UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS - CCH COORDENAÇÃO DO CURSO DE HISTÓRIA JESSICA CARLA DA SILVA RORAIMA NA DÉCADA DE 1980: O debate artístico e cultural. Boa Vista/RR 2013 1 UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS - CCH COORDENAÇÃO DO CURSO DE HISTÓRIA JESSICA CARLA DA SILVA RORAIMA NA DÉCADA DE 1980: O debate artístico e cultural. Monografia apresentada como pré-requisito para conclusão do Curso de Licenciatura e Bacharelado em História da Universidade Federal de Roraima. Orientador: Prof. Msc. Antônio Klinger da Silva Souza. Boa Vista/RR 2013 2 JESSICA CARLA DA SILVA RORAIMA NA DÉCADA DE 1980: O debate artístico e cultural. Monografia apresentada como pré-requisito para conclusão do Curso de Licenciatura e Bacharelado em História da Universidade Federal de Roraima, defendida em 15 de abril de 2013 e avaliada pela seguinte banca examinadora. _________________________________________________ Prof. MSc. Antônio Klinger da Silva Souza Orientador / Curso de História/UFRR _____________________________________ Profa. Dra. Maria das Graças dos Santos Dias Curso de História/UFRR _______________________________________ Prof. Esp. Francisco Marcos Mendes Nogueira Curso de História/UFRR 3 Dedico: À minha mãe, irmãos, sobrinhos e esposo. 4 AGRADECIMENTOS Com minhas simples palavras vou tentar agradecer pessoas que foram importantes e fundamentais para que eu pudesse continuar e finalizar esse trabalho monográfico. Embora seja difícil expressar a minha gratidão a todas essas pessoas que direta ou indiretamente, contribuíram para realização do mesmo. Sei que posso ser injusta em esquecer alguns nomes, pois é impossível apontar todos os amigos e pessoas que passaram ou estiveram ao meu lado durante minha formação. Ao longo da minha jornada acadêmica, diversas foram as dificuldades enfrentadas, porém a força e as motivações da família e amigos estiveram presentes nesses desafios, fazendo com que eu pudesse prosseguir e concluir, mas uma etapa da minha vida. Em primeiro lugar agradeço a Deus por conduzir e iluminar minha vida, por ter me dado força e perseverança. Agradeço á minha família, á minha Avó querida e amigos. Em especial agradeço ao meu esposo Ítalo Rodolfo Oliveira da Costa, por mostrar que sou capaz sempre que eu penso o contrário, por está ao meu lado, nas horas incertas, por acreditar em mim, quando eu mesmo pensei em desistir, sempre me incentivando e sendo agente principal da minha longa caminhada acadêmica, pois, sem seu decisivo amparo ao meu lado, nada disso seria possível hoje! Agradeço por me encorajar a conquistar meus sonhos e principalmente por torná-los reais. Agradeço seu companheirismo ao longo do curso, sua paciência em vários momentos, sua compreensão e atenção que recebi durante minha formação. Muito obrigada! Agradeço á minha mãe Maria das Graças Batista Moura, que mesmo longe de mim, sempre está em meus pensamentos, ou falando ao telefone comigo, tendo orgulho de mim, com palavras carinhosas, me incentiva. Obrigada mãezinha por me amar incondicionalmente. Dedico minha formação a você dona Graça, que sempre lutou por cada um de seus filhos, mãe querida sinto saudades. Aos meus amados irmãos , meu muito obrigada, Antônia Gracelia Batista Moura e 5 meu lindo irmão Jeferson Batista Moura, agradeço por todo carinho que sempre tiveram por mim, por contribuírem para minha formação direta ou indiretamente. Agradeço aos meus sobrinhos maravilhosos; Gleiciane Batista ,Jeovany Batista da Anunciação e em especial a razão da minha vida, ,minha sobrinha Laís Kimberly de Souza Batista, desculpe a ausência em determinados momentos. Agradeço por ser compreensiva e entender que aos dias finais de concluir o trabalho monográfico, não pude lhe dá atenção que tanto precisava. Dedico todos os meus esforços a você minha princesinha Laís Kimberly. Obrigada por está ao meu lado sendo mais um incentivo para minha vida. As minhas cunhadas Rávila Gabriele Oliveira Ramo e em especial a Kely Pinheiro de Oliveira Batista, obrigada por me ouvir, por está comigo quando mais precisei, por ser amiga, agradeço a Deus por ter vocês em nossa família, obrigada cunhadas por tudo. A minha madrinha Maria Raimunda. Meus mais sinceros agradecimentos ao meu amigo e orientador MSc. Antônio Klinger da Silva Souza, não tenho palavras para descrever como sou grata por toda dedicação com a condução e conclusão deste trabalho, pois suas orientações foram fundamentais para a realização e conclusão desta monografia, agradeço a compreensão, disponibilidade, confiança, por ser paciente nas horas de angústia e dificuldades ao longo do trabalho, obrigada por disponibilizar seu tempo em me orientar. E principalmente por reafirmar que “Não vim até aqui pra desistir agora” (Engenheiros do Hawaii). Aos professores do Departamento de História da UFRR que contribuíram para minha formação acadêmica. Em especial aos professores por suas intensas contribuições: Drª Maria das Graças Santos Dias, Dr Nélvio Paulo Dutra Santos, Dr. Reginaldo Gomes de Oliveira, MSc Márcia D’Acampora, Drª Maria Luiza Fernandes e ao meu querido e com carinho professor, Orlando de Lira Carneiro. Aos meus amigos do curso de História do ano de 2008, onde tive a oportunidade de conhecer pessoas maravilhosas, que certamente jamais esquecerei. Aos amigos do PIBID- Adriele, Elen, Thiago e Rozenildo.e ao professor Alfredo A minha amiga que do início do curso até o termino esteve presente, Adriane Fernandes Brito, que compartilhou diversos momentos, foram muitas histórias vividas, uma amizade que será eterna. Agradeço a Gizele de Souza França, que longe ou perto sempre torceu pelas minhas 6 conquistas, obrigada por ser amiga em todas as horas. Agradeço as palavras amigas de Kassandra Pinheiro de Oliveira Amorim, que sempre acreditou em mim, ajudando-me nos momentos que mais precisei. Agradeço a Jesana Pereira Figueira amiga de longa dada que é como uma irmã pra mim. Minhas amigas. Sonaira, Nádia, Claudilene, Daina e Jessyka Karolaine que direta ou indiretamente me ajudaram. As minhas queridas amigas do curso de História Wandercila Veras (kinha) uma pessoa incrível e amiga de todas as horas, a minha amiga flor Eurinedes Gonçalves, Wendleng Stephannie Barreto da Silva, não posso deixa de agradece a Karoline Viana Coelho, obrigada meninas. Agradeço aos amigos Elvis Cândido, Jobson Cândido, Ismael Guedes,.Fábio Almeida, Leonardo por me ajudarem no decorrer do curso. Não poderia deixar de agradecer ao meu querido amigo Francisco Marcos Mendes Nogueira, que com uma simples frase, faz o meu dia ficar melhor “Bom dia flor do dia” obrigada por todo carinho que recebo. Um agradecimento todo especial aos entrevistados Eliakin Rufino, Neuber Uchâo e Zeca Preto, por responder ao questionário, obrigada por me ajudarem a realizar e eternizar um sonho. Agradeço ao professor Dr. Reginaldo Gomes de Oliveira, que me ajudou no início do projeto da minha monografia, obrigada por fazer parte do meu trabalho, em todos os momentos que precisei sempre disposto a me ajudar, sou grata por ter respondido ao questionário. Agradeço por tudo professor Reginaldo. Meu agradecimento mais que especial á minha querida e amada professora Dr Maria das Graças Santos Dias, só tenho a agradecer por ter sido sua aluna, obrigada por me incentivar e acreditar em mim. Enfim, agradeço a todas as pessoas que alguma forma contribuíram para minha formação acadêmica. 7 Makunaimando Cai o sol na terra de Makunaima Boa Vista no céu, lua cheia de mel sob a serra de Pacaraima eu sou de Roraima surubim, tucunaré, piramutaba sou pedra pintada, buriti, bacaba Caracaranã, farinha d’água, tucumã curumim te espera cunhantã um boto cantando no rio beijo de caboco no cio parixara na roda de abril, se abriu linha fina no meu jandiá carne seca, xibé, aluá jiquitaia, caxiri, taperebá... (Zeca Preto) 8 RESUMO Este trabalho discute questões relacionadas à cultura e a identidade roraimense, dando ênfase em apresentar o Movimento Roraimeira, sendo os questionadores desta temática na década de 1980 em Roraima. Os artistas apresentam como eram retratadas a arte e cultura no em então Território Federal de Roraima, através dos periódicos da época em questão, enaltecem alguns pontos que os jornais abordavam, com as falas dos artistas que enfatizavam questões como a falta de políticas públicas voltadas a arte, os mesmos eram retratados, como um grupo pequeno e teimoso, pois debatiam essas questões em Roraima. O trabalho contém seis perguntas envolvendo os embates que fizeram parte da gênese do Movimento Roraimeira, e como foram apresentados ao Ex-Território de Roraima, em suas falas os integrantes do Movimento Roraimeira apresentam pontos indispensável para compreensão dos debates artísticos e culturais que fomentavam na década de 80 em Roraima. Palavras-chave: Cultura; Identidade; Movimento Roraimeira; Jornais. 9 ABSTRACT This paper discusses issues related to culture and identity roraimense, with emphasis on the present Roraimeira Movement, and the questioning of this issue in the 1980s in Roraima. The artists present were portrayed as the art and culture in the then Federal Territory of Roraima, through the periodicals of the time in question, extol some points that newspapers dealt with the speeches of artists who emphasized issues such as lack of public policies to art, they were portrayed as a small, stubborn, because these issues debated in Roraima. The work contains six questions involving the clashes that took part in the genesis of Roraimeira Movement, and they were presented to the former Territory of Roraima, in their speeches the members of the Movement Roraimeira feature points essential to understanding the artistic and cultural debates that fomented the decade 80 in Roraima. Keywords: Culture, Identity, Movement Roraimeira; Newspapers. 10 LISTA DE ILUSTRAÇÕES QUADRO 1 – JORNAIS E MANCHETES SOBRE O RORAIMEIRA................................. 35 11 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 13 2. IDENTIDADE, CULTURA E UMA VISÃO DA LEI ....................................................... 17 2.1 Sobre cultura e identidade: uma análise teórica ................................................................. 17 2.2 Plano Nacional de Cultura e suas influências em Roraima ................................................ 21 3. UMA PROMOÇÃO RORAIMEIRA ............................................................................... 23 3.1 A musicalidade roraimeira ................................................................................................... 23 3.2 O poeta Eliakin ................................................................................................................... 28 3.3 A “Cruviana” de Neuber Uchôa ......................................................................................... 30 3.4 “O Filho de dona Neuza”: Zeca preto ................................................................................ 31 4 DECADÁ DE 80: AS NOTÍCIAS DO RORAIMEIRA ................................................... 33 4.1 O uso de jornais como fonte de pesquisa ............................................................................ 33 4.2 As notícias do Roraimeira .................................................................................................. 35 4.3 Breves relances da História de Boa Vista ........................................................................... 42 5. COMPREENDER AS INFLUÊNCIAS CULTURAIS INTERNAS E EXTERNAS NA PRODUÇÃO DAS LETRAS DAS MUSICAS DO MOVIMENTO RORAIMEIRA ...... 45 5.1 Como nasceu o Movimento Roraimeira? ........................................................................... 46 5.2 Quais as ideias centrais do Movimento Roraimeira? ......................................................... 48 5.3 Quais as principais influências do Movimento Roraimeira? ............................................. 50 5.4 Quais Os Principais Protagonistas? .................................................................................... 51 5.5 Quais linguagens artísticas mais visíveis do Movimento Roraimeira? .............................. 53 5.6 Quais as principais obras de música, literatura, artes plásticas, fotografia, dança? ........... 54 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................. 57 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 60 ANEXOS ANEXO A: Jornal de Roraima 11/04/1991 .............................................................................. 62 ANEXO B: Boletim da Educação e Cultura 10/1984 .............................................................. 63 ANEXO C: Folha de Boa Vista, 05/10/1984 ............................................................................ 64 ANEXO D: Folha de Boa Vista, 22/01/1989 ........................................................................... 65 ANEXO E: Folha de Boa Vista, 22/01/1989 ............................................................................ 66 ANEXO F: Folha de Boa Vista, 22/01/1989 ............................................................................ 67 12 ANEXO G: A Critica de Roraima, 13/08/1989 ........................................................................ 68 ANEXO H: A Critica de Roraima, 13/08/1989 ........................................................................ 69 ANEXO I: A Critica de Roraima, 13/08/1989 .......................................................................... 70 ANEXO J: A Critica de Roraima, 13/08/1989 ......................................................................... 71 ANEXO K: O Estado de Roraima, 10/03/1991........................................................................ 72 ANEXO L: Folha de Boa Vista, 21/03/1991 ............................................................................ 73 ANEXO M: Folha de Boa Vista, 13/04/199 ............................................................................. 74 ANEXO N: Folha de Boa Vista, 15/06/1991 ........................................................................... 75 ANEXO O: Jornal de Roraima, 18/06/1991 ............................................................................. 76 ANEXO P: Jornal de Roraima, 23/06/1991 ............................................................................. 77 ANEXO Q: Folder .................................................................................................................... 78 ANEXO R: Folder .................................................................................................................... 79 ANEXO S: Folder .................................................................................................................... 80 13 1 - INTRODUÇÃO A cultura artística está ligada as questões de representações, o Movimento Roraimeira é um marco, nas discussões sobre a cultura regional, natureza, beleza e rica dos costumes indígenas de Roraima. O Movimento apresenta todos esses elementos, pois o mesmo é multicultural. Suas representações vão além das músicas, das discussões entre amigos, além da arte, o Movimento Roraimeira é uma referência, abriga de braços abertos às pessoas que por algum motivo migraram para o extremo norte e aqui adotaram Roraima como sua terra, criando raízes, não querendo mais ir embora, se tornando assim pertencentes a Roraima. Através da arte expõem toda a riqueza da Amazônia. O Movimento Roraimeira transita no tempo, pois o mesmo, nos dias de hoje, suas canções são reconhecidas e cantadas. Com suas músicas expandem seus horizontes, as belezas naturais demonstrando a cada geração, o que vem a ser o Movimento. Suas músicas ultrapassam fronteiras, não admite preconceitos, suas canções revelam em simples palavras as exuberâncias da fauna e flora de Roraima, sua musicalidade é única. Buscam na simplicidade de ser e de viver suas inspirações, declamam seus amores em versos, quadros, fotografias, canções e apresentações teatrais. O Movimento Roraimeira, no passado, buscava com demonstrações públicas sua luta pela valorização da arte e da cultura. Diferentemente dos dias atuais, o Movimento está em foco, e bem vivo, suas músicas são frequentemente tocadas nas rádios, há documentários relacionados ao Movimento, nas redes sociais são queridos e bem aceitos, seus projetos que consistem em apresentar shows uma vez por mês na casa do Neuber, tem público garantido, na Universidade há debates sobre a temática Roraimeira. Suas vozes foram ouvidas e ainda ecoam por Roraima. O Movimento Roraimeira colhe o que plantou nos anos de 1980, são popularmente conhecidos, e principalmente reconhecidos. Seus artistas ocupam seu lugar ao sol, com talento e genialidade. Cada canção tem um sentido único, escritas de diferentes formas, com objetivos próprios destinados, como é o caso da canção Roraimeira, que foi escrita bem antes dos primeiros debates sobre o Movimento, mas foi escolhida para dar nome ao Movimento. 