Acórdão do processo 0044200-12.2008.5.04.0023 (RO) Redator: FABIANO DE CASTILHOS BERTOLUCCI Participam: HUGO CARLOS SCHEUERMANN, JOÃO PEDRO SILVESTRIN Data: 18/03/2010 Origem: 23ª Vara do Trabalho de Porto Alegre EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO. RADIALISTA. ACÚMULO DE FUNÇÕES. As funções de Produtor Executivo e de Locutor Comentarista Esportivo, porque afetas a setores diferentes (respectivamente, de Produção e Locução), devem ser objeto de contratos de trabalho distintos, a teor da Lei 6.615/78, artigos 4º e 14, e do Quadro Anexo ao Decreto 84.134/79 que regulamenta tal Lei. Não há falar, portanto, em acumulação entre tais funções. VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pela MM. Juíza Lucia Ehrenbrink, da 23ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, sendo recorrentes PORTAL RADIODIFUSÃO LTDA. E OUTRO(S) e recorrido RAFAEL CABELEIRA DE CORONEL MACHADO. Inconformadas com a sentença das fls. 310/322, as reclamadas interpõem recurso ordinário às fls. 328/340. Querem ver afastada da condenação a anotação da CTPS do autor em nome de todas elas e em face de contrato único. Insurgemse, igualmente, contra o deferimento de diferenças salariais por acúmulo de função, diferenças salariais pelo exercício da função de Técnico em Externa, horas extras, FGTS, e honorários assistenciais. Em face da decisão da fl. 382, que julgou procedentes os embargos de declaração opostos pelo reclamante, as demandadas, nas fls. 385/387, ratificam o apelo, complementando-o quanto à base de cálculo do valor do acúmulo de funções. Contra-razões às fls. 394/400. É o relatório. ISTO POSTO: ANOTAÇÃO DA CTPS EM NOME DE TODAS AS RÉS E EM FACE DE CONTRATO ÚNICO. O autor postulou, e obteve êxito no 1º grau, o reconhecimento da existência de um único contrato de trabalho, a ser anotado na sua CTPS em nome de todas as empresas do grupo econômico que se beneficiaram do seu trabalho. Conforme evidenciado pela prova, pelo menos formalmente o autor manteve, simultaneamente, três contratos de trabalho: dois com a empresa Portal Radiodifusão Ltda. (primeira reclamada) e um com a Empresa Portoalegrense de Comunicação Ltda. (segunda reclamada). Todos os contratos foram firmados na mesma data (21/3/2001) e rescindidos também na mesma data (12/3/2007). Como dito, houve dois contratos de trabalho com a empresa Portal Radiodifusão Ltda.: um para a função de “produtor executivo”, com carga semanal de trabalho de 36 horas (fl. 69); e outro para a função de “locutor comentarista esportivo”, e ainda para o exercício, de forma acumulada, da função de “locutor apresentador animador” (recebendo, por essa última, o adicional de 40% sobre o seu salário fixo mensal) com “jornada reduzida de 06 (seis) horas semanais” (fl. 90 e aditamento da fl. 92). Pela Empresa Portoalegrense de Comunicação, o autor foi contratado para o desempenho das funções de “locutor comentarista esportivo”, com “jornada reduzida de 06 (seis) horas semanais” (fl. 124). A sentença afastou a alegação da defesa de que o autor manteve esses três contratos com as reclamadas, ditas empresas distintas, com personalidade jurídica própria, assim como rechaçou a alegação de que seria correta a conduta de reconhecer dois contratos de trabalho com a mesma empresa (Portal Radiodifusão Ltda.), fundada na premissa de que as funções contratadas seriam de setores diferentes (produção e locução), nos termos da Lei 6.615/78 (Lei dos Radialistas). Disse a sentença a esse respeito: “Há grupo econômico quando as empresas possuem sócios, bens e interesses comuns, controle acionário, subordinação ou qualquer outro elemento que indique uma interligação de forma que todas tenham de beneficiado da força de trabalho do empregado, ainda que indiretamente. É o caso dos autos. Os três contratos foram firmados nas mesmas condições, mesma data, mesmo formato, mesmas testemunhas, com duas empresas que possuem como sócio comum Rafael Alvarez Gadret (fls.49 e ss.) e possuem o mesmo objeto: a radiodifusão. Forçoso concluir, portanto, a incidência do art.2º, §2º, da CLT, em virtude da formação de grupo econômico pelas reclamadas. O fato de as reclamadas possuírem cadastro nacional de pessoa jurídica distintos não descaracteriza a unidade de comando. Em face da existência do grupo econômico, a relação jurídica que liga o autor ao grupo é una, não havendo falar em existência de contratos distintos e simultâneos. Nesse sentido, aliás, a Súmula n.