RORAIMA NA DÉCADA DE 1980: O debate artístico e cultural.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS - CCH
COORDENAÇÃO DO CURSO DE HISTÓRIA
JESSICA CARLA DA SILVA
RORAIMA NA DÉCADA DE 1980: O debate artístico e cultural.
Boa Vista/RR
2013
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS - CCH
COORDENAÇÃO DO CURSO DE HISTÓRIA
JESSICA CARLA DA SILVA
RORAIMA NA DÉCADA DE 1980: O debate artístico e cultural.
Monografia apresentada como pré-requisito
para conclusão do Curso de Licenciatura e
Bacharelado em História da Universidade
Federal de Roraima.
Orientador: Prof. Msc. Antônio Klinger da
Silva Souza.
Boa Vista/RR
2013
2
JESSICA CARLA DA SILVA
RORAIMA NA DÉCADA DE 1980: O debate artístico e cultural.
Monografia apresentada como pré-requisito
para conclusão do Curso de Licenciatura e
Bacharelado em História da Universidade
Federal de Roraima, defendida em 15 de abril
de 2013 e avaliada pela seguinte banca
examinadora.
_________________________________________________
Prof. MSc. Antônio Klinger da Silva Souza
Orientador / Curso de História/UFRR
_____________________________________
Profa. Dra. Maria das Graças dos Santos Dias
Curso de História/UFRR
_______________________________________
Prof. Esp. Francisco Marcos Mendes Nogueira
Curso de História/UFRR
3
Dedico:
À minha mãe, irmãos, sobrinhos e esposo.
4
AGRADECIMENTOS
Com minhas simples palavras vou tentar agradecer pessoas que foram importantes e
fundamentais para que eu pudesse continuar e finalizar esse trabalho monográfico. Embora
seja difícil expressar a minha gratidão a todas essas pessoas que direta ou indiretamente,
contribuíram para realização do mesmo. Sei que posso ser injusta em esquecer alguns nomes,
pois é impossível apontar todos os amigos e pessoas que passaram ou estiveram ao meu lado
durante minha formação.
Ao longo da minha jornada acadêmica, diversas foram as dificuldades enfrentadas,
porém a força e as motivações da família e amigos estiveram presentes nesses desafios,
fazendo com que eu pudesse prosseguir e concluir, mas uma etapa da minha vida.
Em primeiro lugar agradeço a Deus por conduzir e iluminar minha vida, por ter me
dado força e perseverança. Agradeço á minha família, á minha Avó querida e amigos.
Em especial agradeço ao meu esposo Ítalo Rodolfo Oliveira da Costa, por mostrar
que sou capaz sempre que eu penso o contrário, por está ao meu lado, nas horas incertas, por
acreditar em mim, quando eu mesmo pensei em desistir, sempre me incentivando e sendo
agente principal da minha longa caminhada acadêmica, pois, sem seu decisivo amparo ao meu
lado, nada disso seria possível hoje! Agradeço por me encorajar a conquistar meus sonhos e
principalmente por torná-los reais. Agradeço seu companheirismo ao longo do curso, sua
paciência em vários momentos, sua compreensão e atenção que recebi durante minha
formação. Muito obrigada!
Agradeço á minha mãe Maria das Graças Batista Moura, que mesmo longe de mim,
sempre está em meus pensamentos, ou falando ao telefone comigo, tendo orgulho de mim,
com palavras carinhosas, me incentiva. Obrigada mãezinha por me amar incondicionalmente.
Dedico minha formação a você dona Graça, que sempre lutou por cada um de seus filhos, mãe
querida sinto saudades.
Aos meus amados irmãos , meu muito obrigada, Antônia Gracelia Batista Moura e
5
meu lindo irmão Jeferson Batista Moura, agradeço por todo carinho que sempre tiveram por
mim, por contribuírem para minha formação direta ou indiretamente.
Agradeço aos meus sobrinhos maravilhosos; Gleiciane Batista ,Jeovany Batista da
Anunciação e em especial a razão da minha vida, ,minha sobrinha Laís Kimberly de Souza
Batista, desculpe a ausência em determinados momentos. Agradeço por ser compreensiva e
entender que aos dias finais de concluir o trabalho monográfico, não pude lhe dá atenção que
tanto precisava. Dedico todos os meus esforços a você minha princesinha Laís Kimberly.
Obrigada por está ao meu lado sendo mais um incentivo para minha vida.
As minhas cunhadas Rávila Gabriele Oliveira Ramo e em especial a Kely Pinheiro
de Oliveira Batista, obrigada por me ouvir, por está comigo quando mais precisei, por ser
amiga, agradeço a Deus por ter vocês em nossa família, obrigada cunhadas por tudo.
A minha madrinha Maria Raimunda.
Meus mais sinceros agradecimentos ao meu amigo e orientador MSc. Antônio
Klinger da Silva Souza, não tenho palavras para descrever como sou grata por toda dedicação
com a condução e conclusão deste trabalho, pois suas orientações foram fundamentais para a
realização e conclusão desta monografia, agradeço a compreensão, disponibilidade, confiança,
por ser paciente nas horas de angústia e dificuldades ao longo do trabalho, obrigada por
disponibilizar seu tempo em me orientar. E principalmente por reafirmar que “Não vim até
aqui pra desistir agora” (Engenheiros do Hawaii).
Aos professores do Departamento de História da UFRR que contribuíram para minha
formação acadêmica. Em especial aos professores por suas intensas contribuições: Drª Maria
das Graças Santos Dias, Dr Nélvio Paulo Dutra Santos, Dr. Reginaldo Gomes de Oliveira,
MSc Márcia D’Acampora, Drª Maria Luiza Fernandes e ao meu querido e com carinho
professor, Orlando de Lira Carneiro.
Aos meus amigos do curso de História do ano de 2008, onde tive a oportunidade de
conhecer pessoas maravilhosas, que certamente jamais esquecerei.
Aos amigos do PIBID- Adriele, Elen, Thiago e Rozenildo.e ao professor Alfredo
A minha amiga que do início do curso até o termino esteve presente, Adriane
Fernandes Brito, que compartilhou diversos momentos, foram muitas histórias vividas, uma
amizade que será eterna.
Agradeço a Gizele de Souza França, que longe ou perto sempre torceu pelas minhas
6
conquistas, obrigada por ser amiga em todas as horas.
Agradeço as palavras amigas de Kassandra Pinheiro de Oliveira Amorim, que
sempre acreditou em mim, ajudando-me nos momentos que mais precisei. Agradeço a Jesana
Pereira Figueira amiga de longa dada que é como uma irmã pra mim. Minhas amigas.
Sonaira, Nádia, Claudilene, Daina e Jessyka Karolaine que direta ou indiretamente me
ajudaram. As minhas queridas amigas do curso de História Wandercila Veras (kinha) uma
pessoa incrível e amiga de todas as horas, a minha amiga flor Eurinedes Gonçalves, Wendleng
Stephannie Barreto da Silva, não posso deixa de agradece a Karoline Viana Coelho, obrigada
meninas.
Agradeço aos amigos Elvis Cândido, Jobson Cândido, Ismael Guedes,.Fábio
Almeida, Leonardo por me ajudarem no decorrer do curso.
Não poderia deixar de agradecer ao meu querido amigo Francisco Marcos Mendes
Nogueira, que com uma simples frase, faz o meu dia ficar melhor “Bom dia flor do dia”
obrigada por todo carinho que recebo.
Um agradecimento todo especial aos entrevistados Eliakin Rufino, Neuber Uchâo e
Zeca Preto, por responder ao questionário, obrigada por me ajudarem a realizar e eternizar um
sonho.
Agradeço ao professor Dr. Reginaldo Gomes de Oliveira, que me ajudou no início do
projeto da minha monografia, obrigada por fazer parte do meu trabalho, em todos os
momentos que precisei sempre disposto a me ajudar, sou grata por ter respondido ao
questionário. Agradeço por tudo professor Reginaldo.
Meu agradecimento mais que especial á minha querida e amada professora Dr Maria
das Graças Santos Dias, só tenho a agradecer por ter sido sua aluna, obrigada por me
incentivar e acreditar em mim.
Enfim, agradeço a todas as pessoas que alguma forma contribuíram para minha
formação acadêmica.
7
Makunaimando
Cai o sol na terra de Makunaima
Boa Vista no céu, lua cheia de mel
sob a serra de Pacaraima
eu sou de Roraima
surubim, tucunaré, piramutaba
sou pedra pintada, buriti, bacaba
Caracaranã, farinha d’água, tucumã
curumim te espera cunhantã
um boto cantando no rio
beijo de caboco no cio
parixara na roda de abril, se abriu
linha fina no meu jandiá
carne seca, xibé, aluá
jiquitaia, caxiri, taperebá...
(Zeca Preto)
8
RESUMO
Este trabalho discute questões relacionadas à cultura e a identidade roraimense, dando ênfase
em apresentar o Movimento Roraimeira, sendo os questionadores desta temática na década de
1980 em Roraima. Os artistas apresentam como eram retratadas a arte e cultura no em então
Território Federal de Roraima, através dos periódicos da época em questão, enaltecem alguns
pontos que os jornais abordavam, com as falas dos artistas que enfatizavam questões como a
falta de políticas públicas voltadas a arte, os mesmos eram retratados, como um grupo
pequeno e teimoso, pois debatiam essas questões em Roraima. O trabalho contém seis
perguntas envolvendo os embates que fizeram parte da gênese do Movimento Roraimeira, e
como foram apresentados ao Ex-Território de Roraima, em suas falas os integrantes do
Movimento Roraimeira apresentam pontos indispensável para compreensão dos debates
artísticos e culturais que fomentavam na década de 80 em Roraima.
Palavras-chave: Cultura; Identidade; Movimento Roraimeira; Jornais.
9
ABSTRACT
This paper discusses issues related to culture and identity roraimense, with emphasis on the
present Roraimeira Movement, and the questioning of this issue in the 1980s in Roraima. The
artists present were portrayed as the art and culture in the then Federal Territory of Roraima,
through the periodicals of the time in question, extol some points that newspapers dealt with
the speeches of artists who emphasized issues such as lack of public policies to art, they were
portrayed as a small, stubborn, because these issues debated in Roraima. The work contains
six questions involving the clashes that took part in the genesis of Roraimeira Movement, and
they were presented to the former Territory of Roraima, in their speeches the members of the
Movement Roraimeira feature points essential to understanding the artistic and cultural
debates that fomented the decade 80 in Roraima.
Keywords: Culture, Identity, Movement Roraimeira; Newspapers.
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
QUADRO 1 – JORNAIS E MANCHETES SOBRE O RORAIMEIRA................................. 35
11
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 13
2. IDENTIDADE, CULTURA E UMA VISÃO DA LEI ....................................................... 17
2.1 Sobre cultura e identidade: uma análise teórica ................................................................. 17
2.2 Plano Nacional de Cultura e suas influências em Roraima ................................................ 21
3. UMA PROMOÇÃO RORAIMEIRA ............................................................................... 23
3.1 A musicalidade roraimeira ................................................................................................... 23
3.2 O poeta Eliakin ................................................................................................................... 28
3.3 A “Cruviana” de Neuber Uchôa ......................................................................................... 30
3.4 “O Filho de dona Neuza”: Zeca preto ................................................................................ 31
4 DECADÁ DE 80: AS NOTÍCIAS DO RORAIMEIRA ................................................... 33
4.1 O uso de jornais como fonte de pesquisa ............................................................................ 33
4.2 As notícias do Roraimeira .................................................................................................. 35
4.3 Breves relances da História de Boa Vista ........................................................................... 42
5. COMPREENDER AS INFLUÊNCIAS CULTURAIS INTERNAS E EXTERNAS NA
PRODUÇÃO DAS LETRAS DAS MUSICAS DO MOVIMENTO RORAIMEIRA ...... 45
5.1 Como nasceu o Movimento Roraimeira? ........................................................................... 46
5.2 Quais as ideias centrais do Movimento Roraimeira? ......................................................... 48
5.3 Quais as principais influências do Movimento Roraimeira? ............................................. 50
5.4 Quais Os Principais Protagonistas? .................................................................................... 51
5.5 Quais linguagens artísticas mais visíveis do Movimento Roraimeira? .............................. 53
5.6 Quais as principais obras de música, literatura, artes plásticas, fotografia, dança? ........... 54
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 57
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 60
ANEXOS
ANEXO A: Jornal de Roraima 11/04/1991 .............................................................................. 62
ANEXO B: Boletim da Educação e Cultura 10/1984 .............................................................. 63
ANEXO C: Folha de Boa Vista, 05/10/1984 ............................................................................ 64
ANEXO D: Folha de Boa Vista, 22/01/1989 ........................................................................... 65
ANEXO E: Folha de Boa Vista, 22/01/1989 ............................................................................ 66
ANEXO F: Folha de Boa Vista, 22/01/1989 ............................................................................ 67
12
ANEXO G: A Critica de Roraima, 13/08/1989 ........................................................................ 68
ANEXO H: A Critica de Roraima, 13/08/1989 ........................................................................ 69
ANEXO I: A Critica de Roraima, 13/08/1989 .......................................................................... 70
ANEXO J: A Critica de Roraima, 13/08/1989 ......................................................................... 71
ANEXO K: O Estado de Roraima, 10/03/1991........................................................................ 72
ANEXO L: Folha de Boa Vista, 21/03/1991 ............................................................................ 73
ANEXO M: Folha de Boa Vista, 13/04/199 ............................................................................. 74
ANEXO N: Folha de Boa Vista, 15/06/1991 ........................................................................... 75
ANEXO O: Jornal de Roraima, 18/06/1991 ............................................................................. 76
ANEXO P: Jornal de Roraima, 23/06/1991 ............................................................................. 77
ANEXO Q: Folder .................................................................................................................... 78
ANEXO R: Folder .................................................................................................................... 79
ANEXO S: Folder .................................................................................................................... 80
13
1 - INTRODUÇÃO
A cultura artística está ligada as questões de representações, o Movimento Roraimeira
é um marco, nas discussões sobre a cultura regional, natureza, beleza e rica dos costumes
indígenas de Roraima. O Movimento apresenta todos esses elementos, pois o mesmo é
multicultural. Suas representações vão além das músicas, das discussões entre amigos, além
da arte, o Movimento Roraimeira é uma referência, abriga de braços abertos às pessoas que
por algum motivo migraram para o extremo norte e aqui adotaram Roraima como sua terra,
criando raízes, não querendo mais ir embora, se tornando assim pertencentes a Roraima.
Através da arte expõem toda a riqueza da Amazônia. O Movimento Roraimeira
transita no tempo, pois o mesmo, nos dias de hoje, suas canções são reconhecidas e cantadas.
Com suas músicas expandem seus horizontes, as belezas naturais demonstrando a cada
geração, o que vem a ser o Movimento.
Suas músicas ultrapassam fronteiras, não admite preconceitos, suas canções revelam
em simples palavras as exuberâncias da fauna e flora de Roraima, sua musicalidade é única.
Buscam na simplicidade de ser e de viver suas inspirações, declamam seus amores em versos,
quadros, fotografias, canções e apresentações teatrais.
O Movimento Roraimeira, no passado, buscava com demonstrações públicas sua luta
pela valorização da arte e da cultura. Diferentemente dos dias atuais, o Movimento está em
foco, e bem vivo, suas músicas são frequentemente tocadas nas rádios, há documentários
relacionados ao Movimento, nas redes sociais são queridos e bem aceitos, seus projetos que
consistem em apresentar shows uma vez por mês na casa do Neuber, tem público garantido,
na Universidade há debates sobre a temática Roraimeira. Suas vozes foram ouvidas e ainda
ecoam por Roraima.
O Movimento Roraimeira colhe o que plantou nos anos de 1980, são popularmente
conhecidos, e principalmente reconhecidos. Seus artistas ocupam seu lugar ao sol, com talento
e genialidade. Cada canção tem um sentido único, escritas de diferentes formas, com
objetivos próprios destinados, como é o caso da canção Roraimeira, que foi escrita bem antes
dos primeiros debates sobre o Movimento, mas foi escolhida para dar nome ao Movimento.