14 O Movimento Roraimeira teve sua gênese nos anos 80, com um grupo de artistas de diversas linguagens culturais, formado por elemento das mais diversas partes do Brasil, sobressaindo os nascidos em Roraima – que, por meio das manifestações indígenas e inspirações colhidas na natureza (fauna e flora), buscavam uma identidade regional. Suas ações e atuações levavam, e ainda hoje levam, seus expectadores a uma viagem as nuances regionais, até então pouco conhecida, pela massa migrante que compunha o atual Estado de Roraima. A população de Roraima é formada a partir de uma diversidade étnica. Esta diversidade faz do Estado um imenso caldeirão cultural, que tem sua particularidade em ser um Estado plural, pois, há uma diversidade de costumes e idiomas principalmente os indígenas. Nesta linha, sabendo que Roraima é composto em sua maioria por migrantes, entendemos que este trabalho poderá proporcionar à sociedade local o conhecimento de um Movimento artístico e cultural que predominou no cenário nacional durante as décadas de 1980 e 1990, mas que a nível local não teve o devido reconhecimento. Ainda assim, nessa contemporaneidade, vem ressurgindo no espaço midiático, como se a sua identidade fosse, somente agora, desvelada para a sociedade. Roraima convive com seus povos indígenas, os ribeirinhos, os nordestinos, os sulistas, isto ocorre por uma heterogeneidade gerada com o fluxo migratório. Este trabalho apresenta questões relacionadas às migrações que fazem parte da construção do então Território Federal de Roraima, este trabalho não tem interesse em analisar está questão, pois nosso enfoque está ligado especificamente aos debates artísticos e culturais envolvendo alguns agentes, pertencentes ao Movimento Roraimeira. A finalidade, portanto, é apresentar uma análise sistemática sobre questões envolvendo embates culturais e identitários em Roraima, partindo sobre os aspectos do Movimento Roraimeira. Tendo como aporte os periódicos da década de 1980. Para melhor analise utilizamos de questionário, para fazer as comparações nas falas dos artistas selecionados para o trabalho. Através dos questionamentos colhidos dos artistas e integrantes do Movimento Roraimeira, podemos inferir que com as narrativas, permitiu analisar os significados atribuídos as vivencias e as trajetórias individuais. É interessante perceber que o Movimento Roraimeira vem ocupando, aos poucos, seu espaço no meio acadêmico, em especial na Universidade Federal de Roraima - UFRR, sendo por diversas ocasiões e nos mais diversos cursos temas de trabalhos de conclusão de curso, 15 monografias, videografias, documentários, artigos científicos, dentre outros, ou mesmo tendo, em seu âmbito, a presença de membros do Movimento para explanações e apresentações de seus trabalhos para a comunidade acadêmica. O recorte temporal justifica-se com base no fluxo de migrantes para Boa Vista na década de 1980, onde começam a surgir um questionamento sobre a cultura local e qual seria sua identidade, estas questões envolveram uma gama de diversos pensamentos, pessoas da música, artes, escritores, dançarinos, poetas, fotógrafos entre outras expressões artísticas, que faziam o debate da construção cultural de Boa Vista, para compreender as mudanças evidenciadas neste período. Ressaltamos que nossa problemática para o desenvolvimento do trabalho partiu do seguinte questionamento: Quais as implicações culturais que exerceu o Movimento Roraimeira no contexto do Território Federal de Roraima na década de 1980? Tivemos, inicialmente, a expectativa em trabalhar com entrevistas mistas, através de um questionário com seis perguntas relacionadas à temática, pois entendíamos que o contato com os artistas aconteceria sem maiores problemas, uma vez que os sujeitos dessa pesquisa moram em Boa Vista e em plena atividade artística. Contudo, vislumbramos nos jornais da época um arcabouço primaz de fontes para desenvolver a pesquisa. Sendo assim, optamos metodologicamente em analisar as notícias publicadas nos jornais para escrever a trajetória do Movimento Roraimeira. O objetivo geral do trabalho é identificar os fatores artísticos e culturais na década de 1980 em Roraima, verificando as características do cenário regional na música. É de suma importância a valorização dos artistas locais, pois, os mesmo expressam a identidade de um povo por meio da arte. Um bom exemplo são as músicas cujas letras descrevem a beleza e pluralidade de determinadas regiões, culturas ou sociedades, além de demonstrar sentimentos vividos pelo artista em contato com o meio no qual está inserido. No primeiro capítulo analisamos teorias relacionadas a identidade e a cultura tendo por base autores da Nova História e da Antropologia, pois entendemos que são indispensável para debates relacionados à temática, uma vez que os mesmo apresentam sucintamente, enfoque pertinentes a construção do trabalho. No capitulo seguinte fazemos uma breve explanação sobre a musicalidade que é de fundamental importância ao trabalho, pois através das canções há uma representação de 16 Roraima, também ocorrem os debates, que surgem através de encontros musicais, enfatizando as músicas de composição dos artistas Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto. Ao pensarmos a confecção do terceiro capítulo procuramos dar maior ênfase ao Movimento Roraimeira, portanto, buscamos analisar notícias relacionadas aos membros do Trio. Para isso buscamos selecionar dez manchetes de jornais referentes as falas dos integrantes do Movimento Roraimeira e em seguida, analisamos cada periódico para termos melhor clareza dos acontecimento inerentes a eles. O último capítulo é construído a partir do uso de um questionário com seis perguntas relacionadas ao Movimento Roraimeira. Foram entrevistados os artistas Eliakin Rufino, Neuber Uchôa, Zeca Preto, e também entrevistamos o Professor Dr. Reginaldo Gomes de Oliveira1. A ideia deste capítulo foi compreender as nuances da gênese do Movimento Roraimeira e trazer para os dias atuas as falas dos mesmos. O Trio Roraimeira atualmente é reconhecido culturalmente, é um grupo que já somam duas décadas de árduos trabalhos voltados à construção da identidade roraimense. O grupo Roraimeira, possui discos gravados e um vasto currículo com experiência de apresentações em eventos de vários Estados do país. No exterior, o grupo já realizou turnês com shows na Europa, Portugal Este trabalho é antes de tudo uma tentativa de adquirir subsídios que nos permitam formular respostas para algumas indagações que se fazem presentes no cenário artístico e cultural de Roraima. Apesar de termos encontrados uma gama de trabalhos que utilizaram o Movimento Roraimeira como objeto ou sujeito de pesquisa, inclusive o documentário exibido pela TV Universitária, entendemos que este continua a ser um tema a ser explorado, o qual pode proporcionar muitas outras discussões, pois a história do Movimento também representa e remete à história da cultura artística de Roraima. 1 Professor Associado lotado no Departamento de História/ UFRR. Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Desenvolve pesquisas sobre Amazônia e Artes, atuando principalmente com temas relacionados à História Cultural de Roraima, Estado de Roraima, Arte em Roraima, História e Movimentos Sociais e História e Desenvolvimento Regional. Consultor na área de História na ODIC (Organização dos Indígenas na cidade). Pesquisador-Visitante na Universidade de Guyana e na Universidade do Suriname. Atualmente é vice-reitor da Universidade Federal de Roraima (UFRR). 17 2 IDENTIDADE, CULTURA E UMA VISÃO DA LEI 2.1 Sobre cultura e identidade: uma análise teórica Os pressupostos teóricos que permearam a confecção deste trabalho tiveram seu aporte baseado no viés da Nova História Cultural. Com os novos campos da historiografia, a História ganham um novo rumo, isso se dar a partir da segunda metade do século XX, com a Escola dos Annales (1929), principalmente com a terceira geração dos Annales, que vão discutir diferentes abordagens e há uma aproximação da História com outras ciências. Desta forma surge à concepção da Nova História Cultural que tem diversos elementos entrelaçando os conceitos de cultura. Como aporte para trabalhar esse termo, Peter Burke descreve cultura da seguinte forma: O termo cultura costumava se referir às artes e às ciências, depois, foi empregado para descrever seus equivalentes populares – músicas folclóricas, medicina popular e assim por diante. Na última geração, a palavra passou a se referir a uma ampla gama de artefatos (imagens, ferramentas, casas e assim por diante) e práticas (conversar, 2 ler, jogar) . Por isso entendemos a necessidade de trabalhar outras áreas dos diversos campos das ciências, propondo um debate com a Antropologia. Para assim compreender como se dá o contexto da cultura. A Nova História Cultural estabelece um dialogo com a Antropologia Simbólica, portanto, corroborando com Geertz percebemos que “o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo essas teias e a sua analise3”. Com esta afirmação é possível expor exatamente os elementos pesquisados quando inferir que, ao mesmo tempo, o homem produz sua cultura e também é o produto da mesma. Como o termo “cultura”, é amplamente utilizado, por diversas ciências, possui uma conceituação vasta e complexa. Diante de tantos conceitos, recorre-se, a Geertz quando descreve que cultura tem uma natureza simbólica e uma estruturação sistemática que viabiliza sua reprodução e manutenção: Como sistemas entrelaçados de signos interpretáveis, (o que eu chamaria símbolos, ignorando as utilizações provinciais), a cultura não é um poder, algo ao qual podem ser atribuídos casualmente os acontecimentos sociais, os comportamentos, as 2 BURKE, Peter. O Que é História Cultural, 2ª Ed., Rio de Janeiro, Zahar, 2008, p.43. 3 GEERTZ, Cliford. A interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1989, p.15. 18 instituições ou os processos; ela é um contexto, algo dentro do qual eles podem ser descritos de forma inteligível – isto é, descritos com densidade4. A História Cultural mantém uma relação de proximidade com a Antropologia Simbólica. “Estudar a cultura é, portanto, estudar um código de símbolos partilhados pelos membros dessa cultura5”. A definição de cultura é muito ampla e não é tão simples defini-la. Seu conceito é múltiplo. De uma forma geral podemos inferir que ela é a junção de ideias, abstrações e comportamento de um determinado grupo/sociedade, é tudo aquilo que é produzido pelo homem, sendo concreto ou imaterial, neste sentido o Movimento Cultural Roraimeira busca expressar, pela arte, as belezas de Roraima, a valorização do povo boavistense, as riquezas culturais e contribuir para entender a formação da identidade regional. Pesavento acentua que “A cultura é ainda uma forma de expressão e tradição da realidade que se faz de forma simbólica, ou seja, admite-se que os sentimentos conferidos às palavras, às coisas, às ações e aos atores sociais se apresentam de forma cifrada, portanto já um significado e uma apreciação valorativa.” 6 Assim, percebemos que cultura é uma expressão da construção humana, atreladas as questões identitárias, sendo construída através do diálogo entre as pessoas no dia a dia “Assim, cultura e identidade estão estreitamente interligadas, no sentido da produção e da troca de significados compartilhados.” 7 Nessa interação social a formação se dá gradativamente por meio de símbolos e significados que fazem sentido a essas pessoas, e são compartilhados entre elas. Burke enfatiza que a cultura “não possui muros e arames farpados que possam impedir o trânsito de ideias e a ressignificação das identidades.”8 Toda manifestação cultural está repleta de elementos e significados que identificam o povo a que pertence, a uma determinada comunidade ou região. 4 GEERTZ, Cliford. A interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1989, p.24. 5 LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro: 24ª Ed. Jorge Zahar, 2009, p. 63. 6 PESAVENTO, Sandra Jatahy. História & história Cultural, 2ª Ed., Belo Horizonte. Ed. Autentica, 2008, p.15. 7 LAZZARIN, Luís Fernando. Multiculturalismo e multiculturalidade: recorrências discursivas na educação musical. Revista da ABEM, Porto Alegre, V. 19, 121-128, mar. 2008. p.124. 8 BURKE, Peter. O que é História cultural: Fronteiras e encontros. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 2005. p. 153. 19 Tendo como aporte teórico as bases da Nova História Cultural, destacamos que é preciso analisar e compreender o objeto de pesquisa, no caso, o debate artístico e cultural, neste aspecto, ainda tendo por base o que ressalta Pesavento: Tais traços são, por sua vez, indícios que se colocam no lugar do acontecido, que se substituem a ele. São, por assim dizer, representações do acontecido, e que o historiador visualiza como fontes ou documentos para sua pesquisa, porque os vê como registros de significados de questões que levanta. Estamos, pois, diante de representações do passado que se constroem como fonte através do olhar do historiador. (...) A História Cultural se torna, assim, uma representação que resgata representações, que se incumbe de construir uma representação sobre o já 9 representado . Neste contexto, os processos de representação estão sujeitos a intensas reformulações, de acordo com os interesses que estejam em jogo. Woodward descreve que “a representação inclui as práticas de significação e os sistemas simbólicos por meio dos quais os significados são produzidos, posicionando-nos como sujeito. É por meio dos significados produzidos pelas representações que damos sentido à nossa experiência e àquilo que somos” 10. Com a temática proposta busca-se entender o processo do debate cultural da década de 1980 em Boa Vista, haja vista, no período que compreende o espaço temporal, o cenário está em constantes transformações. Naquele período, Roraima, ainda era Território Federal, no entanto, já havia pressão e articulações políticas que viabilizasse sua mudança para a condição de Estado. Contudo, o enfoque do trabalho está em debater as questões culturais do então Território Federal de Roraima. O Movimento Roraimeira está ligado a representações roraimenses11 nas questões culturais, em todos os seus segmentos, com todas as riquezas e sua complexidade nas músicas, nas artes plásticas, na dança, na literatura e também na fotografia, o Movimento se expressa na demonstração pública de luta pela valorização da arte, da cultura, na valorização das belezas naturais, nas questões de diversidades socioculturais, nas expressões e símbolos da cultura indígena local. Entende-se o sentimento do Roraimeira12 como algo que sempre se alimenta da cultura, e varia de acordo com concepções subjetivas de pessoas, corpo, 9 Idem, p.42-43. 