º 129, in verbis: A prestação de serviços a mais de uma empresa do mesmo grupo econômico, durante a mesma jornada de trabalho, não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de trabalho, salvo ajuste em contrário. Aliás, sequer a legislação que regula a relação de emprego em empresas de radiodifusão, caso das reclamadas, conforta a interpretação da defesa de que devem ser reconhecidos contratos de trabalho simultâneos e independentes com cada uma das empresas integrantes do grupo. Reza o art. 9º da Lei nº 6.615/78, verbis: “No caso de se tratar de rede de radiodifusão, de propriedade ou controle de um mesmo grupo, deverá ser mencionado na Carteira de Trabalho e Previdência Social o nome da emissora na qual será prestado o serviço. Parágrafo único - Quando se tratar de emissora de Onda Tropical pertencente à mesma concessionária e que transmita simultânea, integral e permanentemente a programação de emissora de Onda Média, serão mencionados os nomes das duas emissoras”. No caso, a legislação impõe que na CTPS do trabalhador conste o nome das emissoras para as quais tenha o autor prestado o trabalho, mas não há como extrair da exegese destas normas a formação de tantos contratos de trabalho quantos forem os componentes do grupo. Neste aspecto, entendo que as normas legais são claras ao impor tão-somente o registro na CTPS das emissoras nas quais o autor tenha prestado o trabalho. Determino que seja anotada na CTPS o nome de todas as empresas do grupo que se beneficiaram do seu trabalho, mas em um contrato único.” Na busca de reforma da sentença com relação à determinação de retificação da CTPS do autor, com a anotação de um único contrato, dizem as reclamadas que: (1) o autor manteve três contratos distintos com as reclamadas, empresas distintas, em funções diferentes em cada uma delas; (2) tratam-se de contratos celebrados no mesmo momento, mas que previam atividades distintas, em setores diferentes e com jornadas diferenciadas umas das outras; (3) as contratações foram realizadas de acordo com a Lei 6.615/78, regulamentadora da profissão do radialista, em especial à luz do disposto no seu artigo 14; (4) a declaração de existência de grupo econômico entre as reclamadas, nos termos da Súmula 129 do TST, violaria a Lei 6.615/78, assim como o Decreto 84.134/79, que a regulamenta. O artigo 12 da lei citada prevê a obrigação do empregador de anotar na CTPS do radialista o nome da emissora para a qual está prestando o serviço, e qual serviço será prestado. Segundo o seu entendimento, “se o radialista trabalha para uma Radio e outras emissoras estão também utilizando os seus serviços, mesmo pertencentes ao mesmo dono ou grupo econômico, deve ser anotado na CTPS tal circunstância e deve o radialista receber salário por isto, eis que trata-se de outro contrato de trabalho. Assim, todos os radialistas que prestarem serviço a outra emissora, mesmo do mesmo grupo econômico, tem direito a um novo contrato.” O pedido do reclamante é de “declaração da existência de um contrato de trabalho com o grupo econômico com as retificações da Carteira de Trabalho do Autor”. O cerne do seu pedido parece ser o fato de ter laborado, durante o mesmo período, e ao longa da sua jornada, indistintamente em prol das duas empresas reclamadas, ditas por ele integrantes do mesmo grupo econômico. Afinal, suas razões para a pretensão são: a) porque os dois contratos de trabalho para a função de Locutor Comentarista Esportivo seriam meros desdobramentos do contrato de trabalho para a função de Produtor Executivo; b) por serem os empregadores integrantes do mesmo grupo econômico; c) por não haver diferenciação nas atividades por ele prestadas para a Rádio Pampa e para a Televisão Pampa; e d) por inexistentes controles de jornadas separados. A existência de grupo econômico, reconhecida na sentença, não foi refutada de forma específica nas razões recursais. Aliás, nem mesmo na defesa, na qual as reclamadas limitaram-se a sustentar, quanto a esse tema, que “o grupo econômico não possui personalidade jurídica não podendo, portanto, anotar a CTPS do autor como empregador.” O que as recorrentes pretendem é, à luz da Lei 6.615/78, demonstrar terem as empresas, ainda que integrantes de grupo econômico, a faculdade de firmar contratos de trabalho distintos com o mesmo empregado. É certo que a lei permite - até mesmo obriga - que, em determinadas circunstâncias (trabalho em diferentes “setores”, assim definidos na Lei 6.615/78), um mesmo empregador mantenha com o empregado radialista mais de um contrato de emprego. A regra sequer faz alusão a grupo econômico. É o que está previsto no artigo 14 da Lei 6.615/78 (e não no artigo 12, invocado no recurso, estranho à lide, pois trata de contratos por prazo determinado para produção de