olhar a mortalidade como um todo, como uma política federal, o meio de fazer isso foram incentivos financeiros via FAEC — Fundo de Ações Estratégicas e de Compensação. Em relação à questão da média e alta complexidade — MAC, como eu já disse aqui, através da produção de série histórica de toda a mamografia, o que for FAEC vai ser pago extrateto e todos os tetos da média e alta complexidade vão ser repostos de acordo com a série histórica. Isso já foi acordado, inclusive na reunião com o Ministro que eu presenciei, com a bancada feminina. Então, não se trata de a Prefeitura pagar. Não é isso. Junto com a portaria, em novembro de 2013, a gente emitiu uma nota técnica explicativa, porque a gente sabia que ia dar problema, por uma série de motivos. Então, naquele momento já havia uma nota técnica. A partir do início deste ano, quando o problema apareceu de forma mais forte na mídia, nas entidades de pacientes, a gente produziu outras notas técnicas. A última delas está aqui e posso 65 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 mandar por e-mail para quem precisar. Nela estão relacionadas todas as evidências em que a gente baseou a tomada de decisão. Acolho a fala da Deputada Mara Gabrilli em relação à adaptação dos mamógrafos. Acho que a gente não tem como não olhar isso. Eu preciso pensar em como a gente vai colocar isso em prática, mas quero enfatizar que a gente acolhe essa fala. Também vou acolher a sugestão do Deputado Alexandre Roso. Eu acho que, sim, o Ministério precisa melhorar o diálogo tanto com esta Casa Legislativa quanto com os pacientes. Mas eu acho que isso é um esforço, é um processo. Não nego que a gente precisa melhorar essa comunicação, mas eu não acho que isso tire todo o rigor técnico para as nossas tomadas de decisão diante da portaria e de tudo que a gente tem pensado. Eu reconheço que isso pode ter causado insegurança e acho que fica confuso mesmo. Eu estava até pensando aqui como fica todo esse debate para a paciente, para a pessoa. Outra questão que foi citada aqui. Eu sou mulher, tenho 35 anos, há caso de câncer de mama na minha família e eu optei por não fazer mamografia. Eu tenho a consciência limpa, durmo tranquila, com as opções que a gente tem feito nas políticas púbicas relacionadas ao câncer de mama. Muitas vezes foi dito aqui para eu me por no lugar da mulher. Eu estou nesse lugar e eu atendi paciente, eu não estou olhando só número. Eu tenho a meta de reduzir a mortalidade, e, hoje, para reduzir a mortalidade no Brasil, é preciso fazer as mamografias na faixa etária em que há maior evidência. Como é que a gente vai discutir isso daqui a 2 ou 3 anos, quando esse perfil já tiver mudado? Esse é outro momento, e a gente vai estar aberta para a discussão. Eu acho que esclareci a maioria das questões. Se faltou alguma coisa, eu fico à disposição de todos. Já deixei meu contato, mas repito: [email protected]. Acho que a gente pode montar um grupo de trabalho para pensar em como fazer isso, se num projeto de lei... Enfim, para encontrar a melhor forma. A gente tem uma avaliação da assessoria jurídica do Ministério no sentido de que a redação da portaria não ia contra a redação da Lei nº 11.664. Foi feita essa avaliação, a coisa não foi feita sem consequência. 66 CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ Comissão de Seguridade Social e Família Número: 0174/14 COM REDAÇÃO FINAL 25/03/2014 Eu acho que a gente precisa pensar em como trabalhar juntos para rever a lei, porque as evidências estão claras, estão todas aqui, então a gente tem que montar um grupo de trabalho para ver como ajeitar a coisa com congruência e coerência entre a política do Legislativo e a política do Executivo. Eu acho que a gente tem que seguir esse caminho agora em conjunto. A SRA. PRESIDENTA (Deputada Carmen Zanotto) - Obrigada, Dra. Patricia Sampaio. Eu quero mais uma vez agradecer aos colegas Deputados e Deputadas que estiveram conosco na tarde de hoje, agradecer às mulheres que aqui representam a FEMAMA, agradecer à assessoria técnica e agradecer aos nossos convidados pelas ilustres presenças e pelas exposições. Nada mais havendo a tratar, vou encerrar a presente reunião, antes convocando reunião ordinária para amanhã, dia 26 de março, às 9h30min, neste plenário, para discutirmos os itens da pauta. Está encerrada a reunião. Obrigada. (Palmas.) 67