10 WOODWARD, Kathryn. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.) Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. 9. Ed. Petrópolis: Vozes, 2009, p. 17. 11 Aquilo que é próprio de Roraima. 12 Em entrevista concedia no dia 14 de março de 2013, o artista Eliakin Rufino, definiu o que seria sentimento Roraimeira, sendo um sentimento de amor à cidade. 20 identidade. O Movimento esboça à tentativa de estabelecer, e conhecer um sentimento, preservar as raízes culturais regionais, fomentando uma reflexão através da arte . Em entrevista a Revista RAIZ no dia 07 de dezembro de 2006, Eliakin Rufino explica o que foi o Movimento Roraimeira: […] é o nome de uma música do cantor e compositor paraense Zeca Preto. Esta música foi classificada em 2° lugar no II Festival de Música de Roraima que aconteceu em julho de 1984. É a primeira música que fala do povo e da paisagem de Roraima. […] falava da nossa cultura e da nossa paisagem natural. Outros artistas, de outras linguagens artísticas, que também utilizavam a temática local nas suas obras, se juntaram a nós: nasceu aí o Movimento Cultural Roraimeira, inspirado no Movimento Modernista e no Movimento Tropicalista, com o objetivo de construir uma estética local e começar a esboçar e revelar uma identidade cultural para o povo de Roraima. […] um Movimento Cultural (música, literatura, fotografia, artes plásticas, dança) que reconhecia e acomodava todas as diferenças e apontava para a diversidade e a pluralidade como a marca da nossa identidade13. Ao descrever o Movimento Roraimeira, Eliankin Rufino relata como foi à gênese do mesmo enfatizando que o nome dado foi tirado de uma canção do musico Zeca Preto, deste modo o poeta apresenta as linguagens e expressões artístico-culturais que compunha toda aquela manifestação que ajudou a difundir a cultura no então Território Federal de Roraima, os artistas que envolveram diversas áreas da arte, fala das influências aponta que a temática do grupo estava interligada as questões da fauna e flora presente, nas suas apresentações. Em 1989, Eliakin Rufino foi entrevistado pelo Jornal de Roraima, neste período o Movimento estava em expansão, o poeta explicava quais as temáticas do show Roraimeira, esboçando sua preocupação ao reafirmar que o espetáculo estava voltado para a conscientização das raízes boa-vistenses. Ambos os integrantes acreditam que Roraimeira, não é somente um espetáculo. “Fazemos parte de um Movimento Cultural, voltado para os temas regionais, que é a linguagem universal, depois do Romantismo. A mistura perfeita entre música dança e poesia proporciona aos espectadores uma constatação da realidade cultural de Roraima”. Segundo Eliakim Rufino, a fórmula do espetáculo reúne duas condições básicas para divulgar a arte e a cultura de Roraima. O show é cultural e educativo, por isso tratamos especificamente temas regionais14. Para Eliakim Rufino Roraimeira é puro regionalismo! Que por meio de suas artes, o que se via e o que se ouvia, fazia parte do vocabulário e do cotidiano das pessoas que moravam em Roraima, expressando toda beleza do regionalismo em poesias, músicas, dança, fotografia, para deixar registrados fatos que não poderiam ser esquecidos, era preciso mostrar 13 14 RAIZ – Cultura do Brasil. www.revistaraiz.uol.com.br. Acessado em 11 de novembro de 2011. JORNAL DE RORAIMA. Sucesso de “Roraimeira” terá reprise. Boa Vista, 11 de abril de 1991. 21 primeiramente aos roraimenses que havia cultura artística em Roraima, que devia ser valorizada e aceita. Nesses entraves começava a ter uma preocupação relacionada a essas discussões em relação à cultura e identidade. Nesse ínterim, Stuart Hall15 em sua concepção de identidade, trata de questões culturais e identitárias sob uma perspectiva relacional, sendo esta desenvolvida a partir da problematização dos conceitos de identidade e cultura, “o próprio processo de identificação, através do qual nos projetamos em nossas identidades culturais, tornou-se mais provisório, variável e problemático”, propondo-nos pensar que tais conceitos ganharam novas abordagens com a modernidade. 2.2 Plano Nacional de Cultura e suas influências em Roraima Atualmente, a lei 12.433/2010 é a principal política pública desenvolvida pelo Governo Federal, por meio do Ministério da Cultura, para incentivar os artistas brasileiros. O Ministério da Cultura lançou “As metas do Plano Nacional de Cultura”, no dia 2 de Dezembro de 2010, em ato continuo, no qual foi sancionada a lei n° 12.343/2010. Em seu primeiro artigo ficou estabelecido o seguinte: Art. 1° - Fica aprovado o Plano Nacional de Cultura, em conformidade com o § 3° do art. 215 da Constituição Federal, constante do anexo, com duração de 10 (dez) anos e regido pelos seguintes princípios: no Art. 2° inciso I, III, IV diz: reconhecer e valorizar a diversidade cultural, étnica e regional brasileira; valorizar e difundir as criações artísticas e os bens culturais; universalizar o acesso à arte e à cultura; estimular a presença da arte e da cultura no ambiente educacional16. Essa Lei serviu de impulso para muitos artista que, até então, não conseguiam dedicarse exclusivamente à sua arte, sendo necessário, como em quase todos os casos no Brasil, a dependência de uma outra fonte de renda para que possa se manter. Como o Plano de Metas foi possível perceber e por em prática a valorização cultural, mas principalmente, do artista. Isso inspirou muitos outros pólos de cultura e abrirem caminho para novos aprendizes nas artes, fez surgir escolas e oficinas voltadas para tal fim, levando em consideração, primordialmente, a identidade regional. 15 16 HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 10ª Ed., Rio de Janeiro: DP&A, 2005, p.12. METAS DO PLANO NACIONAL DE CULTURA. content/uplods/2012/02/METAS_PNC_final.pdf. Acessado em 22/02/13. www.Pnc.Culturadigital.br/wp- 22 As bases dessa Lei estão contidas na Constituição Federal de 1988, a qual assegura a todos cidadãos brasileiros o incentivo a cultura, a proteção das diferentes formas de expressão. Nesse ínterim, convém destacar, ainda, que é dever do Estado garantir a cultura e proteger as diversas manifestações culturais. Deste modo, a Carta Magna, por meio de seus enunciados, reconhece e valoriza a diversidade cultural, étnica e regional brasileira; valoriza e difunde as criações artísticas e os bens culturais e; promove o direito à memória por meio dos museus, arquivos e coleções. 23 3 UMA PROMOÇÃO RORAIMEIRA 3.1 A musicalidade Roraimeira “Te achei na grande América do Sul quero atos que me falem só de ti e em tua forma bela e selvagem entre os dedos o teu barro o teu chão e em tuas férteis terras enraizar a semente do poeta Eliakim nos seus versos inerentes ao amor...” (Roraimeira – Zeca Preto) No trecho em epígrafe, que é parte da música Roraimeira autoria de Zeca Preto, que foi escrita no ano de 1984, podemos perceber inicialmente, a presença de vários elementos que são próprios do Movimento Roraimeira. A canção exalta em sua primeira frase a condição de migrante a qual o compositor faz parte, ele, oriundo do Estado do Pará descreve seu encantamento ao encontrar Roraima na imensidão da América do Sul, além de seu interesse em querer conhecer os costumes e a história da região. A partir de então, em parceria com outros artistas buscam apresentar Roraima ao mundo tendo como suporte a inspiração em elementos da fauna e da flora, além das manifestações indígenas e dos costumes da população regional, isso pode ser compreendido no trecho “entre os dedos o teu barro, o teu chão”, pois há uma relação muito próxima com artistas plásticos que também contribuíram para a formação do Movimento Roraimeira. Portanto, vindo se juntar ao poeta Eliakin Rufino, que até então semeava sua arte por meio de suas poesias, publicando em jornais locais e regionais da época. Vimos, então, que anos mais tarde as sementes plantadas por Eliakin germinaram, cresceram e agora fornecem frutos, dos quais os roraimenses, e outros brasileiros se deliciam, embalados pelos “versos inerentes ao amor”. O Movimento Roraimeira, tem como principais artistas, o grupo musical formado por três componentes: Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto, suas marcas registradas são as diversidades temáticas e a pluralidade musical que há muito tempo desenvolvem trabalhos que estão relacionados à identidade cultural roraimense. Cuja característica é a valorização indígena aliada a um caldeirão de sons que misturam ritmos caribenhos, amazônicos e nordestinos. 24 No ano de 1991 o artista Eliakin Rufino deu uma entrevista para o Jornal de Roraima17, descrevendo como foi o início do Movimento Roraimeira. Para o poeta: [...] RORAIMEIRA começou em 1989, no teatro Amazonas, durante lançamento do livro de Eliakin, evento que contou com a participação de músicos locais, exibida em público a música “RORAIMEIRA”, de Zeca Preto, que deu idéia para o show […]. Com o êxito da festa, Eliakin, que fazia faculdade de Filosofia em Manaus, descobriu que seria viável a realização de “uma noitada roraimense”. Que pouco tempo depois foi executada por Eliakin, Neuber e Zeca Preto, no mesmo esquema do show feito por eles no ano seguinte aqui em Boa Vista, onde não havia sido apresentado um espetáculo desse tipo ainda. Após a apresentação os artistas seguiram suas carreiras solo. Reencontrando-se em 88 quando Neuber Uchôa e Zeca Preto gravaram o disco em conjunto, o 'caimbé' reacendendo a chama do RORAIMEIRA.18 Na década de 1980, havia diversas manifestações artísticas das quais participavam, inclusive, integrantes de origem indígena. Neste sentido nos propomos discutir as influências como elementos modificadores culturais na cidade de Boa Vista. Dando destaque as canções produzidas que retratavam a cidade, no sentido de representar suas belezas e atrativos culturais: “Sons e ruídos estão impregnados no nosso cotidiano de tal forma que, na maioria das vezes, não tomamos consciência deles. Eles nos acompanham diariamente, como uma autêntica trilha sonora de nossas vidas, manifestando-se sem distinção nas experiências individuais ou coletivas”19. O espetáculo do grupo Roraimeira traz músicas, envolventes, ricas culturalmente que identificam o estilo musical roraimense. O Trio Roraimeira20 lançou o LP “Roraima” (1992) e o CD “O canto de Roraima” e suas influências indígenas e caribenhas, gravado ao vivo no Teatro Carlos Gomes, em Boa Vista, RR, em abril de 2000. Tendo sido selecionado para o Projeto Pixinguinha/2008, culminando no lançamento, no dia 12 de agosto de 2009, no Palácio da Cultura (RR) o CD RORAIMEIRA – O canto de Roraima. O Movimento Roraimeira foi objeto do “Documentário Roraimeira – Expressão amazônica”, da série DOC-TV/MinC, do documentarista Thiago Bríglia, O documentário aborda o Movimento Roraimeira, surgido em Roraima no início dos anos 1980, e que se 17 JORNAL DE RORAIMA. Sucesso de “Roraimeira” terá reprise. Boa Vista, 11 de abril de 1991. 18 Idem. 19 MORAES, José Geraldo Vinci de. História e música: canção popular e conhecimento histórico. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 20, nº 39, p. 203-221. 2000, p. 204 20 Como ficou conhecido os integrantes do Movimento Roraimeira, composto pelos artistas; Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto. 25 desenrolou no estado durante os dez anos seguintes. Artistas locais das artes plásticas, música, dança e fotografia, lançaram seu olhar sobre os aspectos singulares da cultura roraimense, elaborando uma efervescente cena artística popular. Foi exibido pela Rede Brasil no dia 27/08/2009. O Movimento Roraimeira tem um vasto repertorio, entre essas letras de músicas podemos destacam: Do norte, Canto das águas, Cruviana, Roraimeira, Makunaimando, Cidade do campo, dentre outras canções. Tendo as músicas elementos de expressão da valorização regional, difundidos e representados pelos músicos locais. Percebendo a importância de preservar e resgatar os hábitos e costumes locais através das canções, no contexto histórico e social, Bosi21 descreve a música como plural e não singular. A música estabelece uma dimensão sem fronteira, é considerada ciência e arte, sendo uma expressão artística, que não se importa com raça ou nível social, contém forte poder de comunicação. Como aponta Faria “A música passa uma mensagem e revela a forma de vida mais nobre, a qual, a humanidade almeja, ela demonstra emoção, não ocorrendo apenas no inconsciente, mas toma conta das pessoas, envolvendo-as trazendo lucidez à consciência.”22 Ela é plural, valiosa, encanta, representa e transmite informações! É utilizada para expressar sentimentos, revoltas, fortalecendo assim a cultura. Possui papel importante para o enriquecimento humano, pois, trás consigo o poder de transformar sentimentos, ideias e cotidianos. Nela sempre haverá dois lados. Neste sentido Morais esclarece que “Pois música é, antes de mais nada, movimento. E sentimento ou consciência do espaço-tempo. Ritmos; sons, silêncios e ruídos; estruturas que engendram formas vivas. Música é, igualmente, tensão e relaxamento, expectativas preenchida ou não, organização e liberdade de abolir uma ordem escolhida; controle e acaso”23. Um dos fatores mais importante na construção de uma sociedade é sem dúvida sua herança cultural e a música faz parte deste contexto relacionado à cultura. Para Thiago Pinto as questões relacionadas às contribuições que a música apresenta estão descritas quando o autor revelar que “música é manifestação de crenças, de identidades, é universal quanto à sua existência e importância em qualquer que seja a sociedade. Ao mesmo tempo é singular e de 21 BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das letras, 1996. 22 FARIA, Márcia Nunes. A música, fator importante na aprendizagem. Assis chateaubriand – Pr, 2001. 40f. Monografia (Especialização em Psicopedagogia) – Centro Técnico-Educacional Superior do Oeste Paranaense – CTESOP/CAEDRHS. 2001. p.4 23 MORAES Apud OLIVEIRA, Reginaldo Gomes. Roraima, Amazônia de Makunaima e o ensino de Música. (Programa de Pós-Graduação) CBM, Rio de Janeiro, 1991, p.45-46. 26 difícil tradução, quando apresentada fora de seu contexto ou de seu meio cultural” 24 . Inferindo que a música é muito mais que sons e palavras, elas apresentam uma diversidade, que não tem fronteiras, fazem parte da comunicação, descrevem fatos, acontecimentos, emoções, revoltas e que são eternizadas pelos seus criadores. O Movimento Roraima, em suas letras retratam as belezas do Estado, em suas canções, representam o retrato típico da região, fazendo, por vezes, com que apenas os familiarizados com a cultura local entendam o que determinadas letras ou palavras significam. Este contexto expressado pelo autor citado nos remete que é fundamental e necessário compreender os fatores que por ocasião fizeram parte da construção de determinadas canções, para entender e analisar quais são as informações que a canção aborda. Quando discorremos sobre música é essencial entender como se dá o processo de sua construção, com isso podemos perceber a contribuição que a letra da música nos fornece, o que ela traduz, como podemos visualizar sua perspectiva social e histórica e o que a canção constrói, Moraes aponta: Na realidade, a letra de uma canção, isto é, a “voz que canta” ou a “palavracantada”, assume uma outra característica e instância interpretativa e assim deve ser compreendida, para não se distanciar das suas íntimas relações musicais. O distanciamento relativo entre ela e a estrutura musical deve ser feito apenas com intenção analítica, pois os elementos da poética concedem caminhos e indícios importantes para compreender não somente a canção, mas também parte da realidade que gira em torno dela.25 Assim, podemos perceber como as canções são importantes para a sociedade, pois elas trazem e refletem um conjunto de informações, que são repassadas através de suas letras, que identificam um cenário, descrevem fatos e são utilizadas como forma de manifestações. Com relação à linguagem musical interna é necessário levar em conta variantes básicas relacionadas com a linha melódica e o ritmo. A(s) melodia (s) principal(is), os motivos musicais, o andamento, os ritmos e a harmonização, são elementos da linguagem musical que podem ser analisados isoladamente e nas relações entre si, pois têm um discurso e características próprias que normalmente apontam indícios importantes e determinantes para sua compreensão.26 24 PINTO, Tiago de Oliveira. Som e música. Questões de uma Antropologia Sonora. REVISTA DE ANTROPOLOGIA, São Paulo, USP, V. 44, nº 1, p. 222-286. 