14
O Movimento Roraimeira teve sua gênese nos anos 80, com um grupo de artistas de
diversas linguagens culturais, formado por elemento das mais diversas partes do Brasil,
sobressaindo os nascidos em Roraima – que, por meio das manifestações indígenas e
inspirações colhidas na natureza (fauna e flora), buscavam uma identidade regional.
Suas ações e atuações levavam, e ainda hoje levam, seus expectadores a uma viagem
as nuances regionais, até então pouco conhecida, pela massa migrante que compunha o atual
Estado de Roraima. A população de Roraima é formada a partir de uma diversidade étnica.
Esta diversidade faz do Estado um imenso caldeirão cultural, que tem sua particularidade em
ser um Estado plural, pois, há uma diversidade de costumes e idiomas principalmente os
indígenas.
Nesta linha, sabendo que Roraima é composto em sua maioria por migrantes,
entendemos que este trabalho poderá proporcionar à sociedade local o conhecimento de um
Movimento artístico e cultural que predominou no cenário nacional durante as décadas de
1980 e 1990, mas que a nível local não teve o devido reconhecimento. Ainda assim, nessa
contemporaneidade, vem ressurgindo no espaço midiático, como se a sua identidade fosse,
somente agora, desvelada para a sociedade. Roraima convive com seus povos indígenas, os
ribeirinhos, os nordestinos, os sulistas, isto ocorre por uma heterogeneidade gerada com o
fluxo migratório.
Este trabalho apresenta questões relacionadas às migrações que fazem parte da
construção do então Território Federal de Roraima, este trabalho não tem interesse em analisar
está questão, pois nosso enfoque está ligado especificamente aos debates artísticos e culturais
envolvendo alguns agentes, pertencentes ao Movimento Roraimeira.
A finalidade, portanto, é apresentar uma análise sistemática sobre questões envolvendo
embates culturais e identitários em Roraima, partindo sobre os aspectos do Movimento
Roraimeira. Tendo como aporte os periódicos da década de 1980. Para melhor analise
utilizamos de questionário, para fazer as comparações nas falas dos artistas selecionados para
o trabalho. Através dos questionamentos colhidos dos artistas e integrantes do Movimento
Roraimeira, podemos inferir que com as narrativas, permitiu analisar os significados
atribuídos as vivencias e as trajetórias individuais.
É interessante perceber que o Movimento Roraimeira vem ocupando, aos poucos, seu
espaço no meio acadêmico, em especial na Universidade Federal de Roraima - UFRR, sendo
por diversas ocasiões e nos mais diversos cursos temas de trabalhos de conclusão de curso,
15
monografias, videografias, documentários, artigos científicos, dentre outros, ou mesmo tendo,
em seu âmbito, a presença de membros do Movimento para explanações e apresentações de
seus trabalhos para a comunidade acadêmica.
O recorte temporal justifica-se com base no fluxo de migrantes para Boa Vista na
década de 1980, onde começam a surgir um questionamento sobre a cultura local e qual seria
sua identidade, estas questões envolveram uma gama de diversos pensamentos, pessoas da
música, artes, escritores, dançarinos, poetas, fotógrafos entre outras expressões artísticas, que
faziam o debate da construção cultural de Boa Vista, para compreender as mudanças
evidenciadas neste período.
Ressaltamos que nossa problemática para o desenvolvimento do trabalho partiu do
seguinte questionamento: Quais as implicações culturais que exerceu o Movimento
Roraimeira no contexto do Território Federal de Roraima na década de 1980? Tivemos,
inicialmente, a expectativa em trabalhar com entrevistas mistas, através de um questionário
com seis perguntas relacionadas à temática, pois entendíamos que o contato com os artistas
aconteceria sem maiores problemas, uma vez que os sujeitos dessa pesquisa moram em Boa
Vista e em plena atividade artística. Contudo, vislumbramos nos jornais da época um
arcabouço primaz de fontes para desenvolver a pesquisa. Sendo assim, optamos
metodologicamente em analisar as notícias publicadas nos jornais para escrever a trajetória do
Movimento Roraimeira.
O objetivo geral do trabalho é identificar os fatores artísticos e culturais na década de
1980 em Roraima, verificando as características do cenário regional na música. É de suma
importância a valorização dos artistas locais, pois, os mesmo expressam a identidade de um
povo por meio da arte. Um bom exemplo são as músicas cujas letras descrevem a beleza e
pluralidade de determinadas regiões, culturas ou sociedades, além de demonstrar sentimentos
vividos pelo artista em contato com o meio no qual está inserido.
No primeiro capítulo analisamos teorias relacionadas a identidade e a cultura tendo
por base autores da Nova História e da Antropologia, pois entendemos que são indispensável
para debates relacionados à temática, uma vez que os mesmo apresentam sucintamente,
enfoque pertinentes a construção do trabalho.
No capitulo seguinte fazemos uma breve explanação sobre a musicalidade que é de
fundamental importância ao trabalho, pois através das canções há uma representação de
16
Roraima, também ocorrem os debates, que surgem através de encontros musicais, enfatizando
as músicas de composição dos artistas Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto.
Ao pensarmos a confecção do terceiro capítulo procuramos dar maior ênfase ao
Movimento Roraimeira, portanto, buscamos analisar notícias relacionadas aos membros do
Trio. Para isso buscamos selecionar dez manchetes de jornais referentes as falas dos
integrantes do Movimento Roraimeira e em seguida, analisamos cada periódico para termos
melhor clareza dos acontecimento inerentes a eles.
O último capítulo é construído a partir do uso de um questionário com seis perguntas
relacionadas ao Movimento Roraimeira. Foram entrevistados os artistas Eliakin Rufino,
Neuber Uchôa, Zeca Preto, e também entrevistamos o Professor Dr. Reginaldo Gomes de
Oliveira1. A ideia deste capítulo foi compreender as nuances da gênese do Movimento
Roraimeira e trazer para os dias atuas as falas dos mesmos.
O Trio Roraimeira atualmente é reconhecido culturalmente, é um grupo que já
somam duas décadas de árduos trabalhos voltados à construção da identidade roraimense. O
grupo Roraimeira, possui discos gravados e um vasto currículo com experiência de
apresentações em eventos de vários Estados do país. No exterior, o grupo já realizou turnês
com shows na Europa, Portugal
Este trabalho é antes de tudo uma tentativa de adquirir subsídios que nos permitam
formular respostas para algumas indagações que se fazem presentes no cenário artístico e
cultural de Roraima. Apesar de termos encontrados uma gama de trabalhos que utilizaram o
Movimento Roraimeira como objeto ou sujeito de pesquisa, inclusive o documentário exibido
pela TV Universitária, entendemos que este continua a ser um tema a ser explorado, o qual
pode proporcionar muitas outras discussões, pois a história do Movimento também representa
e remete à história da cultura artística de Roraima.
1
Professor Associado lotado no Departamento de História/ UFRR. Doutor em História Social pela Universidade
de São Paulo (USP). Desenvolve pesquisas sobre Amazônia e Artes, atuando principalmente com temas
relacionados à História Cultural de Roraima, Estado de Roraima, Arte em Roraima, História e Movimentos
Sociais e História e Desenvolvimento Regional. Consultor na área de História na ODIC (Organização dos
Indígenas na cidade). Pesquisador-Visitante na Universidade de Guyana e na Universidade do Suriname.
Atualmente é vice-reitor da Universidade Federal de Roraima (UFRR).
17
2 IDENTIDADE, CULTURA E UMA VISÃO DA LEI
2.1 Sobre cultura e identidade: uma análise teórica
Os pressupostos teóricos que permearam a confecção deste trabalho tiveram seu aporte
baseado no viés da Nova História Cultural. Com os novos campos da historiografia, a História
ganham um novo rumo, isso se dar a partir da segunda metade do século XX, com a Escola
dos Annales (1929), principalmente com a terceira geração dos Annales, que vão discutir
diferentes abordagens e há uma aproximação da História com outras ciências. Desta forma
surge à concepção da Nova História Cultural que tem diversos elementos entrelaçando os
conceitos de cultura. Como aporte para trabalhar esse termo, Peter Burke descreve cultura da
seguinte forma:
O termo cultura costumava se referir às artes e às ciências, depois, foi empregado
para descrever seus equivalentes populares – músicas folclóricas, medicina popular e
assim por diante. Na última geração, a palavra passou a se referir a uma ampla gama
de artefatos (imagens, ferramentas, casas e assim por diante) e práticas (conversar,
2
ler, jogar) .
Por isso entendemos a necessidade de trabalhar outras áreas dos diversos campos das
ciências, propondo um debate com a Antropologia. Para assim compreender como se dá o
contexto da cultura. A Nova História Cultural estabelece um dialogo com a Antropologia
Simbólica, portanto, corroborando com Geertz percebemos que “o homem é um animal
amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo essas
teias e a sua analise3”. Com esta afirmação é possível expor exatamente os elementos
pesquisados quando inferir que, ao mesmo tempo, o homem produz sua cultura e também é o
produto da mesma. Como o termo “cultura”, é amplamente utilizado, por diversas ciências,
possui uma conceituação vasta e complexa.
Diante de tantos conceitos, recorre-se, a Geertz quando descreve que cultura tem
uma natureza simbólica e uma estruturação sistemática que viabiliza sua reprodução e
manutenção:
Como sistemas entrelaçados de signos interpretáveis, (o que eu chamaria símbolos,
ignorando as utilizações provinciais), a cultura não é um poder, algo ao qual podem
ser atribuídos casualmente os acontecimentos sociais, os comportamentos, as
2
BURKE, Peter. O Que é História Cultural, 2ª Ed., Rio de Janeiro, Zahar, 2008, p.43.
3
GEERTZ, Cliford. A interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1989, p.15.
18
instituições ou os processos; ela é um contexto, algo dentro do qual eles podem ser
descritos de forma inteligível – isto é, descritos com densidade4.
A História Cultural mantém uma relação de proximidade com a Antropologia
Simbólica. “Estudar a cultura é, portanto, estudar um código de símbolos partilhados pelos
membros dessa cultura5”.
A definição de cultura é muito ampla e não é tão simples defini-la. Seu conceito é
múltiplo. De uma forma geral podemos inferir que ela é a junção de ideias, abstrações e
comportamento de um determinado grupo/sociedade, é tudo aquilo que é produzido pelo
homem, sendo concreto ou imaterial, neste sentido o Movimento Cultural Roraimeira busca
expressar, pela arte, as belezas de Roraima, a valorização do povo boavistense, as riquezas
culturais e contribuir para entender a formação da identidade regional.
Pesavento acentua que “A cultura é ainda uma forma de expressão e tradição da
realidade que se faz de forma simbólica, ou seja, admite-se que os sentimentos conferidos às
palavras, às coisas, às ações e aos atores sociais se apresentam de forma cifrada, portanto já
um significado e uma apreciação valorativa.” 6
Assim, percebemos que cultura é uma expressão da construção humana, atreladas as
questões identitárias, sendo construída através do diálogo entre as pessoas no dia a dia
“Assim, cultura e identidade estão estreitamente interligadas, no sentido da produção e da
troca de significados compartilhados.”
7
Nessa interação social a formação se dá
gradativamente por meio de símbolos e significados que fazem sentido a essas pessoas, e são
compartilhados entre elas. Burke enfatiza que a cultura “não possui muros e arames farpados
que possam impedir o trânsito de ideias e a ressignificação das identidades.”8 Toda
manifestação cultural está repleta de elementos e significados que identificam o povo a que
pertence, a uma determinada comunidade ou região.
4
GEERTZ, Cliford. A interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1989, p.24.
5
LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro: 24ª Ed. Jorge Zahar, 2009, p. 63.
6
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História & história Cultural, 2ª Ed., Belo Horizonte. Ed. Autentica, 2008, p.15.
7
LAZZARIN, Luís Fernando. Multiculturalismo e multiculturalidade: recorrências discursivas na
educação musical. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 19, 121-128, mar. 2008. p.124.
8
BURKE, Peter. O que é História cultural: Fronteiras e encontros. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 2005. p. 153.
19
Tendo como aporte teórico as bases da Nova História Cultural, destacamos que é
preciso analisar e compreender o objeto de pesquisa, no caso, o debate artístico e cultural,
neste aspecto, ainda tendo por base o que ressalta Pesavento:
Tais traços são, por sua vez, indícios que se colocam no lugar do acontecido, que se
substituem a ele. São, por assim dizer, representações do acontecido, e que o
historiador visualiza como fontes ou documentos para sua pesquisa, porque os vê
como registros de significados de questões que levanta. Estamos, pois, diante de
representações do passado que se constroem como fonte através do olhar do
historiador. (...) A História Cultural se torna, assim, uma representação que resgata
representações, que se incumbe de construir uma representação sobre o já
9
representado .
Neste contexto, os processos de representação estão sujeitos a intensas reformulações,
de acordo com os interesses que estejam em jogo. Woodward descreve que “a representação
inclui as práticas de significação e os sistemas simbólicos por meio dos quais os significados
são produzidos, posicionando-nos como sujeito. É por meio dos significados produzidos pelas
representações que damos sentido à nossa experiência e àquilo que somos” 10. Com a temática
proposta busca-se entender o processo do debate cultural da década de 1980 em Boa Vista,
haja vista, no período que compreende o espaço temporal, o cenário está em constantes
transformações.
Naquele período, Roraima, ainda era Território Federal, no entanto, já havia pressão
e articulações políticas que viabilizasse sua mudança para a condição de Estado. Contudo, o
enfoque do trabalho está em debater as questões culturais do então Território Federal de
Roraima.
O Movimento Roraimeira está ligado a representações roraimenses11 nas questões
culturais, em todos os seus segmentos, com todas as riquezas e sua complexidade nas
músicas, nas artes plásticas, na dança, na literatura e também na fotografia, o Movimento se
expressa na demonstração pública de luta pela valorização da arte, da cultura, na valorização
das belezas naturais, nas questões de diversidades socioculturais, nas expressões e símbolos
da cultura indígena local. Entende-se o sentimento do Roraimeira12 como algo que sempre se
alimenta da cultura, e varia de acordo com concepções subjetivas de pessoas, corpo,
9
Idem, p.42-43.
10
WOODWARD, Kathryn. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, Tomaz
Tadeu da (Org.) Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. 9. Ed. Petrópolis: Vozes, 2009, p. 17.
11
Aquilo que é próprio de Roraima.
12
Em entrevista concedia no dia 14 de março de 2013, o artista Eliakin Rufino, definiu o que seria sentimento
Roraimeira, sendo um sentimento de amor à cidade.
20
identidade. O Movimento esboça à tentativa de estabelecer, e conhecer um sentimento,
preservar as raízes culturais regionais, fomentando uma reflexão através da arte .
Em entrevista a Revista RAIZ no dia 07 de dezembro de 2006, Eliakin Rufino
explica o que foi o Movimento Roraimeira:
[…] é o nome de uma música do cantor e compositor paraense Zeca Preto. Esta
música foi classificada em 2° lugar no II Festival de Música de Roraima que
aconteceu em julho de 1984. É a primeira música que fala do povo e da paisagem
de Roraima. […] falava da nossa cultura e da nossa paisagem natural. Outros
artistas, de outras linguagens artísticas, que também utilizavam a temática local nas
suas obras, se juntaram a nós: nasceu aí o Movimento Cultural Roraimeira,
inspirado no Movimento Modernista e no Movimento Tropicalista, com o objetivo
de construir uma estética local e começar a esboçar e revelar uma identidade
cultural para o povo de Roraima. […] um Movimento Cultural (música, literatura,
fotografia, artes plásticas, dança) que reconhecia e acomodava todas as diferenças e
apontava para a diversidade e a pluralidade como a marca da nossa identidade13.
Ao descrever o Movimento Roraimeira, Eliankin Rufino relata como foi à gênese do
mesmo enfatizando que o nome dado foi tirado de uma canção do musico Zeca Preto, deste
modo o poeta apresenta as linguagens e expressões artístico-culturais que compunha toda
aquela manifestação que ajudou a difundir a cultura no então Território Federal de Roraima,
os artistas que envolveram diversas áreas da arte, fala das influências aponta que a temática
do grupo estava interligada as questões da fauna e flora presente, nas suas apresentações.