mensagens publicitárias): “Não será permitido, por força de um só contrato de trabalho, o exercício para diferentes setores, dentre os mencionados no artigo 4º”. A Lei 6.615/78, em seu artigo 4º, diz: “A profissão de Radialista compreende as seguintes atividades: I - Administração; II - Produção; III - Técnica. § 1º - As atividades de administração compreendem somente as especializadas, peculiares às empresas de radiodifusão. § 2º - As atividades de produção se subdividem nos seguintes setores: a) autoria; b) direção; c) produção; d) interpretação; e) dublagem; f) locução g) caracterização; h) cenografia. § 3º - As atividades técnicas se subdividem nos seguintes setores: a) direção; b) tratamento e registros sonoros; c) tratamento e registros visuais; d) montagem e arquivamento; e) transmissão de sons e imagens; f) revelação e copiagem de filmes; g) artes plásticas e animação de desenhos e objetos; h) manutenção técnica. § 4º - As denominações e descrições das funções em que se desdobram as atividades e os setores mencionados nos parágrafos anteriores constarão do regulamento.' (grifos nossos) No Quadro de Descrição anexo ao Decreto 84.134/79, que regulamenta a Lei 6.615/78, assim encontram-se situadas as funções desenvolvidas pelo reclamante: a de Produtor Executivo no item 15 do Setor de Produção (letra C) afeto à Atividade de Produção (item II); as de Locutor Comentarista Esportivo e de Locutor Apresentador Animador, respectivamente, nos itens 3 e 2 do Setor de Locução (letra F), também alusivo à Atividade de Produção (item II). Assim, tendo em conta os “setores” legalmente previstos, poderiam ter sido firmados contratos de trabalhos distintos para as funções de “produtor executivo” e de “locutor comentarista esportivo”, o primeiro pertencente à atividade de “produção”, setor de “produção”, no qual inserido a função de “Produtor Executivo”; e o segundo também dentro da atividade de “produção”, mas no setor de “locução”, no qual estão inseridas as funções de “locutor comentarista esportivo” e a função de “”locutor apresentador animador”. Assim, à luz da Lei 6.615/78, pelo menos em relação às funções de “produtor executivo” e de “locutor comentarista esportivo” poderiam (ou deveriam) ser firmados dois contratos de trabalho distintos. A questão que remanesce, contudo, é a regularidade de o reclamante ter sido contratado por empresas integrantes do mesmo grupo econômico, através de contratos de trabalho distintos, para o exercício da mesma função, no caso a função de “locutor comentarista esportivo”. Nessa parte, o recurso não merece prosperar, na medida em que perfeitamente possível, à luz da prova, reconhecer a unicidade dos contratos firmados para o exercício da função de “locutor comentarista esportivo” tendo como contratantes, em contratos apenas formalmente diversos, a Portal Radiodifusão Ltda. e a Empresa Portoalegrense de Comunicação Ltda., integrantes do mesmo grupo econômico. Entende-se, tanto à luz da CLT, quanto sob o enfoque da Lei 6.615/78, que empresas integrantes de um mesmo grupo econômico não podem contratar o mesmo empregado para o exercício da mesma função sob a forma de contratos de trabalho separados, quando esse trabalho é desenvolvido indistintamente em prol de uma ou de outra das suas empregadoras, ao longo da jornada. Observe-se que, em relação à mesma função (pertencente ao mesmo “setor”), mesmo para as empresas de radiodifusão, incide a Súmula 129 do TST: “A prestação de serviços a mais de uma empresa do mesmo grupo econômico, durante a mesma jornada de trabalho, não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de trabalho, salvo ajuste em contrário.” A questão é, pois, a possibilidade de o autor prestar, para empresas integrantes de um grupo econômico, funções idênticas (locutor comentarista esportivo), por contratos de trabalho diferentes. A Lei dos Radialistas contém regra específica com relação ao vínculo de emprego quando se trate de grupo econômico. A regra consta do artigo 9º da Lei 6.615/78, segundo a qual: “No caso de se tratar de rede de radiodifusão, de propriedade ou controle de um mesmo grupo, deverá ser mencionado na Carteira de Trabalho e Previdência Social o nome da emissora na qual será prestado o serviço. Parágrafo único - Quando se tratar de emissora de Onda Tropical pertencente à mesma concessionária e que transmita simultânea, integral e permanentemente a programação de emissora de Onda Média, serão mencionados os nomes das duas emissoras.” A regra geral, portanto, é de que conste na CTPS do empregado o nome da empresa em favor de quem o empregado presta trabalho. Parece