2001, p. 224. 25 MORAES, José Geraldo Vinci de. História e música: canção popular e conhecimento histórico. 2000, p.215. 26 Idem. 27 A construção de uma música tem como base três elementos, que são eles: melodia, harmonia e ritmo, a melodia identifica a música ou os sons sucessivos dando sentido a uma frase musical, já na harmonia são vários sons executados. E por fim o ritmo é a parte métrica da música. Nas canções que fazem parte do repertório do Movimento Roraimeira, identificamos questões relacionadas a um dialogo muito próximo com a realidade social, vivenciada no então Território Federal de Roraima. Música deve ser entendida como arte e relacionada ao conhecimento sociocultural. Mas eles também devem ser compreendidos na lógica do desenvolvimento da visão de mundo do autor que está, obviamente, vinculada também aos aspectos sociais e culturais de um determinado gênero e estilo. Além disso, a forma instrumental, os tipos de instrumentos e seus timbres, a interpretação e também os arranjos de um dado documento sonoro contêm indicações fundamentais para compreender a canção em si mesma e nas suas relações com as experiências sociais e culturais de seu tempo.27 Ao descrevemos sobre a música, identificamos como são compostas as propriedades do som, sendo elas: timbre, altura, intensidade e duração. Música é a arte de combinar os sons. O Movimento Roraimeira, tem em suas canções uma mescla de informações, há uma troca de conhecimento entre os nascidos na região e os migrantes que encontraram em Roraima um lugar para viver. A música faz parte da vida, ela está ligada as representações, estão inseridas nos cotidianos de diferentes pessoas, remontam sentimentos, recordações, histórias vividas, momentos que são eternizados através das canções em sua total pluralidade. Música é linguagem. As canções retratadas pelo Movimento Roraimeira, são entendidas como uma forma de manifestação artística, onde buscam através da arte, debater questões, pertinentes relacionadas aos habitantes nativos e migrantes de Roraima, embelezando e exaltando a fauna e flora. As canções dão valiosas contribuições para a compreensão de como se deu a gênese dos debates sobre a cultura de Roraima e com enfoque nas discussões identitárias. 27 MORAES, José Geraldo Vinci de. História e música: canção popular e conhecimento histórico. 2000, p.215. 28 3.2 O poeta Eliakin28 Eliakin Rufino de Souza mais conhecido como Eliakin Rufino, nasceu no dia 27 de maio de 1956, em Boa Vista–RR. Em seu currículo consta a publicação de dez livros de Poesia, sendo eles: Pássaros Ariscos (1984), Poemas (1987), Escola de Poesia (1990), Brincadeira (1991), Poeta de água doce (1993), Versão Poética do Estatuto da Criança e do Adolescente (1995), Poesia para ler na cama (1997), Poeta de água doce, 2ª Edição (1999), Haikai (2010) e Cavalo Selvagem (2011). Lecionou Filosofia, Arte e História nas escolas da rede pública do Estado de Roraima entre 1985 e 2001. No período entre 2002 e 2006 lecionou Filosofia na Escola de Aplicação da Universidade Federal de Roraima – UFRR. De março de 2007 a novembro de 2009 foi Gestor Cultural da Universidade Federal de Roraima. Desde 2010 leciona Literatura em Roraima, no curso de Letras da Universidade Federal de Roraima - UFRR. Participa de encontros de escritores, feiras de livros e eventos de literatura, em diversas cidades brasileiras desde 1985. É presença frequente no Congresso Brasileiro de Poesia em Bento Gonçalves - RS. Em 2012 participou da primeira Feira de Livros do Amapá, em Macapá. E têm poemas publicados em antologias nacionais e internacionais. Foi premiado em diversos festivais de poesia. Já gravou poemas em disco e faz shows de poesia falada por todo o Brasil desde 1983. É autor da letra do Hino do Município de Boa Vista - RR. Lançou cinco CD’s solos e autorais: Amazônia legal (1997), Me toca (1998), Eliakin em Porto Alegre ao vivo (2006), Mestiço (2008) e Eliakin Diz (2011). Lançou, em parceria com Armando de Paula, o CD infantil Os Direitos da Criança, versão poética e musical do Estatuto da Criança e do Adolescente -ECA, em dezembro de 2008. Possui composições gravadas em coletâneas, CD’s de festivais e CD’s com parceiros, tais como: Nilson Chaves (PA), Zé Miguel (AP), Graça Gomes (AC), Bado (R0) e Célio Cruz (AM). Participou da gravação do DVD “Gente da mesma floresta”, lançado pelo Instituto Itaú Cultural (SP) em 2008. Participa de festivais e faz shows de música por todo o Brasil desde 1980. Em 1998 fez sete shows na Alemanha, nas cidades de Frankfurt e Berlim. Em 2012, convidado por Jurandir Costa e Fernanda Kopanakis, fez shows na cidade de Coimbra, em Portugal e nas cidades de Praia e Mindelo, no Cabo Verde. 28 Todas as informações descridas, a respeito da biografia do artista foram prestadas por Eliakin Rufino 29 Suas músicas já foram gravadas por diversos artistas da região norte, entre eles, Leila Pinheiro (Ditados impopulares), Aíla Magalhães (Todo mundo nasce artista), Nilson Chaves (Tudo índio), Marco Monteiro (Plural), Eliana Printes (Madrugada), Cileno (O mundo vai acabar), Lucinha Bastos (Pimenta com sal), Netinho Solimões (Carta do Amazonas) entre outros. Foi um dos 55 selecionados do “Rumos Itaú da Música”, edição 2007/2009 e realizou seu show no Instituto Itaú Cultural no dia 8 de março de 2008, o show foi exibido pela TV Cultura (SP) no dia 20 de julho de 2009. Fez parte do documentário Roraimeira – Expressão amazônica, da série DOC-TV/MinC, do documentarista Thiago Bríglia, exibido pela Rede Brasil no dia 27/08/2009. Teve trabalho selecionado para o Projeto Amazônia das Artes, promovido pelo SESC, ocasião em que realizou show musical no Terminal Turístico de Santarém no dia 7 de agosto de 2009. Organizou em Boa Vista, em 1995, um encontro de escritores da região norte do Brasil com a presença do poeta Thiago de Mello, entre outros convidados. Produz, desde 1991, shows de música, dança, teatro e poesia, de artistas roraimenses e de outros Estados. Além de produzir e/ou participar em Boa Vista e outras cidades da Amazônia, desde 1995, do Show da Consciência Negra, no dia 20 de novembro, em virtude desse evento compôs a música Palmas pra Zumbi. Publicou na imprensa escrita de Roraima, entre 1988 e 1998, mais de 300 artigos de opinião sobre os mais diversos assuntos e temas, período em que também apresentou programas culturais no rádio e na televisão, sobretudo entre os anos de 1987/1992, em Boa Vista - RR. Produziu mais de 60 eventos artísticos no espaço cultural Casa do Poeta, em Santa Cecília (RR) entre setembro de 2001 e abril de 2004. Vindo mais tarde lançar o seu CD “Batida Brasileira” em 2009. Em 2011 integrou a turnê da cantora Euterpe por 10 cidades da Amazônia Legal. Em 2012, convidado pelo cantor e compositor Carlos Farias, participou do projeto Terças Poéticas, do Palácio das Artes, em Belo Horizonte - MG, acompanhado de sua filha, a poeta Odara Rufino. 30 3.3 A “Cruviana” de Neuber Uchôa29 Neuber Uchôa nasceu em Boa Vista, capital de Roraima e, ainda criança, começou a cantar em programas de auditório. Na adolescência, descobriu o violão e passou a compor as primeiras canções, mas somente aos 21 anos de idade, em 1980, nasceu a música que seria um dos seus maiores hits: Ave, 3º lugar no I Festival de Música de Roraima. A canção foi gravada cinco anos depois, num compacto simples, produzido em junho daquele ano no Rio de Janeiro. Daí em diante, shows e discos estão sendo produzidos pelo artista que, juntamente com Eliakin Rufino e Zeca Preto formam a “Regionalíssima Trindade” do Movimento Roraimeira, que se propõe a traduzir Roraima em sua estética artística e cultural. Dessa fase regionalista, destaque para as músicas: Cruviana, Nossa Bossa, além de Makunaimando (parceria com Zeca Preto), verdadeiros hinos de Roraima. Outro momento marcante foi à produção do programa Roraimeira na TV, dirigido e apresentado pelo grupo em 1992, na TVE (TV Educativa) e reapresentado em rede nacional naquele mesmo ano, além dos espetáculos realizados na cidade do Rio de Janeiro, durante o projeto “Cantorias Amazônicas”, no Centro Cultural do Banco do Brasil - CCBB, em janeiro e fevereiro de 2000. Destacam-se ainda os discos e shows produzidos em parceria com Zeca Preto, entre os quais uma pequena turnê pelo Norte e Distrito Federal, além de shows na Suíça e Venezuela. Nessa fase pós-regionalista, vale lembrar as apresentações no Centro Cultural Carioca e na Lona Cultural de Campo Grande, ambas no Rio de Janeiro, durante o lançamento do CD Muito Prazer (2002). Na mesma época, Neuber divide o palco do Olímpia com Sandra de Sá e Elba Ramalho, entre outros, no show de 85 anos do Retiro dos Artistas. Também fez shows em Niteroi e Cabo Frio, no Rio de Janeiro. Ouvindo e compondo, Neuber acumulou repertório e experiência que se somaram ao swingue forjado na mistura de ritmos afro-latinos com a brasilidade amazônica, nascendo daí uma batida própria. Discografia: Compacto simples AVE – solo (RJ-1985); LP Caimbé – parceria com Zeca Preto (RJ-1988 ); LP Roraima – parceria com Zeca Preto e Eliakin Rufino (PA-1992); CD Makunaimeira – parceria com Zeca Preto (PA-1994); CD Amazon Music – parceria com Zeca Preto (PA1997); CD O Canto de Roraima – parceria com Zeca Preto e Eliakin Rufino (RR-2000); CD 29 Informação prestadas em entrevista para o site http://bomgadamata.wordpress.com/2008/07/13/neuber-uchoaum-amazonida-popular/ acessado em 01/03/13 31 Muito Prazer – solo (RJ-2002); CD Eu Preciso Aprender a Ser Pop – solo (SP-2006) 3.4 “O Filho de dona Neuza”: Zeca preto30 José Maria de Souza Garcia, conhecido artisticamente como Zeca Preto nasceu em Belém no dia 10 de outubro de 1950. Embora tenha nascido em Belém do Pará, foi no Estado de Roraima em que fincou suas raízes,em Boa Vista -RR desde 1975. Zeca Preto é compositor, cantor e poeta e há mais de 30 anos canta as belezas da região Amazônica. Utiliza termos indígenas e ritmos que mesclam as influências musicais do norte do país, como o Carimbó e o Siriá com o Merengue e a Salsa do Caribe. Em 1980, no II FEMUR Festival de Música em Roraima obteve o segundo lugar com a canção Macuxana. Em 1984, no III FEMUR obteve novamente o segundo lugar com a música Roraimeira, que é sucesso até hoje. Em 1987, Zeca lançou o livro de poemas Beiral. O evento aconteceu no próprio local. Em 1995, no XVII FEMUCIC Festival de Música Cidade Canção ganhou o melhor arranjo na cidade de Maringá no Paraná. Em 1996, no XVIII FEMUCIC, ganhou em parceria com Neuber Uchôa primeiro lugar com música Canto das Pedras, sendo agraciado com a primeira faixa do CD do Festival. Também na cidade de Maringá no Paraná. Zeca Preto já realizou em Roraima centenas de eventos culturais como: (Shows em teatros, Ginásio de Esportes, Praças públicas, Feiras, Penitenciária, Hospitais, Parques, Rede escolar estadual e municipal, creches, Universidade, etc.) e já se apresentou em várias cidades. Inclusive já esteve no exterior como Venezuela e Suíça. Em 2009, Foi agraciado com o Projeto Pixinguinha. Foi Tema do DOC TV IV- Roraima Expressão Amazônica. Foi escolhido para elaborar texto poético para Agenda Caixa Econômica Federal. Discografia LP Gresem: Compacto Duplo (1984); LP Roraimeira (1985); LP Caimbé (1988); LP Roraima: e Fita Cassete (1991); CD Makunaimeira (1994); CD Amazon Music (1997); CD O Canto de Roraiama (2000); CD Na Ponta do Norte (2001); Tempo de Jambo (2004); Nada de Concreto (2008); Roraimeira - O Canto de Roraima (Zeca Preto, Neuber Eliakin) (2009); A Nata: (Zeca Preto e Neuber) Coletânea (2009); Mãedioca (2010). 30 Informações obtidas no site http://antologiamomentoliterocultural.blogspot.com.br/2010/12/zeca-pretoentrevista-n-289.html. Acessado em 01/04/13 32 CDs Coletivos: VI FEMUR; XVIII FEMUUCIC ; VII FEMUR; CANTA RORAIMA 2002 (4 músicas); M. P. RORAIMA – SESC/RR Livros Coletivos: 500 Outonos de Versos Colaborador: O Pasárgada Sociedade Poética; Revista Eletrônica Magriça; Jornal da Poesia; Livros Individuais: BEIRAL: livro de poemas (1987); BEIRAL e outros (2011) 33 4 DECADÁ DE 1980: AS NOTÍCIAS DO RORAIMEIRA. “Sigo meu destino de nortista, sou peixe-boi, arara, onça pintada, preguiça. Eu pertenço a tribo dos artistas, sou musico, poeta equilibrista, passista. Não põe tua canoa atrás da minha porque eu sei, você vai se alagar ligeiro. Eu sou do norte de canoa viajo o mundo inteiro, paçoca com banana, sombra, sol, buritizeiro. Mas esse cheiro de peixe, esse embalo de rede! Rede! Esse jeito de ser do norte...”. (Do norte - Zeca Preto e Eliakin Rufino) Ao se identificar como homem do norte, automaticamente os autores da canção se inserem ao ambiente amazônico unindo elementos da natureza com ações próprias das áreas urbanas. Também expressam suas condições como artistas para expressar suas ideias acerca da região por meio de sua arte, sendo elas com canções, poesias, danças, imagens e tantas outras manifestações possíveis. Ao mesmo tempo em que buscam se fixar como expressão artística e cultural, sobretudo em Roraima e na Amazônia, a frase “Não põe tua canoa atrás da minha porque eu sei você vai se alagar ligeiro”, pode representar a perseverança dos artistas na expectativa de se tornar um “Movimento” permanente e não apenas um modismo, algo de momento. Procuram expressar o desejo e o sentimento de que sua arte se expanda por todos os rincões, atravessando as fronteiras de Roraima e ganhando o mundo. Sua mensagem principal se baseia nos costumes locais, como comidas, hábitos e fazeres, sempre com a calma e a tranquilidade e peculiaridade do nortista, como no “embalo de rede” próprio do “do ser norte”. 4.1 O uso de jornais como fonte de pesquisa Ao optar em trabalhar com jornais, o historiador precisa ter a noção de que eles narram fatos que aconteceram, no mínimo, no dia anterior, efetivamente são narrativas do passado, ainda que recente e com prováveis desdobramentos imediatos na contemporaneidade31. É interessante enfatizar que o tema central de cada periódico é disposto de acordo com os interesses daqueles que os escrevem. Ao nos reportamos aos jornais de que circularam e ainda circulam em Roraima percebemos que a imprensa do Estado sempre esteve voltada para as questões políticas de 31 ABUD, Kátia Maria. Ensino de história. São Paulo: Cengage Learning, 2010, p. 27. 