Em 1989, Eliakin Rufino foi entrevistado pelo Jornal de Roraima, neste período o
Movimento estava em expansão, o poeta explicava quais as temáticas do show Roraimeira,
esboçando sua preocupação ao reafirmar que o espetáculo estava voltado para a
conscientização das raízes boa-vistenses.
Ambos os integrantes acreditam que Roraimeira, não é somente um espetáculo.
“Fazemos parte de um Movimento Cultural, voltado para os temas regionais, que é a
linguagem universal, depois do Romantismo. A mistura perfeita entre música dança
e poesia proporciona aos espectadores uma constatação da realidade cultural de
Roraima”. Segundo Eliakim Rufino, a fórmula do espetáculo reúne duas condições
básicas para divulgar a arte e a cultura de Roraima. O show é cultural e educativo,
por isso tratamos especificamente temas regionais14.
Para Eliakim Rufino Roraimeira é puro regionalismo! Que por meio de suas artes, o
que se via e o que se ouvia, fazia parte do vocabulário e do cotidiano das pessoas que
moravam em Roraima, expressando toda beleza do regionalismo em poesias, músicas, dança,
fotografia, para deixar registrados fatos que não poderiam ser esquecidos, era preciso mostrar
13
14
RAIZ – Cultura do Brasil. www.revistaraiz.uol.com.br. Acessado em 11 de novembro de 2011.
JORNAL DE RORAIMA. Sucesso de “Roraimeira” terá reprise. Boa Vista, 11 de abril de 1991.
21
primeiramente aos roraimenses que havia cultura artística em Roraima, que devia ser
valorizada e aceita. Nesses entraves começava a ter uma preocupação relacionada a essas
discussões em relação à cultura e identidade.
Nesse ínterim, Stuart Hall15 em sua concepção de identidade, trata de questões
culturais e identitárias sob uma perspectiva relacional, sendo esta desenvolvida a partir da
problematização dos conceitos de identidade e cultura, “o próprio processo de identificação,
através do qual nos projetamos em nossas identidades culturais, tornou-se mais provisório,
variável e problemático”, propondo-nos pensar que tais conceitos ganharam novas
abordagens com a modernidade.
2.2 Plano Nacional de Cultura e suas influências em Roraima
Atualmente, a lei 12.433/2010 é a principal política pública desenvolvida pelo
Governo Federal, por meio do Ministério da Cultura, para incentivar os artistas brasileiros. O
Ministério da Cultura lançou “As metas do Plano Nacional de Cultura”, no dia 2 de
Dezembro de 2010, em ato continuo, no qual foi sancionada a lei n° 12.343/2010. Em seu
primeiro artigo ficou estabelecido o seguinte:
Art. 1° - Fica aprovado o Plano Nacional de Cultura, em conformidade com o § 3°
do art. 215 da Constituição Federal, constante do anexo, com duração de 10 (dez)
anos e regido pelos seguintes princípios: no Art. 2° inciso I, III, IV diz: reconhecer e
valorizar a diversidade cultural, étnica e regional brasileira; valorizar e difundir as
criações artísticas e os bens culturais; universalizar o acesso à arte e à cultura;
estimular a presença da arte e da cultura no ambiente educacional16.
Essa Lei serviu de impulso para muitos artista que, até então, não conseguiam dedicarse exclusivamente à sua arte, sendo necessário, como em quase todos os casos no Brasil, a
dependência de uma outra fonte de renda para que possa se manter. Como o Plano de Metas
foi possível perceber e por em prática a valorização cultural, mas principalmente, do artista.
Isso inspirou muitos outros pólos de cultura e abrirem caminho para novos aprendizes nas
artes, fez surgir escolas e oficinas voltadas para tal fim, levando em consideração,
primordialmente, a identidade regional.
15
16
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 10ª Ed., Rio de Janeiro: DP&A, 2005, p.12.
METAS
DO
PLANO
NACIONAL
DE
CULTURA.
content/uplods/2012/02/METAS_PNC_final.pdf. Acessado em 22/02/13.
www.Pnc.Culturadigital.br/wp-
22
As bases dessa Lei estão contidas na Constituição Federal de 1988, a qual assegura a
todos cidadãos brasileiros o incentivo a cultura, a proteção das diferentes formas de
expressão. Nesse ínterim, convém destacar, ainda, que é dever do Estado garantir a cultura e
proteger as diversas manifestações culturais. Deste modo, a Carta Magna, por meio de seus
enunciados, reconhece e valoriza a diversidade cultural, étnica e regional brasileira; valoriza e
difunde as criações artísticas e os bens culturais e; promove o direito à memória por meio dos
museus, arquivos e coleções.
23
3 UMA PROMOÇÃO RORAIMEIRA
3.1 A musicalidade Roraimeira
“Te achei na grande América do Sul
quero atos que me falem só de ti
e em tua forma bela e selvagem
entre os dedos o teu barro o teu chão
e em tuas férteis terras enraizar
a semente do poeta Eliakim
nos seus versos inerentes ao amor...”
(Roraimeira – Zeca Preto)
No trecho em epígrafe, que é parte da música Roraimeira autoria de Zeca Preto, que
foi escrita no ano de 1984, podemos perceber inicialmente, a presença de vários elementos
que são próprios do Movimento Roraimeira. A canção exalta em sua primeira frase a condição
de migrante a qual o compositor faz parte, ele, oriundo do Estado do Pará descreve seu
encantamento ao encontrar Roraima na imensidão da América do Sul, além de seu interesse
em querer conhecer os costumes e a história da região.
A partir de então, em parceria com outros artistas buscam apresentar Roraima ao
mundo tendo como suporte a inspiração em elementos da fauna e da flora, além das
manifestações indígenas e dos costumes da população regional, isso pode ser compreendido
no trecho “entre os dedos o teu barro, o teu chão”, pois há uma relação muito próxima com
artistas plásticos que também contribuíram para a formação do Movimento Roraimeira.
Portanto, vindo se juntar ao poeta Eliakin Rufino, que até então semeava sua arte por
meio de suas poesias, publicando em jornais locais e regionais da época. Vimos, então, que
anos mais tarde as sementes plantadas por Eliakin germinaram, cresceram e agora fornecem
frutos, dos quais os roraimenses, e outros brasileiros se deliciam, embalados pelos “versos
inerentes ao amor”.
O Movimento Roraimeira, tem como principais artistas, o grupo musical formado por
três componentes: Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto, suas marcas registradas são as
diversidades temáticas e a pluralidade musical que há muito tempo desenvolvem trabalhos
que estão relacionados à identidade cultural roraimense. Cuja característica é a valorização
indígena aliada a um caldeirão de sons que misturam ritmos caribenhos, amazônicos e
nordestinos.
24
No ano de 1991 o artista Eliakin Rufino deu uma entrevista para o Jornal de
Roraima17, descrevendo como foi o início do Movimento Roraimeira. Para o poeta:
[...] RORAIMEIRA começou em 1989, no teatro Amazonas, durante lançamento do
livro de Eliakin, evento que contou com a participação de músicos locais, exibida
em público a música “RORAIMEIRA”, de Zeca Preto, que deu idéia para o show
[…]. Com o êxito da festa, Eliakin, que fazia faculdade de Filosofia em Manaus,
descobriu que seria viável a realização de “uma noitada roraimense”. Que pouco
tempo depois foi executada por Eliakin, Neuber e Zeca Preto, no mesmo esquema
do show feito por eles no ano seguinte aqui em Boa Vista, onde não havia sido
apresentado um espetáculo desse tipo ainda. Após a apresentação os artistas
seguiram suas carreiras solo. Reencontrando-se em 88 quando Neuber Uchôa e Zeca
Preto gravaram o disco em conjunto, o 'caimbé' reacendendo a chama do
RORAIMEIRA.18
Na década de 1980, havia diversas manifestações artísticas das quais participavam,
inclusive, integrantes de origem indígena. Neste sentido nos propomos discutir as influências
como elementos modificadores culturais na cidade de Boa Vista. Dando destaque as canções
produzidas que retratavam a cidade, no sentido de representar suas belezas e atrativos
culturais: “Sons e ruídos estão impregnados no nosso cotidiano de tal forma que, na maioria
das vezes, não tomamos consciência deles. Eles nos acompanham diariamente, como uma
autêntica trilha sonora de nossas vidas, manifestando-se sem distinção nas experiências
individuais ou coletivas”19.
O espetáculo do grupo Roraimeira traz músicas, envolventes, ricas culturalmente que
identificam o estilo musical roraimense. O Trio Roraimeira20 lançou o LP “Roraima” (1992) e
o CD “O canto de Roraima” e suas influências indígenas e caribenhas, gravado ao vivo no
Teatro Carlos Gomes, em Boa Vista, RR, em abril de 2000.
Tendo sido selecionado para o Projeto Pixinguinha/2008, culminando no lançamento,
no dia 12 de agosto de 2009, no Palácio da Cultura (RR) o CD RORAIMEIRA – O canto de
Roraima. O Movimento Roraimeira foi objeto do “Documentário Roraimeira – Expressão
amazônica”, da série DOC-TV/MinC, do documentarista Thiago Bríglia, O documentário
aborda o Movimento Roraimeira, surgido em Roraima no início dos anos 1980, e que se
17
JORNAL DE RORAIMA. Sucesso de “Roraimeira” terá reprise. Boa Vista, 11 de abril de 1991.
18
Idem.
19
MORAES, José Geraldo Vinci de. História e música: canção popular e conhecimento histórico. Revista
Brasileira de História. São Paulo, v. 20, nº 39, p. 203-221. 2000, p. 204
20
Como ficou conhecido os integrantes do Movimento Roraimeira, composto pelos artistas; Eliakin Rufino,
Neuber Uchôa e Zeca Preto.
25
desenrolou no estado durante os dez anos seguintes. Artistas locais das artes plásticas, música,
dança e fotografia, lançaram seu olhar sobre os aspectos singulares da cultura roraimense,
elaborando uma efervescente cena artística popular. Foi exibido pela Rede Brasil no dia
27/08/2009.
O Movimento Roraimeira tem um vasto repertorio, entre essas letras de músicas
podemos destacam: Do norte, Canto das águas, Cruviana, Roraimeira, Makunaimando,
Cidade do campo, dentre outras canções. Tendo as músicas elementos de expressão da
valorização regional, difundidos e representados pelos músicos locais. Percebendo a
importância de preservar e resgatar os hábitos e costumes locais através das canções, no
contexto histórico e social, Bosi21 descreve a música como plural e não singular.
A música estabelece uma dimensão sem fronteira, é considerada ciência e arte, sendo
uma expressão artística, que não se importa com raça ou nível social, contém forte poder de
comunicação. Como aponta Faria “A música passa uma mensagem e revela a forma de vida
mais nobre, a qual, a humanidade almeja, ela demonstra emoção, não ocorrendo apenas no
inconsciente, mas toma conta das pessoas, envolvendo-as trazendo lucidez à consciência.”22
Ela é plural, valiosa, encanta, representa e transmite informações! É utilizada para expressar
sentimentos, revoltas, fortalecendo assim a cultura. Possui papel importante para o
enriquecimento humano, pois, trás consigo o poder de transformar sentimentos, ideias e
cotidianos. Nela sempre haverá dois lados. Neste sentido Morais esclarece que “Pois música
é, antes de mais nada, movimento. E sentimento ou consciência do espaço-tempo. Ritmos;
sons, silêncios e ruídos; estruturas que engendram formas vivas. Música é, igualmente, tensão
e relaxamento, expectativas preenchida ou não, organização e liberdade de abolir uma ordem
escolhida; controle e acaso”23.
Um dos fatores mais importante na construção de uma sociedade é sem dúvida sua
herança cultural e a música faz parte deste contexto relacionado à cultura. Para Thiago Pinto
as questões relacionadas às contribuições que a música apresenta estão descritas quando o
autor revelar que “música é manifestação de crenças, de identidades, é universal quanto à sua
existência e importância em qualquer que seja a sociedade. Ao mesmo tempo é singular e de
21
BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das letras, 1996.
22
FARIA, Márcia Nunes. A música, fator importante na aprendizagem. Assis chateaubriand – Pr, 2001. 40f.
Monografia (Especialização em Psicopedagogia) – Centro Técnico-Educacional Superior do Oeste Paranaense –
CTESOP/CAEDRHS. 2001. p.4
23
MORAES Apud OLIVEIRA, Reginaldo Gomes. Roraima, Amazônia de Makunaima e o ensino de Música.
(Programa de Pós-Graduação) CBM, Rio de Janeiro, 1991, p.45-46.
26
difícil tradução, quando apresentada fora de seu contexto ou de seu meio cultural”
24
.
Inferindo que a música é muito mais que sons e palavras, elas apresentam uma diversidade,
que não tem fronteiras, fazem parte da comunicação, descrevem fatos, acontecimentos,
emoções, revoltas e que são eternizadas pelos seus criadores.
O Movimento Roraima, em suas letras retratam as belezas do Estado, em suas
canções, representam o retrato típico da região, fazendo, por vezes, com que apenas os
familiarizados com a cultura local entendam o que determinadas letras ou palavras significam.
Este contexto expressado pelo autor citado nos remete que é fundamental e necessário
compreender os fatores que por ocasião fizeram parte da construção de determinadas canções,
para entender e analisar quais são as informações que a canção aborda.
Quando discorremos sobre música é essencial entender como se dá o processo de sua
construção, com isso podemos perceber a contribuição que a letra da música nos fornece, o
que ela traduz, como podemos visualizar sua perspectiva social e histórica e o que a canção
constrói, Moraes aponta:
Na realidade, a letra de uma canção, isto é, a “voz que canta” ou a “palavracantada”, assume uma outra característica e instância interpretativa e assim deve ser
compreendida, para não se distanciar das suas íntimas relações musicais. O
distanciamento relativo entre ela e a estrutura musical deve ser feito apenas com
intenção analítica, pois os elementos da poética concedem caminhos e indícios
importantes para compreender não somente a canção, mas também parte da
realidade que gira em torno dela.25
Assim, podemos perceber como as canções são importantes para a sociedade, pois
elas trazem e refletem um conjunto de informações, que são repassadas através de suas letras,
que identificam um cenário, descrevem fatos e são utilizadas como forma de manifestações.
Com relação à linguagem musical interna é necessário levar em conta variantes
básicas relacionadas com a linha melódica e o ritmo. A(s) melodia (s) principal(is),
os motivos musicais, o andamento, os ritmos e a harmonização, são elementos da
linguagem musical que podem ser analisados isoladamente e nas relações entre si,
pois têm um discurso e características próprias que normalmente apontam indícios
importantes e determinantes para sua compreensão.26
24
PINTO, Tiago de Oliveira. Som e música. Questões de uma Antropologia Sonora. REVISTA DE
ANTROPOLOGIA, São Paulo, USP, V. 44, nº 1, p. 222-286. 2001, p. 224.
25
MORAES, José Geraldo Vinci de. História e música: canção popular e conhecimento histórico. 2000,
p.215.
26
Idem.
27
A construção de uma música tem como base três elementos, que são eles: melodia,
harmonia e ritmo, a melodia identifica a música ou os sons sucessivos dando sentido a uma
frase musical, já na harmonia são vários sons executados. E por fim o ritmo é a parte métrica
da música.
Nas canções que fazem parte do repertório do Movimento Roraimeira, identificamos
questões relacionadas a um dialogo muito próximo com a realidade social, vivenciada no
então Território Federal de Roraima. Música deve ser entendida como arte e relacionada ao
conhecimento sociocultural.
Mas eles também devem ser compreendidos na lógica do desenvolvimento da visão
de mundo do autor que está, obviamente, vinculada também aos aspectos sociais e
culturais de um determinado gênero e estilo. Além disso, a forma instrumental, os
tipos de instrumentos e seus timbres, a interpretação e também os arranjos de um
dado documento sonoro contêm indicações fundamentais para compreender a
canção em si mesma e nas suas relações com as experiências sociais e culturais de
seu tempo.27
Ao descrevemos sobre a música, identificamos como são compostas as propriedades
do som, sendo elas: timbre, altura, intensidade e duração. Música é a arte de combinar os
sons. O Movimento Roraimeira, tem em suas canções uma mescla de informações, há uma
troca de conhecimento entre os nascidos na região e os migrantes que encontraram em
Roraima um lugar para viver.