perfeitamente possível, segundo se infere da lei, a existência de contratos de trabalho distintos com empresas integrantes do mesmo grupo econômico, desde que, como soa evidente, tais contratos de trabalho se desenvolvam de forma distinta. Não foi o que ocorreu no caso em análise, segundo se extrai da prova. Nos horários de trabalho dos três contratos não havia distinção de horários nos quais eram desenvolvidas cada uma das funções.Tome-se como exemplo dessa indistinção o controle de horário do período de 21/01/2003 a 20/02/2003. Ele consta, como relacionado à empresa Portal Radiodifusão, na fl. 143 e, indicando como empregador a Empresa Portoalegrense de Comunicação, na fl. 192. Da comparação entre ambos verifica-se que a única diferença é o cabeçalho, na parte em que consta o nome do empregador. Os horários cumpridos nos supostamente “distintos” contratos de trabalho são rigorosamente os mesmos, deixando claro que, no mesmo horário o autor prestava trabalho às duas empresas. Há, portanto, um contrato único, pelo menos com relação à função de “locutor comentarista esportivo”, em que devem figurar como empregadoras as duas empresas (Portal Radiodifusão Ltda. e Empresa Portoalegrense de Comunicação Ltda.). E há, ainda, com respaldo em expressa permissão legal, um outro contrato, como produtor executivo, em que devem figurar como empregadoras as mesmas empresas, em face da indistinção da pessoa jurídica em favor de quem o trabalho era prestado. Trata-se de acolher apenas parcialmente o pedido do reclamante, e não integralmente, como fez a sentença. Tal conclusão implica o provimento parcial ao recurso das reclamadas para afastar o reconhecimento de um único contrato de trabalho, reconhecendo, em vez disso, a existência de dois contratos de trabalho, ambos firmados pelas duas empresas reclamadas. Note-se não haver razão para condenação genérica, como constou da sentença, de anotação da CTPS “em nome de todas as empresas do grupo que se beneficiaram do seu trabalho”, inclusive por falta de prova de que outras empresas, além das reclamadas, tenham se beneficiado do trabalho do autor. Neste sentido já decidiu a 2ª Turma deste Tribunal, tendo como relatora a então Juíza Convocada, e hoje Desembargadora, Denise Pacheco: Recurso do reclamante. Prestação de serviços a mais de uma empresa. Grupo econômico. Empresas de Radiodifusão. Demonstrada a existência de grupo econômico, a prestação de serviços a mais de uma empresa do grupo, no decorrer da mesma jornada de trabalho, não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de trabalho. Aplicação da Súmula nº 129 do TST. A legislação que regula a relação de emprego em empresas de radiodifusão impõe que, em caso de grupo econômico, conste na CTPS do trabalhador o nome das emissoras para as quais é prestado o trabalho, mas isso não autoriza a interpretação de que, obrigatoriamente, haja a formação de tantos contratos de trabalho quantos forem os componentes do grupo. Apelo parcialmente provido para determinar apenas a anotação da CTPS de todas as empresas do grupo que se beneficiaram dos serviços do autor. (processo 0093800-05.2003.5.04.0402 (RO), julgado em 28/5/2008) Ainda, em situação bastante assemelhada a esta, envolvendo as mesmas reclamadas, decidiu no mesmo sentido a 6ª Turma deste Tribunal: “RADIALISTA. UNICIDADE CONTRATUAL. SERVIÇO PRESTADO AO GRUPO ECONÔMICO. Contratado para atuar nas empresas de comunicação do mesmo grupo econômico, o reclamante exercia atividades de locutor comentarista e também como produtor executivo. Embora firmados três contratos distintos, na mesma data, o autor prestava serviços como locutor comentarista esportivo na rádio e na televisão. Assim, acertada a sentença que reconheceu a existência de contrato único, de acordo com a Lei 6.615/78, que regulamenta a profissão do radialista, sem prejuízo do contrato como produtor. Provimento negado.” (proc. 0114400-82.2005.5.04.0012 (RO), Rel. Juiz Marçal Henri dos Santos Figueiredo, julgado em 16/5/2007) DIFERENÇAS SALARIAIS POR ACÚMULO DE FUNÇÃO Voltam-se as recorrentes contra a condenação ao pagamento de diferenças salariais decorrentes de acúmulo da função de Locutor Comentarista Esportivo àquela de Produtor Executivo. Invocam os artigos 4º e 14 da Lei 6.615/78. Sucessivamente, requerem a compensação de todos os valores pagos ao autor pelo exercício da função de Locutor, sob pena de enriquecimento sem causa. No recurso complementar, assim consta: “não pode a base de cálculo para apuração do valor de acúmulo de funções ser a soma do valor pago pelos contratos anotados, haja vista a inexistência de contrato uno e