34 interesse não das massas, mas sim das elites. No período analisado ficou visível o foco das noticias. Contudo, precisamos ter consciência de que o jornalista não é um historiador. A ele cabe a divulgação da notícia e a venda de seu periódico, ao contrario do historiador que irá analisar, ou não, o fato ali publicado caso o eleja como objetos de sua pesquisa. Nesse sentido Kátia Abud discorre a diferença entre o historiador e o jornalista, para ela: “historiadores (grifo nosso) estes estudam o passado baseados em conceitos e métodos específicos, os jornalistas, por sua vez, produzem narrativas que são registradas e lidas em jornais, revistas, sites, rádio e televisão”32. É muito importante de que independente do jornal, o pesquisador que utiliza esse tipo de periódico como fonte não deve perder de vista que o mesmo nunca deve ser tomado com efeito de verdade, mas sim como representação de grupos sociais sobre si mesmos e a realidade que os cercam. Tomar o jornal como fonte não significa pensá-lo como detentor de verdades; ao contrário, o que se propõe é pensá-lo a partir de suas parcialidades, a começar pela observação do grupo que o edita, das sociabilidades que este grupo exercita nas diferentes conjunturas políticas, das intenções explícitas ou sutis em exaltar ou execrar atores políticos. Em outras palavras, observar as múltiplas vinculações que a fonte tece com o meio propicia ao pesquisador “olhar os documentos e decodificá-los a partir de seus usos e finalidades”.33 Os jornalistas, porém, ao narrar fatos contribuem com a História, pois seu trabalho, convertido em documentos, passa a ser utilizado por historiadores no cruzamento com outras fontes de informação, para que se compreendam as sociedades do passado e suas formas de relacionamento, representações, conflitos, jogos de forças e significados presentes na memória34. Outra vantagem ao trabalhar com periódicos (jornais) é a possibilidade de alinhar textos e imagens, sobretudo fotografias e charges, nos fornecendo, assim, informações recentes ou, quando distanciada historicamente, nos dá indícios e dados sobre mudanças e permanências. 32 Idem. p. 27. SAMARA, Eni de Mesquita; TUPY,Ismênia S. S. T. História & Documento e metodologia de pesquisa. Belo Horizonte: autêntica, 2007. 33 34 ABUD, Kátia Maria. Ensino de história. 2010, p. 27. 35 4.2 As notícias do Roraimeira Quadro 1 – jornais e manchetes sobre o Roraimeira DATA JORNAL NOTICIA/MANCHETE 10/1984 Boletim da educação e cultura Roraimeira em ação Exalta a apresentação do show Roraimeira no cine Super K; Define o movimento e dá conta de seus objetivos. 05/10/1984 Folha de Roraimeira: a vida nativa vai ao palco Trata de um espetáculo cuja finalidade é adquirir recursos para a gravação do LP Roraimeira. Pedem apoio ao empresariado local e autoridades. “É preciso que todos conheçam nosso trabalho para que possam reconhecê-lo”. Cultura e arte: teimosia em Roraima Gênese do Movimento Roraimeira; critica ao poder publico em realção a arte e questionamentos a não publicação do livro 1ª Antologia dos poetas roraimenses; Lei Sarney de incentivo a cultura. Arte e cultura – um ato de teimosia Posição política de Eliakim Rufino; falta de políticas públicas e/ou apoio do governo para a cultura; tentativa de explicar a formação da identidade cultural em Roraima por Eliakim Rufino; trabalho do Zeca preto e crítica ao governo; contraponto empresarial x incentivo à cultura; Artistas levam “Roraimeira” ao palco do Sesc Destaca que o Roraimeira se apresenta depois de sete anos depois da primeira apresentação; traz uma sinopse do que é e como surgiu Roraimeira a partir de uma visão de Eliakim Rufino. Luz, Câmera, Roraimeira Comenta o show Roraimeira, realizado no palco do SESC, com a participação de Vânia Rufino, e a nova parceria oportunizada pelo SESC e empresários locais. Conta ainda da caravana que iria viajar pelos municípios de Roraima. Boa Vista Hoje e amanhã tem “Roraimeira” no Carlos Gomes Alude o surgimento do grupo em uma apresentação no Teatro Amazonas em 1984 o qual traz o espetáculo para Boa Vista e dá inicio ao movimento; também dá uma conotação, segundo a visão dos integrantes, quanto a origem e função do movimento Roraimeira. Folha de Show Roraimeira Apresenta o show Roraimeira e dá conta de que a renda será destinada à edição de um livro e gravação de disco; aponta a dança zôo-dança e a dança indígena. Eliakim critica abandono do Teatro Carlos Gomes Demonstra aspectos do show Roraimeira o qual tinha como finalidade arrecadar fundos para a edição de um livro de Eliakim e a gravação de um disco com Neuber e Zeca; Eliakim critica o abandono em que se encontrava “a única casa de espetáculos de Roraima”, o Teatro Carlos Gomes. Exposição Lamenta o fim da Lei Sarney; exalta a atitude de Eliakim ao abrir sua casa e fazer da mesma uma galeria “A Cunha” para exposições permanentes de artistas. Boa Vista 22/01/1989 Folha de Boa Vista 13/08/1989 A Critica de Roraima 10/03/1991 O Estado de Roraima 21/03/1991 Folha de Boa Vista 13/04/1991 15/06/1991 Folha de Boa Vista 18/06/1991 Jornal de Roraima 23/06/1991 Jornal de Roraima RESUMO 36 Para iniciarmos este tópico utilizamos a tabela acima, na qual descrevemos os jornais da época, destacando as datas, jornais/manchetes relacionadas ao Movimento Roraimeira, e um resumo das noticias que serão utilizados como analise sistemática do período em questão. Os jornais selecionados seguem uma ordem cronológica, sendo que grande parte dos jornais foram cedidos do acervo pessoal do artista Eliakin Rufino. Foram selecionadas dez manchetes relacionadas às falas dos artistas; Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto, que buscavam por meio da mídia impressa meios de transmitir sua arte e por em debate questões relacionadas a cultura e identidade de Roraima. Também o professor Reginaldo Gomes de Oliveira, que fez parte da gênese do Movimento. A década de 1980 trouxe inúmeras manifestações artísticas a nível nacional e também local. Foi um período em que surgiram bandas de rock nacional, música sertaneja e outros estilos. A qualidade das músicas e das letras inspiraram, e ainda hoje inspiram, jovens por todas as partes. Em Roraima surgiu o Movimento Roraimeira que se tornou sinônimo de cultura e arte e a maior representação da identidade cultural da região, tendo sido reconhecido nacionalmente. RORAIMEIRA é um movimento idealizado por artistas plásticos, músicos, compositores, poetas e coreógrafos, a maioria deles natural de Boa Vista e visam com isso, o que de bem existe em termos artísticos no Território. O objetivo maior desse movimento segundo Eliakin, um dos compositores, é conquistar um espaço, fazer ver aos olhos dos críticos e de toda a população que, aqui, existes talentos que devem se mais incentivados e explorados não só a nível local como, também, em termos de Brasil.35 Naquela década, um periódico que circulava na cidade de Boa Vista intitulado, Educação & Cultura, publicou, em outubro de 1984, um artigo denominado Roraimeira em Ação. No teor da matéria, que exaltava a apresentação do show Roraimeira, no Cine Super K, destacava o repertório dos compositores e músicos locais que abordavam não só o regionalismo roraimense como, também, um estilo que definia a música popular brasileira. O periódico continuou a exaltar o trabalho e a apresentação dos artistas e procurou definir seus objetivos da seguinte forma segundo Eliakin: “é conquistar um especo, fazendo ver aos olhos dos críticos e de toda a população que, aqui, existem talentos que devem ser mais incentivados e explorados não só a nível local como, também, em termos de Brasil.” 36 35 36 BOLETIM DA EDUCAÇÃO & CULTURA. Roraimeira em Ação. ANO I, Out. 1984. Idem. 37 Com o tema: Roraimeira: a vida nativa vai ao palco, o jornal de Boa Vista, de 05 de abril de 1984, descreve que os artistas Zé Maria, Neuber e Eliakim, são as pessoas que estão “pesquisando a linguagem artística e musical do Território”. Demonstrando que em sua gênese o Movimento Roraimeira, já apresentava um espetáculo profissional e que almejavam um reconhecimento local e com pretensões a níveis nacionais. Isto é visivelmente percebido quando o trio trabalha para a construção do primeiro LP. Em sua fala Neuber afirma que “o espetáculo tem a finalidade de sensibilizar, através de um trabalho bem feito, as demais autoridades e os empresários no sentido de que deem maior apoio aos artistas locais que hoje, mesmo sem condições, tentam desenvolver a linguagem artística e cultural do Território”.37 O jornal Folha de Boa Vista publicou Cultura e Arte: teimosia em Roraima, Murilo Souza apontar o embrião de como se deu as primeiras discussões que remetiam os questionamentos, sobre a cultura e identidade em Roraima, enfatizando que seu início, tem como base pontos em comum, neste período ainda não havia a formação do Movimento Roraimeira: “A cultura e a arte em Roraima ainda são teimosia de uns poucos aventureiros, que no início da década de 80, com a realização do 1º festival da Música Popular Roraimense chegaram a conclusão de que tinham alguma coisa em comum, na sua música, na sua poesia, na sua arte. Nascia o movimento “Roraimeira”38 A matéria enfatiza que nesta época não havia incentivos por parte do poder público, contudo, Eliakin sobressalta que “pouco ou nada se fez de lá pra cá” 39, neste caso ressaltamos que o poeta se referia ao período que aconteceu o 1º Festival de Música Popular Roraimense, que ocorreu no ano de 1984. Expondo que isso continuou mesmo após a realização do festival, ao salientar que a falta de apoio acontecia mesmo transcorridos quase dez anos da realização do 1° Festival, não havendo nenhum incentivo, para divulgação da arte e cultura em Roraima. O poeta esboça ainda que “a produção artística existe, porém o que não há é incentivo para escoar-se esta produção”40. Em sua fala podemos inferir que há uma busca incessante por parte dos artistas roraimenses, que querem mostrar sua arte, mais infelizmente não tem o apoio necessário, para desenvolver seu trabalho. Como pode ser vista na citação a seguir concedida ao jornalista Murilo Souza (1989) ainda em entrevista com Eliakin, descreve que “[...] O mercado de arte em Roraima ainda é restringidíssimo à uns pouco com um mínino 37 Idem. JORNAL FOLHA DE BOA VISTA. Cultura e Arte: teimosia em Roraima. Boa Vista, 22/01/1989. 39 Idem. 40 Idem. 38 38 de sensibilidade e poder aquisitivo. O próprio Governo do Estado e a Prefeitura Municipal, através de seus órgãos competentes para promover a cultura, nada fazem ”41Um dos grandes problemas enfrentados pelos artistas locais, era o descaso e a falta de incentivo do poder público, que impossibilitava o crescimento da arte e cultura de Roraima. Seguindo com a manchete, no domingo o jornal A Critica de Roraima, trouxe uma matéria que embora pareça um trocadilho jornalístico e que por vezes pode levar o leitor, a pensar que é semelhante à notícia, exposta no jornal anteriormente trabalhado aborda as questões relacionadas à cultural no Estado, com “Arte e Cultura – um ato de teimosia”42 através das noticias entendemos como era difícil trabalhar com a arte e cultura no então Território: “As pessoas que ainda se ocupam de tentar fazer arte em Roraima podem ser consideradas destemidas” 43 . Com isso reafirmamos a falta de incentivos para o desenvolvimento dos artistas em Roraima. A escritora romancista, radicada em Roraima, Nenê Macaggi foi um exemplo de perseverança e persistência na produção e divulgação da arte, pois a mesma presa em uma cadeira de rodas aos 76 anos, trabalhava cinco horas por dia, para assim poder concluir sua obra. É dela que parte a seguir o trecho retirado do jornal, A Crítica de Roraima, em tom de desabafo, relata o descaso em relação à promoção da arte e cultura, no então Território de Roraima, como podemos perceber no trecho a seguir: “se eu não estivesse presa nesta cadeira, sairia com os originais debaixo do braço atrás [sic] do patrocínio para a publicação. Porém, acredito em meu talento e que este patrocínio venha até mim”44 desabafava a escritora. Em sua fala Eliakin descreve como era relacionada à cultura no então Território de Roraima, enfoca as questões da migração, comentando sobre os dois caminhos percebidos por ele ao remete que em Roraima a cultura indígena, estava sendo deixada para trás com a inserção imposta da cultura “branca”, ou seja, havia uma negação por parte de pessoas que residiam em Roraima, que simplesmente ignoravam todos os costumes tradicionais indígenas, e tentaram impor a cultura trazida por migrantes oriundos das diversas regiões brasileiras. Segundo o poeta Eliakim, duas vertentes principais formadoras da cultura roraimense: a cultura indígena – altamente esmagada pela cultura “branca” – e a cultura imposta pela maciça miscigenação componedora entre estas duas linhas pode 41 Idem. A CRITICA DE RORAIMA. Arte e Cultura – um ato de teimosia. Boa Vista, 13/08/1989. 43 A CRITICA DE RORAIMA. Arte e Cultura – um ato de teimosia. Boa Vista, 13/08/1989. 44 Idem. 42 39 ser sentido naquilo que Rufino classifica como neocolonialismo, que seria a nova colonização de Roraima, verificada após a invasão garimpeira.45 Dando sequência a entrevista de Eliakin para o jornal, ele aborda que “[...] o povo roraimense era composto por nativos da própria região norte e nordestinos que para cá migraram em busca do sonho dourado. Com o advento do garimpo em grande escala, as miscigenações que já eram sentidas e que refletiam sobre a nossa cultura praticamente esmagaram o que restava da cultural local”46. Com essa afirmação, o poeta esclarece os motivos das discussões pertinentes envolvendo a temática da cultura e identidade local, que é deixada de lado, para inserir novos costumes e outros discursos, enfatizando que a população roraimense, era predominantemente indígena, e aponta os motivos dessa mudança no cenário, com o fluxo minerador. Sendo que um dos fatores motivadores para o aumento populacional está ligado, sobretudo, a abertura do garimpo: “Em Roraima, a cultura local é totalmente desprestigiada pelos órgãos encarregados de promovê-la e de preservá-la, [...] além de um total descaso para com os produtores culturais. Eu chego a dizer que todos aqueles que trabalham com a cultura no Estado, estão pagando para fazer arte”.47 O poeta discorre com indignação e tristeza a total falta de incentivo a cultura, o descaso do poder público em relação ao desenvolvimento da arte e da cultura em Roraima, Eliakin também denúncia que para se ter arte em Roraima era necessário que os artistas, encontrassem outros meios de promover a cultura, como ele mesmo afirma, “tirando do próprio bolso” para assim divulgar sua arte. No jornal supracitado, O Estado de Roraima, de 1991, enfatiza o significado do Movimento Roraimeira. Podemos, também, observar a consumação do Trio Roraimeira e como foi noticiado naquele periódico houve a apresentação do show Roraimeira no palco do SESC-RR. É importante salientar que o trio é fruto do Movimento Roraimeira, mas a partir de então, passaram a se apresentar juntos incorporando o nome do Movimento. O Trio Roraimeira ganhou notoriedade, a partir de então, sendo amplamente divulgado na mídia, produzindo shows, gravando discos e CD’s, difundindo a arte por todo Roraima, e em seguida, para o Brasil. Percebe-se portanto que o Trio se torna mais conhecido que o próprio Movimento que o originou. 45 Idem Idem 47 A CRITICA DE RORAIMA. Arte e Cultura – um ato de teimosia. Boa Vista, 13/08/1989. 