A música faz parte da vida, ela está ligada as representações, estão inseridas nos
cotidianos de diferentes pessoas, remontam sentimentos, recordações, histórias vividas,
momentos que são eternizados através das canções em sua total pluralidade. Música é
linguagem.
As canções retratadas pelo Movimento Roraimeira, são entendidas como uma forma
de manifestação artística, onde buscam através da arte, debater questões, pertinentes
relacionadas aos habitantes nativos e migrantes de Roraima, embelezando e exaltando a fauna
e flora. As canções dão valiosas contribuições para a compreensão de como se deu a gênese
dos debates sobre a cultura de Roraima e com enfoque nas discussões identitárias.
27
MORAES, José Geraldo Vinci de. História e música: canção popular e conhecimento histórico. 2000,
p.215.
28
3.2 O poeta Eliakin28
Eliakin Rufino de Souza mais conhecido como Eliakin Rufino, nasceu no dia 27 de
maio de 1956, em Boa Vista–RR. Em seu currículo consta a publicação de dez livros de
Poesia, sendo eles: Pássaros Ariscos (1984), Poemas (1987), Escola de Poesia (1990),
Brincadeira (1991), Poeta de água doce (1993), Versão Poética do Estatuto da Criança e do
Adolescente (1995), Poesia para ler na cama (1997), Poeta de água doce, 2ª Edição (1999),
Haikai (2010) e Cavalo Selvagem (2011).
Lecionou Filosofia, Arte e História nas escolas da rede pública do Estado de Roraima
entre 1985 e 2001. No período entre 2002 e 2006 lecionou Filosofia na Escola de Aplicação
da Universidade Federal de Roraima – UFRR. De março de 2007 a novembro de 2009 foi
Gestor Cultural da Universidade Federal de Roraima. Desde 2010 leciona Literatura em
Roraima, no curso de Letras da Universidade Federal de Roraima - UFRR.
Participa de encontros de escritores, feiras de livros e eventos de literatura, em
diversas cidades brasileiras desde 1985. É presença frequente no Congresso Brasileiro de
Poesia em Bento Gonçalves - RS. Em 2012 participou da primeira Feira de Livros do Amapá,
em Macapá. E têm poemas publicados em antologias nacionais e internacionais. Foi premiado
em diversos festivais de poesia. Já gravou poemas em disco e faz shows de poesia falada por
todo o Brasil desde 1983. É autor da letra do Hino do Município de Boa Vista - RR.
Lançou cinco CD’s solos e autorais: Amazônia legal (1997), Me toca (1998), Eliakin
em Porto Alegre ao vivo (2006), Mestiço (2008) e Eliakin Diz (2011). Lançou, em parceria
com Armando de Paula, o CD infantil Os Direitos da Criança, versão poética e musical do
Estatuto da Criança e do Adolescente -ECA, em dezembro de 2008.
Possui composições gravadas em coletâneas, CD’s de festivais e CD’s com parceiros,
tais como: Nilson Chaves (PA), Zé Miguel (AP), Graça Gomes (AC), Bado (R0) e Célio Cruz
(AM). Participou da gravação do DVD “Gente da mesma floresta”, lançado pelo Instituto Itaú
Cultural (SP) em 2008.
Participa de festivais e faz shows de música por todo o Brasil desde 1980. Em 1998
fez sete shows na Alemanha, nas cidades de Frankfurt e Berlim. Em 2012, convidado por
Jurandir Costa e Fernanda Kopanakis, fez shows na cidade de Coimbra, em Portugal e nas
cidades de Praia e Mindelo, no Cabo Verde.
28
Todas as informações descridas, a respeito da biografia do artista foram prestadas por Eliakin Rufino
29
Suas músicas já foram gravadas por diversos artistas da região norte, entre eles, Leila
Pinheiro (Ditados impopulares), Aíla Magalhães (Todo mundo nasce artista), Nilson Chaves
(Tudo índio), Marco Monteiro (Plural), Eliana Printes (Madrugada), Cileno (O mundo vai
acabar), Lucinha Bastos (Pimenta com sal), Netinho Solimões (Carta do Amazonas) entre
outros.
Foi um dos 55 selecionados do “Rumos Itaú da Música”, edição 2007/2009 e
realizou seu show no Instituto Itaú Cultural no dia 8 de março de 2008, o show foi exibido
pela TV Cultura (SP) no dia 20 de julho de 2009. Fez parte do documentário Roraimeira –
Expressão amazônica, da série DOC-TV/MinC, do documentarista Thiago Bríglia, exibido
pela Rede Brasil no dia 27/08/2009.
Teve trabalho selecionado para o Projeto Amazônia das Artes, promovido pelo
SESC, ocasião em que realizou show musical no Terminal Turístico de Santarém no dia 7 de
agosto de 2009.
Organizou em Boa Vista, em 1995, um encontro de escritores da região norte do
Brasil com a presença do poeta Thiago de Mello, entre outros convidados. Produz, desde
1991, shows de música, dança, teatro e poesia, de artistas roraimenses e de outros Estados.
Além de produzir e/ou participar em Boa Vista e outras cidades da Amazônia, desde 1995, do
Show da Consciência Negra, no dia 20 de novembro, em virtude desse evento compôs a
música Palmas pra Zumbi.
Publicou na imprensa escrita de Roraima, entre 1988 e 1998, mais de 300 artigos de
opinião sobre os mais diversos assuntos e temas, período em que também apresentou
programas culturais no rádio e na televisão, sobretudo entre os anos de 1987/1992, em Boa
Vista - RR.
Produziu mais de 60 eventos artísticos no espaço cultural Casa do Poeta, em Santa
Cecília (RR) entre setembro de 2001 e abril de 2004. Vindo mais tarde lançar o seu CD
“Batida Brasileira” em 2009. Em 2011 integrou a turnê da cantora Euterpe por 10 cidades da
Amazônia Legal. Em 2012, convidado pelo cantor e compositor Carlos Farias, participou do
projeto Terças Poéticas, do Palácio das Artes, em Belo Horizonte - MG, acompanhado de sua
filha, a poeta Odara Rufino.
30
3.3 A “Cruviana” de Neuber Uchôa29
Neuber Uchôa nasceu em Boa Vista, capital de Roraima e, ainda criança, começou a
cantar em programas de auditório. Na adolescência, descobriu o violão e passou a compor as
primeiras canções, mas somente aos 21 anos de idade, em 1980, nasceu a música que seria um
dos seus maiores hits: Ave, 3º lugar no I Festival de Música de Roraima. A canção foi gravada
cinco anos depois, num compacto simples, produzido em junho daquele ano no Rio de
Janeiro.
Daí em diante, shows e discos estão sendo produzidos pelo artista que, juntamente
com Eliakin Rufino e Zeca Preto formam a “Regionalíssima Trindade” do Movimento
Roraimeira, que se propõe a traduzir Roraima em sua estética artística e cultural.
Dessa fase regionalista, destaque para as músicas: Cruviana, Nossa Bossa, além de
Makunaimando (parceria com Zeca Preto), verdadeiros hinos de Roraima. Outro momento
marcante foi à produção do programa Roraimeira na TV, dirigido e apresentado pelo grupo
em 1992, na TVE (TV Educativa) e reapresentado em rede nacional naquele mesmo ano, além
dos espetáculos realizados na cidade do Rio de Janeiro, durante o projeto “Cantorias
Amazônicas”, no Centro Cultural do Banco do Brasil - CCBB, em janeiro e fevereiro de
2000. Destacam-se ainda os discos e shows produzidos em parceria com Zeca Preto, entre os
quais uma pequena turnê pelo Norte e Distrito Federal, além de shows na Suíça e Venezuela.
Nessa fase pós-regionalista, vale lembrar as apresentações no Centro Cultural
Carioca e na Lona Cultural de Campo Grande, ambas no Rio de Janeiro, durante o lançamento
do CD Muito Prazer (2002). Na mesma época, Neuber divide o palco do Olímpia com Sandra
de Sá e Elba Ramalho, entre outros, no show de 85 anos do Retiro dos Artistas. Também fez
shows em Niteroi e Cabo Frio, no Rio de Janeiro. Ouvindo e compondo, Neuber acumulou
repertório e experiência que se somaram ao swingue forjado na mistura de ritmos afro-latinos
com a brasilidade amazônica, nascendo daí uma batida própria.
Discografia:
Compacto simples AVE – solo (RJ-1985); LP Caimbé – parceria com Zeca Preto (RJ-1988 );
LP Roraima – parceria com Zeca Preto e Eliakin Rufino (PA-1992); CD Makunaimeira –
parceria com Zeca Preto (PA-1994); CD Amazon Music – parceria com Zeca Preto (PA1997); CD O Canto de Roraima – parceria com Zeca Preto e Eliakin Rufino (RR-2000); CD
29
Informação prestadas em entrevista para o site http://bomgadamata.wordpress.com/2008/07/13/neuber-uchoaum-amazonida-popular/ acessado em 01/03/13
31
Muito Prazer – solo (RJ-2002); CD Eu Preciso Aprender a Ser Pop – solo (SP-2006)
3.4 “O Filho de dona Neuza”: Zeca preto30
José Maria de Souza Garcia, conhecido artisticamente como Zeca Preto nasceu em
Belém no dia 10 de outubro de 1950. Embora tenha nascido em Belém do Pará, foi no Estado
de Roraima em que fincou suas raízes,em Boa Vista -RR desde 1975.
Zeca Preto é compositor, cantor e poeta e há mais de 30 anos canta as belezas da
região Amazônica. Utiliza termos indígenas e ritmos que mesclam as influências musicais do
norte do país, como o Carimbó e o Siriá com o Merengue e a Salsa do Caribe.
Em 1980, no II FEMUR Festival de Música em Roraima obteve o segundo lugar com
a canção Macuxana. Em 1984, no III FEMUR obteve novamente o segundo lugar com a
música Roraimeira, que é sucesso até hoje. Em 1987, Zeca lançou o livro de poemas Beiral.
O evento aconteceu no próprio local. Em 1995, no XVII FEMUCIC Festival de Música
Cidade Canção ganhou o melhor arranjo na cidade de Maringá no Paraná.
Em 1996, no XVIII FEMUCIC, ganhou em parceria com Neuber Uchôa primeiro
lugar com música Canto das Pedras, sendo agraciado com a primeira faixa do CD do
Festival. Também na cidade de Maringá no Paraná. Zeca Preto já realizou em Roraima
centenas de eventos culturais como: (Shows em teatros, Ginásio de Esportes, Praças públicas,
Feiras, Penitenciária, Hospitais, Parques, Rede escolar estadual e municipal, creches,
Universidade, etc.) e já se apresentou em várias cidades. Inclusive já esteve no exterior como
Venezuela e Suíça. Em 2009, Foi agraciado com o Projeto Pixinguinha. Foi Tema do DOC TV
IV- Roraima Expressão Amazônica. Foi escolhido para elaborar texto poético para Agenda
Caixa Econômica Federal.
Discografia
LP Gresem: Compacto Duplo (1984); LP Roraimeira (1985); LP Caimbé (1988); LP
Roraima: e Fita Cassete (1991); CD Makunaimeira (1994); CD Amazon Music (1997); CD O
Canto de Roraiama (2000); CD Na Ponta do Norte (2001); Tempo de Jambo (2004); Nada de
Concreto (2008); Roraimeira - O Canto de Roraima (Zeca Preto, Neuber Eliakin) (2009); A
Nata: (Zeca Preto e Neuber) Coletânea (2009); Mãedioca (2010).
30
Informações obtidas no site http://antologiamomentoliterocultural.blogspot.com.br/2010/12/zeca-pretoentrevista-n-289.html. Acessado em 01/04/13
32
CDs Coletivos:
VI FEMUR; XVIII FEMUUCIC ; VII FEMUR; CANTA RORAIMA 2002 (4 músicas); M. P.
RORAIMA – SESC/RR
Livros Coletivos:
500 Outonos de Versos
Colaborador:
O Pasárgada Sociedade Poética; Revista Eletrônica Magriça; Jornal da Poesia;
Livros Individuais:
BEIRAL: livro de poemas (1987); BEIRAL e outros (2011)
33
4 DECADÁ DE 1980: AS NOTÍCIAS DO RORAIMEIRA.
“Sigo meu destino de nortista,
sou peixe-boi, arara, onça pintada, preguiça.
Eu pertenço a tribo dos artistas, sou musico,
poeta equilibrista, passista.
Não põe tua canoa atrás da minha porque eu sei,
você vai se alagar ligeiro.
Eu sou do norte de canoa viajo o mundo inteiro,
paçoca com banana, sombra, sol, buritizeiro.
Mas esse cheiro de peixe, esse embalo de rede! Rede!
Esse jeito de ser do norte...”.
(Do norte - Zeca Preto e Eliakin Rufino)
Ao se identificar como homem do norte, automaticamente os autores da canção se
inserem ao ambiente amazônico unindo elementos da natureza com ações próprias das áreas
urbanas. Também expressam suas condições como artistas para expressar suas ideias acerca
da região por meio de sua arte, sendo elas com canções, poesias, danças, imagens e tantas
outras manifestações possíveis.
Ao mesmo tempo em que buscam se fixar como expressão artística e cultural,
sobretudo em Roraima e na Amazônia, a frase “Não põe tua canoa atrás da minha porque eu
sei você vai se alagar ligeiro”, pode representar a perseverança dos artistas na expectativa de
se tornar um “Movimento” permanente e não apenas um modismo, algo de momento.
Procuram expressar o desejo e o sentimento de que sua arte se expanda por todos os rincões,
atravessando as fronteiras de Roraima e ganhando o mundo. Sua mensagem principal se
baseia nos costumes locais, como comidas, hábitos e fazeres, sempre com a calma e a
tranquilidade e peculiaridade do nortista, como no “embalo de rede” próprio do “do ser
norte”.
4.1 O uso de jornais como fonte de pesquisa
Ao optar em trabalhar com jornais, o historiador precisa ter a noção de que eles
narram fatos que aconteceram, no mínimo, no dia anterior, efetivamente são narrativas do
passado,
ainda
que
recente
e
com
prováveis
desdobramentos
imediatos
na
contemporaneidade31. É interessante enfatizar que o tema central de cada periódico é disposto
de acordo com os interesses daqueles que os escrevem.
Ao nos reportamos aos jornais de que circularam e ainda circulam em Roraima
percebemos que a imprensa do Estado sempre esteve voltada para as questões políticas de
31
ABUD, Kátia Maria. Ensino de história. São Paulo: Cengage Learning, 2010, p. 27.
34
interesse não das massas, mas sim das elites. No período analisado ficou visível o foco das
noticias.
Contudo, precisamos ter consciência de que o jornalista não é um historiador. A ele
cabe a divulgação da notícia e a venda de seu periódico, ao contrario do historiador que irá
analisar, ou não, o fato ali publicado caso o eleja como objetos de sua pesquisa. Nesse sentido
Kátia Abud discorre a diferença entre o historiador e o jornalista, para ela: “historiadores
(grifo nosso) estes estudam o passado baseados em conceitos e métodos específicos, os
jornalistas, por sua vez, produzem narrativas que são registradas e lidas em jornais, revistas,
sites, rádio e televisão”32.
É muito importante de que independente do jornal, o pesquisador que utiliza esse
tipo de periódico como fonte não deve perder de vista que o mesmo nunca deve ser tomado
com efeito de verdade, mas sim como representação de grupos sociais sobre si mesmos e a
realidade que os cercam.
Tomar o jornal como fonte não significa pensá-lo como detentor de verdades; ao
contrário, o que se propõe é pensá-lo a partir de suas parcialidades, a começar pela observação
do grupo que o edita, das sociabilidades que este grupo exercita nas diferentes conjunturas
políticas, das intenções explícitas ou sutis em exaltar ou execrar atores políticos. Em outras
palavras, observar as múltiplas vinculações que a fonte tece com o meio propicia ao
pesquisador “olhar os documentos e decodificá-los a partir de seus usos e finalidades”.33
Os jornalistas, porém, ao narrar fatos contribuem com a História, pois seu trabalho,
convertido em documentos, passa a ser utilizado por historiadores no cruzamento com outras
fontes de informação, para que se compreendam as sociedades do passado e suas formas de
relacionamento, representações, conflitos, jogos de forças e significados presentes na
memória34.