sob pena de a recorrente ter que pagar duas vezes pelos mesmos serviços prestados.” Conforme exposto no item anterior, no Quadro de Descrição anexo ao Decreto 84.134/79, que regulamenta a Lei 6.615/78, as funções desenvolvidas pelo reclamante apresentam os seguintes enquadramentos: a de Produtor Executivo no item 15 do Setor de Produção (letra C) afeto à Atividade de Produção (item II); as de Locutor Comentarista Esportivo e de Locutor Apresentador Animador, respectivamente, nos itens 3 e 2 do Setor de Locução (letra F), também alusivo à Atividade de Produção (item II). As funções de Produtor Executivo e de Locutor Comentarista Esportivo, porque vinculadas a setores diferentes (respectivamente, de Produção e Locução), devem ser objeto de contratos de trabalho distintos, conforme artigo 14 da Lei 6.615/78: 'Não será permitido, por força de um só contrato de trabalho, o exercício para diferentes setores, dentre os mencionados no art. 4º.' (grifo nosso) Assim, dá-se provimento ao recurso para excluir da condenação o pagamento das diferenças salariais em apreço. DIFERENÇAS SALARIAIS. FUNÇÃO DE TÉCNICO EM EXTERNAS Na inicial o reclamante alegou que a partir de meados de 2002 passou a fazer também as tarefas da função de Técnico de Externas. Pediu o pagamento de diferenças salariais daí decorrentes, com reflexos. Interpretando a prova oral, o Juízo de origem entendeu provado que o autor exerceu a função de Técnico de Externas e que o salário desta função era superior àquele que ele percebia (contando o acúmulo salarial deferido quanto à função de Locutor Comentarista Esportivo). Com fundamento na Lei 6.615/78 (artigos 4º e 14), reconheceu que deveria ter sido celebrado contrato de trabalho específico quanto à função de Técnico de Externas. Considerando que tal contrato de trabalho não foi firmado e para evitar enriquecimento sem causa para a parte empregadora, deferiu diferenças salariais pelo exercício da função de Técnico em Externas, com reflexos. Recorrem as rés. Asseveram que não restou provado que o autor tivesse sofrido alterações no seu contrato de trabalho a partir de 2002. Dizem que ele foi contratado nos termos do artigo 456, parágrafo único, da CLT, de modo que sempre efetuou ou ajudou na instalação dos equipamentos necessários para as transmissões fora do Estado. Aduzem que, se o entendimento for pela existência de alteração contratual, encontra-se prescrita a ação para anulá-la, pois tal alteração ocorreu mais de cinco anos antes do ajuizamento da demanda. Veja-se que as reclamadas não negam o exercício pelo autor de tarefas da função de Técnico de Externas. Simplesmente sustentam que tal exercício não foi objeto de alteração contratual porque estaria incluído no contrato de trabalho, nos termos do parágrafo único da artigo 456 da CLT, alegando, em caráter sucessivo, a prescrição total da ação referentemente à alteração contratual. A prova oral é no sentido de que houve a alteração contratual alegada na inicial, conforme ali noticiado. A primeira testemunha apresentada pelo autor, Ilson Luís Batista Kievel, que se qualificou como Operador de Gravações e Técnico de Externa, em seu depoimento (fls. 301/302) disse que: “trabalha na rda desde 2001, isto num terceiro contrato, porque trabalhou outros dois contratos anteriores a este último que está vigente; o depoente trabalhava com o rte na rádio do grupo da rda; a função do rte era de repórter, apresentava o programa, em transmissões de futebol, Carnaval, Feira do Livro, Assembléia, conforme o evento da época, atuando preferencialmente na área do futebol; dentro de Porto Alegre e do Estado do RS, em algumas vezes o depoente e rte estavam escalados para o mesmo jogo, mas o depoente não ia trabalhar fora do RS, porque lá havia a contratação de técnico; técnico de externas faz a atividade de montagem do equipamento(s) para transmissão do jogo de futebol; na rádio é utilizado um amplificador de retorno que é o equipamento(s) para receber o som que vem da rádio para conversar com as pessoas ao vivo, um pré-shure que faz a emissão do som para as linhas de telefone que vão para a rádio; tais aparelhos precisam ser testados, há também um cabo de 100m ou microfone sem fio utilizados nas transmissões; o equipamento(s) pode apresentar problemas nos estádios, como pares não estarem batendo certo; aqui em Porto Alegre a ETE já possui tudo pronto na parte da instalação e era mais simples, dizendo que utilizavam isto diariamente, porque trabalhavam bastante com futebol, por volta de 80% da programação; fora do estado do RS havia a montagem pelos repórteres, quem fosse escalado para transmitir