Universidade Federal de Minas Gerais Instituto de Ciências Biológicas Programa de Pós-­‐Graduação em Ecologia, Conservação e Manejo de Vida Silvestre REDE DE INTERAÇÕES MUTUALÍSTICAS FRUGÍVORO-­‐PLANTA EM CAMPOS RUPESTRES i Mariane Lobato Meneses Varela Belo Horizonte 2011 Rede de interações mutualísticas frugívoro-­‐planta em campos rupestres Mariane Lobato Meneses Varela Orientador: Prof. Dr. Marcos Rodrigues ii Dissertação apresentada ao Instituto de Biologia da Universidade Federal de Minas Gerais como parte dos requisitos para a obtenção do título em Mestre em Ecologia, Conservação e Manejo da Vida Silvestre. Belo Horizonte 2011 iii “Quem dera os jovens soubessem o que podem e os velhos pudessem o que sabem.” José Saramago iv Belo Horizonte, 24 de fevereiro de 2011 BANCA EXAMINADORA Prof. Dr. Marcos Rodrigues (orientador) ____________________________ Assinatura Profa. Dra. Cristina Sazima ____________________________ Assinatura Prof. Dr. Flávio Henrique Guimarães Rodrigues ____________________________ Assinatura Prof. Dr. José Pires de Lemos Filho bfxbg ____________________________ Assinatura v Agradecimentos Aos professores Adriano Paglia, Eduardo Borba e Zélia Lobato pelas contribuições realizadas a este manuscrito. Aos professores Eduardo Borba, Mario Cozuol, e Flávio Rodrigues que durante o curso da pós-­‐ graduação abriram minha mente para novas idéias e me ajudaram a pensar melhor. Aos colegas de mestrado que acabaram virando amigos, principalmente a Nadjia, e que juntos compartilhamos aflições, raiva, desespero e pânico total! Mas também foi muito divertido!! Ao pessoal do Lab Marina, Renata, Lilian, Guilherme e Daniel pelas conversas produtivas e improdutivas, todas valeram. Ao pessoal do laboratório de botânica, especialmente a Mariana, que foram muito gentis identificando as plantas. Ao meu orientador Marcos Rodrigues que quis entrar nessa comigo mesmo sabendo que eu não sabia nada! Ao pessoal do curso da Pós Fred e Cris que sempre tiveram boa vontade para ajudar no que fosse possível. A banca examinadora que aceitou meu convite! Ao programa de Pós-­‐graduação em Ecologia Conservação e Manejo de Vida Silvestre da UFMG e ao IBAMA pela oportunidade de realizar este estudo. A U.S. Fish & Wildlife Service pelo patrocínio. A meus amigos Anne, Jô, Sandra, Brenda, Krininha, Eliza, Elaine, Mary e Ciça que contribuíram indiretamente, diretamente, ou ate sem querer para realização deste trabalho. A minha mãe Márcia meu Pai Marcio e meu irmão Diego, que sempre me apoiaram e nunca foram contra minhas escolhas, mesmo quando não concordavam..... e também por agüentaram todas as minhas bagunças em toda a casa durante todo este processo. A meus tios tias e primos, pela união e alegria. A minha avó Benita por ser tão leve, divertida e diferente de todas as avós que já conheci. A meu noivo Caca, que e acreditou dimaisnimim!!! Querido você é tudo de bom!! A Cinthia e Nicole que foram comigo para o campo quando não consegui encontrar ninguém e ao Lecínio por ter sempre nos recebido tão bem no Alto do Palácio. vi Ao Alto do Palácio, nunca me cansei de olhar para você! A todas as aves que defecaram muitas sementes no saco e visitavam muitas plantas! A Laura que agüentou sol escaldante, frio intenso, chuva de granizo na cabeça e até medir sementes milimétricas e não desistiu de me ajudar! Agradecimento especial a Lica, amiga, sem sua ajuda eu não teria conseguido. Valeu demais, por tudo, mesmo!!! vii SUMÁRIO Resumo 1 Abstract 2 Introdução 3 Objetivo 5 Materiais e Métodos 5 Resultados 17 Discussão 27 Conclusão 33 Referências bibliográficas 34 viii Resumo: Redes de interações mutualísticas são reconhecidas como moldadoras da biodiversidade atualmente encontrada na Terra. Para descrever as redes de interações mutualísticas são utilizadas métricas qualitativas: número de componentes, tamanho, conectância, grau médio, grau de distribuição, e aninhamento da rede. Outras métricas tais como: dependência, força e assimetria, são usadas para quantificar as interações. Índices de centralidade apontam quais espécies tem muitas interações e ocupam papel central na rede. Estes índices são também utilizados para identificar as espécies que ocupam papel central em uma rede de