46 40 Fazendo alusão ao show Roraimeira, o jornal Folha de Boa Vista, do dia 21 de março de 1991, circulou a matéria Luz, Câmera, Roraimeira. Expressava que o show, apesar da simplicidade cênica, proporcionou momentos de diversão e descontração ao público presente, que segundo o jornal era composto por uma plateia seleta, e devido a entrada franca o espaço do SESC ficou pequeno. “Com poucos recursos cênicos e apenas violão e percussão, o espetáculo abre espaço para a poesia picante de Eliakim, que abre o show com um poema “alertando” para a situação do homem-animal-homem. Eu sou o cavalo selvagem”48 Nos chama atenção, em especial, uma guinada no meio artístico roraimense. Se a década de oitenta, conforme pudemos observar nos jornais daquela época já trabalhados nesta monografia, o apoio e incentivo dedicado a arte e a cultura roraimense eram quase que inexistentes, os anos iniciais da década de noventa demonstraram algo no sentido inverso, aliados ao SESC e tendo patrocínio de empresários locais o Trio Roraimeira se preparava para divulgar seus trabalhos pelo interior de Roraima. “A caravana espera poder dar continuidade ao trabalho, no interior do Estado, já contam com o patrocínio de empresários locais e do próprio SESC, mas esta nova investida acarreta mais despesas, por isso tentarão ampliar o número de patrocinadores” 49. Cerca de um mês após a apresentação do grupo50 Roraimeira no SESC, o jornal Folha de Boa Vista, publicado em 13 de abril de 1991, repete o mesmo espetáculo no teatro Carlos Gomes. Na entrevista para o jornal, os artistas ressaltam a importância do show Roraimeira e suas características enfatizando o sentido de expressar e difundir as peculiaridades da cidade onde habitam: Ambos os integrantes acreditam que Roraimeira, não é somente um espetáculo. ‘Fazemos parte de um movimento cultural, voltado para os temas regionais, que é a linguagem universal, depois do Romantismo. A mistura perfeita entre música dança e poesia proporciona aos espectadores uma constatação da realidade cultural de Roraima. Segundo Eliakim Rufino, a fórmula do espetáculo reúne duas condições básicas para divulgar a arte e a cultura de Roraima’. O show é cultural e educativo, por isso tratamos especialmente de temas regionais.51 48 JORNAL FOLHA DE BOA VISTA. Luz, Câmara, Roraimeira. Boa Vista, 21/03/1991. JORNAL FOLHA DE BOA VISTA. Luz, Câmara, Roraimeira. Boa Vista, 21/03/1991. 50 Embora estejamos trabalhando o Trio Roraimeira, composto por Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto, salientamos que o Jornal Folha de Boa Vista o caracteriza como “grupo”, isso si deve à participação de outros artistas que atuaram naquele show. 51 JORNAL FOLHA DE BOA VISTA. Hoje e amanhã tem “Roraimeira” no Carlos Gomes. Boa Vista, 13/04/1991. 49 41 Os artistas que cantam a terra! Assim podemos descrever o Trio Roraimeira; são reconhecidos em seus shows com repertórios que expressam suas vivências em Roraima, esboçam com arte toda a beleza da fauna e flora do Estado, apresentando sempre seu repertorio plural em seus espetáculos, descrevendo a importância de conhecermos os costumes regionais dando ênfase em relatar e apresentar a arte e a cultura em Roraima, apontando sua peculiaridade, seu jeito simples de viver, demonstrando o caldeirão de informações pertinentes dos nascidos em Roraima, os povos indígenas. Em 15 de junho de 1991, o jornal Folha de Boa Vista, mais uma vez tem em suas manchetes o Show Roraimeira. A matéria enfatiza que o objetivo do espetáculo será para financiar a gravação de um disco e para edição de um livro. O evento ocorreu no teatro Carlos Gomes, a temática do espetáculo é apresentada como sendo: “Show é regional e os ritmos possuem uma forte influência e bem harmonizada influência nordestina, assim como amazônica, afro e caribenha”52. Justificando por que o Movimento Roraimeira é plural e composto por um caldeirão de influências. Em tom de desabafo, Eliakim Rufino concedeu entrevista para o Jornal de Roraima no dia 18 de junho de 1991, denunciando o descaso e o abandono daquela que por ele foi identificada como sendo a “única casa de espetáculo” de Roraima, naquele período. O jornal enfatizava, na fala do poeta, o total abandono por parte do poder público em relação ao Teatro Carlos Gomes e prossegue sua retórica afirmando as péssimas condições físicas e estruturais do teatro. Eliakim expõe que foi preciso que os artista se responsabilizassem pela limpeza do ambiente, climatização, sonorização, iluminação e até da segurança, pois do contrário, não teria havido o show. No domingo ao final do show, Eliakim fez uma crítica ao “abandono em que se encontra a única casa de espetáculos de Roraima”, referindo-se ao teatro Carlos Gomes, que não conta com sistema de som e, naquela noite, “nem vigia tinha, nós é que improvisamos tudo, ligamos ar-condicionado, as luzes e colocamos a casa para funcionar”53 Face ao exposto na entrevista acima, Eliakim Rufino abre as portas de sua casa, localizada em Cidade Santa Cecília, criando o espaço “Casa do Poeta”, um local destinado a apresentações das mais diversas expressões artísticas e culturais. A atitude do poeta coincide 52 53 BOLETIM DA EDUCAÇÃO & CULTURA. Roraimeira em Ação. ANO I, Out. 1984. JORNAL DE RORAIMA. Eliakim critica abandono do Teatro Carlos Gomes. Boa Vista, 18/06/1991. 42 justamente como o fim da Lei de Incentivo a Cultura (Lei Sarney54). Essa entrevista concedida ao Jornal de Roraima no dia 23 de junho de 1991, serviu para reafirmar a importância do Movimento Roraima como marco da identidade artística e cultural do Estado de Roraima. “Achando criativamente uma saída, o nosso poeta Eliakim Rufino fez de sua casa uma galeria... A Cunhã, para exposições permanentes de artistas que não tinham onde expor seus trabalhos.”55 4.3 Breves relances da História de Boa Vista Em 13 de setembro de 1943, o presidente da República Getúlio Dorneles Vargas, através do decreto lei n 5.812 cria os Territórios Federais, dentre eles o Território Federal do Rio Branco, sendo desmembrado neste momento do Estado do Amazonas. Oliveira56 argumenta que no ano de 1962, a denominação de Território Federal do Rio Branco foi modificada para Território Federal de Roraima, devido à confusão nas correspondências, e mesmo o destino de pessoas, eram trocados do Acre para Boa Vista e vice-versa, entre o Território e a capital do Acre, também denominada Rio Branco. Em 1988, data da promulgação da constituição Brasileira, foi criado o Estado de Roraima, deixando de ser Território Federal de Roraima. Boa Vista é uma cidade que é conhecida por sua pluralidade, de pessoas oriundas dos mais diversos Estados. Souza57 salienta que o número populacional é formado em grande parte de migrantes. Por estar localizada no extremo norte do país, Roraima é um Estado fronteiriço, a leste faz fronteira com a República Cooperativista da Guiana, ao norte e oeste com a República Bolivariana de Venezuela e ao, sul, com os estados do Amazonas e do Pará. 54 Lei de incentivo à cultura sendo a primeira lei federal visando propiciar meios de incentivo à produção cultural foi a chamada Lei Sarney, Lei nº 7.505, de 2 de julho de 1986, instituída no ano seguinte à criação do Ministério da Cultura, então já desvinculado da Pasta da Educação. A lei permitia as empresas financiarem ações culturais por meio da renúncia fiscal, desde que tais ações fossem levadas a cabo por produtores artísticoculturais - tanto públicos quanto privados. O produtor era o elemento central, pois as ações de captação de recursos e de produção artístico-cultural ficavam ao seu encargo. Após o recebimento do aporte de recursos, a título de doação ou patrocínio, a entidade cultural deveria prestar contas à Receita Federal e ao Ministério da Cultura sobre a sua correta aplicação. http://www.senado.gov.br/senado/presidencia/memoria/07.asp. Acessado em 28/03/13. 55 Jornal de Roraima 23/06/1991 OLIVEIRA, Reginaldo Gomes de. A herança dos descaminhos na formação do Estado de Roraima. USP, São Paulo, 2003. 56 57 SOUZA, Carla Monteiro de. Gaúchos em Roraima. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2001. (Coleção História, 42). 43 A dinâmica cultural do Estado é compreendida ao longo do seu contexto histórico. Para a historiadora Carla Monteiro, ''Pode-se dizer que, nos anos 1980, ocorre uma verdadeira corrida para Roraima, ocasionada basicamente pelos estímulos à ocupação das terras e pelos inúmeros garimpos de ouro surgidos na área yanomami”58. Com essas informações é possível visualizar o motivo do crescimento rápido do Estado de Roraima, identificarmos o início da década de maior migração para o antigo Território. Segundo levantamentos do IBGE/RR59 o período da década de 1980 obteve um fluxo expressivo do aumento populacional. O Instituto publicou em 1987 que a população que era de 72.758 habitantes, passou para o número de 115.247 habitantes no ano de 1990. Isto acontece, principalmente, por consequências das migrações de diversas pessoas em busca de melhores oportunidades devido ao garimpo e ao universo fronteiriço, estes são alguns fatores que ajudam a explicar este aumento de habitantes naquele período. Neste sentido a historiadora Carla Monteiro esclarece que “Roraima é por excelência uma terra de migrantes. Longe de ser o El Dorado sonhado por alguns, enquadra-se no ideal da ‘fronteira’, é considerada um celeiro de oportunidades, tanto para aqueles que detêm algum tipo de recurso quanto para os despossuídos, fato que atrai migrantes de todos os cantos do Brasil.”60 Com a migração diversas culturas se encontram, pessoais de vários lugares do país e etnias, influenciam para que se forme no Estado uma cultura plural. A população roraimense é formada por povos indígenas e migrantes provindos de todo o Brasil. Isso faz com que Roraima seja multicultural. Nestes contextos Roraima vivenciava suas modificações. A pluralidade faz de Roraima um ambiente peculiar, com marcas de todas as culturas conviventes, fato que dificulta a definição de um perfil cultural da região e torna complexa a tarefa de compreender o que seja uma “identidade roraimense”. Observa-se, frequentemente, que se confundem tais condições com a inexistência de uma cultura ou de uma identidade próprias. Isto se deve a diversos fatores, mas, principalmente, à carência de reflexão mais amplas e profundas sobre o que seria, hoje, uma “identidade roraimense” e qual o seu lugar no contexto cultural local e 61 nacional . 58 SOUZA. Carla Monteiro de. MIGRAÇÃO E MEMÓRIA:(re)territorialização e inserção social entre gaúchos residentes em Roraima. Professora do Departamento de História da Universidade Federal de Roraima (UFRR); doutora em História pela PUCRS. p.110 59 IBGE, CENSO 2010. 60 SOUZA, Carla Monteiro de. A história oral e os estudos migratórios na Amazônia brasileira: o caso de Roraima. In: 26a REUNIÃO DA SBPH, Rio de Janeiro, 2006. p.5. Disponível em: bph.org/reuniao/26/trabalhos/Carla_Monteiro_Souza/. Acesso em: 01 de fev. 2013 61 OLIVEIRA, Rafael da Silva; WANKLER Cátia Monteiro; SOUZA, Carla Monteiro de. Identidade e Poesia 44 Nesta linha, sabendo que Roraima é composta, em sua maioria por migrantes, entendemos que essa pesquisa proporcionará à sociedade local o conhecimento de um movimento artístico e cultural que predominou no cenário nacional durante as décadas de 1980 e 1990, mas que a nível local não teve o devido reconhecimento. Ainda assim, nessa contemporaneidade, vem ressurgindo no espaço midiático, como se a sua identidade fosse, somente agora, desvelada para a sociedade. Roraima convive com seus povos indígenas, os ribeirinhos, os nordestinos, os sulistas, isto ocorre por uma heterogeneidade gerada com o fluxo migratório. Neste sentido, por fim, o trabalho apresenta uma temática relacionada com o debate artístico e cultural na década de 1980, com nosso foco se limitando em entender o Movimento Cultural Roraimeira, que na década de 1980 foi um movimento muito expressivo, que buscava fazer o debate e a questionar a cultura e identidade de Roraima. Musicada: Panorama do Movimento Roraimeira a Partir da Cidade de Boa Vista como uma das Fontes de Inspiração. Revista Acta Geográfica, Boa Vista-RR, ano III, n°6, p.27-37, jul./dez. de 2009, p. 28. 45 5. COMPREENDER AS INFLUÊNCIAS CULTURAIS INTERNAS E EXTERNAS NA PRODUÇÃO DAS LETRAS DAS MUSICAS DO MOVIMENTO RORAIMEIRA. Buriti do campo que prazer Igarapé tão bom te conhecer Boa Vista vai onde a vista ver No verde do campo vi você Correm mitos no vento Pedra de Macunaíma Voa meu pensamento Sobre o Monte Roraima Cidade do campo, beira-rio Estrela do norte do Brasil, Cidade do campo entardecer Boa Vista linda de se ver Correm rios de tempo Águas de Pacaraima Montes em movimentos Coração de Roraima. (Cidade do Campo: Eliakim Rufino) A canção Cidade do Campo do poeta Eliakin Rufino é descrita por Neuber Uchôa como um hino de Boa Vista. Como em poesia o autor enfatiza como é prazeroso viver em Boa Vista. Desvendando seus mistérios, seus lugares, seus mitos. Percorrendo as trilhas, as estradas até chegar aos extremos do Estado citando o Município de Pacaraima e a tríplice fronteira no Monte Roraima. Esboça em suas linhas o desejo de estar e poder desfrutar dos encantos de sua terra, apresenta seu regionalismo, enfatizando e dizendo que pertence a esse lugar, cantando sua região, valorizando em versos seu habitar natural quando em belas palavras apresenta sua terra, “Boa Vista vai onde a vista ver... Boa Vista linda de se ver”. Os versos reportam aos idos da fundação de Boa Vista, e até mesmo os dias atuais, pois da Orla se tem a visão esplendorosa do rio Branco, da Serra Grande, das Serras do Cantá e da Malacaxeta. A sensação prazerosa do vento e da brisa ao final da tarde, ou mesmo da “cruviana” nas madrugadas podem ser lembrados ao ouvir a canção. O principal foco deste capítulo é discutir como se deu a formação do Movimento Roraimeira a partir das falas de seus principais integrantes. Para tanto foram realizadas entrevistas mistas com quatro integrantes, sendo eles: Eliakin Rufino, Neuber Uchôa, Reginaldo Gomes de Oliveira e Zeca Preto. As questões culturais, regionais e identitárias do 46 então Território Federal de Roraima, nortearam as temáticas abordadas pelo Movimento, proporcionando debates sobre cultura e identidade e valorizando as belezas naturais da região. Elaboramos um questionário com seis perguntas nas quais se buscou extrair informações que nos dessem conta desde os primórdios, culminando com o ápice do Movimento. Assim, cada entrevistado expôs seu pensamento e suas falas a partir das seguintes questões: Como nasceu o Movimento Roraimeira? Quais as ideias centrais do Movimento Roraimeira? Quais as principais influências do Movimento Roraimeira? Quais os principais protagonistas? Quais linguagens artísticas mais visíveis do Movimento Roraimeira? Quais as principais obras de música, literatura, artes plásticas, fotografia, dança? Para melhor compreensão optamos em transformar cada pergunta em tópicos, que serão abordados a seguir. 5.1 Como nasceu o Movimento Roraimeira? Na visão do poeta Eliakin Rufino62 o Movimento Cultural Roraimeira nasceu em 1984, mais precisamente no mês de julho. Naquela ocasião o cantor e compositor Zeca Preto, conhecido na época como Zé Maria, classificou sua música “Roraimeira” para o II Festival de Música de Roraima – FEMUR tendo ela obtido o 2º lugar. Um mês depois Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto, pela primeira vez juntos, realizaram um show, que intitularam Roraimeira, em Manaus, no Teatro Amazonas. Em outubro daquele ano, repetiram o show em Boa Vista, no antigo Cine Super K em 1984. Esses três eventos marcam o início do que seria chamado mais tarde Movimento Roraimeira. A abordagem dada pelo cantor Neuber Uchôa dá conta de que “[...] o Movimento Roraimeira nasceu depois da música, à música Roraimeira, a música nasceu primeiro, é uma música do Zeca, que dá nome ao movimento, música que é de 1984, e o movimento surgiu no mesmo ano” 63. Nesse sentido percebemos a conexão de informação entre Eliakin e Neuber ao serem taxativos na afirmação de que o Movimento teve como base a música de Zeca Preto. Em seguida, Neuber também menciona a apresentação em Manaus enfatizando as temáticas regionalistas e os primeiros passos dos artistas e suas composições. Então o Movimento surgiu a partir daí e com o tempo é que foi caindo à ficha e só 62 63 Entrevista mista concedida em 14/03/13. Entrevista mista concedida em 18/03/13. 