o jogo e parece que pagavam um técnico da cidade onde eles estavam para fazer, e depois a partir de dado momento o repórter era ensinado e aprendia esta função; tal instalação teria remuneração equivalente ao salário de um empregado técnico em telecomunicações da ETE, que possui salário de mercado de R$ 700,00, mais ou menos; o salário de repórter e jornalista é de R$ 1.000,00 e para técnico de externa é por volta de R$ 600,00; no caso do rte eles eram contratados como radialistas, onde o salário é menor, apesar da formação profissional do rte como jornalista, mas a contratação é para jornada de 6h; em cidades como Caxias do Sul, Passo Fundo, era feita a montagem técnica; aduz que havia concentrações de times como Grêmio e Inter no interior, e iam até 5 dias antes do jogo para cobertura prévia do jogo; a montagem técnica externa, se não houver problema com a telefônica, demandavam 1h, se não havia problemas, mas poderia ser superior, no caso de ocorrerem problemas; na época do depoente não manteve contato com outro técnico, até porque ficava na central, e recebia o som que vinha do local do jogo e não havia contratação de técnico pelas empresas de comunicação de maneira conjunta; devia haver uns quatro ou cinco repórteres esportivos para cobertura dos times Grêmio e Inter;”. A segunda testemunha trazida pelo demandante, Diogo Mello Rimoli, radialista, referiu (fl. 302): “o depoente trabalhou para a rda até março/2001, mais ou menos num contrato que foi firmado em junho ou julho de 1999 e a função do depoente era de trabalhar como repórter esportivo; foi colega do rte e diz que não se lembra quando o rte começou a trabalhar e diz que se não se engana o rte trabalhou como estagiário na rda, e depois ele voltou a trabalhar, mas nesta época o depoente já trabalhava em outra empresa, continuando o depoente a trabalhar como repórter esportivo; encontrava o rte nas coberturas dos eventos esportivo, porque basicamente são as mesmas; na época que o depoente trabalhava na rda ela fazia que estabelecessem um contato com a cidade para onde seria feita a cobertura, para ser feita a instalação do equipamento, e apurada a cotação (orçamento) ele era submetido à diretoria da rda para aprovação; enquanto o depoente trabalhou na rda nunca fez instalação; tais instalações eram pagas pela rda; na época o valor era de uns R$ 300,00, mas o depoente diz que procura aproximar valores, pois em algumas cidades podia ser menos, outras mais; o depoente trabalhou nesta atividade até o ano de 2005 e o sistema era o mesmo da época que trabalhava na rda; o que o depoente pôde observar em algumas oportunidades em coberturas fora do RS é que a rda havia mudado o sistema, e os profissionais faziam a instalação, o que não era assim no período(s) que o depoente trabalhou na rda; algumas empresas de comunicação contratavam profissionais e outras levavam seus próprios técnicos para fazerem a instalação, que não era feita pelos repórteres; a duração da instalação demandava lapso de 1h30min e depois havia a desinstalação, recolhimento do material, num lapso de 45min, para na última não havia necessidade de testes; quando havia a contratação do serviço da cidade local do evento, eles eram contratados de outra emissora que estava fazendo o próprio evento, e eventualmente havia mais de uma pessoa, mas o que via com as empresas que iam com profissional técnico iam apenas com um profissional;”. Considerando-se que, com base na mencionada alteração contratual, foram postuladas diferenças de salário e que esse consiste em verba de trato sucessivo assegurada em lei, não há falar em prescrição total a respeito, mas apenas em prescrição qüinqüenal das parcelas, conforme Súmula 294 do TST. Vale esclarecer que a função de Técnico de Externas é do Setor de Transmissão de Sons e Imagens afeto à Atividade de Técnica (Quadro de Descrição anexo ao Decreto 84.134/79, que regulamenta a Lei 6.615/78, item 3 da letra “E” do item III). Tal função, portanto, integra setor diferente daqueles de Produção e de Locução aos quais, respectivamente, vinculadas as funções de Produtor Executivo e de Locutor Comentarista Esportivo. Assim, e nos termos do já citado artigo 14 da Lei 6.615/78 ('Não será permitido, por força de um só contrato de trabalho, o exercício para diferentes setores, dentre os mencionados no art. 4º.'), o exercício da função de Técnico de Externas exige contrato de trabalho específico, o que não se coaduna com o disposto no parágrafo único do artigo 456 da CLT, in verbis: “À falta de prova ou inexistindo cláusula expressa a tal respeito, entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal.” Portanto, oriundo