Outra vantagem ao trabalhar com periódicos (jornais) é a possibilidade de alinhar
textos e imagens, sobretudo fotografias e charges, nos fornecendo, assim, informações
recentes ou, quando distanciada historicamente, nos dá indícios e dados sobre mudanças e
permanências.
32
Idem. p. 27.
SAMARA, Eni de Mesquita; TUPY,Ismênia S. S. T. História & Documento e metodologia de pesquisa.
Belo Horizonte: autêntica, 2007.
33
34
ABUD, Kátia Maria. Ensino de história. 2010, p. 27.
35
4.2 As notícias do Roraimeira
Quadro 1 – jornais e manchetes sobre o Roraimeira
DATA
JORNAL
NOTICIA/MANCHETE
10/1984
Boletim da
educação e
cultura
Roraimeira em ação
Exalta a apresentação do show Roraimeira no cine Super
K; Define o movimento e dá conta de seus objetivos.
05/10/1984
Folha de
Roraimeira: a vida nativa
vai ao palco
Trata de um espetáculo cuja finalidade é adquirir recursos
para a gravação do LP Roraimeira. Pedem apoio ao
empresariado local e autoridades. “É preciso que todos
conheçam nosso trabalho para que possam reconhecê-lo”.
Cultura e arte: teimosia
em Roraima
Gênese do Movimento Roraimeira; critica ao poder
publico em realção a arte e questionamentos a não
publicação do livro 1ª Antologia dos poetas roraimenses;
Lei Sarney de incentivo a cultura.
Arte e cultura – um ato
de teimosia
Posição política de Eliakim Rufino; falta de políticas
públicas e/ou apoio do governo para a cultura; tentativa de
explicar a formação da identidade cultural em Roraima por
Eliakim Rufino; trabalho do Zeca preto e crítica ao
governo; contraponto empresarial x incentivo à cultura;
Artistas
levam
“Roraimeira” ao palco do
Sesc
Destaca que o Roraimeira se apresenta depois de sete anos
depois da primeira apresentação; traz uma sinopse do que
é e como surgiu Roraimeira a partir de uma visão de
Eliakim Rufino.
Luz, Câmera, Roraimeira
Comenta o show Roraimeira, realizado no palco do SESC,
com a participação de Vânia Rufino, e a nova parceria
oportunizada pelo SESC e empresários locais. Conta ainda
da caravana que iria viajar pelos municípios de Roraima.
Boa Vista
Hoje e amanhã tem
“Roraimeira” no Carlos
Gomes
Alude o surgimento do grupo em uma apresentação no
Teatro Amazonas em 1984 o qual traz o espetáculo para
Boa Vista e dá inicio ao movimento; também dá uma
conotação, segundo a visão dos integrantes, quanto a
origem e função do movimento Roraimeira.
Folha de
Show Roraimeira
Apresenta o show Roraimeira e dá conta de que a renda
será destinada à edição de um livro e gravação de disco;
aponta a dança zôo-dança e a dança indígena.
Eliakim critica abandono
do Teatro Carlos Gomes
Demonstra aspectos do show Roraimeira o qual tinha
como finalidade arrecadar fundos para a edição de um
livro de Eliakim e a gravação de um disco com Neuber e
Zeca; Eliakim critica o abandono em que se encontrava “a
única casa de espetáculos de Roraima”, o Teatro Carlos
Gomes.
Exposição
Lamenta o fim da Lei Sarney; exalta a atitude de Eliakim
ao abrir sua casa e fazer da mesma uma galeria “A
Cunha” para exposições permanentes de artistas.
Boa Vista
22/01/1989
Folha de
Boa Vista
13/08/1989
A Critica
de
Roraima
10/03/1991
O Estado
de
Roraima
21/03/1991
Folha de
Boa Vista
13/04/1991
15/06/1991
Folha de
Boa Vista
18/06/1991
Jornal de
Roraima
23/06/1991
Jornal de
Roraima
RESUMO
36
Para iniciarmos este tópico utilizamos a tabela acima, na qual descrevemos os jornais
da época, destacando as datas, jornais/manchetes relacionadas ao Movimento Roraimeira, e
um resumo das noticias que serão utilizados como analise sistemática do período em questão.
Os jornais selecionados seguem uma ordem cronológica, sendo que grande parte dos jornais
foram cedidos do acervo pessoal do artista Eliakin Rufino. Foram selecionadas dez manchetes
relacionadas às falas dos artistas; Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto, que buscavam
por meio da mídia impressa meios de transmitir sua arte e por em debate questões
relacionadas a cultura e identidade de Roraima. Também o professor Reginaldo Gomes de
Oliveira, que fez parte da gênese do Movimento.
A década de 1980 trouxe inúmeras manifestações artísticas a nível nacional e
também local. Foi um período em que surgiram bandas de rock nacional, música sertaneja e
outros estilos. A qualidade das músicas e das letras inspiraram, e ainda hoje inspiram, jovens
por todas as partes. Em Roraima surgiu o Movimento Roraimeira que se tornou sinônimo de
cultura e arte e a maior representação da identidade cultural da região, tendo sido reconhecido
nacionalmente.
RORAIMEIRA é um movimento idealizado por artistas plásticos, músicos,
compositores, poetas e coreógrafos, a maioria deles natural de Boa Vista e visam
com isso, o que de bem existe em termos artísticos no Território. O objetivo maior
desse movimento segundo Eliakin, um dos compositores, é conquistar um espaço,
fazer ver aos olhos dos críticos e de toda a população que, aqui, existes talentos que
devem se mais incentivados e explorados não só a nível local como, também, em
termos de Brasil.35
Naquela década, um periódico que circulava na cidade de Boa Vista intitulado,
Educação & Cultura, publicou, em outubro de 1984, um artigo denominado Roraimeira em
Ação. No teor da matéria, que exaltava a apresentação do show Roraimeira, no Cine Super K,
destacava o repertório dos compositores e músicos locais que abordavam não só o
regionalismo roraimense como, também, um estilo que definia a música popular brasileira.
O periódico continuou a exaltar o trabalho e a apresentação dos artistas e procurou
definir seus objetivos da seguinte forma segundo Eliakin: “é conquistar um especo, fazendo
ver aos olhos dos críticos e de toda a população que, aqui, existem talentos que devem ser
mais incentivados e explorados não só a nível local como, também, em termos de Brasil.” 36
35
36
BOLETIM DA EDUCAÇÃO & CULTURA. Roraimeira em Ação. ANO I, Out. 1984.
Idem.
37
Com o tema: Roraimeira: a vida nativa vai ao palco, o jornal de Boa Vista, de 05 de
abril de 1984, descreve que os artistas Zé Maria, Neuber e Eliakim, são as pessoas que estão
“pesquisando a linguagem artística e musical do Território”. Demonstrando que em sua
gênese o Movimento Roraimeira, já apresentava um espetáculo profissional e que almejavam
um reconhecimento local e com pretensões a níveis nacionais. Isto é visivelmente percebido
quando o trio trabalha para a construção do primeiro LP. Em sua fala Neuber afirma que “o
espetáculo tem a finalidade de sensibilizar, através de um trabalho bem feito, as demais
autoridades e os empresários no sentido de que deem maior apoio aos artistas locais que hoje,
mesmo sem condições, tentam desenvolver a linguagem artística e cultural do Território”.37
O jornal Folha de Boa Vista publicou Cultura e Arte: teimosia em Roraima, Murilo
Souza apontar o embrião de como se deu as primeiras discussões que remetiam os
questionamentos, sobre a cultura e identidade em Roraima, enfatizando que seu início, tem
como base pontos em comum, neste período ainda não havia a formação do Movimento
Roraimeira: “A cultura e a arte em Roraima ainda são teimosia de uns poucos aventureiros,
que no início da década de 80, com a realização do 1º festival da Música Popular Roraimense
chegaram a conclusão de que tinham alguma coisa em comum, na sua música, na sua poesia,
na sua arte. Nascia o movimento “Roraimeira”38
A matéria enfatiza que nesta época não havia incentivos por parte do poder público,
contudo, Eliakin sobressalta que “pouco ou nada se fez de lá pra cá” 39, neste caso ressaltamos
que o poeta se referia ao período que aconteceu o 1º Festival de Música Popular Roraimense,
que ocorreu no ano de 1984. Expondo que isso continuou mesmo após a realização do
festival, ao salientar que a falta de apoio acontecia mesmo transcorridos quase dez anos da
realização do 1° Festival, não havendo nenhum incentivo, para divulgação da arte e cultura
em Roraima.
O poeta esboça ainda que “a produção artística existe, porém o que não há é
incentivo para escoar-se esta produção”40. Em sua fala podemos inferir que há uma busca
incessante por parte dos artistas roraimenses, que querem mostrar sua arte, mais infelizmente
não tem o apoio necessário, para desenvolver seu trabalho. Como pode ser vista na citação a
seguir concedida ao jornalista Murilo Souza (1989) ainda em entrevista com Eliakin, descreve
que “[...] O mercado de arte em Roraima ainda é restringidíssimo à uns pouco com um mínino
37
Idem.
JORNAL FOLHA DE BOA VISTA. Cultura e Arte: teimosia em Roraima. Boa Vista, 22/01/1989.
39
Idem.
40
Idem.
38
38
de sensibilidade e poder aquisitivo. O próprio Governo do Estado e a Prefeitura Municipal,
através de seus órgãos competentes para promover a cultura, nada fazem ”41Um dos grandes
problemas enfrentados pelos artistas locais, era o descaso e a falta de incentivo do poder
público, que impossibilitava o crescimento da arte e cultura de Roraima.
Seguindo com a manchete, no domingo o jornal A Critica de Roraima, trouxe uma
matéria que embora pareça um trocadilho jornalístico e que por vezes pode levar o leitor, a
pensar que é semelhante à notícia, exposta no jornal anteriormente trabalhado aborda as
questões relacionadas à cultural no Estado, com “Arte e Cultura – um ato de teimosia”42
através das noticias entendemos como era difícil trabalhar com a arte e cultura no então
Território: “As pessoas que ainda se ocupam de tentar fazer arte em Roraima podem ser
consideradas destemidas”
43
. Com isso reafirmamos a falta de incentivos para o
desenvolvimento dos artistas em Roraima.
A escritora romancista, radicada em Roraima, Nenê Macaggi foi um exemplo de
perseverança e persistência na produção e divulgação da arte, pois a mesma presa em uma
cadeira de rodas aos 76 anos, trabalhava cinco horas por dia, para assim poder concluir sua
obra. É dela que parte a seguir o trecho retirado do jornal, A Crítica de Roraima, em tom de
desabafo, relata o descaso em relação à promoção da arte e cultura, no então Território de
Roraima, como podemos perceber no trecho a seguir: “se eu não estivesse presa nesta cadeira,
sairia com os originais debaixo do braço atrás [sic] do patrocínio para a publicação. Porém,
acredito em meu talento e que este patrocínio venha até mim”44 desabafava a escritora.
Em sua fala Eliakin descreve como era relacionada à cultura no então Território de
Roraima, enfoca as questões da migração, comentando sobre os dois caminhos percebidos por
ele ao remete que em Roraima a cultura indígena, estava sendo deixada para trás com a
inserção imposta da cultura “branca”, ou seja, havia uma negação por parte de pessoas que
residiam em Roraima, que simplesmente ignoravam todos os costumes tradicionais indígenas,
e tentaram impor a cultura trazida por migrantes oriundos das diversas regiões brasileiras.
Segundo o poeta Eliakim, duas vertentes principais formadoras da cultura
roraimense: a cultura indígena – altamente esmagada pela cultura “branca” – e a
cultura imposta pela maciça miscigenação componedora entre estas duas linhas pode
41
Idem.
A CRITICA DE RORAIMA. Arte e Cultura – um ato de teimosia. Boa Vista, 13/08/1989.
43
A CRITICA DE RORAIMA. Arte e Cultura – um ato de teimosia. Boa Vista, 13/08/1989.
44
Idem.
42
39
ser sentido naquilo que Rufino classifica como neocolonialismo, que seria a nova
colonização de Roraima, verificada após a invasão garimpeira.45
Dando sequência a entrevista de Eliakin para o jornal, ele aborda que “[...] o povo
roraimense era composto por nativos da própria região norte e nordestinos que para cá
migraram em busca do sonho dourado. Com o advento do garimpo em grande escala, as
miscigenações que já eram sentidas e que refletiam sobre a nossa cultura praticamente
esmagaram o que restava da cultural local”46. Com essa afirmação, o poeta esclarece os
motivos das discussões pertinentes envolvendo a temática da cultura e identidade local, que é
deixada de lado, para inserir novos costumes e outros discursos, enfatizando que a população
roraimense, era predominantemente indígena, e aponta os motivos dessa mudança no cenário,
com o fluxo minerador. Sendo que um dos fatores motivadores para o aumento populacional
está ligado, sobretudo, a abertura do garimpo: “Em Roraima, a cultura local é totalmente
desprestigiada pelos órgãos encarregados de promovê-la e de preservá-la, [...] além de um
total descaso para com os produtores culturais. Eu chego a dizer que todos aqueles que
trabalham com a cultura no Estado, estão pagando para fazer arte”.47
O poeta discorre com indignação e tristeza a total falta de incentivo a cultura, o
descaso do poder público em relação ao desenvolvimento da arte e da cultura em Roraima,
Eliakin também denúncia que para se ter arte em Roraima era necessário que os artistas,
encontrassem outros meios de promover a cultura, como ele mesmo afirma, “tirando do
próprio bolso” para assim divulgar sua arte.
No jornal supracitado, O Estado de Roraima, de 1991, enfatiza o significado do
Movimento Roraimeira. Podemos, também, observar a consumação do Trio Roraimeira e
como foi noticiado naquele periódico houve a apresentação do show Roraimeira no palco do
SESC-RR. É importante salientar que o trio é fruto do Movimento Roraimeira, mas a partir de
então, passaram a se apresentar juntos incorporando o nome do Movimento.
O Trio Roraimeira ganhou notoriedade, a partir de então, sendo amplamente
divulgado na mídia, produzindo shows, gravando discos e CD’s, difundindo a arte por todo
Roraima, e em seguida, para o Brasil. Percebe-se portanto que o Trio se torna mais conhecido
que o próprio Movimento que o originou.
45
Idem
Idem
47
A CRITICA DE RORAIMA. Arte e Cultura – um ato de teimosia. Boa Vista, 13/08/1989.
46
40
Fazendo alusão ao show Roraimeira, o jornal Folha de Boa Vista, do dia 21 de março
de 1991, circulou a matéria Luz, Câmera, Roraimeira. Expressava que o show, apesar da
simplicidade cênica, proporcionou momentos de diversão e descontração ao público presente,
que segundo o jornal era composto por uma plateia seleta, e devido a entrada franca o espaço
do SESC ficou pequeno. “Com poucos recursos cênicos e apenas violão e percussão, o
espetáculo abre espaço para a poesia picante de Eliakim, que abre o show com um poema
“alertando” para a situação do homem-animal-homem. Eu sou o cavalo selvagem”48
Nos chama atenção, em especial, uma guinada no meio artístico roraimense. Se a
década de oitenta, conforme pudemos observar nos jornais daquela época já trabalhados nesta
monografia, o apoio e incentivo dedicado a arte e a cultura roraimense eram quase que
inexistentes, os anos iniciais da década de noventa demonstraram algo no sentido inverso,
aliados ao SESC e tendo patrocínio de empresários locais o Trio Roraimeira se preparava para
divulgar seus trabalhos pelo interior de Roraima. “A caravana espera poder dar continuidade
ao trabalho, no interior do Estado, já contam com o patrocínio de empresários locais e do
próprio SESC, mas esta nova investida acarreta mais despesas, por isso tentarão ampliar o
número de patrocinadores” 49.
Cerca de um mês após a apresentação do grupo50 Roraimeira no SESC, o jornal
Folha de Boa Vista, publicado em 13 de abril de 1991, repete o mesmo espetáculo no teatro
Carlos Gomes. Na entrevista para o jornal, os artistas ressaltam a importância do show
Roraimeira e suas características enfatizando o sentido de expressar e difundir as
peculiaridades da cidade onde habitam:
Ambos os integrantes acreditam que Roraimeira, não é somente um espetáculo.