interações. O objetivo do estudo foi o de descrever qualitativamente e quantitativamente a rede de interações entre aves frugívoras e plantas de uma área de campo rupestre; ambiente que abriga enorme riqueza, endemismo e diversidade de espécies de plantas e animais; indicando as possíveis espécies chave que compõe este sistema. O estudo foi realizado no Alto do Palácio localizado no Parque Nacional da Serra do Cipó, MG, Brasil. Os dados foram coletados mensalmente ao longo de 12 meses em três diferentes fisionomias comumente encontradas na área: afloramentos rochosos, campos e mata ciliar. Redes de neblina foram utilizadas para capturar aves que eram colocadas em sacos para que defecassem. As sementes encontradas nas fezes das aves foram triadas em comparadas com frutos coletados ao longo das fisionomias amostradas. O acompanhamento fenológico das espécies de plantas zoocoricas em estagio de frutificação foi realizada em transectos pré estabelecidaos nas três fisionomias. A rede de interações aves frugívoras-­‐ plantas apresentou-­‐se aninhada, com predominância de interações assimétricas, o que é comum em redes de interações mutualísticas. Esta rede de interações mostrou que frugívoros com baixa proporção da dieta ocuparam papel de especialistas na rede de interações. A espécie de ave Elaenia obscura (Tyrannidae) possui enorme importância para a rede de interações mutualísticas frugívoro planta do Alto do Palácio e foi considerada como espécie chave desta comunidade. Palavras chave: rede de interações mutualísticas, espécie chave, campos rupestres 9 Abstract: Mutualistic interaction networks are composed by two groups: plants and animals, they are recognize as the architecture of Earth biodiversity. To describe mutualistic interaction networks metric as number of compounds, size, conectance, average degree, distribution degree and nestedness are used. Other metrics are used to quantify interactions: dependence, straight and asymmetry. Centrality indexes point witch species are involved in many interactions and have central hole in the network. The aim in this work was to describe qualitatively and quantitatively the mutualistic interaction network between frugivorous birds and plants of a Campo Rupestre area, a peculiar environment witch contains huge richness, endemism and diversity of plants and animals, showing the probable keystone species of the this system. The study was made in Alto Palácio region located in Serra do Cipo National Park, MG, Brazil. The data was collected monthly along a year in tree different fisionomyies usually find in the area: rock outcrops, grassland and gallery forest. Mist nets were used to capture birds that were placed in bags so they could defecate. The feces were than separated in increase magnifying glasses, and the seeds found in the feces were compared to those collected along the transects established throughout different fisionomys. This transects were used to phenological accompanimento of the zoocorics plants. The mutualistic interaction network plant frugivorous is nested with high asymmetrical interactions, what is common in others mutualistic interactions networks. In the network we may observe that frugivorous with low proportion of fruits in the diet occupied specialist place in the network. The specie Elaenia obscura (Tyrannidae) is recognize as having a great importance to the mutualistic interaction network of frugivorous birds and plants from Alto do Palácio region and was considered as the keystone specie of the community. Keywords: Multualistic interaction networks, keystone species, campos rupestres. 