ou não de alteração contratual, o comprovado exercício da função de Técnico de Externas deveria ter sido objeto de contrato de trabalho próprio. Registre-se que as recorrentes não questionam o valor reconhecido na sentença como salário-hora para a função de Técnico de Externas, tampouco atacam o entendimento do Juízo “a quo” de que tal salário é superior àquele percebido pelo autor. Assim, e tendo em vista os limites do recurso, impõe-se negar-lhe provimento. HORAS EXTRAS O autor postulou o pagamento de horas extras, reputando como tais as prestadas além de seis por dia ou de trinta e seis semanais, com repercussões. O Juízo de origem deferiu horas extras, assim consideradas as excedentes à sexta diária e à trigésima sexta semanal, conforme registros de horário juntados aos autos, considerando o horário declinado na petição inicial na hipótese de ausência de registro, com reflexos. Entendeu sujeito o reclamante à jornada de seis horas mediante interpretação dos artigos 2º, 4º e 18, II, da Lei 6.615/78. As recorrentes sustentam indevidas horas extras. Dizem que o autor firmou três contratos distintos com elas, com cargas horárias específicas para cada um. Invocando os cartões-ponto e o artigo 18, I e II, da Lei 6.615/78, asseveram que o reclamante não ultrapassou a jornada de seis horas na contratação para exercer a função de Produtor Executivo em que era submetido à carga horária contratual de trinta e seis horas semanais, nem superou a jornada de cinco horas nas contratações para exercer a função de Locutor Comentarista Esportivo, por força das quais se sujeitava à carga horária contratual de seis horas semanais em cada uma delas, inclusive naquela à qual acumulada a função de Locutor Apresentador Animador. Afirmam que cabia ao demandante apontar por amostragem as diferenças entre as jornadas contratadas e as efetivamente laboradas e que não o fez, não tendo se desincumbido de seu ônus probatório, de modo que não lhe assiste direito ao pagamento de horas extras. Sucessivamente, requerem sejam consideradas extras apenas as horas excedentes às cargas horárias contratadas, de trinta e seis horas semanais no contrato de Produtor Executivo e de seis horas semanais em cada um dos contratos de Locutor Comentarista Esportivo, quando não satisfeitas ou não compensadas com folga ou jornada menor em outro dia. Caso mantido o entendimento da existência de contrato uno e de acúmulo de função, ainda sucessivamente, pretendem sejam reputadas extras somente as horas excedentes a quarenta e quatro horas semanais e a oito diárias, quando não compensadas com folga ou jornada menor em outro dia, deduzidos os valores já satisfeitos ao título. A jornada legal é de seis horas para a função de Produtor Executivo (Quadro Anexo ao Decreto 84.134/79, II, “C”, 15, Lei 6.615/78, artigos 4º, II, § 2º, “c”, e 18, II), e de cinco horas para a função de Locutor Comentarista Esportivo (Quadro Anexo ao Decreto 84.134/79, II, “F”, 3, Lei 6.615/78, artigos 4º, II, § 2º, “f”, e 18, I). A função de Locutor Apresentador Animador também tem jornada legal de cinco horas (Quadro Anexo ao Decreto 84.134/79, II, “F”, 2, Lei 6.615/78, artigos 4º, II, § 2º, “f”, e 18, I). No caso, todavia, não cabe aferir o desempenho desta função em face de jornada própria. Como a função de Locutor Apresentador Animador foi objeto de acumulação ao contrato de trabalho firmado pelo autor para exercer a função de Locutor Comentarista Esportivo (celebrado com a primeira ré), cumpre reconhecer que a execução daquela função foi contratada para ocorrer dentro da jornada que ele cumpria em face deste contrato. Vieram aos autos controles de horário às fls. 142/172 e 175/289). O confronto entre a folha-ponto da fl. 146, relativa à função de Produtor Executivo, e aquela da fl. 195, referente à função de Locutor Comentarista Esportivo, ambas alusivas ao período de 21/6/2003 a 20/7/2003, evidencia que o reclamante desenvolvia de forma simultânea as mencionadas funções, executando ora uma, ora outra. A localização das reclamadas no mesmo endereço revela que o autor desenvolveu de forma simultânea tanto os contratos celebrados com a primeira reclamada, como aquele firmado com a segunda reclamada, todos com vigências idênticas. Diferentemente do que sustentam as recorrentes, entende-se que a Lei 6.615/78, mesmo prevendo a coexistência de contratos de trabalho em prol do mesmo empregador (desde que se trate de trabalho que, na forma fixada em lei, se situe em diferentes “setores”) não confere respaldo à forma de execução do contrato posta em prática pelas