‘Fazemos parte de um movimento cultural, voltado para os temas regionais, que é a
linguagem universal, depois do Romantismo. A mistura perfeita entre música dança
e poesia proporciona aos espectadores uma constatação da realidade cultural de
Roraima.
Segundo Eliakim Rufino, a fórmula do espetáculo reúne duas condições básicas para
divulgar a arte e a cultura de Roraima’. O show é cultural e educativo, por isso
tratamos especialmente de temas regionais.51
48
JORNAL FOLHA DE BOA VISTA. Luz, Câmara, Roraimeira. Boa Vista, 21/03/1991.
JORNAL FOLHA DE BOA VISTA. Luz, Câmara, Roraimeira. Boa Vista, 21/03/1991.
50
Embora estejamos trabalhando o Trio Roraimeira, composto por Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto,
salientamos que o Jornal Folha de Boa Vista o caracteriza como “grupo”, isso si deve à participação de outros
artistas que atuaram naquele show.
51
JORNAL FOLHA DE BOA VISTA. Hoje e amanhã tem “Roraimeira” no Carlos Gomes. Boa Vista,
13/04/1991.
49
41
Os artistas que cantam a terra! Assim podemos descrever o Trio Roraimeira; são
reconhecidos em seus shows com repertórios que expressam suas vivências em Roraima,
esboçam com arte toda a beleza da fauna e flora do Estado, apresentando sempre seu
repertorio plural em seus espetáculos, descrevendo a importância de conhecermos os
costumes regionais dando ênfase em relatar e apresentar a arte e a cultura em Roraima,
apontando sua peculiaridade, seu jeito simples de viver, demonstrando o caldeirão de
informações pertinentes dos nascidos em Roraima, os povos indígenas.
Em 15 de junho de 1991, o jornal Folha de Boa Vista, mais uma vez tem em suas
manchetes o Show Roraimeira. A matéria enfatiza que o objetivo do espetáculo será para
financiar a gravação de um disco e para edição de um livro. O evento ocorreu no teatro Carlos
Gomes, a temática do espetáculo é apresentada como sendo: “Show é regional e os ritmos
possuem uma forte influência e bem harmonizada influência nordestina, assim como
amazônica, afro e caribenha”52. Justificando por que o Movimento Roraimeira é plural e
composto por um caldeirão de influências.
Em tom de desabafo, Eliakim Rufino concedeu entrevista para o Jornal de Roraima
no dia 18 de junho de 1991, denunciando o descaso e o abandono daquela que por ele foi
identificada como sendo a “única casa de espetáculo” de Roraima, naquele período. O jornal
enfatizava, na fala do poeta, o total abandono por parte do poder público em relação ao Teatro
Carlos Gomes e prossegue sua retórica afirmando as péssimas condições físicas e estruturais
do teatro. Eliakim expõe que foi preciso que os artista se responsabilizassem pela limpeza do
ambiente, climatização, sonorização, iluminação e até da segurança, pois do contrário, não
teria havido o show.
No domingo ao final do show, Eliakim fez uma crítica ao “abandono em que se
encontra a única casa de espetáculos de Roraima”, referindo-se ao teatro Carlos
Gomes, que não conta com sistema de som e, naquela noite, “nem vigia tinha, nós é
que improvisamos tudo, ligamos ar-condicionado, as luzes e colocamos a casa para
funcionar”53
Face ao exposto na entrevista acima, Eliakim Rufino abre as portas de sua casa,
localizada em Cidade Santa Cecília, criando o espaço “Casa do Poeta”, um local destinado a
apresentações das mais diversas expressões artísticas e culturais. A atitude do poeta coincide
52
53
BOLETIM DA EDUCAÇÃO & CULTURA. Roraimeira em Ação. ANO I, Out. 1984.
JORNAL DE RORAIMA. Eliakim critica abandono do Teatro Carlos Gomes. Boa Vista, 18/06/1991.
42
justamente como o fim da Lei de Incentivo a Cultura (Lei Sarney54). Essa entrevista
concedida ao Jornal de Roraima no dia 23 de junho de 1991, serviu para reafirmar a
importância do Movimento Roraima como marco da identidade artística e cultural do Estado
de Roraima. “Achando criativamente uma saída, o nosso poeta Eliakim Rufino fez de sua casa
uma galeria... A Cunhã, para exposições permanentes de artistas que não tinham onde expor
seus trabalhos.”55
4.3 Breves relances da História de Boa Vista
Em 13 de setembro de 1943, o presidente da República Getúlio Dorneles Vargas,
através do decreto lei n 5.812 cria os Territórios Federais, dentre eles o Território Federal do
Rio Branco, sendo desmembrado neste momento do Estado do Amazonas.
Oliveira56 argumenta que no ano de 1962, a denominação de Território Federal do
Rio Branco foi modificada para Território Federal de Roraima, devido à confusão nas
correspondências, e mesmo o destino de pessoas, eram trocados do Acre para Boa Vista e
vice-versa, entre o Território e a capital do Acre, também denominada Rio Branco. Em 1988,
data da promulgação da constituição Brasileira, foi criado o Estado de Roraima, deixando de
ser Território Federal de Roraima.
Boa Vista é uma cidade que é conhecida por sua pluralidade, de pessoas oriundas dos
mais diversos Estados. Souza57 salienta que o número populacional é formado em grande
parte de migrantes. Por estar localizada no extremo norte do país, Roraima é um Estado
fronteiriço, a leste faz fronteira com a República Cooperativista da Guiana, ao norte e oeste
com a República Bolivariana de Venezuela e ao, sul, com os estados do Amazonas e do Pará.
54
Lei de incentivo à cultura sendo a primeira lei federal visando propiciar meios de incentivo à produção
cultural foi a chamada Lei Sarney, Lei nº 7.505, de 2 de julho de 1986, instituída no ano seguinte à criação do
Ministério da Cultura, então já desvinculado da Pasta da Educação. A lei permitia as empresas financiarem ações
culturais por meio da renúncia fiscal, desde que tais ações fossem levadas a cabo por produtores artísticoculturais - tanto públicos quanto privados. O produtor era o elemento central, pois as ações de captação de
recursos e de produção artístico-cultural ficavam ao seu encargo. Após o recebimento do aporte de recursos, a
título de doação ou patrocínio, a entidade cultural deveria prestar contas à Receita Federal e ao Ministério da
Cultura sobre a sua correta aplicação. http://www.senado.gov.br/senado/presidencia/memoria/07.asp. Acessado
em 28/03/13.
55
Jornal de Roraima 23/06/1991
OLIVEIRA, Reginaldo Gomes de. A herança dos descaminhos na formação do Estado de Roraima. USP,
São Paulo, 2003.
56
57
SOUZA, Carla Monteiro de. Gaúchos em Roraima. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2001. (Coleção História, 42).
43
A dinâmica cultural do Estado é compreendida ao longo do seu contexto histórico. Para
a historiadora Carla Monteiro, ''Pode-se dizer que, nos anos 1980, ocorre uma verdadeira
corrida para Roraima, ocasionada basicamente pelos estímulos à ocupação das terras e pelos
inúmeros garimpos de ouro surgidos na área yanomami”58. Com essas informações é possível
visualizar o motivo do crescimento rápido do Estado de Roraima, identificarmos o início da
década de maior migração para o antigo Território.
Segundo levantamentos do IBGE/RR59 o período da década de 1980 obteve um
fluxo expressivo do aumento populacional. O Instituto publicou em 1987 que a população
que era de 72.758 habitantes, passou para o número de 115.247 habitantes no ano de 1990.
Isto acontece, principalmente, por consequências das migrações de diversas pessoas em busca
de melhores oportunidades devido ao garimpo e ao universo fronteiriço, estes são alguns
fatores que ajudam a explicar este aumento de habitantes naquele período. Neste sentido a
historiadora Carla Monteiro esclarece que “Roraima é por excelência uma terra de migrantes.
Longe de ser o El Dorado sonhado por alguns, enquadra-se no ideal da ‘fronteira’, é
considerada um celeiro de oportunidades, tanto para aqueles que detêm algum tipo de recurso
quanto para os despossuídos, fato que atrai migrantes de todos os cantos do Brasil.”60
Com a migração diversas culturas se encontram, pessoais de vários lugares do país e
etnias, influenciam para que se forme no Estado uma cultura plural. A população roraimense
é formada por povos indígenas e migrantes provindos de todo o Brasil. Isso faz com que
Roraima seja multicultural. Nestes contextos Roraima vivenciava suas modificações.
A pluralidade faz de Roraima um ambiente peculiar, com marcas de todas as
culturas conviventes, fato que dificulta a definição de um perfil cultural da região e
torna complexa a tarefa de compreender o que seja uma “identidade roraimense”.
Observa-se, frequentemente, que se confundem tais condições com a inexistência de
uma cultura ou de uma identidade próprias. Isto se deve a diversos fatores, mas,
principalmente, à carência de reflexão mais amplas e profundas sobre o que seria,
hoje, uma “identidade roraimense” e qual o seu lugar no contexto cultural local e
61
nacional .
58
SOUZA. Carla Monteiro de. MIGRAÇÃO E MEMÓRIA:(re)territorialização e inserção social entre
gaúchos residentes em Roraima. Professora do Departamento de História da Universidade Federal de Roraima
(UFRR); doutora em História pela PUCRS. p.110
59
IBGE, CENSO 2010.
60
SOUZA, Carla Monteiro de. A história oral e os estudos migratórios na Amazônia brasileira: o caso de
Roraima. In: 26a REUNIÃO DA SBPH, Rio de Janeiro, 2006. p.5. Disponível em:
bph.org/reuniao/26/trabalhos/Carla_Monteiro_Souza/. Acesso em: 01 de fev. 2013
61
OLIVEIRA, Rafael da Silva; WANKLER Cátia Monteiro; SOUZA, Carla Monteiro de. Identidade e Poesia
44
Nesta linha, sabendo que Roraima é composta, em sua maioria por migrantes,
entendemos que essa pesquisa proporcionará à sociedade local o conhecimento de um
movimento artístico e cultural que predominou no cenário nacional durante as décadas de
1980 e 1990, mas que a nível local não teve o devido reconhecimento. Ainda assim, nessa
contemporaneidade, vem ressurgindo no espaço midiático, como se a sua identidade fosse,
somente agora, desvelada para a sociedade. Roraima convive com seus povos indígenas, os
ribeirinhos, os nordestinos, os sulistas, isto ocorre por uma heterogeneidade gerada com o
fluxo migratório.
Neste sentido, por fim, o trabalho apresenta uma temática relacionada com o debate
artístico e cultural na década de 1980, com nosso foco se limitando em entender o Movimento
Cultural Roraimeira, que na década de 1980 foi um movimento muito expressivo, que
buscava fazer o debate e a questionar a cultura e identidade de Roraima.
Musicada: Panorama do Movimento Roraimeira a Partir da Cidade de Boa Vista como uma das Fontes de
Inspiração. Revista Acta Geográfica, Boa Vista-RR, ano III, n°6, p.27-37, jul./dez. de 2009, p. 28.
45
5. COMPREENDER AS INFLUÊNCIAS CULTURAIS INTERNAS E EXTERNAS NA
PRODUÇÃO DAS LETRAS DAS MUSICAS DO MOVIMENTO RORAIMEIRA.
Buriti do campo que prazer
Igarapé tão bom te conhecer
Boa Vista vai onde a vista ver
No verde do campo vi você
Correm mitos no vento
Pedra de Macunaíma
Voa meu pensamento
Sobre o Monte Roraima
Cidade do campo, beira-rio
Estrela do norte do Brasil,
Cidade do campo entardecer
Boa Vista linda de se ver
Correm rios de tempo
Águas de Pacaraima
Montes em movimentos
Coração de Roraima.
(Cidade do Campo: Eliakim Rufino)
A canção Cidade do Campo do poeta Eliakin Rufino é descrita por Neuber Uchôa
como um hino de Boa Vista. Como em poesia o autor enfatiza como é prazeroso viver em
Boa Vista. Desvendando seus mistérios, seus lugares, seus mitos. Percorrendo as trilhas, as
estradas até chegar aos extremos do Estado citando o Município de Pacaraima e a tríplice
fronteira no Monte Roraima.
Esboça em suas linhas o desejo de estar e poder desfrutar dos encantos de sua terra,
apresenta seu regionalismo, enfatizando e dizendo que pertence a esse lugar, cantando sua
região, valorizando em versos seu habitar natural quando em belas palavras apresenta sua
terra, “Boa Vista vai onde a vista ver... Boa Vista linda de se ver”. Os versos reportam aos
idos da fundação de Boa Vista, e até mesmo os dias atuais, pois da Orla se tem a visão
esplendorosa do rio Branco, da Serra Grande, das Serras do Cantá e da Malacaxeta. A
sensação prazerosa do vento e da brisa ao final da tarde, ou mesmo da “cruviana” nas
madrugadas podem ser lembrados ao ouvir a canção.
O principal foco deste capítulo é discutir como se deu a formação do Movimento
Roraimeira a partir das falas de seus principais integrantes. Para tanto foram realizadas
entrevistas mistas com quatro integrantes, sendo eles: Eliakin Rufino, Neuber Uchôa,
Reginaldo Gomes de Oliveira e Zeca Preto. As questões culturais, regionais e identitárias do
46
então Território Federal de Roraima, nortearam as temáticas abordadas pelo Movimento,
proporcionando debates sobre cultura e identidade e valorizando as belezas naturais da região.
Elaboramos um questionário com seis perguntas nas quais se buscou extrair
informações que nos dessem conta desde os primórdios, culminando com o ápice do
Movimento. Assim, cada entrevistado expôs seu pensamento e suas falas a partir das
seguintes questões: Como nasceu o Movimento Roraimeira? Quais as ideias centrais do
Movimento Roraimeira? Quais as principais influências do Movimento Roraimeira? Quais os
principais protagonistas? Quais linguagens artísticas mais visíveis do Movimento Roraimeira?
Quais as principais obras de música, literatura, artes plásticas, fotografia, dança? Para melhor
compreensão optamos em transformar cada pergunta em tópicos, que serão abordados a
seguir.
5.1 Como nasceu o Movimento Roraimeira?
Na visão do poeta Eliakin Rufino62 o Movimento Cultural Roraimeira nasceu em
1984, mais precisamente no mês de julho. Naquela ocasião o cantor e compositor Zeca Preto,
conhecido na época como Zé Maria, classificou sua música “Roraimeira” para o II Festival
de Música de Roraima – FEMUR tendo ela obtido o 2º lugar. Um mês depois Eliakin Rufino,
Neuber Uchôa e Zeca Preto, pela primeira vez juntos, realizaram um show, que intitularam
Roraimeira, em Manaus, no Teatro Amazonas. Em outubro daquele ano, repetiram o show em
Boa Vista, no antigo Cine Super K em 1984. Esses três eventos marcam o início do que seria
chamado mais tarde Movimento Roraimeira.
A abordagem dada pelo cantor Neuber Uchôa dá conta de que “[...] o Movimento
Roraimeira nasceu depois da música, à música Roraimeira, a música nasceu primeiro, é uma
música do Zeca, que dá nome ao movimento, música que é de 1984, e o movimento surgiu no
mesmo ano” 63. Nesse sentido percebemos a conexão de informação entre Eliakin e Neuber ao
serem taxativos na afirmação de que o Movimento teve como base a música de Zeca Preto.
Em seguida, Neuber também menciona a apresentação em Manaus enfatizando as temáticas
regionalistas e os primeiros passos dos artistas e suas composições.
Então o Movimento surgiu a partir daí e com o tempo é que foi caindo à ficha e só
62
63
Entrevista mista concedida em 14/03/13.
Entrevista mista concedida em 18/03/13.
47
alguns anos depois, a gente se deu conta da batata quente que tínhamos nas mãos e
passamos, inclusive, a fazer analogias com outros Movimentos porque nós não
inventamos o regionalismo, o regionalismo é uma coisa mundial, em todo canto tem
o regionalismo, as influências foram muitas, a gente teve oportunidade de ver outros
artistas, outros poetas, que também cantam sua aldeia64.