10 Introdução As interações ecológicas ocorrem amplamente na natureza e têm potencial para influenciar a dinâmica evolutiva das espécies moldando e transformando as comunidades. As interações mutualísticas, sendo benéficas para ambas as partes, sempre foram, durante a história, motivo de grande interesse e curiosidade dos naturalistas (Bascompte & Jordano 2007). As plantas, seus polinizadores e dispersores de sementes são os arquitetos da biodiversidade, pois a dinâmica da comunidade depende profundamente das diferentes formas com as quais as espécies interagem (Bascompte et al. 2006). As redes de interações mutualísticas animal-­‐planta, são por definição redes de dois modos ou de duas entidades: plantas e animais, sendo representadas por gráficos bipartidos (Bascompte & Jordano 2007). Métricas como: tamanho da rede, distribuição de grau das espécies , aninhamento e conectância; estão relacionadas com dados qualitativos e apesar de serem validos para descrição da rede estas métricas assumem que todas as interações presentes na rede são igualmente importantes (Vásquez et al. 2005). Métricas mais recentes (dependência, assimetria, força do mutualismo e força da espécie) baseadas em freqüência de visitas ou provenientes da extensão das próprias descrições qualitativas surgiram buscando quantificar as interações (Bascompte et al. 2006, Bascompte & Jordano 2007, Vasquez Vásquez et al. 2005). Recentemente métricas envolvendo índices de centralidades foram utilizadas em estudos com redes de interações de polinizadores (Martin Gonzáles et al. 2010) e em sistemas de peixes clientes e limpadores (Sazima et al. 2010). Tais índices são utilizados para medir aspectos diferentes de como uma rede é centrada em alguns nós (espécies) em particular (Jordano et al. 2006). Um destes índices é sugerido como indicador de espécies que ocupam papel chave no sistema (Martin Gonzáles et al. 2010, Jordan et al. 2006). Espécies chave se realmente existem, são importantes para entender as funções das comunidades e desta forma possuem grandes implicações para o manejo e manutenção da biodiversidade dos ecossistemas (Payton et al. 2002). Desde a introdução do conceito de espécie chave, inúmeros trabalhos surgiram utilizando e adaptando o conceito para diversos grupos e ecossistemas (Tanner et al. 1994, Daily et al. 1993; Berlow et al 1999; Jain & Krishna 2002). A extensa utilização do conceito de espécie chave ganhou incontáveis críticas 11 inclusive sugestões de que o conceito seria amplamente utilizado, pobremente definido, não demonstrando, inconsistente e até “ma moda” ( Mills et al. 1996). A aplicação do conceito de espécie chave em interações mutualísticas é reconhecida quando ocorrem interações altamente especializadas onde, várias espécies dependem fortemente de uma única espécie, seja para ser dispersada ou polinizada. E excepcionalmente quando o mutualismo entre duas espécies é muito forte que ao se remover uma das espécies o outro mutualista seria altamente afetado, desestabilizando a comunidade (Payton et al. 2002). O conceito de recursos chave pode ser aplicado à plantas que produzem frutos com baixa redundância, a quantidades e freqüência confiáveis, e são consumidos por grande proporção dos vertebrados locais com os quais coexiste (Peres 2000). Diversos índices foram criados com intuito de medir o quão forte seria uma interação, ou quanto uma única espécie poderia afetar toda uma comunidade. Dentre eles os índices de centralidade que vêm sendo utilizados recentemente em estudos de interações (Jordan 2006, Sazima et al. 2010, Martin Gonzales et al. 2010) e são interessantes, pois consideram interações indiretas entre as espécies dentro da rede (Jordan 2006). Muitas plantas produzem frutos de polpa carnosa contendo altos valores nutritivos, como uma recompensa para seus dispersores, as variedades de cor formas e tamanhos servem como atrativos para os mesmos. Tais características são consideradas atributos para a dispersão e são fundamentais para a dispersão de sementes. Além disso, quando os animais se alimentam de tais “recompensas” aumenta a possibilidade de dispersão das sementes para áreas distantes da planta mãe evitando a competição e predação (Howe & Miriti 2004). A frugivoria, a ação de consumir frutos pelos animais, pode ser considerada como uma interação mutualística quando a ave não inviabiliza a semente. A frugivoria é uma função fundamental na demografia e evolução das comunidades de plantas, pois a regeneração natural dessas é fortemente dependente da disseminação de sementes por animais (Jordano 2000). A Cadeia do Espinhaço destaca-­‐se por ser uma das maiores formações montanhosas do Brasil, estendendo-­‐se por cerca de 1000 km e ocupando desde o centro sul de Minas Gerais até a Chapada Diamantina na Bahia (Azevedo & Machado 2008). As montanhas variam de 900 a 1500 m