47 alguns anos depois, a gente se deu conta da batata quente que tínhamos nas mãos e passamos, inclusive, a fazer analogias com outros Movimentos porque nós não inventamos o regionalismo, o regionalismo é uma coisa mundial, em todo canto tem o regionalismo, as influências foram muitas, a gente teve oportunidade de ver outros artistas, outros poetas, que também cantam sua aldeia64. É notório na fala de Neuber Uchôa, em relação ao início do Movimento, os sentimentos de medo e insegurança, mas também percebemos a esperança e o desejo para que “aquilo” se firmasse e se expandisse o que de fato veio acontecer. As questões do regionalismo permearam, e ainda permeiam, as composições dos cantores e hoje se conectam com a linguagem dos tempos atuais. O professor Reginaldo Gomes de Oliveira descreveu como foram os primeiros embates voltado a temática dos questionamentos sobre cultura e identidade, para ele: Esse movimento que denominaram Roraimeira não teve uma data certa para começar. O que despertou o sentimento e desejo de valorizar a cultura de Roraima foi o retorno de jovens roraimenses com graduação no final dos anos de 1970. Esses jovens começaram a buscar aspectos culturais que marcassem a identidade de Roraima. No final dos anos de 1970 e começo dos 80, Roraima recebeu muitos 65 imigrantes que buscavam identificar a cultura regional . A fala mais técnica e objetiva do Professor Reginaldo Gomes de Oliveira não deixa transparecer os agentes que compunha a formação do Movimento, ou se quer dá pistas de como ele surgiu. Ao contrário de Neuber e Eliakin que buscam enfatizar as apresentações em shows e no festival, por outro lado, o professor esclarece que havia a necessidade de ambientar os migrantes recém-chegados em Roraima aos aspectos artístico e cultural dessa região. Em outro momento, cita que o retorno dos universitários à suas raízes propiciaram o debate sobre a temática a ser abordada pelo Movimento naquilo que tangia a identidade de Roraima. Zeca Preto apresenta o show sendo o mentor das primeiras articulações envolvendo a temática Roraimeira, descreve que o grupo realizou um belíssimo show na cidade de Manaus e que repetiram o mesmo espetáculo em Boa vista, apresenta que: O Movimento nasceu de um show que fizemos em Manaus no Teatro Amazonas em agosto de 1984, e denominamos esse show de Roraimeira, nome de uma música minha que obteve o segundo lugar no Festival de música em Roraima em julho do ano de 1984 (um mês antes). A coisa foi tão boa que resolvemos fazer aqui em Boa 64 65 Entrevista mista concedida em 18/03/13. Entrevista mista concedida em 25/02/13. 48 Vista no Cine Super K, um espaço com mais 750 lugares, novamente o Show Roraimeira foi sucesso total, casa lotada com gente ocupando o chão do cinema (meio e as laterais)66 Sendo o último artista a responder o questionário Zeca Preto apontou alguns elementos, que os outros acima não descreveram, como o numeroso público presentes no espetáculo. Sua afirmação pode ser vista nos Jornais da época, já expostos no trabalho. Zeca Preto parte da mesma concepção de Eliakin Rufino e Neuber Uchôa, enfatiza que as discussões que envolveram a gênese do Movimento Roraimeira teve seu início a partir de um show. Denominado Roraimeira, que era o nome de uma música do mesmo. 5.2 Quais as ideias centrais do Movimento Roraimeira? De forma bem sucinta Eliakin Rufino afirma as ideias centrais eram “produzir obras de arte, em diversas linguagens artísticas, que tivessem Roraima como temática principal, optando preferencialmente pela beleza da paisagem cultural e natural com o objetivo de ajudar na construção da identidade do povo roraimense e servir de divulgação turística do Estado de Roraima” 67. Neuber Uchôa apresenta três ideias principais em sua fala, enfatiza que o Movimento tinha o desejo de mostrar em seus shows a cultura do povo heterogêneo do Norte. Em outro ponto retrata que a ideia central estava entorno de um tripé, abordando os elementos norteadores da cultura de Roraima, (indígena, migrante e caribenha). Bem a ideia central do Movimento era traduzir o sentimento desse povo heterogêneo, desse povo em arte, que naquela ocasião (1984), a gente se deu conta que, em meados dos anos 80, a gente se deu conta que éramos um povo, cheio de referências culturais, gente de todos os lugares do mundo, se manifestando de acordo com as suas necessidades, mas a gente sabia, a gente notava que tínhamos a cultura indígena como a nossa espinha principal, o resto era influência trazida de fora e aos poucos, agente foi se dando conta que ideia central do Movimento, girava em torno de um tripé, que é cultura indígena, os de fora representando maciçamente pelos nordestinos e o caribe68. Demonstra outra ideia central que estava ligada a diversidade e o acolhimento de costumes, tanto dos nascidos em Roraima, quanto dos migrantes. Apontar que a outra ideia seria relacionada às fronteiras, sendo ingrediente indispensável para o caldeirão de influências, como se a cultura e a identidade estivessem sendo tecidas, como uma colcha de 66 Entrevista mista concedida em 08/03/13 . Entrevista mista concedida em 14/03/13. 68 Entrevista mista concedida em 18/03/13. 67 49 retalhos, em que “tudo” poderia ser aproveitado e aprimorado pelos artistas, mesclando a cultura e a identidade. Ao descrever sobre as ideias centrais do Movimento Roraima o professor Reginaldo Gomes de Oliveira destaca que na década de 80, os universitários buscavam incentivos para poder desenvolver a arte no então Território Federal de Roraima, tinham como apoio o Departamento de Assuntos Culturais (DAC)69 para desenvolverem suas temáticas relacionadas ao regionalismo. No início dos anos de 1980 os jovens graduados de Roraima eram incentivados pelo Departamento de Assuntos Culturais (DAC) para pensarem e desenvolverem projetos envolvendo temas da cultura de Roraima. Esses temas centrais eram voltados para temas indígenas e ambientais mesclados com elementos da cultura nordestina. Nesse sentido, a produção literária ou nas artes plásticas, na dança, na música ou no teatro eram mesclados com essa temática ambiental e indígena70. Observa-se que a fala do professor está baseada, sobretudo à Lei de Incentivo à Cultura – Lei Sarney, a qual já foi abordada anteriormente. Demonstra ainda que existia um órgão público no Território Federal de Roraima destinado para tratar de tais assuntos, os quais aproximam intelectuais e artistas no desenvolvimento de trabalhos voltados para a discussão da temática cultural local. As ideias centrais que Zeca Preto relatar, são as questões relacionadas ao regionalismo, que é muito típico nas músicas que o mesmo compõe, observamos que ao enfatizar esses elementos, o cantor apresenta o que Neuber Uchôa esboça em suas falas, a valorização e o orgulho ser e pertencer a Roraima. Zeca Preto aponta que seria “Levar a Música, a dança e a poesia de boa qualidade ao nosso povo de forma que se orgulhassem de ser chamados de Roraimenses. Levar isso para toda Amazônia, todo o país e o resto do mundo”71. Em suas palavras percebemos o desejo que os integrantes do Movimento Roraimeira tinham em difundir a arte, não só no Território Federal de Roraima, mas apresentar a arte roraimense aos quatro cantos do mundo. 69 Quando me refiro ao DAC (Departamento de Assuntos Culturais) estou me referindo a um departamento vinculado a Secretaria de Educação e Cultura do ex-Território Federal de Roraima que foi criado no começo dos anos 1980. Estava localizado onde hoje se encontra a Assembleia Legislativa do Estado de Roraima 70 Entrevista mista concedida em 25/02/13. 71 Entrevista mista concedida em 08/03/13. 50 5.3 Quais as principais influências do Movimento Roraimeira? Nesse aspecto Eliakin Rufino acentua como principais influências “o Movimento Modernista, o Movimento Tropicalista, o Movimento Clube da Esquina e o Movimento Pessoal do Ceará.” 72 Por outro lado, Neuber Uchôa e Reginaldo Gomes partem do principio que era necessário estabelecer uma identidade cultural regional própria, sem a intervenção ou influência de outros movimentos que aconteceram em outras regiões brasileiras. Contudo, Neuber Uchôa descreve que “a gente se deu conta que na realidade nossa identidade é a nossa diversidade, então cabia a nós, apenas acomodar essas diferenças que aqui estavam, e emergir como uma arte nova, como uma coisa original, que é o que fazemos hoje, é um regionalismo contemporâneo um regionalismo Pop”73. Seguindo essa linha Reginaldo Gomes aponta que “os jovens roraimenses graduados vinham de distintas regiões onde haviam se formado. Por conta disso, as ideias eram relacionadas com as regiões de suas formações. Contudo, a questão ambiental e indígena foram os principais temas presentes no movimento” 74 . Vemos, portanto que havia sim, influências externas para a construção da identidade cultural local proposta pelo Movimento Roraimeira. Tal afirmação encontra suporte na fala de Neuber. A gente é um povo novo, que mistura gentes de todas as tribos. Então eu acho que as principais influências no Brasil são os gaúchos, os baianos e os paraenses, esses três povos, segundo a gente observou durante essas quase três décadas, são povos que como a gente diz se bastam, eles têm músicas próprias, eles têm uma roupa própria, tem um sotaque, eles têm uma comida, uma música, tudo próprio, os baianos, até os mendigos baianos estão preparados para receber os turistas, para dar o seu recado, traduzir em cultura, em divisas sabe, o seu modovivendes. Que eu acho o turismo é a comercialização da cultura de cada um, bom eu acho que essa é a nossa vantagem, por ter optado pelo regionalismo 75. Ao descrever as influências do Movimento Roraimeira, Zeca Preto apontar assim como Eliakin Rufino e Neuber Uchôa que “Creio que foi Movimento Modernista de 1922 (Semana de Arte Moderna), também pelo Movimento Tropicalista. O primeiro com certeza foi o que mais tocou o Roraimeira, até pelo Mário de Andrade com Makunaíma que hoje já se chama em todo Roraima de MAKUNÁIMA”76. Conforme já havia sido mencionado pelo poeta Eliakin Rufino. 72 Entrevista mista concedida em 14/03/13. Entrevista mista concedida em 18/03/13. 74 Entrevista mista concedida em 25/03/13 . 75 Entrevista mista concedida em 18/03/13. 76 Entrevista mista concedida em 08/03/13. 73 51 5.4 Quais os principais protagonistas? Eliakin Rufino classifica como principais protagonistas, destacando por arte e estilo, os seguintes: “na música popular: Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto; nas artes plásticas: Elieser Rufino; na dança: Vânia Rufino; na Fotografia destacam-se: Jorge Macedo e Wank Carmo” 77 . Para o poeta, eles formavam a base do Movimento Roraimeira, que encabeçaram e articularam para que fossem divulgadas a temática regional não só em Roraima, mas com objetivo de exportar suas riquezas artísticas. Neuber Uchôa esboça que as pessoas que deram origem aos primeiros questionamentos e buscaram recursos para expandir a arte no Território Federal de Roraima foi o Trio Roraimeira, enfatiza que: “Mais o Movimento Roraimeira surgi em 1984, essa é que é a verdade, e a cabeça do Movimento somos eu, Eliakin e Zeca Preto, que na ocasião participavam de festivais cantando músicas regionalistas”78. Para explicar como se deu todo o processo de criação do Movimento, Neuber Uchôa pontua na entrevista, os questionamentos que levaram o grupo a pensar da mesma forma, buscando o regionalismo como base para as indagações que norteavam os artistas que queriam exalta sua terra. O cantor descreve que os protagonistas foram: Na verdade nós três demos início a coisa né, porque a vida é assim mesmo, alguém começa! Na verdade a gente sabia que tínhamos nas mãos uma coisa muito mais ampla, que precisava agregar outros valores, então aos poucos nós fomos também trazendo pra perto da gente, outros artistas, de outras artes, da literatura, das artes plásticas, da fotografia, da dança, que faziam a arte ligadas a temática Roraimeira. Que Roraimeira antes de tudo é fazer arte voltada para temática de Roraima. Aos poucos a gente foi se dando conta o que era ser Roraimeira. Roraimeira não é ser roraimense, é muito mais que isso, têm roraimense que não são necessariamente nascido em Roraima, e têm uns roraimenses que são traíras, não são roraimenses suficientes. Zeca Preto, por exemplo, é um paraense, é autor da música Roraimeira, é uma pessoa que se identifica com os nossos valores. É nós três representamos realmente os principais protagonistas, mais existem outros artistas também que militam na arte Roraimeira que são: os artistas Eliezer Rufino, nas fotografias temos o Jorge Macedo, o Cardoso e outros artistas plásticos, fazem obras que têm referências regionalistas que falam da nossas serras, dos nossos rios, e dos nossos costumes, enfim apresentam obras regionalistas. 79 Podemos perceber na fala de Neuber Uchôa o sentimento de fazer parte dessa história, demonstrando a importância e a dificuldade assumida por eles em começar e principalmente dar continuidade a arte em Roraima. O mesmo resume que “Roraimeira antes de tudo é fazer 77 Entrevista mista concedida em 14/03/13. Entrevista mista concedida em 18/03/13. 79 Idem. 78 52 arte voltada para temática de Roraima” 80. Com indignação demonstra em sua fala o descaso no quais muitos dos nascidos em Roraima adotam a postura em não aceitar e assumir que é do Norte, e se posicionam de modo contrário ao regionalismo, dando mais importância e valorizando as expressões artística e culturais de outras regiões, ou mesmo as internacionais. Quando abordado, o professor Reginaldo Gomes da ênfase em descrever que os protagonistas não eram um ou outro, o mesmo não relata que o Trio Roraimeira foram precursores do Movimento. Ele aponta vários artistas que encabeçavam o Movimento Roraimeira tais artistas como: No começo não havia figuras que se destacasse, mas aos poucos alguns nomes foram surgindo: Nas artes plásticas os nomes de Ana Maria, Valniro e Cardoso começaram divulgar essa temática regional em suas obras. Contudo, se você conversar com esses artistas eles não se sentiram parte do Movimento porque na época não tínhamos essa ideia de Movimento artístico e cultura Roraimeira. Na música Ricardo Souto Maior, Miranda de Aquino, Zeca Preto, Neuber Uchôa, Eliakin Rufino. No teatro os nomes de Marcos Montenegro, Chacon, e Catarina sobressaíram. Na dança temos os nomes de Natalina Gavioli, Vânia Rufino, Marcio Costa. Havia também festivais de música, teatro, dança e exposição de desenho e pintura organizados por professores de Artes nas escolas estaduais. O DAC foi o grande fomentador dessa ação envolvendo as diferentes linguagens da arte em busca da identidade roraimense.81 Podemos observar que nem Eliakin Rufino, nem Neuber Uchôa convergem nos nomes dos protagonistas aos quais o professor Reginaldo Gomes aponta como integrantes do Movimento Roraimeira, o mesmo destaca que Cardoso não se considera como membro do Grupo, tanto Reginaldo Gomes quanto Neuber Uchôa reafirmam que Cardoso esteve presente na gênese do Movimento.Tal informação não pode ser confirmado, pois o artista Jorge Augusto Cardoso não foi entrevistado. Assim como Eliakin Rufino e Neuber Uchôa o cantor Zeca Preto aponta que os precursores do Movimento Roraimeira foram “[...] os principais protagonistas do Movimento são os que continuam até hoje Zeca Preto, Neuber Uchôa, Eliakin Rufino e Vânia, na época esposa de Eliakin e Elieser nas Artes Plásticas”82. Enfatizando que o Movimento Roraimeira ainda é vivo, e que acontecem apresentação em diversos lugares com apresentações do Trio Roraimeira. O cantor enfatiza que haviam outros integrantes, relata assim como Reginaldo Gomes 80 Entrevista mista concedida em 18/03/13. Entrevista mista concedida em 25/02/13. 82 Entrevista mista concedida em 08/03/13 . 