É notório na fala de Neuber Uchôa, em relação ao início do Movimento, os
sentimentos de medo e insegurança, mas também percebemos a esperança e o desejo para que
“aquilo” se firmasse e se expandisse o que de fato veio acontecer. As questões do
regionalismo permearam, e ainda permeiam, as composições dos cantores e hoje se conectam
com a linguagem dos tempos atuais.
O professor Reginaldo Gomes de Oliveira descreveu como foram os primeiros
embates voltado a temática dos questionamentos sobre cultura e identidade, para ele:
Esse movimento que denominaram Roraimeira não teve uma data certa para
começar. O que despertou o sentimento e desejo de valorizar a cultura de Roraima
foi o retorno de jovens roraimenses com graduação no final dos anos de 1970. Esses
jovens começaram a buscar aspectos culturais que marcassem a identidade de
Roraima. No final dos anos de 1970 e começo dos 80, Roraima recebeu muitos
65
imigrantes que buscavam identificar a cultura regional .
A fala mais técnica e objetiva do Professor Reginaldo Gomes de Oliveira não deixa
transparecer os agentes que compunha a formação do Movimento, ou se quer dá pistas de
como ele surgiu. Ao contrário de Neuber e Eliakin que buscam enfatizar as apresentações em
shows e no festival, por outro lado, o professor esclarece que havia a necessidade de
ambientar os migrantes recém-chegados em Roraima aos aspectos artístico e cultural dessa
região. Em outro momento, cita que o retorno dos universitários à suas raízes propiciaram o
debate sobre a temática a ser abordada pelo Movimento naquilo que tangia a identidade de
Roraima.
Zeca Preto apresenta o show sendo o mentor das primeiras articulações envolvendo a
temática Roraimeira, descreve que o grupo realizou um belíssimo show na cidade de Manaus
e que repetiram o mesmo espetáculo em Boa vista, apresenta que:
O Movimento nasceu de um show que fizemos em Manaus no Teatro Amazonas em
agosto de 1984, e denominamos esse show de Roraimeira, nome de uma música
minha que obteve o segundo lugar no Festival de música em Roraima em julho do
ano de 1984 (um mês antes). A coisa foi tão boa que resolvemos fazer aqui em Boa
64
65
Entrevista mista concedida em 18/03/13.
Entrevista mista concedida em 25/02/13.
48
Vista no Cine Super K, um espaço com mais 750 lugares, novamente o Show
Roraimeira foi sucesso total, casa lotada com gente ocupando o chão do cinema
(meio e as laterais)66
Sendo o último artista a responder o questionário Zeca Preto apontou alguns
elementos, que os outros acima não descreveram, como o numeroso público presentes no
espetáculo. Sua afirmação pode ser vista nos Jornais da época, já expostos no trabalho. Zeca
Preto parte da mesma concepção de Eliakin Rufino e Neuber Uchôa, enfatiza que as
discussões que envolveram a gênese do Movimento Roraimeira teve seu início a partir de um
show. Denominado Roraimeira, que era o nome de uma música do mesmo.
5.2 Quais as ideias centrais do Movimento Roraimeira?
De forma bem sucinta Eliakin Rufino afirma as ideias centrais eram “produzir obras
de arte, em diversas linguagens artísticas, que tivessem Roraima como temática principal,
optando preferencialmente pela beleza da paisagem cultural e natural com o objetivo de
ajudar na construção da identidade do povo roraimense e servir de divulgação turística do
Estado de Roraima” 67.
Neuber Uchôa apresenta três ideias principais em sua fala, enfatiza que o Movimento
tinha o desejo de mostrar em seus shows a cultura do povo heterogêneo do Norte. Em outro
ponto retrata que a ideia central estava entorno de um tripé, abordando os elementos
norteadores da cultura de Roraima, (indígena, migrante e caribenha).
Bem a ideia central do Movimento era traduzir o sentimento desse povo
heterogêneo, desse povo em arte, que naquela ocasião (1984), a gente se deu conta
que, em meados dos anos 80, a gente se deu conta que éramos um povo, cheio de
referências culturais, gente de todos os lugares do mundo, se manifestando de
acordo com as suas necessidades, mas a gente sabia, a gente notava que tínhamos a
cultura indígena como a nossa espinha principal, o resto era influência trazida de
fora e aos poucos, agente foi se dando conta que ideia central do Movimento, girava
em torno de um tripé, que é cultura indígena, os de fora representando maciçamente
pelos nordestinos e o caribe68.
Demonstra outra ideia central que estava ligada a diversidade e o acolhimento de
costumes, tanto dos nascidos em Roraima, quanto dos migrantes. Apontar que a outra ideia
seria relacionada às fronteiras, sendo ingrediente indispensável para o caldeirão de
influências, como se a cultura e a identidade estivessem sendo tecidas, como uma colcha de
66
Entrevista mista concedida em 08/03/13 .
Entrevista mista concedida em 14/03/13.
68
Entrevista mista concedida em 18/03/13.
67
49
retalhos, em que “tudo” poderia ser aproveitado e aprimorado pelos artistas, mesclando a
cultura e a identidade.
Ao descrever sobre as ideias centrais do Movimento Roraima o professor Reginaldo
Gomes de Oliveira destaca que na década de 80, os universitários buscavam incentivos para
poder desenvolver a arte no então Território Federal de Roraima, tinham como apoio o
Departamento de Assuntos Culturais (DAC)69 para desenvolverem suas temáticas
relacionadas ao regionalismo.
No início dos anos de 1980 os jovens graduados de Roraima eram incentivados pelo
Departamento de Assuntos Culturais (DAC) para pensarem e desenvolverem
projetos envolvendo temas da cultura de Roraima. Esses temas centrais eram
voltados para temas indígenas e ambientais mesclados com elementos da cultura
nordestina. Nesse sentido, a produção literária ou nas artes plásticas, na dança, na
música ou no teatro eram mesclados com essa temática ambiental e indígena70.
Observa-se que a fala do professor está baseada, sobretudo à Lei de Incentivo à
Cultura – Lei Sarney, a qual já foi abordada anteriormente. Demonstra ainda que existia um
órgão público no Território Federal de Roraima destinado para tratar de tais assuntos, os quais
aproximam intelectuais e artistas no desenvolvimento de trabalhos voltados para a discussão
da temática cultural local.
As ideias centrais que Zeca Preto relatar, são as questões relacionadas ao regionalismo,
que é muito típico nas músicas que o mesmo compõe, observamos que ao enfatizar esses
elementos, o cantor apresenta o que Neuber Uchôa esboça em suas falas, a valorização e o
orgulho ser e pertencer a Roraima. Zeca Preto aponta que seria “Levar a Música, a dança e a
poesia de boa qualidade ao nosso povo de forma que se orgulhassem de ser chamados de
Roraimenses. Levar isso para toda Amazônia, todo o país e o resto do mundo”71. Em suas
palavras percebemos o desejo que os integrantes do Movimento Roraimeira tinham em
difundir a arte, não só no Território Federal de Roraima, mas apresentar a arte roraimense aos
quatro cantos do mundo.
69
Quando me refiro ao DAC (Departamento de Assuntos Culturais) estou me referindo a um departamento
vinculado a Secretaria de Educação e Cultura do ex-Território Federal de Roraima que foi criado no começo dos
anos 1980. Estava localizado onde hoje se encontra a Assembleia Legislativa do Estado de Roraima
70
Entrevista mista concedida em 25/02/13.
71
Entrevista mista concedida em 08/03/13.
50
5.3 Quais as principais influências do Movimento Roraimeira?
Nesse aspecto Eliakin Rufino acentua como principais influências “o Movimento
Modernista, o Movimento Tropicalista, o Movimento Clube da Esquina e o Movimento
Pessoal do Ceará.”
72
Por outro lado, Neuber Uchôa e Reginaldo Gomes partem do principio
que era necessário estabelecer uma identidade cultural regional própria, sem a intervenção ou
influência de outros movimentos que aconteceram em outras regiões brasileiras. Contudo,
Neuber Uchôa descreve que “a gente se deu conta que na realidade nossa identidade é a nossa
diversidade, então cabia a nós, apenas acomodar essas diferenças que aqui estavam, e emergir
como uma arte nova, como uma coisa original, que é o que fazemos hoje, é um regionalismo
contemporâneo um regionalismo Pop”73.
Seguindo essa linha Reginaldo Gomes aponta que “os jovens roraimenses graduados
vinham de distintas regiões onde haviam se formado. Por conta disso, as ideias eram
relacionadas com as regiões de suas formações. Contudo, a questão ambiental e indígena
foram os principais temas presentes no movimento”
74
. Vemos, portanto que havia sim,
influências externas para a construção da identidade cultural local proposta pelo Movimento
Roraimeira. Tal afirmação encontra suporte na fala de Neuber.
A gente é um povo novo, que mistura gentes de todas as tribos. Então eu acho que as
principais influências no Brasil são os gaúchos, os baianos e os paraenses, esses três
povos, segundo a gente observou durante essas quase três décadas, são povos que
como a gente diz se bastam, eles têm músicas próprias, eles têm uma roupa própria,
tem um sotaque, eles têm uma comida, uma música, tudo próprio, os baianos, até os
mendigos baianos estão preparados para receber os turistas, para dar o seu recado,
traduzir em cultura, em divisas sabe, o seu modovivendes. Que eu acho o turismo é a
comercialização da cultura de cada um, bom eu acho que essa é a nossa vantagem,
por ter optado pelo regionalismo 75.
Ao descrever as influências do Movimento Roraimeira, Zeca Preto apontar assim
como Eliakin Rufino e Neuber Uchôa que “Creio que foi Movimento Modernista de 1922
(Semana de Arte Moderna), também pelo Movimento Tropicalista. O primeiro com certeza foi
o que mais tocou o Roraimeira, até pelo Mário de Andrade com Makunaíma que hoje já se
chama em todo Roraima de MAKUNÁIMA”76. Conforme já havia sido mencionado pelo
poeta Eliakin Rufino.
72
Entrevista mista concedida em 14/03/13.
Entrevista mista concedida em 18/03/13.
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Entrevista mista concedida em 18/03/13.
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73
51
5.4 Quais os principais protagonistas?
Eliakin Rufino classifica como principais protagonistas, destacando por arte e estilo,
os seguintes: “na música popular: Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto; nas artes
plásticas: Elieser Rufino; na dança: Vânia Rufino; na Fotografia destacam-se: Jorge Macedo e
Wank Carmo”
77
. Para o poeta, eles formavam a base do Movimento Roraimeira, que
encabeçaram e articularam para que fossem divulgadas a temática regional não só em
Roraima, mas com objetivo de exportar suas riquezas artísticas.
Neuber Uchôa esboça que as pessoas que deram origem aos primeiros
questionamentos e buscaram recursos para expandir a arte no Território Federal de Roraima
foi o Trio Roraimeira, enfatiza que: “Mais o Movimento Roraimeira surgi em 1984, essa é que
é a verdade, e a cabeça do Movimento somos eu, Eliakin e Zeca Preto, que na ocasião
participavam de festivais cantando músicas regionalistas”78. Para explicar como se deu todo o
processo de criação do Movimento, Neuber Uchôa pontua na entrevista, os questionamentos
que levaram o grupo a pensar da mesma forma, buscando o regionalismo como base para as
indagações que norteavam os artistas que queriam exalta sua terra. O cantor descreve que os
protagonistas foram:
Na verdade nós três demos início a coisa né, porque a vida é assim mesmo, alguém
começa! Na verdade a gente sabia que tínhamos nas mãos uma coisa muito mais
ampla, que precisava agregar outros valores, então aos poucos nós fomos também
trazendo pra perto da gente, outros artistas, de outras artes, da literatura, das artes
plásticas, da fotografia, da dança, que faziam a arte ligadas a temática Roraimeira.
Que Roraimeira antes de tudo é fazer arte voltada para temática de Roraima. Aos
poucos a gente foi se dando conta o que era ser Roraimeira. Roraimeira não é ser
roraimense, é muito mais que isso, têm roraimense que não são necessariamente
nascido em Roraima, e têm uns roraimenses que são traíras, não são roraimenses
suficientes. Zeca Preto, por exemplo, é um paraense, é autor da música Roraimeira,
é uma pessoa que se identifica com os nossos valores. É nós três representamos
realmente os principais protagonistas, mais existem outros artistas também que
militam na arte Roraimeira que são: os artistas Eliezer Rufino, nas fotografias temos
o Jorge Macedo, o Cardoso e outros artistas plásticos, fazem obras que têm
referências regionalistas que falam da nossas serras, dos nossos rios, e dos nossos
costumes, enfim apresentam obras regionalistas. 79
Podemos perceber na fala de Neuber Uchôa o sentimento de fazer parte dessa história,
demonstrando a importância e a dificuldade assumida por eles em começar e principalmente
dar continuidade a arte em Roraima. O mesmo resume que “Roraimeira antes de tudo é fazer
77
Entrevista mista concedida em 14/03/13.
Entrevista mista concedida em 18/03/13.
79
Idem.
78
52
arte voltada para temática de Roraima” 80. Com indignação demonstra em sua fala o descaso
no quais muitos dos nascidos em Roraima adotam a postura em não aceitar e assumir que é do
Norte, e se posicionam de modo contrário ao regionalismo, dando mais importância e
valorizando as expressões artística e culturais de outras regiões, ou mesmo as internacionais.
Quando abordado, o professor Reginaldo Gomes da ênfase em descrever que os
protagonistas não eram um ou outro, o mesmo não relata que o Trio Roraimeira foram
precursores do Movimento. Ele aponta vários artistas que encabeçavam o Movimento
Roraimeira tais artistas como:
No começo não havia figuras que se destacasse, mas aos poucos alguns nomes
foram surgindo: Nas artes plásticas os nomes de Ana Maria, Valniro e Cardoso
começaram divulgar essa temática regional em suas obras. Contudo, se você
conversar com esses artistas eles não se sentiram parte do Movimento porque na
época não tínhamos essa ideia de Movimento artístico e cultura Roraimeira. Na
música Ricardo Souto Maior, Miranda de Aquino, Zeca Preto, Neuber Uchôa,
Eliakin Rufino. No teatro os nomes de Marcos Montenegro, Chacon, e Catarina
sobressaíram. Na dança temos os nomes de Natalina Gavioli, Vânia Rufino, Marcio
Costa. Havia também festivais de música, teatro, dança e exposição de desenho e
pintura organizados por professores de Artes nas escolas estaduais. O DAC foi o
grande fomentador dessa ação envolvendo as diferentes linguagens da arte em busca
da identidade roraimense.81
Podemos observar que nem Eliakin Rufino, nem Neuber Uchôa convergem nos nomes
dos protagonistas aos quais o professor Reginaldo Gomes aponta como integrantes do
Movimento Roraimeira, o mesmo destaca que Cardoso não se considera como membro do
Grupo, tanto Reginaldo Gomes quanto Neuber Uchôa reafirmam que Cardoso esteve presente
na gênese do Movimento.Tal informação não pode ser confirmado, pois o artista Jorge
Augusto Cardoso não foi entrevistado.
Assim como Eliakin Rufino e Neuber Uchôa o cantor Zeca Preto aponta que os
precursores do Movimento Roraimeira foram “[...] os principais protagonistas do Movimento
são os que continuam até hoje Zeca Preto, Neuber Uchôa, Eliakin Rufino e Vânia, na época
esposa de Eliakin e Elieser nas Artes Plásticas”82. Enfatizando que o Movimento Roraimeira
ainda é vivo, e que acontecem apresentação em diversos lugares com apresentações do Trio
Roraimeira.
O cantor enfatiza que haviam outros integrantes, relata assim como Reginaldo Gomes
80
Entrevista mista concedida em 18/03/13.
Entrevista mista concedida em 25/02/13.
82
Entrevista mista concedida em 08/03/13 .
81
53
e Neuber Uchôa, o artista plástico Di Cardoso, “Vale lembrar que Jorge Augusto Cardoso,
Mestre Afonso e Walníro Souza (artistas plásticos) fizeram parte do primeiro Roraimeira, em
Manaus em agosto de 1984. Na fotografia83 temos Wank Carmo e Jorge Macedo”.