podendo atingir mais de 2000 m de altitude (Giulietti & Pirani 1997) e separam a bacia hidrográfica do Rio São Francisco das bacias dos rios que correm para o Atlântico (Pardo, Jequitinhonha, Mucuri e Doce) (Moreira & Carmelier 1977), Esta cadeia de 12 montanhas atua como uma faixa de transição entre três grandes biomas Brasileiros: Caatinga, Cerrado e Floresta Atlântica (Gontijo 2008). Na cadeia do espinhaço diversas fitofisionomias são encontradas e são determinadas pela fisiografia presente em determinado local, sendo assim fisionomias variando desde florestas até campos ocorrem na região. Formações florestais altamente influenciadas pela umidade como as florestas de galeria e as florestas nebulares são encontradas nas margens de riachos e em altitudes elevadas. Outras fitofisionomias como florestas semi-­‐descíduas, capões de mata, campos de cerrado, campos e campos rupestres aparecem ao longo de toda a cadeia de montanhas, o que caracteriza a Cadeia do Espinhaço como um grande mosaico de fitofisionomias (Giulietti et al. 1997) Os campos rupestres são comumente encontrados na Cadeia do Espinhaço e são de extrema importância para conservação, já que detém enorme riqueza, diversidade, elevado grau de endemismo e inúmeras espécies raras e ameaçadas tanto de plantas, como de animais (Giulietti 1987, 1997; Rapini et al. 2008; Azevedo et al. 2008; Leite et al. 2008; Alves et al. 2008; Vasconcelos et al. 2008; Lessa et al. 2008). Compreender as interações mutualísticas entre plantas e aves frugívoras que habitam os campos rupestres é de fundamental importância, pois possui implicações na elaboração de medidas de conservação para a manutenção deste ambiente formidável. Objetivo Geral O presente estudo teve como objetivo descrever qualitativamente e quantitativamente a rede de interações mutualísticas frugívoro-­‐planta dos campos cupestres do Alto do Palácio (AP), Parque Nacional da Serra do Cipó, indicando a importância das espécies e as possíveis espécies chave que compõe este sistema. Objetivos especificos • Verificar a comunidade de aves que compõe a rede de interações mutualísticas frugívoro-­‐planta em três fitofisionomias do (AP); • Verificar a comunidade de plantas que compõe a rede de interações mutualísticas frugívoro-­‐planta em três fitofisionomias do (AP); 13 • Descobrir quais são as espécies especialistas e as generalistas que fazem parte da rede de interações mutualísticas do (AP); • Calcular a frequência de ocorrencia e a abundância das espécies; • Caracterizar a rede de interações mutualísticas do (AP), descrevendo o tamanho da rede, grau da espécie, grau médio das espécies, grau de distribuição, aninhamento, e conectancia; • Avaliar métricas quantidativas das espécies da rede como: assimetria e dependência ou força do mutualismo, força da espécie. • Simular extinções das espécies verificando as possíveis consequências para a rede de interações mutualísticas do (AP) Material e Métodos Área de Estudo O estudo foi realizado na região do Alto do Palácio (19º15' S, 43º31' W) no leste do Parque Nacional da Serra do Cipó (PNSC), localizado no município de Morro do Pilar, na porção sul da Cadeia do Espinhaço em Minas Gerais, Brasil (Figura 1 e 2A). A temperatura da área varia entre 15 e 20°C, já quanto a pluviosidade observa-­‐se amplitude elevada (menos de 5mm nos meses mais secos e cerca de 400mm nos meses de chuva) (Rodrigues et al. in press). A área de estudo está localizada a cerca de 1300 m de altitude onde várias fisionomias são encontradas, entre elas três são mais extensas e evidentes: campos rupestres, campos e florestas de galeria. Os campos rupestres são caracterizados pelo afloramento de rochas expostos na superfície, entremeados por solo arenoso e cascalhos, a vegeteção é caracterizada por porção herbácea decontínua, com predominância de arbustos e subarbustos sempre verdes (Figura 2B). Os campos são formados por solos pedregosos onde predomina uma vegetação herbácea-­‐arbustiva com árvores esparsas e baixas (Figura 4). Por último, as matas ciliares ou de galeria, ocorrem ao longo de riachos e apresentam solos mais desenvolvidos e estrato arbóreo mais complexo, com árvores de até 15 m de altura (Figura 3D) (sensu Giulietti et al. 1997). 14