reclamadas. Para que se possa, à luz da lei, cogitar de jornadas distintas, é preciso que se demonstre o desempenho das funções de forma distinta. No caso, os próprios contratos de trabalho são a prova de que tal distinção não ocorria. Não se justifica, portanto, computar como horas extras apenas aquelas excedentes da jornada contratada em cada um dos contratos se, na prática, sequer se mostra possível mensurar o tempo despendido no exercício de cada função. Não há fundamento, sequer, em face da forma como cumprida a jornada de trabalho, para que se calcule horas extras a partir do somatório das jornadas contratadas. Correta a sentença ao considerar extras as horas excedentes da sexta diária e da 36ª semanal. Esta Turma já decidiu nesse sentido: “RADIALISTA. CONTRATOS DISTINTOS. JORNADA REDUZIDA. DIFERENÇAS SALARIAIS. Reconhecidos três contratos de trabalho distintos e demonstrado o desempenho das atividades concomitantemente, não se justifica o pagamento de remuneração proporcional à pretensa jornada reduzida quanto a dois destes contratos.” (proc. 00956-2007028-04-00-0 (RO), Rel. Des. Ricardo Tavares Gehling, julgado em 24/9/2009) Ressalte-se que não sendo possível aferir quanto tempo de sua carga horária diária ou semanal o autor dedicou a cada uma das reclamadas, impõe-se considerar que ambas se beneficiaram de todas as horas extras que ele prestou. Referentemente à alegação sucessiva de que as horas extras prestadas teriam sido objeto de compensação com folgas ou jornada a menor, não merece apreciação o recurso. É que, diante do silêncio da sentença quanto ao alegado na defesa em tal sentido, a ré não opôs embargos de declaração, resultando caracterizada a preclusão a respeito da matéria. Note-se, de todo modo, que a forma genérica como foi estabelecida a “compensação” (“sempre que esta for ultrapassada por necessidade do serviço, deverá ser compensada com o mesmo número de folgas” ; fls. 70, 91 e 125) e tendo em conta as diversas cargas horárias originalmente estabelecidas, conforme a função (36 horas semanais, 6 horas semanais e seis horas semanais), não há como entender-se conformada a pactuação ao quanto estabelecido no artigo 59, § 2º, da CLT. Por fim, quanto à alegada existência de horas extras pagas, entende-se que a sentença autorizou a dedução de valores ao incluir na sua parte dispositiva a expressão “contados os valores pagos”. Logo, no aspecto, o recurso não tem objeto. Sinale-se que não há insurgência específica contra a condenação ao pagamento de duas horas e trinta minutos em três vezes por mês para a atividade de Técnico de Externa e reflexos. Nega-se provimento ao recurso, no tópico. FGTS Subsistente a condenação principal ao pagamento de parcelas remuneratórias, remanesce o deferimento acessório de FGTS sobre tais parcelas. HONORÁRIOS ASSISTENCIAIS As reclamadas buscam ser absolvidas da condenação em honorários assistenciais. Sucessivamente, pedem sejam reduzidos tais honorários a 10% sobre o valor da condenação. Predomina na Turma, em sua atual composição, o entendimento de que, nas lides decorrentes da relação de emprego, são devidos honorários assistenciais se preenchidos os requisitos previstos no artigo 14 da Lei 5.584/70. Nesse sentido, as Súmulas 219 e 329 do TST. Na fl. 8 há declaração de que o reclamante não tem situação econômica que lhe permita demandar sem prejuízo do sustento próprio ou da família. Assim, e tendo em vista o disposto na Lei 7.115/83, presume-se verdadeira tal informação. Portanto, não aproveita às rés a alegação de que o autor tem renda bem superior a dois salários mínimos mensais. Por outro lado, não havendo prova de que a assistência judiciária tenha sido prestada por advogado credenciado pelo sindicato da categoria, dá-se provimento ao recurso para excluir da condenação os honorários assistenciais. Ante o exposto, ACORDAM os Magistrados integrantes da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO para (1) afastar o reconhecimento de um único contrato de trabalho, reconhecendo, em vez disso, a existência de dois contratos de trabalho, ambos firmados pelas duas empresas reclamadas, um para o exercício da função de “produtor executivo” e outro para a função de “locutor comentarista esportivo”; e (2) excluir da condenação o pagamento de diferenças salariais decorrentes de acúmulo da função de Locutor Comentarista Esportivo àquela de Produtor Executivo e honorários assistenciais. Valor da condenação que se reduz de R$ 18.000,00 para R$ 15.000,00 para todos os efeitos legais. Intimem-se. Porto Alegre, 18 de março de 2010 (quinta-feira). Des. Fabiano de Castilhos Bertolucci Relator