Percebemos que alguns integrantes são relatados pelo professor Reginaldo Gomes estão na
fala de Neuber Uchâo e Zeca Preto, como o do artista Di Cardoso, que esteve presente nas
primeiras mesões do grupo, e que depois não continuou no Movimento Roraimeira como já
foi explicado na fala do Professor Reginaldo Gomes.
Nas respostas dos entrevistados observamos que há nomes citados, nomes que não são
descritos de forma unanime, cada entrevistado enfatizou sua opinião, e em alguns momentos
as respostas são parecidas e em outros se divergem.
5.5 Quais linguagens artísticas mais visíveis do Movimento Roraimeira?
Como já discutimos no primeiro capítulo acerca das representações artísticas, os
entrevistados deram suas contribuições ao descrever quais eram as linguagens que estavam
atreladas ao Movimento. Destarte Neuber Uchôa discorre sobre o assunto destacando o
seguinte:
Eu acho que é exatamente a linguagem que a gente abraçou eu, Eliakin e Zeca Preto,
era a música e poesia da gente, embora a dança também no início fizesse parte do
Movimento. As artes Roraimeiras eram representadas pela música, pela literatura e
pela dança, que faziam parte do início dos shows, com a Vânia Rufino que dançava
nos shows, que mantinha um grupo de dança chamado de fibras tensas, que fazia
uma coreografia baseada nos gestuais dos animais amazônicos e para isso agente
deu o nome de Zoodança, então pra ti vê até nisso a gente se preocupava, com o que
representar nos shows, que elementos a gente usaria na manifestação artística
Roraimeira, tinha que ser algo que estivesse ligado a nós, a nossa realidade, então
daí a nossa preocupação, com as artes que se identificam mais com o povo de
Roraima, elas estão inseridas nas artes mais executadas na música e na literatura. 84
Então, ao analisar o relato do artista, percebemos que havia uma gama de expressões
artísticas que se faziam presentes no Movimento. O “zoodança”, por exemplo, teve destaque
durante as apresentações do Trio Roraimeira, tendo estado presente nos shows em Manaus e
também no show no Teatro Carlos Gomes, em Boa Vista, na década de 1980.
O professor Reginaldo Gomes, por sua vez, enfatizou que “quando se iniciou a
discussão sobre arte e cultura regional o debate envolveu todas as linguagens da arte: teatro,
83
84
A fotografia mencionada não nos foi cedida para publicação nesta monografia.
Entrevista mista concedida em 18/03/13.
54
dança, música, artes plásticas e literatura”85. Nesse ínterim, percebemos harmonia nas
informações dadas anteriormente em outro tópico, acerca das expressões manifestadas pelo
Movimento. O professor destaca também que “um grande número de pessoas que chegou a
Boa Vista deixou a cidade por um tempo. Sem profissionais qualificados no campo das
distintas linguagens, as ações musicais começaram a ganhar destaque”86.
Zeca Preto apresentou as linguagens do Movimento Roraimeira, como sendo
elementos da natureza, descreve que “As linguagens principais são: Música, Poesia e Dança,
essa última linguagem era coreografada por Vânia Rufino. Zoodança (baseada nos gestos dos
animais)”87. Todos que responderam ao questionário apontam para esses elementos que Zeca
Preto menciona.
Em relação ao poeta Eliakin Rufino, ressaltamos que por ocasião deste
questionamento, o mesmo se absteve em respondê-lo ou a tecer quaisquer tipos de
comentários sobre essa temática.
5.6 Quais as principais obras de música, literatura, artes plásticas, fotografia, dança?
Os destaques apontados por Eliakin Rufino foram sistematizados da seguinte
forma88:
Música: Roraimeira (Zeca Preto), Ave e Nossa bossa (Neuber Uchoa)
Makunaimando (Zeca e Neuber) Fuzarca na maloca (Eliakin Rufino) e Cidade do Campo
(Armando de Paula e Eliakin Rufino);
Literatura: o livro de poemas Pássaros Ariscos, de Eliakin Rufino, primeiro livro de
poemas publicado em Roraima, em fevereiro de 1984 é um marco do movimento e da história
da literatura local. A partir de 1989 o poema Cavalo Selvagem destaca-se como o poema mais
popular do movimento.
Artes plásticas: Principalmente os murais cerâmicos do Palácio da Cultura e do
Hemocentro, de autoria do artista plástico Elieser Rufino.
Dança: A Zoodança, criada por Eliakin Rufino e encenada pelo Grupo de Dança
Fibras Tensas, sob a direção de Vânia Rufino. É o primeiro grupo de dança a apresentar-se no
festival de dança de Joinville-SC em julho de 1990.
85
Entrevista mista concedida em 25/02/13.
Entrevista mista concedida em 25/02/13.
87
Entrevista mista concedida em 08/03/13.
88
Entrevista mista concedida em 14/03/13.
86
55
Fotografia: o conjunto de fotos com temática roraimense e todas as capas de discos
e folders do Movimento Roraimeira feitas pelo do fotográfo Jorge Macedo
Em relação as música Neuber Uchôa destaca, sobretudo “a música que dá nome ao
Movimento Roraimeira, que é uma música do Zeca Preto, do Festival de 1984”89. Também
ressalta a importância de músicas como Nossa Bossa, destacada por ele como sendo “um dos
hinos do Movimento Roraimeira”90. Além de Cruviana considerada por ele como “a maior
declaração de amor que eu faço a minha terra!”91, Macunaimando e Cidade do campo de
Elikin Rufino e Armando “que também é um hino a Boa Vista”92.
Enfim são muitas músicas graças a Deus, hoje a gente tem orgulho de subir para
cantar nos palcos e quando a gente desce têm muita gente que fica magoada por que
a gente não cantou essa ou aquela outra música. Aos poucos a gente foi
conquistando, graças a nossa insistência, também o nosso espaço. Valeu a pena ter
insistido, e hoje ter isso aí veí, ser objeto de estudo, que já está nos anais da
Universidade, isso é bacana, isso é compensador, eu tenho muito orgulho do que eu
fiz, se eu tivesse que fazer o mesmo caminho, eu faria tudo de novo, até a ferrada da
arraia eu queria de volta (risos). Eu tenho orgulho de ser artista, de ser quem eu sou,
de ser regionalista principalmente [sic]93.
O cantor também salienta a literatura:
A gente tem as poesias do Eliakin Rufino, todo universo, as nossas letras também
são, pura literatura cultural voltada para o regionalismo tem: o cavalo selvagem, sol
de verão poesia dele que se destacam nesse cenário regionalista, bem são muitas
músicas, talvez a artes plásticas, temos um grande painel feito pelo Eliezer Rufino,
irmão do Eliakin, feito de cerâmica lá na entrada do palácio da cultura, é um
exemplo bacana, uma arte voltada para a cestaria indígena, são elementos da cultura
indígena também que fazem parte desse universo. 94
Neuber Uchôa finalizou sua entrevista agradecendo a Deus pelo sucesso obtido com
o Movimento Roraimeira enfatizando o seguinte: “acho que a gente está bem servido, temos
algumas obras que a gente deixou, e que podem servi de exemplos marcantes que é a obra
Roraimeira”95.
O professor Reginaldo Gomes contribuiu neste tópico destacando que “há alguns
estudos sobre esse tema Roraimeira, mas não temos um registro claro sobre as principais
obras”96. Em relação ao setor da música na figura discorreu que “Neuber Uchoa, Zeca Preto e
Eliakin Rufino tem se destacado e gravaram um repertório significativo sobre a temática
89
Entrevista mista concedida em 18/03/13.
Idem.
91
Idem.
92
Idem.
93
Idem.
94
Idem.
95
Idem.
96
Entrevista mista concedida em 25/02/13.
90
56
regional”
97
. Continuou discorrendo que após a década de 1980, “fotógrafos como Jorge
Macedo e outros se destacaram na arte de registrar por meio da fotografia as pessoas e as
paisagens de Roraima” 98.
Contudo, o professor Reginaldo Gomes encerrou sua entrevista afirmando: “No meu
entendimento Roraimeira não chegou a ser um movimento artístico e cultural, mas foi o nome
de uma música que influenciou os músicos regionais na composição musical com elementos
da cultura indígena e meio ambiente presentes nas suas canções” 99.
Por fim Zeca Preto corrobora respondendo a última pergunta do questionário, a
respeito das obras que envolveram a temática Roraimeira, o mesmo aponta que fizeram parte:
Na música os discos: Roraima: O Canto de Roraima e suas Influências Indígenas e
Caribenhas, Roraimeira: O Canto de Roraima. Na Literatura os livros: Pássaros
Ariscos, Poemas, Escola de Poesia, Brincadeira, Poeta de Água Doce, entre outros...
Nas Artes Plásticas, as Telas de Elieser. A Fotografia de Wank Carmo, a Fotografia
de Jorge Macedo (Exposição Fotográfica Roraimeira) Uma maravilha... 100
Salientamos que a analise das entrevistas dos componentes do Movimento Roraimeira,
nos ajudou a entender como ocorreu o processo e articulações dos envolvidos a formação do
mesmo, suas dificuldades, suas esperanças em produzir e manifestar sua arte e enfatizar o
desejo de pertencer Roraima.
Podemos perceber os fatores que encabeçaram os debates artísticos e culturais da
gênese do Movimento Roraimaira a partir das falas apresentadas por Eliakin, Neuber,
Reginaldo e Zeca. Estes destacaram fatos, momentos, eventos, espetáculos, que fizeram parte
da criação do Movimento Roraimeira. Bem como outros artistas que fizeram parte da historia
do Movimento.
97
Entrevista mista concedida em 25/02/13.
Entrevista mista concedida em 25/02/13.
99
Idem.
100
Entrevista mista concedida em 08/03/13
98
57
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Movimento Roraimeira deixou eternizado em canções, artes, fotos, quadros, um
caminho a ser trilhado para as pessoas que nasceram ou que aqui se sentiram acolhidas. Um
sentimento de amor a sua terra. Declarando que em Roraima há sim cultura artística que as
pessoas que vivem neste Estado sabem valorizar suas riquezas naturais, e que fazem parte de
um povo acolhedor, vivendo em um caldeirão de influências, que somos uma mistura
heterogênea do que há de melhor. Somos do Norte e temos orgulho de vivemos em Roraima.
Um dos principais problemas que o Movimento Roraimeira enfrentou foi a falta de
políticas públicas, voltadas a valorização de quem produzia arte, no então Território Federal
de Roraima, principalmente na década de 1980, como relatam os artistas Eliakin Rufino,
Neuber Uchôa e Zeca Preto, nos periódicos da época. Os mesmos descrevem o descaso tanto
do Governo quanto da Prefeitura, e expõem suas dificuldades para promover sua arte.
Recorremos à imprensa para podermos entender como se deram os debates sobre a
temática. Buscamos nas falas dos artistas, primeiro nos periódicos, depois utilizamos os
questionários, para ampliar as discussões envolvendo os artistas locais. Os jornais
apresentavam denuncias retratando o total estado de abandono da arte em Roraima. Em tom
de desabafo os artistas, apontam que faltavam incentivos dos órgãos competentes para
produzir seus trabalhos, tendo que buscar outros meios ou formas alternativas para produzir
seus shows.
O Movimento Roraimeira buscava as questões de conhecer e difundir para outros
cantos, lugares, países a Cultura Indígena, os costumes regionais de Roraima e que suas
tradições fossem preservadas por meio de suas canções, trabalhadas em seus shows. Os
artistas mesclavam as apresentações que eram exibidas no início no Teatro Carlos Gomes.
Buscavam suas inspirações no regionalismo, transmitiam para o público presente nos
espetáculos, o belo das riquezas naturais de Roraima.
Atuavam como agentes representativos dos viventes de Roraima, mostrando que a
cultura deveria ser exposta ao mundo, pois a cultura está relacionada à alma. O Movimento
tinha como enfoque preservar os hábitos e costumes. Entediam que algo deveria ser feito para
poder preservar suas artes naturais, seu modo de viver, com os debates os integrantes,
identificaram suas produções sendo um ponto de partida, para exaltar sua terra. Eternizando
assim diversos elementos contidos na cultura de Roraima.
58
Neste trabalho, nos propomos, sobretudo, em analisar a atuação do Trio Roraimeira,
que através de seus discos retratavam a identidade, costumes e hábitos locais. Apresentando
expressões artísticas, demonstrando nos palcos por meio de suas canções, um modo de pensar,
fazer e sentir próprio.
O Movimento Roraimeira representou e ainda representa um processo cultural, que
através de suas experiências vividas, tanto em Roraima, quanto fora do Estado, à fomentação
dos discursos dos mesmos, que apresentam elementos plurais em suas obras, manifestações
em busca do aprimoramento de seus trabalhos. Dando sentido ao nome Roraimeira, que seria
um sentimento de pertencer a Roraima.
Podemos perceber que foi por meio das canções que Roraima foi difundido as belezas
e atrativos culturais, por meio da arte foram promovendo a cultura, expondo seus lugares,
belezas e seu turismo típico e único. Descrevendo um local belo para se viver e apresentando
seus encantos, mitos, lendas, paisagens, histórias, comidas, montes, plantas, peixes, costumes
entre outros aspectos.
Apontando uma forte herança cultural que não poder ser esquecida, que os artistas
reafirmam, como se quisessem a qualquer momento expressar seus sentimentos a terra em que
habitam, declarando seu amor em cada canção cantada ou declamada. Enfatizando seu
carinho por Roraima, e expandido para outros lugares, o que a de belo em Boa Vista.
Não podemos esquecer que Roraima é um Estado fronteiriço, por isso também recebe
uma gama de migrantes, que buscam oportunidades, veem no Estado um lugar de esperança
de melhores oportunidades, uma vida mais tranquila, como já canta o poeta Eliakin Rufino.
Ao enfatizar as questões de identidade percebemos que são sistemas de representações
que estão ligadas as construções do que seria o “eu”. Em outras palavras, permite que o
indivíduo se torne semelhante a si mesmo, sendo único, diferente dos outros. Sua construção é
progressiva e contínua. Tendo como destaque inúmeras influências e transformações, fruto da
própria dinâmica cultural e do contato com os outros povos.
No enfoque a respeito de cultura percebemos que estudar cultura é, portanto, estudar
um código de símbolos partilhados e compartilhados pelos membros dessa cultura, na qual o
individuo está inserido.
Através dos periódicos foram verificados, as questões relacionadas à cultura,
observamos como eram retratas essas questões, percebemos que em algumas manchetes a arte
e cultura eram representados, como atos de teimosia de poucos, e que não tinham os
59
incentivos dos órgãos competentes.
Nosso trabalho apresentou as analises sistemáticas sobre os embates do Movimento
Roraimeira, buscamos compreender o processo de sua criação e suas articulação, no exTerritório de Roraima, descrevendo a opinião de cada entrevistado, enfatizando que os
acontecimentos foram diversos, para fomentar sua origem, e que os questionamentos, foram
expostos nas suas canções como uma forma de exaltar as belezas naturais de Boa Vista.
60
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62
ANEXO A
Jornal de Roraima 11/04/1991
63
ANEXO B
Boletim da Educação e Cultura 10/84
64
ANEXO C
Folha de Boa Vista, 05/10/1984
65
ANEXO D
Folha de Boa Vista, 22/01/1989
66
ANEXO E
Folha de Boa Vista, 22/01/1989
67
ANEXO F
Folha de Boa Vista, 22/01/1989
68
ANEXO G
A Critica de Roraima, 13/08/1989
69
ANEXO H
A Critica de Roraima, 13/08/1989
70
ANEXO I
A Critica de Roraima, 13/08/1989
71
ANEXO J
A Critica de Roraima, 13/08/1989
72
ANEXO K
O Estado de Roraima, 10/03/1991
73
ANEXO L
Folha de Boa Vista, 21/03/1991
74
ANEXO M
Folha de Boa Vista, 13/04/1991
75
ANEXO N
Folha de Boa Vista, 15/06/1991
76
ANEXO O
Jornal de Roraima, 18/06/1991
77
ANEXO P
Jornal de Roraima, 23/06/1991
78
ANEXO Q
Folder
79
ANEXO R
Folder
80
ANEXO S
Folder
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