81 53 e Neuber Uchôa, o artista plástico Di Cardoso, “Vale lembrar que Jorge Augusto Cardoso, Mestre Afonso e Walníro Souza (artistas plásticos) fizeram parte do primeiro Roraimeira, em Manaus em agosto de 1984. Na fotografia83 temos Wank Carmo e Jorge Macedo”. Percebemos que alguns integrantes são relatados pelo professor Reginaldo Gomes estão na fala de Neuber Uchâo e Zeca Preto, como o do artista Di Cardoso, que esteve presente nas primeiras mesões do grupo, e que depois não continuou no Movimento Roraimeira como já foi explicado na fala do Professor Reginaldo Gomes. Nas respostas dos entrevistados observamos que há nomes citados, nomes que não são descritos de forma unanime, cada entrevistado enfatizou sua opinião, e em alguns momentos as respostas são parecidas e em outros se divergem. 5.5 Quais linguagens artísticas mais visíveis do Movimento Roraimeira? Como já discutimos no primeiro capítulo acerca das representações artísticas, os entrevistados deram suas contribuições ao descrever quais eram as linguagens que estavam atreladas ao Movimento. Destarte Neuber Uchôa discorre sobre o assunto destacando o seguinte: Eu acho que é exatamente a linguagem que a gente abraçou eu, Eliakin e Zeca Preto, era a música e poesia da gente, embora a dança também no início fizesse parte do Movimento. As artes Roraimeiras eram representadas pela música, pela literatura e pela dança, que faziam parte do início dos shows, com a Vânia Rufino que dançava nos shows, que mantinha um grupo de dança chamado de fibras tensas, que fazia uma coreografia baseada nos gestuais dos animais amazônicos e para isso agente deu o nome de Zoodança, então pra ti vê até nisso a gente se preocupava, com o que representar nos shows, que elementos a gente usaria na manifestação artística Roraimeira, tinha que ser algo que estivesse ligado a nós, a nossa realidade, então daí a nossa preocupação, com as artes que se identificam mais com o povo de Roraima, elas estão inseridas nas artes mais executadas na música e na literatura. 84 Então, ao analisar o relato do artista, percebemos que havia uma gama de expressões artísticas que se faziam presentes no Movimento. O “zoodança”, por exemplo, teve destaque durante as apresentações do Trio Roraimeira, tendo estado presente nos shows em Manaus e também no show no Teatro Carlos Gomes, em Boa Vista, na década de 1980. O professor Reginaldo Gomes, por sua vez, enfatizou que “quando se iniciou a discussão sobre arte e cultura regional o debate envolveu todas as linguagens da arte: teatro, 83 84 A fotografia mencionada não nos foi cedida para publicação nesta monografia. Entrevista mista concedida em 18/03/13. 54 dança, música, artes plásticas e literatura”85. Nesse ínterim, percebemos harmonia nas informações dadas anteriormente em outro tópico, acerca das expressões manifestadas pelo Movimento. O professor destaca também que “um grande número de pessoas que chegou a Boa Vista deixou a cidade por um tempo. Sem profissionais qualificados no campo das distintas linguagens, as ações musicais começaram a ganhar destaque”86. Zeca Preto apresentou as linguagens do Movimento Roraimeira, como sendo elementos da natureza, descreve que “As linguagens principais são: Música, Poesia e Dança, essa última linguagem era coreografada por Vânia Rufino. Zoodança (baseada nos gestos dos animais)”87. Todos que responderam ao questionário apontam para esses elementos que Zeca Preto menciona. Em relação ao poeta Eliakin Rufino, ressaltamos que por ocasião deste questionamento, o mesmo se absteve em respondê-lo ou a tecer quaisquer tipos de comentários sobre essa temática. 5.6 Quais as principais obras de música, literatura, artes plásticas, fotografia, dança? Os destaques apontados por Eliakin Rufino foram sistematizados da seguinte forma88: Música: Roraimeira (Zeca Preto), Ave e Nossa bossa (Neuber Uchoa) Makunaimando (Zeca e Neuber) Fuzarca na maloca (Eliakin Rufino) e Cidade do Campo (Armando de Paula e Eliakin Rufino); Literatura: o livro de poemas Pássaros Ariscos, de Eliakin Rufino, primeiro livro de poemas publicado em Roraima, em fevereiro de 1984 é um marco do movimento e da história da literatura local. A partir de 1989 o poema Cavalo Selvagem destaca-se como o poema mais popular do movimento. Artes plásticas: Principalmente os murais cerâmicos do Palácio da Cultura e do Hemocentro, de autoria do artista plástico Elieser Rufino. Dança: A Zoodança, criada por Eliakin Rufino e encenada pelo Grupo de Dança Fibras Tensas, sob a direção de Vânia Rufino. É o primeiro grupo de dança a apresentar-se no festival de dança de Joinville-SC em julho de 1990. 85 Entrevista mista concedida em 25/02/13. Entrevista mista concedida em 25/02/13. 87 Entrevista mista concedida em 08/03/13. 88 Entrevista mista concedida em 14/03/13. 86 55 Fotografia: o conjunto de fotos com temática roraimense e todas as capas de discos e folders do Movimento Roraimeira feitas pelo do fotográfo Jorge Macedo Em relação as música Neuber Uchôa destaca, sobretudo “a música que dá nome ao Movimento Roraimeira, que é uma música do Zeca Preto, do Festival de 1984”89. Também ressalta a importância de músicas como Nossa Bossa, destacada por ele como sendo “um dos hinos do Movimento Roraimeira”90. Além de Cruviana considerada por ele como “a maior declaração de amor que eu faço a minha terra!”91, Macunaimando e Cidade do campo de Elikin Rufino e Armando “que também é um hino a Boa Vista”92. Enfim são muitas músicas graças a Deus, hoje a gente tem orgulho de subir para cantar nos palcos e quando a gente desce têm muita gente que fica magoada por que a gente não cantou essa ou aquela outra música. Aos poucos a gente foi conquistando, graças a nossa insistência, também o nosso espaço. Valeu a pena ter insistido, e hoje ter isso aí veí, ser objeto de estudo, que já está nos anais da Universidade, isso é bacana, isso é compensador, eu tenho muito orgulho do que eu fiz, se eu tivesse que fazer o mesmo caminho, eu faria tudo de novo, até a ferrada da arraia eu queria de volta (risos). Eu tenho orgulho de ser artista, de ser quem eu sou, de ser regionalista principalmente [sic]93. O cantor também salienta a literatura: A gente tem as poesias do Eliakin Rufino, todo universo, as nossas letras também são, pura literatura cultural voltada para o regionalismo tem: o cavalo selvagem, sol de verão poesia dele que se destacam nesse cenário regionalista, bem são muitas músicas, talvez a artes plásticas, temos um grande painel feito pelo Eliezer Rufino, irmão do Eliakin, feito de cerâmica lá na entrada do palácio da cultura, é um exemplo bacana, uma arte voltada para a cestaria indígena, são elementos da cultura indígena também que fazem parte desse universo. 94 Neuber Uchôa finalizou sua entrevista agradecendo a Deus pelo sucesso obtido com o Movimento Roraimeira enfatizando o seguinte: “acho que a gente está bem servido, temos algumas obras que a gente deixou, e que podem servi de exemplos marcantes que é a obra Roraimeira”95. O professor Reginaldo Gomes contribuiu neste tópico destacando que “há alguns estudos sobre esse tema Roraimeira, mas não temos um registro claro sobre as principais obras”96. Em relação ao setor da música na figura discorreu que “Neuber Uchoa, Zeca Preto e Eliakin Rufino tem se destacado e gravaram um repertório significativo sobre a temática 89 Entrevista mista concedida em 18/03/13. Idem. 91 Idem. 92 Idem. 93 Idem. 94 Idem. 95 Idem. 96 Entrevista mista concedida em 25/02/13. 90 56 regional” 97 . Continuou discorrendo que após a década de 1980, “fotógrafos como Jorge Macedo e outros se destacaram na arte de registrar por meio da fotografia as pessoas e as paisagens de Roraima” 98. Contudo, o professor Reginaldo Gomes encerrou sua entrevista afirmando: “No meu entendimento Roraimeira não chegou a ser um movimento artístico e cultural, mas foi o nome de uma música que influenciou os músicos regionais na composição musical com elementos da cultura indígena e meio ambiente presentes nas suas canções” 99. Por fim Zeca Preto corrobora respondendo a última pergunta do questionário, a respeito das obras que envolveram a temática Roraimeira, o mesmo aponta que fizeram parte: Na música os discos: Roraima: O Canto de Roraima e suas Influências Indígenas e Caribenhas, Roraimeira: O Canto de Roraima. Na Literatura os livros: Pássaros Ariscos, Poemas, Escola de Poesia, Brincadeira, Poeta de Água Doce, entre outros... Nas Artes Plásticas, as Telas de Elieser. A Fotografia de Wank Carmo, a Fotografia de Jorge Macedo (Exposição Fotográfica Roraimeira) Uma maravilha... 100 Salientamos que a analise das entrevistas dos componentes do Movimento Roraimeira, nos ajudou a entender como ocorreu o processo e articulações dos envolvidos a formação do mesmo, suas dificuldades, suas esperanças em produzir e manifestar sua arte e enfatizar o desejo de pertencer Roraima. Podemos perceber os fatores que encabeçaram os debates artísticos e culturais da gênese do Movimento Roraimaira a partir das falas apresentadas por Eliakin, Neuber, Reginaldo e Zeca. Estes destacaram fatos, momentos, eventos, espetáculos, que fizeram parte da criação do Movimento Roraimeira. Bem como outros artistas que fizeram parte da historia do Movimento. 97 Entrevista mista concedida em 25/02/13. Entrevista mista concedida em 25/02/13. 99 Idem. 100 Entrevista mista concedida em 08/03/13 98 57 CONSIDERAÇÕES FINAIS O Movimento Roraimeira deixou eternizado em canções, artes, fotos, quadros, um caminho a ser trilhado para as pessoas que nasceram ou que aqui se sentiram acolhidas. Um sentimento de amor a sua terra. Declarando que em Roraima há sim cultura artística que as pessoas que vivem neste Estado sabem valorizar suas riquezas naturais, e que fazem parte de um povo acolhedor, vivendo em um caldeirão de influências, que somos uma mistura heterogênea do que há de melhor. Somos do Norte e temos orgulho de vivemos em Roraima. Um dos principais problemas que o Movimento Roraimeira enfrentou foi a falta de políticas públicas, voltadas a valorização de quem produzia arte, no então Território Federal de Roraima, principalmente na década de 1980, como relatam os artistas Eliakin Rufino, Neuber Uchôa e Zeca Preto, nos periódicos da época. Os mesmos descrevem o descaso tanto do Governo quanto da Prefeitura, e expõem suas dificuldades para promover sua arte. Recorremos à imprensa para podermos entender como se deram os debates sobre a temática. Buscamos nas falas dos artistas, primeiro nos periódicos, depois utilizamos os questionários, para ampliar as discussões envolvendo os artistas locais. Os jornais apresentavam denuncias retratando o total estado de abandono da arte em Roraima. Em tom de desabafo os artistas, apontam que faltavam incentivos dos órgãos competentes para produzir seus trabalhos, tendo que buscar outros meios ou formas alternativas para produzir seus shows. O Movimento Roraimeira buscava as questões de conhecer e difundir para outros cantos, lugares, países a Cultura Indígena, os costumes regionais de Roraima e que suas tradições fossem preservadas por meio de suas canções, trabalhadas em seus shows. Os artistas mesclavam as apresentações que eram exibidas no início no Teatro Carlos Gomes. Buscavam suas inspirações no regionalismo, transmitiam para o público presente nos espetáculos, o belo das riquezas naturais de Roraima. Atuavam como agentes representativos dos viventes de Roraima, mostrando que a cultura deveria ser exposta ao mundo, pois a cultura está relacionada à alma. O Movimento tinha como enfoque preservar os hábitos e costumes. Entediam que algo deveria ser feito para poder preservar suas artes naturais, seu modo de viver, com os debates os integrantes, identificaram suas produções sendo um ponto de partida, para exaltar sua terra. Eternizando assim diversos elementos contidos na cultura de Roraima. 58 Neste trabalho, nos propomos, sobretudo, em analisar a atuação do Trio Roraimeira, que através de seus discos retratavam a identidade, costumes e hábitos locais. Apresentando expressões artísticas, demonstrando nos palcos por meio de suas canções, um modo de pensar, fazer e sentir próprio. O Movimento Roraimeira representou e ainda representa um processo cultural, que através de suas experiências vividas, tanto em Roraima, quanto fora do Estado, à fomentação dos discursos dos mesmos, que apresentam elementos plurais em suas obras, manifestações em busca do aprimoramento de seus trabalhos. Dando sentido ao nome Roraimeira, que seria um sentimento de pertencer a Roraima. Podemos perceber que foi por meio das canções que Roraima foi difundido as belezas e atrativos culturais, por meio da arte foram promovendo a cultura, expondo seus lugares, belezas e seu turismo típico e único. Descrevendo um local belo para se viver e apresentando seus encantos, mitos, lendas, paisagens, histórias, comidas, montes, plantas, peixes, costumes entre outros aspectos. Apontando uma forte herança cultural que não poder ser esquecida, que os artistas reafirmam, como se quisessem a qualquer momento expressar seus sentimentos a terra em que habitam, declarando seu amor em cada canção cantada ou declamada. Enfatizando seu carinho por Roraima, e expandido para outros lugares, o que a de belo em Boa Vista. Não podemos esquecer que Roraima é um Estado fronteiriço, por isso também recebe uma gama de migrantes, que buscam oportunidades, veem no Estado um lugar de esperança de melhores oportunidades, uma vida mais tranquila, como já canta o poeta Eliakin Rufino. Ao enfatizar as questões de identidade percebemos que são sistemas de representações que estão ligadas as construções do que seria o “eu”. Em outras palavras, permite que o indivíduo se torne semelhante a si mesmo, sendo único, diferente dos outros. Sua construção é progressiva e contínua. Tendo como destaque inúmeras influências e transformações, fruto da própria dinâmica cultural e do contato com os outros povos. No enfoque a respeito de cultura percebemos que estudar cultura é, portanto, estudar um código de símbolos partilhados e compartilhados pelos membros dessa cultura, na qual o individuo está inserido. Através dos periódicos foram verificados, as questões relacionadas à cultura, observamos como eram retratas essas questões, percebemos que em algumas manchetes a arte e cultura eram representados, como atos de teimosia de poucos, e que não tinham os 59 incentivos dos órgãos competentes. Nosso trabalho apresentou as analises sistemáticas sobre os embates do Movimento Roraimeira, buscamos compreender o processo de sua criação e suas articulação, no exTerritório de Roraima, descrevendo a opinião de cada entrevistado, enfatizando que os acontecimentos foram diversos, para fomentar sua origem, e que os questionamentos, foram expostos nas suas canções como uma forma de exaltar as belezas naturais de Boa Vista. 60 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALBERTI, Verena. Manual de história oral. 3ª Ed., Rio de Janeiro: Ed., FVG, 2005. _________ O Campo da História: Especialidades e abordagens. 5ª ed. Petrópolis/RJ: Vozes, 2008. BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das letras, 1996. BURKE, Peter. O Que é História Cultural, 2ª Ed., Rio de Janeiro, Zahar, 2008. CANCLINI, Néstor García. Culturas Híbridas: Estratégias para Entrar e Sair da Modernidade. 4. ed. São Paulo: editora da Universidade de São Paulo, 2008. COCHE, Denys. 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Petrópolis: Vozes, 2009. 62 ANEXO A Jornal de Roraima 11/04/1991 63 ANEXO B Boletim da Educação e Cultura 10/84 64 ANEXO C Folha de Boa Vista, 05/10/1984 65 ANEXO D Folha de Boa Vista, 22/01/1989 66 ANEXO E Folha de Boa Vista, 22/01/1989 67 ANEXO F Folha de Boa Vista, 22/01/1989 68 ANEXO G A Critica de Roraima, 13/08/1989 69 ANEXO H A Critica de Roraima, 13/08/1989 70 ANEXO I A Critica de Roraima, 13/08/1989 71 ANEXO J A Critica de Roraima, 13/08/1989 72 ANEXO K O Estado de Roraima, 10/03/1991 73 ANEXO L Folha de Boa Vista, 21/03/1991 74 ANEXO M Folha de Boa Vista, 13/04/1991 75 ANEXO N Folha de Boa Vista, 15/06/1991 76 ANEXO O Jornal de Roraima, 18/06/1991 77 ANEXO P Jornal de Roraima, 23/06/1991 78 ANEXO Q Folder 79 ANEXO R Folder 80 ANEXO S Folder